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Document 62015CJ0428

Acórdão do Tribunal de Justiça (Terceira Secção) de 27 de outubro de 2016.
Child and Family Agency contra J. D.
Pedido de decisão prejudicial apresentado pela Supreme Court.
Reenvio prejudicial — Cooperação judiciária em matéria civil — Competência, reconhecimento e execução de decisões em matéria matrimonial e de responsabilidade parental — Regulamento (CE) n.° 2201/2003 — Artigo 15.° — Transferência do processo para um tribunal de outro Estado‑Membro — Âmbito de aplicação — Requisitos de aplicação — Tribunal mais bem colocado — Superior interesse da criança.
Processo C-428/15.

Court reports – general

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2016:819

ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção)

27 de outubro de 2016 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Cooperação judiciária em matéria civil — Competência, reconhecimento e execução de decisões em matéria matrimonial e de responsabilidade parental — Regulamento (CE) n.o 2201/2003 — Artigo 15.o — Transferência do processo para um tribunal de outro Estado‑Membro — Âmbito de aplicação — Requisitos de aplicação — Tribunal mais bem colocado — Superior interesse da criança»

No processo C‑428/15,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial apresentado, nos termos do artigo 267.o TFUE, pela Supreme Court (Supremo Tribunal, Irlanda), por decisão de 31 de julho de 2015, que deu entrada no Tribunal de Justiça em 4 de agosto de 2015, no processo

Child and Family Agency

contra

J. D.,

estando presente:

R. P. D.,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Terceira Secção),

composto por: L. Bay Larsen, presidente de secção, M. Vilaras, J. Malenovský (relator), M. Safjan e D. Šváby, juízes,

advogado‑geral: M. Wathelet,

secretário: L. Hewlett, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 12 de maio de 2016,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Child and Family Agency, por L. Jonker, solicitor, T. O’Leary, SC, e D. Leahy, barrister,

em representação de J. D., por I. Robertson, solicitor, M. de Blacam, SC, e G. Lee, BL,

em representação do menor R. P. D., por G. Irwin, solicitor, G. Durcan, SC, S. Fennell, BL, e N. McDonnell, BL,

em representação da Irlanda, por E. Creedon, L. Williams e A. Joyce, na qualidade de agentes, assistidos por A. Carroll, BL,

em representação do Governo checo, por M. Smolek e J. Vláčil, na qualidade de agentes,

em representação do Governo eslovaco, por B. Ricziová, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por M. Wilderspin, na qualidade de agente,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 16 de junho de 2016,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 15.o do Regulamento (CE) n.o 2201/2003 do Conselho, de 27 de novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1347/2000 (JO 2003, L 338, p. 1; retificação no JO 2013, L 82, p. 63).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe a Child and Family Agency (Agência para a proteção da criança e da família, Irlanda, a seguir «Agência») a J. D., a propósito do destino do segundo filho desta, o menor de pouca idade R.

Quadro jurídico

3

Os considerandos 5, 12, 13 e 33 do Regulamento n.o 2201/2003 enunciam:

«(5)

A fim de garantir a igualdade de tratamento de todas as crianças, o presente regulamento abrange todas as decisões em matéria de responsabilidade parental, incluindo as medidas de proteção da criança, independentemente da eventual conexão com um processo matrimonial.

[...]

(12)

As regras de competência em matéria de responsabilidade parental do presente regulamento são definidas em função do superior interesse da criança e, em particular, do critério da proximidade. Por conseguinte, a competência deverá ser, em primeiro lugar, atribuída ao Estado‑Membro de residência habitual da criança, exceto em determinados casos de mudança da sua residência habitual ou na sequência de um acordo entre os titulares da responsabilidade parental.

(13)

No interesse da criança, o presente regulamento permite que o tribunal competente possa, a título excecional e em certas condições, remeter o processo a um tribunal de outro Estado‑Membro se este estiver em melhores condições para dele conhecer. Todavia, nesse caso, o segundo tribunal não deverá ser autorizado a remeter o processo a um terceiro tribunal.

[...]

(33)

O presente regulamento reconhece os direitos fundamentais e os princípios consagrados na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia; pretende, designadamente, garantir o pleno respeito dos direitos fundamentais da criança enunciados no artigo 24.o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia».

4

O artigo 1.o do Regulamento n.o 2201/2003, sob a epígrafe «Âmbito de aplicação», dispõe:

«1.   O presente regulamento é aplicável, independentemente da natureza do tribunal, às matérias civis relativas:

[...]

b)

À atribuição, ao exercício, à delegação, à limitação ou à cessação da responsabilidade parental.

