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Document 62006CJ0179

Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 4 de Outubro de 2007.
Comissão das Comunidades Europeias contra República Italiana.
Incumprimento de Estado - Directiva 92/43/CEE - Preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens - Avaliação das incidências no ambiente.
Processo C-179/06.

Colectânea de Jurisprudência 2007 I-08131

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2007:578

Processo C‑179/06

Comissão das Comunidades Europeias

contra

República Italiana

«Incumprimento de Estado – Directiva 92/43/CEE – Preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens – Avaliação das incidências no ambiente»

Acórdão do Tribunal de Justiça (Quarta Secção) de 4 de Outubro de 2007 

Sumário do acórdão

1.     Ambiente – Preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens – Directiva 92/43

(Directiva 92/43 do Conselho, artigo 6.°, n.° 3)

2.     Acção por incumprimento – Prova do incumprimento – Ónus da prova que incumbe à Comissão

(Artigo 226.° CE)

1.     O artigo 6.°, n.° 3, da Directiva 92/43, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens, subordina a obrigação de efectuar uma avaliação apropriada das incidências de um plano ou de um projecto num sítio protegido à condição de que o plano ou o projecto em questão seja susceptível de afectar esse sítio de maneira significativa. O accionamento deste mecanismo de protecção exige a existência de uma probabilidade ou de um risco de que o plano ou o projecto afecte o sítio em questão de forma significativa. O carácter significativo da incidência num sítio deve estar relacionado com os objectivos de conservação deste sítio. Assim, quando um plano ou projecto, mesmo tendo uma incidência no referido sítio, não implique o risco de comprometer os objectivos de conservação deste, não pode ser considerado susceptível de afectar de forma significativa o sítio em questão. A apreciação de tal risco deve ser efectuado, nomeadamente, à luz das características e das condições ambientais específicas do sítio a que se refere esse plano ou projecto.

(cf. n.os 33‑35)

2.     No âmbito de uma acção por incumprimento, incumbe à Comissão provar a existência do alegado incumprimento. Com efeito, é a esta que cabe apresentar ao Tribunal de Justiça os elementos necessários para que este possa apreciar a existência deste incumprimento, não podendo fundamentar‑se numa qualquer presunção. Por outro lado, o ónus da prova que impende sobre a Comissão no âmbito de uma acção desse tipo deve ser determinado em função dos tipos de obrigações que as directivas impõem aos Estados‑Membros e, por conseguinte, dos resultados que devem ser atingidos por estes últimos.

Assim, no âmbito de uma acção por incumprimento relativa às obrigações enunciadas do artigo 6.°, n.° 3, da Directiva 92/43, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens, a Comissão não pode limitar‑se a alegar a simples existência de acordos‑programa que se referem a projectos de construções industriais localizados no interior de uma zona de protecção especial, mas deve igualmente fornecer elementos suficientemente concretos para poder concluir que esses acordos ultrapassam a fase de uma reflexão administrativa preliminar e comportam um grau de precisão na planificação em questão que exige uma avaliação ambiental das suas incidências. A Comissão deve, além disso, provar que um plano ou um projecto, à luz das características e das condições ambientais específicas do sítio a que se refere tal plano ou projecto, é susceptível de afectar esse sítio de maneira significativa, no que se refere aos objectivos de conservação fixados para este último.

(cf. n.os 37‑39, 41)







ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)

4 de Outubro de 2007 (*)

«Incumprimento de Estado – Directiva 92/43/CEE – Preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens – Avaliação das incidências no ambiente»

No processo C‑179/06,

que tem por objecto uma acção por incumprimento nos termos do artigo 226.° CE, entrada em 5 de Abril de 2006,

