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Document 61998CJ0374

Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 7 de Dezembro de 2000.
Comissão das Comunidades Europeias contra República Francesa.
Incumprimento de Estado - Directivas 79/409/CEE e 92/43/CEE - Conservação das aves selvagens - Zonas de protecção especial.
Processo C-374/98.

Colectânea de Jurisprudência 2000 I-10799

ECLI identifier: ECLI:EU:C:2000:670

61998J0374

Acórdão do Tribunal (Sexta Secção) de 7 de Dezembro de 2000. - Comissão das Comunidades Europeias contra República Francesa. - Incumprimento de Estado - Directivas 79/409/CEE e 92/43/CEE - Conservação das aves selvagens - Zonas de protecção especial. - Processo C-374/98.

Colectânea da Jurisprudência 2000 página I-10799


Sumário
Partes
Fundamentação jurídica do acórdão
Decisão sobre as despesas
Parte decisória

Palavras-chave


1 Ambiente - Conservação das aves selvagens - Directiva 79/409 - Classificação de zonas de protecção especial - Obrigação dos Estados-Membros - Apreciação - Alcance

(Directiva 79/409 do Conselho, artigo 4.°)

2 Ambiente - Conservação das aves selvagens - Directiva 79/409 - Falta de classificação em zona de protecção especial - Consequências - Dualidade dos regimes de protecção aplicáveis

(Directivas 79/409 do Conselho, artigo 4.°, n.os 1, 2 e 4, e 92/43, artigos 6.°, n.os 2 a 4, e 7)

Sumário


1 O inventário das zonas de grande interesse para a conservação das aves selvagens, mais comummente conhecido sob a sigla IBA (Inventory of Important Bird Areas in the European Community), apesar de não ser juridicamente vinculativo para os Estados-Membros em causa, contém elementos de prova científica que permitem apreciar em que medida um Estado-Membro respeitou a sua obrigação de classificar como zonas de protecção especial os territórios mais apropriados em número e em superfície para a conservação das espécies protegidas. Sempre que uma zona determinada satisfizer os critérios para ser classificada como zonas de protecção especial, deve ser objecto, tal como decorre da economia do artigo 4.° da Directiva 79/409 relativa à conservação das aves selvagens, de medidas de conservação especial susceptíveis de garantir, designadamente, a sobrevivência e a reprodução das espécies de aves mencionadas no anexo I dessa directiva.

(cf. n.os 25-26)

4 A letra do artigo 7.° da Directiva 92/43, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens, indica expressamente que o seu artigo 6.°, n.os 2 a 4, se aplica, em substituição do artigo 4.°, n.° 4, primeiro período, da Directiva 79/409 relativa à conservação das aves selvagens, às zonas classificadas ao abrigo do artigo 4.°, n.os 1 ou 2, desta última directiva. Segue-se que, de acordo com uma interpretação literal do artigo 7.° da Directiva 92/43, só as zonas classificadas como zonas de protecção especial ficam sob a alçada do artigo 6.°, n.os 2 a 4, dessa mesma directiva. O facto de o regime de protecção do artigo 4.°, n.° 4, primeiro período, da Directiva 79/409 se aplicar às zonas não classificadas como zonas de protecção especial, quando o deviam ter sido, não implica, por si só, que o regime de protecção a que se refere o artigo 6.°, n.os 2 a 4, da Directiva 92/43 substitua o primeiro regime citado quando se trate das referidas zonas.

(cf. n.os 44-45, 49)