2.   As matérias referidas na alínea b) do n.o 1 dizem, nomeadamente, respeito:

a)

Ao direito de guarda e ao direito de visita;

[...]

d)

À colocação da criança ao cuidado de uma família de acolhimento ou de uma instituição;

[...]»

5

O artigo 2.o, ponto 7, deste regulamento enuncia que, para efeitos do mesmo, entende‑se por:

«‘Responsabilidade parental’, o conjunto dos direitos e obrigações conferidos a uma pessoa singular ou coletiva por decisão judicial, por atribuição de pleno direito ou por acordo em vigor relativo à pessoa ou aos bens de uma criança. O termo compreende, nomeadamente, o direito de guarda e o direito de visita.»

6

O capítulo II do referido regulamento, sob a epígrafe «Competência», compreende nomeadamente uma secção 2, intitulada «Responsabilidade parental», que prevê, nos artigos 8.° a 15.°, um conjunto de regras relativas à competência dos tribunais dos Estados‑Membros na matéria.

7

O artigo 8.o do mesmo regulamento, sob a epígrafe «Competência geral», dispõe, nomeadamente, no seu n.o 1:

«Os tribunais de um Estado‑Membro são competentes em matéria de responsabilidade parental relativa a uma criança que resida habitualmente nesse Estado‑Membro à data em que o processo seja instaurado no tribunal.»

8

Nos termos do artigo 15.o do Regulamento n.o 2201/2003, sob a epígrafe «Transferência para um tribunal mais bem colocado para apreciar a ação»:

«1.   Excecionalmente, os tribunais de um Estado‑Membro competentes para conhecer do mérito podem, se considerarem que um tribunal de outro Estado‑Membro, com o qual a criança tenha uma ligação particular, se encontra mais bem colocado para conhecer do processo ou de alguns dos seus aspetos específicos, e se tal servir o superior interesse da criança:

a)

Suspender a instância em relação à totalidade ou a parte do processo em questão e convidar as partes a apresentarem um pedido ao tribunal desse outro Estado‑Membro, nos termos do n.o 4; ou

b)

Pedir ao tribunal de outro Estado‑Membro que se declare competente nos termos do n.o 5.

2.   O n.o 1 é aplicável:

a)

A pedido de uma das partes; ou

b)

Por iniciativa do tribunal; ou

c)

A pedido do tribunal de outro Estado‑Membro com o qual a criança tenha uma ligação particular, nos termos do n.o 3.

Todavia, a transferência só pode ser efetuada por iniciativa do tribunal ou a pedido do tribunal de outro Estado‑Membro, se for aceite pelo menos por uma das partes.

3.   Considera‑se que a criança tem uma ligação particular com um Estado‑Membro, na aceção do n.o [1], se:

a)

Depois de instaurado o processo no tribunal referido no n.o 1, a criança tiver adquirido a sua residência habitual nesse Estado‑Membro; ou

b)

A criança tiver tido a sua residência habitual nesse Estado‑Membro; ou

c)

A criança for nacional desse Estado‑Membro; ou

d)

Um dos titulares da responsabilidade parental tiver a sua residência habitual nesse Estado‑Membro; ou

e)

O litígio se referir às medidas de proteção da criança relacionadas com a administração, a conservação ou a disposição dos bens na posse da criança, que se encontram no território desse Estado‑Membro.

4.   O tribunal do Estado‑Membro competente para conhecer do mérito deve fixar um prazo para instaurar um processo nos tribunais do outro Estado‑Membro, nos termos do n.o 1.

Se não tiver sido instaurado um processo dentro desse prazo, continua a ser competente o tribunal em que o processo tenha sido instaurado nos termos dos artigos 8.° a 14.°

5.   O tribunal desse outro Estado‑Membro pode, se tal servir o superior interesse da criança, em virtude das circunstâncias específicas do caso, declarar‑se competente no prazo de seis semanas a contar da data em que tiver sido instaurado o processo com base nas alíneas a) ou b) do n.o 1. Nesse caso, o tribunal em que o processo tenha sido instaurado em primeiro lugar renuncia à sua competência. No caso contrário, o tribunal em que o processo tenha sido instaurado em primeiro lugar continua a ser competente, nos termos dos artigos 8.° a 14.°

6.   Os tribunais devem cooperar para efeitos do presente artigo, quer diretamente, quer através das autoridades centrais designadas nos termos do artigo 53.o»

Litígio no processo principal e questões prejudiciais

9

J. D. é nacional do Reino Unido.

10

O seu filho mais velho foi institucionalizado no Reino Unido em 2010, após constatação de que J. D. sofria de uma perturbação de personalidade qualificada como «comportamento antissocial», por um lado, e de que tinha exercido violência física contra esse filho, por outro.