Comissão das Comunidades Europeias, representada por D. Recchia, na qualidade de agente, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandante,

contra

República Italiana, representada por I. M. Braguglia, na qualidade de agente, assistido por G. Fiengo, avvocato dello Stato, com domicílio escolhido no Luxemburgo,

demandada,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),

composto por: K. Lenaerts, presidente de secção, E. Juhász, R. Silva de Lapuerta (relator), G. Arestis e J. Malenovský, juízes,

advogada‑geral: J. Kokott,

secretário: M. Ferreira, administradora principal,

vistos os autos e após a audiência de 21 de Junho de 2007,

vista a decisão tomada, ouvida a advogada‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1       Na sua petição, a Comissão das Comunidades Europeias pede ao Tribunal de Justiça que declare que a República Italiana não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força das disposições combinadas dos artigos 6.°, n.° 3, e 7.° da Directiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de Maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens (JO L 206, p. 7), devido à aprovação, pelo município de Altamura e pela Região de Apúlia, a partir de Dezembro de 2000, de uma modificação do plano de urbanismo constituída por uma série de operações de construção industrial susceptíveis de ter uma incidência significativa na zona de protecção especial (a seguir «ZPE») e no sítio de importância comunitária proposto (a seguir «SICp») IT9120007 de Murgia Alta, sem ter efectuado previamente uma avaliação das incidências, pelo menos no que diz respeito à referida ZPE.

 Quadro jurídico comunitário

2       A Directiva 92/43 tem por objectivo contribuir para assegurar a biodiversidade através da conservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens no território europeu dos Estados‑Membros em que o Tratado CE é aplicável.

3       O artigo 4.° desta directiva rege o procedimento que visa criar uma rede denominada «Natura 2000», prevista no seu artigo 3.°, bem como a designação das zonas especiais de conservação pelos Estados‑Membros.

4       O artigo 6.° da mesma directiva, que prevê as medidas de conservação para as referidas zonas, prevê:

«[…]

2. Os Estados‑Membros tomarão as medidas adequadas para evitar, nas zonas especiais de conservação, a deterioração dos habitats naturais e dos habitats de espécies, bem como as perturbações que atinjam as espécies para as quais as zonas foram designadas, na medida em que essas perturbações possam vir a ter um efeito significativo, atendendo aos objectivos da presente directiva.

3. Os planos ou projectos não directamente relacionados com a gestão do sítio e não necessários para essa gestão, mas susceptíveis de afectar esse sítio de forma significativa, individualmente ou em conjugação com outros planos e projectos, serão objecto de uma avaliação adequada das suas incidências sobre o sítio no que se refere aos objectivos de conservação do mesmo. Tendo em conta as conclusões da avaliação das incidências sobre o sítio e sem prejuízo do disposto no n.° 4, as autoridades nacionais competentes só autorizarão esses planos ou projectos depois de se terem assegurado de que não afectarão a integridade do sítio em causa e de terem auscultado, se necessário, a opinião pública.

[…]»

5       O artigo 7.° da Directiva 92/43 prevê que as obrigações que decorrem do seu artigo 6.°, n.os 2 a 4, substituem as obrigações que decorrem do artigo 4.°, n.° 4, primeira frase, da Directiva 79/409/CEE do Conselho, de 2 de Abril de 1979, relativa à conservação das aves selvagens (JO L 103, p. 1; EE 15 F2 p. 125), no respeitante às zonas classificadas nos termos do n.° 1 do artigo 4.° desta última directiva ou analogamente reconhecidas nos termos do n.° 2 do artigo 4.° da mesma directiva, a partir da data da entrada em aplicação da Directiva 92/43 ou da data da classificação ou do reconhecimento por um Estado‑Membro, nos termos da Directiva 79/409, se esta última for posterior.

 Zona de Murgia Alta

6       Em 1998, o sítio de Murgia Alta foi classificado como ZPE, nos termos do artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 79/409 (código IT9120007). Este sítio pertence à região biogeográfica mediterrânica. A sua superfície é de 143 152 ha.

7       Esta ZPE abriga numerosas aves que constam do anexo I da Directiva 79/409, em particular a mais importante população da espécie Falco naumanni em Itália.