Partes


No processo C-374/98,

Comissão das Comunidades Europeias, representada por P. Stancanelli, membro do Serviço Jurídico, e O. Couvert-Castéra, funcionário nacional posto à disposição do referido serviço, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo no gabinete de C. Gómez de la Cruz, membro do mesmo serviço, Centre Wagner, Kirchberg,

demandante,

contra

República Francesa, representada por K. Rispal-Bellanger, subdirectora na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, e R. Nadal, secretário adjunto dos Negócios Estrangeiros na mesma direcção, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo na Embaixada de França, 8 B, boulevard Joseph II,

demandada,

que tem por objecto obter a declaração de que, por um lado, ao não classificar o sítio das Basses Corbières (França) em zona de protecção especial de determinadas espécies de aves incluídas no anexo I da Directiva 79/409/CEE do Conselho, de 2 de Abril de 1979, relativa à conservação das aves selvagens (JO L 103, p. 1; EE 15 F2 p. 125), bem como de determinadas espécies migratórias não incluídas nesse anexo, e ao também não adoptar medidas de conservação especial no que respeita aos seus habitats, em violação do artigo 4.°, n.os 1 e 2, da referida directiva, e, por outro, ao não adoptar no sítio das Basses Corbières as medidas adequadas para evitar as perturbações que afectam as espécies que se abrigam nesse local bem como as deteriorações dos seus habitats que possam vir a ter um efeito significativo, na sequência da abertura e exploração de pedreiras de calcário no território das comunas de Tautavel e de Vingrau (França), em violação do artigo 6.°, n.os 2 e 4, da Directiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de Maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens (JO L 206, p. 7), a República Francesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do Tratado CE,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Sexta Secção),

composto por: C. Gulmann (relator), presidente de secção, R. Schintgen e V. Skouris, juízes,

advogado-geral: S. Alber,

secretário: D. Louterman-Hubeau, administradora principal,

visto o relatório para audiência,

ouvidas as alegações das partes na audiência de 16 de Dezembro de 1999, na qual a Comissão foi representada por O. Couvert-Castéra e a República Francesa por A. Maitrepierre, encarregada de missão na Direcção dos Assuntos Jurídicos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, na qualidade de agente,

ouvidas as conclusões do advogado-geral apresentadas na audiência de 15 de Fevereiro de 2000,

profere o presente

Acórdão

Fundamentação jurídica do acórdão


1 Por petição apresentada na Secretaria do Tribunal de Justiça em 16 de Outubro de 1998, a Comissão das Comunidades Europeias intentou, ao abrigo do artigo 169.° do Tratado CE (actual artigo 226.° CE), uma acção que tem por objecto obter a declaração de que, por um lado, ao não classificar o sítio das Basses Corbières (França) em zona de protecção especial (a seguir «ZPE») de determinadas espécies de aves incluídas no anexo I da Directiva 79/409/CEE do Conselho, de 2 de Abril de 1979, relativa à conservação das aves selvagens (JO L 103, p. 1; EE 15 F2 p. 125, a seguir «directiva aves»), bem como de determinadas espécies migratórias não incluídas nesse anexo e ao também não adoptar medidas de conservação especial no que respeita aos seus habitats, em violação do artigo 4.°, n.os 1 e 2, da referida directiva, e, por outro, ao não adoptar no sítio das Basses Corbières as medidas adequadas para evitar as perturbações que afectam as espécies que se abrigam nesse local bem como as deteriorações dos seus habitats que possam vir a ter um efeito significativo, na sequência da abertura e exploração de pedreiras de calcário no território das comunas de Tautavel e de Vingrau (França), em violação do artigo 6.°, n.os 2 e 4, da Directiva 92/43/CEE do Conselho, de 21 de Maio de 1992, relativa à preservação dos habitats naturais e da fauna e da flora selvagens (JO L 206, p. 7, a seguir «directiva habitats»), a República Francesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do Tratado CE.

Enquadramento regulamentar

2 O artigo 4.° da directiva aves estabelece:

«1. As espécies mencionadas no anexo I são objecto de medidas de conservação especial respeitantes ao seu habitat, de modo a garantir a sua sobrevivência e a sua reprodução na sua área de distribuição.

Para o efeito, tomar-se-ão em consideração:

a) As espécies ameaçadas de extinção;

b) As espécies vulneráveis a certas modificações dos seus habitats;

c) As espécies consideradas raras porque as suas populações são reduzidas ou porque a sua repartição local é restrita;

d) Outras espécies necessitando de atenção especial devido à especificidade do seu habitat.

Ter-se-á em conta, para proceder às avaliações, quais as tendências e as variações dos níveis populacionais.