11

Quando ainda residia nesse Estado‑Membro, antecipando o nascimento do seu segundo filho, R., J. D. foi sujeita, em 27 de agosto de 2014, a uma avaliação pré‑natal efetuada pelas autoridades de proteção da criança do seu local de residência devido aos seus antecedentes médicos e familiares. Desta avaliação resultou, nomeadamente, que J. D. tinha afeto pelo seu primeiro filho, que tinha uma perspetiva positiva relativamente ao nascimento de R., que fez preparativos para este nascimento e, em particular, que manifestou a sua vontade de colaborar com os assistentes sociais neste âmbito. No entanto, as autoridades competentes consideraram que R. deveria ser colocado, ao nascer, numa família de acolhimento até à instauração de um processo de adoção por terceiros.

12

J. D. rescindiu, então, o seu arrendamento e vendeu os seus bens no Reino Unido, antes de se instalar na Irlanda, em 29 de setembro de 2014. R. nasceu neste segundo Estado‑Membro, em 25 de outubro de 2014. Ambos residem aí desde então.

13

Pouco após o nascimento de R., a Agência requereu ao District Court (Tribunal Distrital, Irlanda) competente que ordenasse que esta criança fosse objeto de uma medida de colocação. Porém, este pedido foi indeferido com o fundamento de que os elementos de prova que tinham por base rumores com origem no Reino Unido em que a Agência se baseava eram inadmissíveis.

14

A Agência interpôs recurso no Circuit Court (Tribunal de Círculo, Irlanda) competente, o qual ordenou a colocação provisória de R. numa família de acolhimento. Esta medida foi renovada periodicamente desde então. Todavia, foi concedido a J. D. um direito de visita regular ao seu filho, do qual fez uso.

15

Além disso, a Agência requereu à High Court (Tribunal Superior, Irlanda) que, no que respeita ao mérito, o processo fosse transferido para a High Court of Justice (England & Wales) [Tribunal Superior de Justiça (Inglaterra e País de Gales), Reino Unido], nos termos do artigo 15.o do Regulamento n.o 2201/2003. Este pedido foi apoiado pelo tutor ad litem de R.

16

Por acórdão de 26 de março de 2015, a High Court (Tribunal Superior) autorizou a Agência a requerer a esse tribunal que se declarasse competente no processo em causa.

17

J. D. pediu autorização para interpor recurso desse acórdão diretamente na Supreme Court (Supremo Tribunal, Irlanda), que, ouvidas as partes, deferiu o seu pedido.

18

Na sua decisão de reenvio, a Supreme Court (Supremo Tribunal) questiona‑se, em primeiro lugar, sobre se o artigo 15.o do Regulamento n.o 2201/2003 pode ser aplicado numa ação que tem por objeto um processo de acolhimento instaurado com base no direito público, como o que lhe foi submetido, apesar de não estar atualmente pendente no Reino Unido nenhum processo e de um reconhecimento de competência por parte dos órgãos jurisdicionais deste Estado‑Membro implicar, assim, a jusante, que as autoridades de proteção da criança do referido Estado‑Membro aceitem decidir o caso de R., instaurando um processo desse tipo ao abrigo do seu direito interno.

19

Em seguida, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta como deve ser interpretado o conceito de «superior interesse da criança» enunciado no artigo 15.o do Regulamento n.o 2201/2003. Entende que este artigo não exige que o tribunal normalmente competente para conhecer de um processo, quando pretende transferir esse processo para um tribunal de outro Estado‑Membro que considera mais bem colocado, proceda a um exame completo do superior interesse da criança. Considera que o tribunal normalmente competente deve, ao invés, efetuar uma avaliação sumária desta questão, à luz do princípio de que o superior interesse da criança exige que a apreciação da situação seja efetuada pelo tribunal mais bem colocado para esse efeito, incumbindo ao tribunal do outro Estado‑Membro efetuar uma análise mais aprofundada.

20

Por último, o órgão jurisdicional de reenvio questiona os elementos a ter em consideração no âmbito dessa avaliação sumária. A este propósito, sublinha que J. D. deixou legalmente o Reino Unido para se estabelecer na Irlanda antes do nascimento de R, perguntando em simultâneo se é, contudo, possível ter em conta o facto de a sua deslocação ter sido motivada pelo medo de que este filho lhe fosse retirado pelos serviços de proteção da criança do primeiro desses dois Estados‑Membros.

21

Nestas circunstâncias, a Supreme Court (Supremo Tribunal) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

O artigo 15.o do Regulamento n.o 2201/2003 aplica‑se a medidas de proteção requeridas por autoridades públicas locais de um Estado‑Membro, nos casos em que, se um tribunal de outro Estado‑Membro aceitar a competência, será necessário instaurar um novo processo, por uma entidade distinta, ao abrigo de um sistema legislativo diferente e, eventualmente, ou mesmo provavelmente, relativamente a circunstâncias factuais diferentes?