8       Dois habitats prioritários mencionados no anexo I da Directiva 92/43 encontram‑se na referida ZPE, a saber, o habitat 6210, intitulado «Formações herbáceas seminaturais secas e facies arbustivas (Festuco‑Brometalia)», e o habitat 6220, intitulado «Subestepes de gramínias e anuais (Thero‑Brachypodietea)», bem como uma planta prioritária mencionada no anexo II da Directiva 92/43, a saber, Stipa austroitalica Martinovsky.

9       O sítio de Murgia Alta é descrito no formulário de dados estabelecido nos termos da Decisão 97/266/CE da Comissão, de 18 de Dezembro de 1996, relativa a um formulário para as informações sobre sítios para os sítios da rede Natura 2000 propostos (JO 1997, L 107, p. 1), da seguinte forma:

«Características gerais do sítio

Classes de habitats                                                       % cobertura

Charneca, moitas, mato e baldio, phrygana                                     20,00

Prados secos, estepes                                                                65,00

Floresta de folha perene                                                       15,00

Total de habitat coberto                                                       100

Outras características do sítio

Paisagem evocadora constituída por ondulações ligeiras e por depressões em forma de poças, com fenómenos cársticos superficiais representados por bolhas e precipícios. O substrato é formado por calcário cretáceo, geralmente coberto de calcarenite do Pleistoceno. O bioclima é submediterrânico.

Qualidade e importância

Sub‑região fortemente caracterizada por um planalto vasto, árido e calcário que culmina a 679 m no Monte Caccia. Apresenta‑se sobretudo sob a forma de um planalto calcário e rochoso. É uma das zonas subestépicas mais extensas de Itália, com uma vegetação herbácea, devido ao Festuco brometalia. A flora da zona é particularmente rica, englobando cerca de 1 500 espécies. Do ponto de vista da fauna aviária que nidifica, recensearam‑se cerca de 90 espécies, número que situa esta zona na segunda posição ao nível regional, depois do Gargano. As formações florestais residuais são caracterizadas pela prevalência de Quercus      pubescens, frequentemente acompanhadas de Fraxinus ornus. Notam‑se raras Quercus cerris e Q. frainetto.

Vulnerabilidade

O factor principal de destruição é a extracção do substracto calcário que, em seguida, é reduzido a pó por meios mecânicos. Desta forma, várias extensões que incluem uma vegetação subestépica são destruídas pelo cultivo de novas zonas. A operação implica também frequentemente muros em pedras secas e outras formas de delimitação com graves perigos de catástrofe hidrogeológica. Incêndios recorrentes, ligados à prevalência da actividade cerealífera, implantação de residências secundárias nos locais mais atractivos para o turismo. Uso impróprio das cavidades cársticas como depósitos de resíduos sólidos urbanos e de resíduos sólidos.»

 Matéria de facto

10     Em 27 de Dezembro de 2000, o município de Altamura aprovou, através de um conjunto de decisões do seu Conselho Municipal, acordos‑programa, na acepção do artigo 27.° da Lei n.° 142, de 8 de Junho de 1990, relativa à organização da autonomia local (legge n.° 142, ordinamento delle autonomie locali) (suplemento ordinário do GURI n.° 135, de 12 de Junho de 1990), que se referem a uma centena de projectos de construções industriais, uma grande parte dos quais se situa na ZPE e no SICp de Murgia Alta. Estes acordos dizem respeito, nomeadamente, a 34 sítios, que representam 60 ha, previstos no âmbito do projecto do Consorzio di Sviluppo Murgiano, e 11 sítios, representando 8 ha, previstos no âmbito do projecto do Consorzio San Marco. Os referidos acordos foram ulteriormente aprovados por decreto da Junta Regional (Governo Regional) da Região de Apúlia.

11     Com o objectivo de favorecer o emprego nas unidades de produção de carácter industrial e artesanal, os sindaci dos municípios interessados podem solicitar à Junta Regional que adopte um acordo‑programa para autorizar a realização de complexos que promovam a obtenção imediata de níveis de emprego significativos.

12     A assinatura de um acordo‑programa, que deve ser autorizado pela Junta Regional, só é admissível se o plano de urbanismo em vigor não previr zonas com um destino específico operacionais e juridicamente disponíveis para os trabalhos a realizar ou se for necessário ampliar estruturas existentes nas zonas contíguas não destinadas às actividades industriais e artesanais.