Os Estados-Membros classificarão, nomeadamente, em zonas de protecção especial os territórios mais apropriados, em número e em extensão, para a conservação destas últimas na zona geográfica marítima e terrestre de aplicação da presente directiva.

2. Os Estados-Membros tomarão medidas semelhantes para as espécies migratórias não referidas no anexo I e cuja ocorrência seja regular, tendo em conta as necessidades de protecção na zona geográfica marítima e terrestre de aplicação da presente directiva no que diz respeito às suas áreas de reprodução, de muda e de invernada e às zonas de repouso e alimentação nos seus percursos de migração. Com esta finalidade, os Estados-Membros atribuem uma importância especial à protecção das zonas húmidas e muito particularmente às de importância internacional.

3. ...

4. Os Estados-Membros tomarão as medidas adequadas para evitar, nas zonas de protecção referidas nos n.os 1 e 2, a poluição ou a deterioração dos habitats bem como as perturbações que afectam as aves, desde que tenham um efeito significativo a propósito dos objectivos do presente artigo. Para além destas zonas de protecção, os Estados-Membros esforçam-se igualmente por evitar a poluição ou a deterioração dos habitats.»

3 A directiva habitats prevê, no seu artigo 7.°, que as obrigações que decorrem do seu artigo 6.°, n.os 2, 3 e 4, «substituem as decorrentes do n.° 4, primeira frase, do artigo 4.° da Directiva 79/409/CEE, no respeitante às zonas de protecção especial classificadas nos termos do n.° 1 do artigo 4.° ou analogamente reconhecidas nos termos do n.° 2, do artigo 4.° da presente directiva a partir da data da sua entrada em aplicação ou da data da classificação ou do reconhecimento pelo Estado-Membro nos termos da Directiva 79/409/CEE, se esta for posterior».

4 O artigo 6.°, n.os 2 a 4, da directiva habitats dispõe:

«2. Os Estados-Membros tomarão as medidas adequadas para evitar, nas zonas especiais de conservação, a deterioração dos habitats naturais e dos habitats de espécies, bem como as perturbações que atinjam as espécies para as quais as zonas foram designadas, na medida em que essas perturbações possam vir a ter um efeito significativo, atendendo aos objectivos da presente directiva.

3. Os planos ou projectos não directamente relacionados com a gestão do sítio e não necessários para essa gestão, mas susceptíveis de afectar esse sítio de forma significativa, individualmente ou em conjugação com outros planos e projectos, serão objecto de uma avaliação adequada das suas incidências sobre o sítio no que se refere aos objectivos de conservação do mesmo. Tendo em conta as conclusões da avaliação das incidências sobre o sítio e sem prejuízo do disposto no n.° 4, as autoridades nacionais competentes só autorizarão esses planos ou projectos depois de se terem assegurado de que não afectarão a integridade do sítio em causa e de terem auscultado, se necessário, a opinião pública.

4. Se, apesar de a avaliação das incidências sobre o sítio ter levado a conclusões negativas e na falta de soluções alternativas, for necessário realizar um plano ou projecto por outras razões imperativas de reconhecido interesse público, incluindo as de natureza social ou económica, o Estado-Membro tomará todas as medidas compensatórias necessárias para assegurar a protecção da coerência global da rede Natura 2000. O Estado-Membro informará a Comissão das medidas compensatórias adoptadas.

No caso de o sítio em causa abrigar um tipo de habitat natural e/ou uma espécie prioritária, apenas podem ser evocadas razões relacionadas com a saúde do homem ou a segurança pública ou com consequências benéficas primordiais para o ambiente ou, após parecer da Comissão, outras razões imperativas de reconhecido interesse público.»

5 Nos termos do artigo 23.°, n.° 1, da directiva habitats, os Estados-Membros porão em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para darem cumprimento a essa directiva no prazo de dois anos a contar da sua notificação. Como a directiva lhes foi notificada em Junho de 1992, o referido prazo expirou em Junho de 1994.