2)

Em caso de resposta afirmativa, em que medida deve o tribunal ter em conta o impacto provável da aceitação de qualquer pedido feito ao abrigo do artigo 15.o sobre o direito de livre circulação dos indivíduos afetados?

3)

Se o ‘superior interesse da criança’ referido no artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003 apenas disser respeito às decisões relativas ao foro, que fatores que não tenham ainda sido considerados para determinar qual o tribunal ‘mais bem colocado’ para apreciar a ação deve o tribunal ter em conta nesta matéria?

4)

Pode o tribunal, para efeitos do artigo 15.o do Regulamento n.o 2201/2003, ter em conta a lei substantiva, a lei processual ou a prática dos tribunais do Estado‑Membro em causa?

5)

Na análise do artigo 15.o do Regulamento n.o 2201/2003, até que ponto deverá o tribunal nacional ter em conta as circunstâncias específicas do caso, nomeadamente o desejo da mãe de se subtrair à ação dos serviços sociais do seu Estado de origem, indo dar à luz noutro país cujo sistema de serviços sociais considera mais favorável?

6)

Quais as questões específicas que devem ser tidas em conta pelo tribunal nacional para determinar qual o tribunal mais bem colocado para julgar o processo?»

Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

22

O órgão jurisdicional de reenvio requereu o benefício do processo prejudicial urgente previsto no artigo 23.o‑A do Estatuto do Tribunal de Justiça da União Europeia e no artigo 107.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça.

23

Em 14 de agosto de 2015, o Tribunal de Justiça decidiu, sob proposta do juiz‑relator, ouvido o advogado‑geral, indeferir este pedido, após ter salientado que as circunstâncias expostas para o apoiar não demonstravam a urgência exigida para justificar a aplicação do referido processo.

24

No entanto, decidiu que o processo devia ser julgado com prioridade, nos termos do artigo 53.o, n.o 3, do Regulamento de Processo.

Quanto aos pedidos de reabertura da fase oral do processo

25

Na sequência da apresentação das conclusões do advogado‑geral, em 16 de junho de 2016, a Agência e a Irlanda pediram, por peças apresentadas na Secretaria do Tribunal de Justiça em 5 e 19 de agosto de 2016, respetivamente, que fosse ordenada a reabertura da fase oral do processo, invocando a necessidade de clarificar a apresentação do quadro processual do processo principal, conforme efetuada pelo órgão jurisdicional de reenvio.

26

A este respeito, o artigo 83.o do Regulamento de Processo prevê que o Tribunal de Justiça pode, a qualquer momento, ouvido o advogado‑geral, ordenar a reabertura da fase oral do processo, designadamente se considerar que não está suficientemente esclarecido.

27

No caso em apreço, o Tribunal de Justiça, ouvido o advogado‑geral, considera‑se, contudo, suficientemente esclarecido, uma vez que os elementos necessários para se pronunciar constam dos autos e que os interessados puderam tomar posição a esse título, quer por escrito quer oralmente. Por conseguinte, não há que ordenar a reabertura da fase oral do processo.

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira questão

28

Com a sua primeira questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 15.o do Regulamento n.o 2201/2003 deve ser interpretado no sentido de que é aplicável a uma ação em matéria de proteção de crianças proposta com base no direito público pela autoridade competente de um Estado‑Membro, como a que está em causa no processo principal, no caso de o reconhecimento de competência por um tribunal de outro Estado‑Membro necessitar, a jusante, que uma autoridade desse outro Estado‑Membro dê início a um processo diferente do instaurado no primeiro Estado‑Membro, ao abrigo do seu direito interno e à luz de circunstâncias factuais eventualmente diferentes.

29

Antes de mais, importa salientar, por um lado, que o artigo 15.o do Regulamento n.o 2201/2003 consta da secção 2 do capítulo II deste regulamento, que estabelece um conjunto de regras de competência nos processos de responsabilidade parental, e, por outro, que este artigo prevê uma regra de competência específica e derrogatória da regra de competência geral que designa os tribunais do lugar de residência habitual da criança como tribunais competentes para conhecer do mérito destes processos, enunciada no artigo 8.o do referido regulamento.

30

Tendo em conta a sistemática da secção 2 do capítulo II do Regulamento n.o 2201/2003 e o lugar que nela ocupa o artigo 15.o, há que considerar que o âmbito de aplicação material deste artigo coincide com o de todas as regras de competência previstas na referida secção, e nomeadamente com o do artigo 8.o do referido regulamento (v., neste sentido, acórdão de 19 de novembro de 2015, P, C‑455/15 PPU, EU:C:2015:763, n.o 44).