13     De 1998 a 2001, um grande número de empresas apresentou ao município de Altamura pedidos para obter acordos‑programa com objecto industrial e artesanal, alguns dos quais implicavam uma modificação do plano geral de urbanismo. Os procedimentos abertos com base nos referidos pedidos não comportam nenhuma fase de programação geral, mas diferentes procedimentos de modificação do referido plano.

14     A Administração Regional submeteu a um procedimento de verificação os projectos do Consorzio di Sviluppo Murgiano quanto à necessidade de avaliação do impacto no ambiente, considerando, pelo contrário, que não havia que submeter outros projectos, como os do Consorzio San Marco, a esse procedimento. Com base nos referidos acordos, o município de Altamura concedeu um certo número de licenças de construção.

 Procedimento pré‑contencioso

15     Em conformidade com o artigo 226.° CE, a Comissão, em 9 de Julho de 2004, enviou uma notificação para cumprir à República Italiana, convidando‑a a expor‑lhe as suas observações sobre a situação da zona em questão, tendo em consideração as obrigações enunciadas nos artigos 6.°, n.° 3, e 7.° da Directiva 92/43.

16     A República Italiana respondeu a esta notificação para cumprir através das comunicações de 14 de Outubro de 2004 e 9 de Junho de 2005, às quais foram anexadas as observações do Ministério do Ambiente e da Protecção do Território.

17     A Comissão dirigiu em 13 de Julho de 2005 um parecer fundamentado à República Italiana, convidando este Estado‑Membro a dar‑lhe cumprimento no prazo de dois meses, a contar da recepção deste.

18     A República Italiana respondeu ao referido parecer através de duas novas comunicações ministeriais, datadas de 3 e 7 de Outubro de 2005.

19     Por considerar que a resposta ao referido parecer não era satisfatória, a Comissão intentou a presente acção.

 Quanto à acção

 Argumentos das partes

20     A Comissão alega que não foi efectuado nenhum procedimento de avaliação das incidências, na acepção do artigo 6.°, n.° 3, da Directiva 92/43, relativamente ao conjunto das operações previstas nos acordos‑programa em causa, que são susceptíveis de ter uma incidência significativa na zona em questão.

21     Defende que as diferentes decisões administrativas pelas quais foram aprovadas as referidas operações são contrárias ao artigo 6.°, n.° 3, na medida em que as intervenções em questão, embora susceptíveis de ter uma incidência significativa na ZPE e no SICp de Murgia Alta, não foram objecto de procedimentos de avaliação das incidências ambientais.

22     A Comissão observa que a natureza jurídica dos acordos‑programa e dos actos que resultam dos mesmos não tem pertinência relativamente às obrigações que incumbem aos Estados‑Membros nos termos desta disposição.

23     Afirma, além disso, que há contiguidade entre as partes do território visadas pelos projectos em causa e que é possível, nesta medida, que haja incidências globais significativas.

24     A Comissão acrescenta que não é relevante que o município de Altamura tenha emitido apenas um número limitado de licenças de construção, que nenhuma outra licença de construção tenha sido emitida em 2003, que os outros pedidos de licenças de construção sejam submetidos a um procedimento de avaliação das incidências e que esteja em curso uma missão destinada a proceder a uma avaliação global no que se refere aos sítios que são objecto das instalações já programadas.

25     Constata igualmente que nenhum motivo foi avançado para justificar a falta de avaliação das incidências e que nenhuma informação foi fornecida para demonstrar que as operações de construção industrial e artesanal em causa não eram susceptíveis de ter incidências significativas na zona protegida.

26     A República Italiana observa que um acordo‑programa não é um acto que define uma situação jurídica, nem um acto administrativo, nem um contrato, mas constitui um instrumento procedimental no âmbito do qual as entidades públicas e privadas definem antecipadamente os comportamentos e compromissos a respeitar para obter um resultado final. Consequentemente, seriam necessárias outras medidas administrativas para que os trabalhos mencionados nos acordos‑programa que são objecto do recurso fossem efectivamente realizados.

27     Este Estado‑Membro observa, por outro lado, que as disposições legislativas relativas à promoção do emprego não podem derrogar as regras em matéria de protecção do território e do ambiente. Ora, em direito italiano, as ZPE e os sítios de importância comunitária beneficiam de um regime muito semelhante ao regime legal restritivo dos parques e das outras zonas naturais.

28     A República Italiana observa que o município de Altamura apenas concedeu um número limitado de licenças de construção para projectos individuais, ligados, em parte, a ampliações de fábricas já existentes, algumas das quais situadas em zonas destinadas a instalações industriais. Posteriormente a Junho de 2003, nenhuma outra licença de construção foi concedida e nenhuma autorização foi outorgada para os projectos propostos pelo Consorzio di Sviluppo Murgiano e pelo Consorzio San Marco.

29     Este Estado‑Membro sublinha que apenas quinze projectos foram efectivamente executados, os quais se referem a partes distintas do território e procedem de modalidades de realização diferentes, quer se trate, por exemplo, de novas instalações ou de ampliações. Afirma que não existe nenhuma contiguidade entre estes projectos nem mesmo um plano geral ou territorial que lhes diga respeito. Alguns deles foram sujeitos a uma avaliação de incidências, enquanto outros foram objecto de diversas autorizações relacionadas com os aspectos ambientais e paisagísticos.

30     A República Italiana indica que, para a totalidade destes projectos, o município de Altamura se dispõe a efectuar uma avaliação global das incidências e a promover as iniciativas que visam moderar as eventuais incidências no ambiente.

31     Este Estado‑Membro acrescenta que todos os procedimentos relativos aos pedidos de instalação de uma fábrica no município de Altamura foram suspensos por se aguardarem os resultados de estudos científicos respeitantes à avaliação das incidências dos projectos no ambiente.

 Apreciação do Tribunal de Justiça

32     Há que observar, a título preliminar, que a disposição cuja violação é invocada pela Comissão se insere num conjunto complexo de regras, que têm por objecto, como resulta do terceiro a sexto considerandos da directiva, a designação e a gestão das zonas pertencentes à rede europeia Natura 2000.

33     O artigo 6.° n.° 3, da Directiva 92/43 subordina a obrigação de efectuar uma avaliação apropriada das incidências de um plano ou de um projecto num sítio protegido à condição de que o plano ou o projecto em questão seja susceptível de afectar esse sítio de maneira significativa (v. acórdão de 7 de Setembro de 2004, Waddenvereniging e Vogelbeschermingsvereniging, C‑127/02, Colect., p. I‑7405, n.° 40).

34     O Tribunal sublinhou igualmente, no n.° 43 do referido acórdão, que o accionamento do mecanismo de protecção do ambiente previsto no artigo 6.°, n.° 3, da Directiva 92/43 exige a existência de uma probabilidade ou de um risco de que o plano ou o projecto afecte o sítio em questão de forma significativa.

35     Quanto a este último critério, o Tribunal precisou, nos n.os 46 a 48 do mesmo acórdão, que, como resulta do artigo 6.°, n.° 3, primeira frase, da referida directiva, conjugado com o seu décimo considerando, o carácter significativo da incidência num sítio de um plano ou projecto está relacionado com os objectivos de conservação deste sítio. Assim, quando um plano ou projecto, mesmo tendo uma incidência no referido sítio, não implique o risco de comprometer os objectivos de conservação deste, não pode ser considerado susceptível de afectar de forma significativa o sítio em questão. A apreciação de tal risco deve ser efectuado, nomeadamente, à luz das características e das condições ambientais específicas do sítio a que se refere esse plano ou projecto.

36     Para determinar se a queixa apresentada contra a República Italiana procede, deve situar‑se a obrigação resultante do artigo 6.°, n.° 3, da Directiva 92/43, como é precisada nos números anteriores do presente acórdão, no âmbito da acção por incumprimento proposta pela Comissão com base no artigo 226.° CE.