31

A este respeito, é certo que resulta dos termos do artigo 1.o, n.os 1 e 2, do Regulamento n.o 2201/2003 que estas regras de competência se aplicam às «matérias civis» relativas à atribuição, ao exercício, à delegação, à limitação ou à cessação da responsabilidade parental, nos termos em que esta última se encontra definida no artigo 2.o, ponto 7, do referido regulamento.

32

No entanto, o Tribunal de Justiça tem reiteradamente declarado que as regras de competência previstas no Regulamento n.o 2201/2003 em matéria de responsabilidade parental devem ser interpretadas, à luz do considerando 5 deste regulamento, no sentido de que são aplicáveis aos processos de responsabilidade parental que têm por objeto a adoção de medidas de proteção de crianças, incluindo o caso em que estas são consideradas, nos termos do direito interno de um Estado‑Membro, abrangidas pelo direito público (v., neste sentido, acórdãos de 27 de novembro de 2007, C, C‑435/06, EU:C:2007:714, n.os 34, 50 e 51; de 2 de abril de 2009, A, C‑523/07, EU:C:2009:225, n.os 24 e 27 a 29; e de 26 de abril de 2012, Health Service Executive, C‑92/12 PPU, EU:C:2012:255, n.os 60 e 61).

33

Decorre do exposto que o artigo 15.o do Regulamento n.o 2201/2003 é aplicável a uma ação em matéria de proteção de crianças proposta com base no direito público pela autoridade competente de um Estado‑Membro e que tem por objeto a adoção de medidas relativas à responsabilidade parental.

34

Em seguida, no que diz respeito à questão de saber se o artigo 15.o do Regulamento n.o 2201/2003 pode ser aplicado no caso de o reconhecimento de competência por um tribunal de outro Estado‑Membro necessitar, a jusante, que uma autoridade desse Estado‑Membro dê início a um processo diferente do instaurado no primeiro Estado‑Membro, ao abrigo do seu direito interno e à luz de circunstâncias factuais eventualmente diferentes, há que salientar que do n.o 1 deste artigo resulta que esse reconhecimento pressupõe que tenha sido submetido ao tribunal em causa um pedido apresentado pelas partes no processo ou pelo tribunal competente desse primeiro Estado‑Membro.

35

Em contrapartida, não resulta deste artigo nem de nenhum outro artigo do Regulamento n.o 2201/2003 que esse pedido, apresentado pelas partes no processo ou pelo tribunal normalmente competente de um Estado‑Membro, esteja sujeito a um requisito processual que acresça àquele evocado no número anterior.

36

No entanto, na medida em que uma regra processual nacional segundo a qual o reconhecimento de competência por um tribunal de outro Estado‑Membro necessita, a jusante, que uma autoridade desse Estado‑Membro dê início a um processo diferente do instaurado no primeiro Estado‑Membro, só é aplicável após a decisão através da qual o tribunal normalmente competente desse primeiro Estado‑Membro solicitou a transferência do processo para um tribunal de outro Estado‑Membro, nos termos do n.o 1 do artigo 15.o do Regulamento n.o 2201/2003, e após a decisão através da qual esse outro tribunal se declarou competente com base no n.o 5 do mesmo artigo, essa regra processual não pode ser entendida como obstando à adoção destas decisões.

37

Além disso, o artigo 15.o do Regulamento n.o 2201/2003 não se opõe a que a instauração de um processo distinto por parte da autoridade do outro Estado‑Membro leve, se for esse o caso, o tribunal desse outro Estado‑Membro a tomar em consideração circunstâncias factuais diferentes das que podiam ter sido consideradas pelo tribunal inicialmente competente. Pelo contrário, essa hipótese é inerente ao mecanismo de transferência para um tribunal mais bem colocado instituído por este artigo.

38

Pelas razões expostas, há que responder à primeira questão que o artigo 15.o do Regulamento n.o 2201/2003 deve ser interpretado no sentido de que é aplicável a uma ação em matéria de proteção de crianças proposta com base no direito público pela autoridade competente de um Estado‑Membro e que tem por objeto a adoção de medidas relativas à responsabilidade parental, como a que está em causa no processo principal, quando o reconhecimento de competência por um tribunal de outro Estado‑Membro necessitar, a jusante, que uma autoridade desse Estado‑Membro dê início a um processo diferente do instaurado no primeiro Estado‑Membro, ao abrigo do seu direito interno e à luz de circunstâncias factuais eventualmente diferentes.

Quanto à terceira, quarta e sexta questões

39

Com a sua terceira, quarta e sexta questões, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, como interpretar e articular os conceitos de tribunal «mais bem colocado» e de «superior interesse da criança», previstos no artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003.

40

O artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003 prevê que os tribunais de um Estado‑Membro competentes para conhecer do mérito de um processo podem pedir a transferência do processo, ou de uma parte específica do mesmo, para um tribunal de outro Estado‑Membro, com o qual a criança tenha uma ligação particular, se considerarem que esse tribunal se encontra mais bem colocado para dele conhecer, e se tal servir o superior interesse da criança.

41

Não se encontrando os conceitos de tribunal «mais bem colocado» e de «superior interesse da criança», na aceção desta disposição, definidos em nenhuma disposição do Regulamento n.o 2201/2003, há que interpretá‑los tendo em conta o contexto no qual se inscrevem e os objetivos prosseguidos pelo referido regulamento.

42

A título preliminar, importa salientar que resulta do considerando 12 do Regulamento n.o 2201/2003 que as regras de competência em matéria de responsabilidade parental deste regulamento são definidas em função do superior interesse da criança.

43

A exigência segundo a qual a transferência de um processo para um tribunal de outro Estado‑Membro deve servir o superior interesse da criança constitui, tal como salientou, em substância, o advogado‑geral no n.o 70 das suas conclusões, uma expressão do princípio orientador que guiou o legislador na conceção deste regulamento, por um lado, e que deve estruturar a sua aplicação nos processos de responsabilidade parental por ele abrangidos, por outro (v., neste sentido, acórdãos de 11 de julho de 2008, Rinau, C‑195/08 PPU, EU:C:2008:406, n.o 51; de 1 de outubro de 2014, E., C‑436/13, EU:C:2014:2246, n.o 45; e de 12 de novembro de 2014, L, C‑656/13, EU:C:2014:2364, n.o 48).

44

A este respeito, importa igualmente salientar que a tomada em consideração do superior interesse da criança no âmbito do Regulamento n.o 2201/2003 visa, como resulta do considerando 33 deste regulamento, garantir o pleno respeito dos direitos fundamentais da criança (v., neste sentido, acórdãos de 23 de dezembro de 2009, Detiček, C‑403/09 PPU, EU:C:2009:810, n.os 53 a 55, e de 5 de outubro de 2010, McB., C‑400/10 PPU, EU:C:2010:582, n.o 60).

45

Para assegurar a tomada em consideração do superior interesse da criança na aplicação das regras de competência instituídas pelo Regulamento n.o 2201/2003 em matéria de responsabilidade parental, o legislador da União recorreu, conforme resulta do considerando 12 deste regulamento, ao critério da proximidade.

46

Por força deste critério, a competência dos tribunais dos Estados‑Membros em matéria de responsabilidade parental é, em regra geral, determinada, em conformidade com o artigo 8.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003, pelo lugar de residência habitual da criança no momento da instauração do processo.

47

No entanto, o artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003 permite a transferência de determinado processo para um tribunal de um Estado‑Membro diferente do normalmente competente, entendendo‑se, como resulta do considerando 13 deste regulamento, que essa transferência deve obedecer a condições específicas, por um lado, e só pode ocorrer a título excecional, por outro.

48

Assim, a regra de transferência para um tribunal de outro Estado‑Membro prevista no artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003 constitui uma regra de competência especial e derrogatória relativamente à regra de competência geral enunciada no artigo 8.o, n.o 1, do referido regulamento, pelo que deve ser interpretada de forma estrita (v., por analogia, acórdãos de 23 de dezembro de 2009, Detiček, C‑403/09 PPU, EU:C:2009:810, n.o 38, e de 21 de outubro de 2015, Gogova, C‑215/15, EU:C:2015:710, n.o 41).

49

Neste contexto, há que interpretar o artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003 no sentido de que o tribunal de um Estado‑Membro normalmente competente para apreciar determinado processo deve, para poder pedir a sua transferência para um tribunal de outro Estado‑Membro, conseguir ilidir a forte presunção a favor da manutenção da sua própria competência que decorre deste regulamento, como salientou o advogado‑geral no n.o 90 das suas conclusões.

50

Em particular, há que recordar, em primeiro lugar, que, nos termos do artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003, a transferência de um processo em matéria de responsabilidade parental, pelo tribunal de um Estado‑Membro, só deve ser efetuada a favor de um tribunal de outro Estado‑Membro com o qual a criança tenha uma «ligação particular».

51

Com vista a estabelecer a existência dessa ligação num determinado processo, há que recorrer aos elementos taxativamente enumerados no artigo 15.o, n.o 3, alíneas a) a e), do Regulamento n.o 2201/2003. Daqui resulta que estão desde logo excluídos do mecanismo de transferência os processos nos quais esses elementos não estão presentes.