37     Há que recordar a este respeito, de acordo com jurisprudência assente, que, no âmbito de uma acção por incumprimento, incumbe à Comissão provar a existência do alegado incumprimento. Com efeito, é a esta que cabe apresentar ao Tribunal de Justiça os elementos necessários para que este possa apreciar a existência deste incumprimento, não podendo fundamentar‑se numa qualquer presunção (v. acórdão de 14 de Junho de 2007, Comissão/Finlândia, C‑342/05, ainda não publicado na Colectânea, n.° 23 e jurisprudência aí referida).

38     Por outro lado, o ónus da prova que impende sobre a Comissão no âmbito de uma acção por incumprimento deve ser determinado em função dos tipos de obrigações que as directivas impõem aos Estados‑Membros e, por conseguinte, dos resultados que devem ser atingidos por estes últimos (v., neste sentido, acórdão de 18 de Junho de 2002, Comissão/França, C‑60/01, Colect., p. I‑5679, n.° 25).

39     Quanto ao artigo 6.°, n.° 3, da Directiva 92/43, cabe à Comissão provar que um plano ou um projecto, à luz das características e das condições ambientais específicas do sítio a que se refere tal plano ou projecto, é susceptível de afectar esse sítio de maneira significativa, no que se refere aos objectivos de conservação fixados para este último.

40     Relativamente às medidas que constituem o objecto da acção e com vista a apreciar a sua procedência, há que distinguir, por um lado, os diferentes acordos‑programa e, por outro, as obras realizadas depois da concessão pelo município de Altamura de licenças de construção.

41     No que respeita, em primeiro lugar, aos acordos‑programa que se encontram em diferentes fases de elaboração, tendo em consideração os argumentos da demandada, segundo a qual os referidos acordos não revestem as características jurídicas de um plano ou de um projecto, na acepção do artigo 6.°, n.° 3, da Directiva 92/43, há que observar que, no âmbito de uma acção por incumprimento relativa às obrigações enunciadas na referida disposição, a Comissão não tinha de se limitar a alegar a simples existência de tais acordos, mas devia igualmente fornecer elementos suficientemente concretos para poder concluir que esses acordos ultrapassam a fase de uma reflexão administrativa preliminar e comportam um grau de precisão na planificação que exige uma avaliação ambiental das suas incidências.

42     Ora, sem que seja necessário determinar o alcance e as consequências jurídicas decorrentes dos acordos‑programa controvertidos por força do direito nacional, é necessário constatar que a Comissão, limitando‑se a mencionar tais acordos, não apresentou elementos suficientemente precisos que permitam ao Tribunal considerar que estavam em causa medidas susceptíveis de afectar o sítio em causa de forma significativa, na acepção do artigo 6.°, n.° 3, da Directiva 92/43.

43     Em segundo lugar, no que se refere às obras realizadas e aos elementos sobre os quais incide o ónus da prova relativo à obrigação de efectuar uma avaliação das incidências ambientais, há que constatar que a Comissão não forneceu ao Tribunal indicações precisas sobre a localização geográfica e a extensão das construções realizadas relativamente ao sítio. Admitiu, no decorrer da audiência, não dispor destas informações.

44     A Comissão não forneceu mais dados relativos à natureza técnica das obras em causa nem trouxe precisões quanto à medida em que as referidas obras, à luz das características e das condições ambientais específicas do sítio, são susceptíveis de o afectar de forma significativa.

45     Nestas condições, cabe concluir que a Comissão não cumpriu satisfatoriamente o ónus da prova relativamente ao alegado incumprimento.

46     Consequentemente, a acção deve ser julgada improcedente no seu todo.

 Quanto às despesas

47     Por força do disposto no artigo 69.°, n.° 2, do Regulamento de Processo, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a República Italiana pedido a condenação da Comissão e tendo esta sido vencida, há que condená‑la nas despesas.

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) decide:

1)      A acção é julgada improcedente.

2)      A Comissão das Comunidades Europeias é condenada nas despesas.

Assinaturas


* Língua do processo: italiano.

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