52

Ora, há que constatar que todos esses elementos atestam — se não expressamente, pelo menos em substância — uma proximidade entre a criança em causa no processo e um Estado‑Membro diferente do do tribunal competente para dele conhecer com base no artigo 8.o, n.o 1, deste regulamento.

53

Com efeito, os dois primeiros elementos dizem respeito à residência adquirida pela criança em causa no outro Estado‑Membro em questão, seja anterior seja posteriormente à instauração do processo no tribunal normalmente competente. O terceiro elemento diz respeito à nacionalidade dessa criança. O quarto elemento deduz, nos litígios pertinentes, a proximidade da referida criança com o outro Estado‑Membro em causa dos bens que esta nele possui. Por último, o quinto elemento assenta na ligação de proximidade que a criança tem, por intermédio dos seus familiares, com determinado Estado‑Membro.

54

Tendo em conta a natureza dos referidos elementos, há que considerar que, na aplicação do artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003 a um determinado processo, o tribunal competente deve comparar a importância e a intensidade da ligação de proximidade «geral» que o une à criança em causa, nos termos do artigo 8.o, n.o 1, deste regulamento, com a importância e a intensidade da ligação de proximidade «particular» atestada por um ou mais elementos enunciados no artigo 15.o, n.o 3, do referido regulamento e que existe, no caso concreto, entre essa criança e certos outros Estados‑Membros.

55

No entanto, a existência de uma «ligação particular» na aceção do artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003, pertinente à luz das circunstâncias do processo, entre a criança e outro Estado‑Membro não prejudica necessariamente, em si, a questão de saber, além disso, se um tribunal desse outro Estado‑Membro se encontra «mais bem colocado para conhecer do processo», na aceção desta disposição, do que o tribunal competente, nem a questão de saber se, em caso afirmativo, a transferência do processo para este último tribunal serve o superior interesse da criança.

56

Por conseguinte, incumbe ainda ao tribunal competente determinar, em segundo lugar, se existe, no outro Estado‑Membro com o qual a criança apresenta uma ligação particular, um tribunal mais bem colocado para conhecer do processo.

57

Para este efeito, o tribunal competente deve determinar se a transferência do processo para esse outro tribunal é suscetível de trazer um valor acrescentado real e concreto, para a tomada de uma decisão relativa à criança, relativamente à hipótese de o manter consigo. Neste quadro, o tribunal competente pode ter em conta, entre outros elementos, as regras processuais do outro Estado‑Membro, como as aplicáveis à recolha das provas necessárias à tramitação do processo. Em contrapartida, o tribunal competente não deveria tomar em consideração, para efeitos dessa avaliação, o direito material desse outro Estado‑Membro que seria eventualmente aplicável pelo tribunal deste último, no caso de o processo lhe ser remetido. Com efeito, essa tomada em consideração seria contrária aos princípios da confiança mútua entre Estados‑Membros e do reconhecimento mútuo das decisões judiciais que constituem a base do Regulamento n.o 2201/2003 (v. neste sentido, acórdãos de 23 de dezembro de 2009, Detiček, C‑403/09 PPU, EU:C:2009:810, n.o 45, e de 15 de julho de 2010, Purrucker, C‑256/09, EU:C:2010:437, n.os 70 e 71).

58

Em terceiro e último lugar, a exigência de que a transferência sirva o superior interesse da criança implica que o tribunal competente se certifique, à luz das circunstâncias concretas do processo, de que a transferência equacionada deste último para um tribunal de outro Estado‑Membro não é suscetível de ter um impacto negativo na situação da criança em causa.

59

Para esse efeito, o tribunal competente deve avaliar o eventual impacto negativo que essa transferência poderá ter nas relações afetivas, familiares e sociais da criança em causa no processo ou na sua situação material.

60

Neste contexto, o tribunal competente pode igualmente decidir, com base no artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003, pedir a transferência não da totalidade do processo mas só de uma parte específica do mesmo, se as circunstâncias que o caracterizam o justificarem. Essa faculdade pode, em especial, ser equacionada quando a ligação de proximidade com o outro Estado‑Membro não diz diretamente respeito à criança enquanto tal, mas a um dos titulares da responsabilidade parental, pela razão enunciada no artigo 15.o, n.o 3, alínea d), do Regulamento n.o 2201/2003.

61

Tendo em conta o exposto, há que responder à terceira, quarta e sexta questões que o artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003 deve ser interpretado no sentido de que:

para poder considerar que um tribunal de outro Estado‑Membro com o qual a criança tem uma ligação particular está mais bem colocado, o tribunal competente de um Estado‑Membro deve certificar‑se de que a transferência do processo para esse tribunal é suscetível de trazer um valor acrescentado real e concreto ao exame desse processo, tendo em conta nomeadamente as regras processuais aplicáveis nesse outro Estado‑Membro;

para poder considerar que essa transferência serve o superior interesse da criança, o tribunal competente de um Estado‑Membro deve nomeadamente certificar‑se de que a referida transferência não é suscetível de ter um impacto negativo na situação da criança.

Quanto à segunda e quinta questões

62

Com as suas segunda e quinta questões, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003 deve ser interpretado no sentido de que o tribunal competente de um Estado‑Membro deve ter em conta, na aplicação desta disposição em determinado processo de responsabilidade parental, o impacto de uma possível transferência desse processo para um tribunal de outro Estado‑Membro na livre circulação das pessoas em causa ou a razão pela qual a mãe da criança em questão fez uso desse direito, previamente à sua instauração.

63

A este propósito, há que recordar, tal como foi exposto no n.o 42 do presente acórdão, que a regra prevista no artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003 foi concebida, à semelhança das outras regras de competência previstas por este regulamento em matéria de responsabilidade parental, em função do superior interesse da criança e que a questão de saber, em determinado caso, se a transferência do processo serve esse superior interesse implica nomeadamente, como foi exposto no n.o 58 do presente acórdão, verificar se essa transferência não é suscetível de ter um impacto negativo na situação da criança em causa.

64

Daqui resulta que o risco de impacto negativo de uma possível transferência do processo no direito de livre circulação da criança em causa integra os elementos que devem ser tidos em consideração na aplicação do artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003.

65

Em contrapartida, as considerações relativas a outras pessoas suscetíveis de ser afetadas pelo processo não têm, em princípio, que ser tidas em conta, a menos que sejam igualmente pertinentes para avaliar o referido risco para a criança.

66

Consequentemente, o eventual impacto dessa transferência no direito de circulação das outras pessoas em causa, incluindo da mãe da criança em questão, não tem de ser tomado em consideração pelo órgão jurisdicional competente, desde que não seja suscetível de se repercutir negativamente na situação dessa criança. O mesmo se aplica à razão pela qual a mãe da criança fez uso do seu direito de livre circulação, previamente à instauração do processo no tribunal competente.

67

Daqui resulta que há que responder à segunda e quinta questões que o artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003 deve ser interpretado no sentido de que o tribunal competente de um Estado‑Membro não deve ter em conta, na aplicação desta disposição em determinado processo de responsabilidade parental, o impacto de uma possível transferência desse processo para um tribunal de outro Estado‑Membro na livre circulação das pessoas em causa diferentes da criança em questão nem a razão pela qual a mãe dessa criança fez uso desse direito, previamente à sua instauração, a menos que tais considerações sejam suscetíveis de se repercutir negativamente na situação da referida criança.

Quanto às despesas

68

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Terceira Secção) declara:

 

1)

O artigo 15.o do Regulamento (CE) n.o 2201/2003 do Conselho, de 27 de novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental e que revoga o Regulamento (CE) n.o 1347/2000, deve ser interpretado no sentido de que é aplicável a uma ação em matéria de proteção de crianças proposta com base no direito público pela autoridade competente de um Estado‑Membro e que tem por objeto a adoção de medidas relativas à responsabilidade parental, como a que está em causa no processo principal, quando o reconhecimento de competência por um tribunal de outro Estado‑Membro necessitar, a jusante, que uma autoridade desse Estado‑Membro dê início a um processo diferente do instaurado no primeiro Estado‑Membro, ao abrigo do seu direito interno e à luz de circunstâncias factuais eventualmente diferentes.

 

2)

O artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003 deve ser interpretado no sentido de que:

para poder considerar que um tribunal de outro Estado‑Membro com o qual a criança tem uma ligação particular está mais bem colocado, o tribunal competente de um Estado‑Membro deve certificar‑se de que a transferência do processo para esse tribunal é suscetível de trazer um valor acrescentado real e concreto ao exame desse processo, tendo em conta nomeadamente as regras processuais aplicáveis nesse outro Estado‑Membro;

para poder considerar que essa transferência serve o superior interesse da criança, o tribunal competente de um Estado‑Membro deve nomeadamente certificar‑se de que a referida transferência não é suscetível de ter um impacto negativo na situação da criança.

 

3)

O artigo 15.o, n.o 1, do Regulamento n.o 2201/2003 deve ser interpretado no sentido de que o tribunal competente de um Estado‑Membro não deve ter em conta, na aplicação desta disposição em determinado processo de responsabilidade parental, o impacto de uma possível transferência desse processo para um tribunal de outro Estado‑Membro na livre circulação das pessoas em causa diferentes da criança em questão nem a razão pela qual a mãe dessa criança fez uso desse direito, previamente à sua instauração, a menos que tais considerações sejam suscetíveis de se repercutir negativamente na situação da referida criança.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: inglês.

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