Processo pré-contencioso

6 Em 2 de Julho de 1996, a Comissão enviou ao Governo francês uma interpelação por inobservância do artigo 4.° da directiva aves, na versão decorrente da directiva habitats, no que respeita ao sítio das Basses Corbières que integra os departamentos do Aude e dos Pyrénées-Orientales. Nessa interpelação, sustentava-se, por um lado, que, atenta a sua importância para a conservação das aves selvagens, designadamente a águia-de-Bonelli, o sítio das Basses Corbières devia ter sido classificado em ZPE e, por outro, que a abertura e exploração da pedreira de calcário nesse sítio, sem estarem reunidas as condições para tal, tinham acarretado a sua deterioração.

7 Na sua resposta de 28 de Novembro de 1996, o Governo francês recordou que as autoridades francesas tinham reconhecido o interesse do sítio em causa ao adoptarem uma medida de conservação especial com vista à protecção da águia-de-Bonelli, ou seja, um regulamento do prefeito relativo à conservação do biótopo dessa espécie nos territórios das comunas de Vingrau e de Tautavel. Por outro lado, esse governo alegou que estava a perspectivar a classificação desses territórios em ZPE. Além disso, referiu que a sociedade OMYA explorava desde há longos anos um jazigo de calcário no território da comuna de Tautavel. O esgotamento do jazigo nessa comuna tinha conduzido a referida sociedade a apresentar um pedido de autorização de extensão da exploração do jazigo para a comuna vizinha, Vingrau. A este propósito, o Governo francês sustentou que o acórdão da cour administrative d'appel de Bordeaux (França), que anulou o despacho do prefeito pelo qual a sociedade OMYA foi autorizada a construir, no território da comuna de Vingrau, as instalações destinadas à exploração da pedreira, satisfazia as exigências da directiva aves.

8 Por ofício de 19 de Dezembro de 1997, a Comissão formulou um parecer fundamentado no qual considerava, por um lado, que, ao não classificar o sítio das Basses Corbières em ZPE de determinadas espécies de aves incluídas no anexo I da directiva aves, bem como de determinadas espécies migratórias não incluídas nesse anexo, e ao também não adoptar medidas de conservação especial no que respeita aos seus habitats, em violação do artigo 4.°, n.os 1 e 2, da referida directiva, e, por outro, que, ao não adoptar no sítio das Basses Corbières as medidas adequadas para evitar as perturbações que afectam as espécies que se abrigam nesse sítio bem como as deteriorações dos seus habitats que possam vir a ter um efeito significativo, na sequência da abertura e exploração de pedreiras de calcário no território das comunas de Tautavel e de Vingrau, em violação do artigo 6.°, n.os 2 e 4, da directiva habitats, a República Francesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do Tratado CE. A Comissão instou a República Francesa a adoptar as medidas necessárias para dar cumprimento à directiva no prazo de dois meses a contar da sua notificação.

9 Por ofício de 22 de Julho de 1998, as autoridades francesas responderam ao parecer fundamentado. Aí referiam, designadamente, que um estudo de impacto muito completo permitira avaliar os efeitos das pedreiras em causa a nível da realização dos objectivos comunitários. Perante o estudo, foram postas em prática as medidas compensatórias aptas a reduzir os efeitos do projecto sobre os meios naturais, as espécies e as paisagens. No seu ofício, as autoridades francesas também referiram a existência de uma decisão do Conseil d'État (França) de 18 de Dezembro de 1996 e de uma decisão do tribunal administratif de Montpellier (França) de Janeiro de 1998 que confirmavam as autorizações de exploração e de implantação de uma instalação classificada, concedidas à sociedade OMYA. Além disso, estas autoridades recordaram estar a decorrer uma tentativa de conciliação entre adversários e partidários da exploração da pedreira de Vingrau e que, no termo dessa mediação, dariam início a uma processo de classificação em ZPE.

Quanto ao mérito

10 A Comissão acusa a República Francesa:

- em primeiro lugar, de não ter classificado em ZPE o sítio das Basses Corbières;

- em segundo, de não ter adoptado medidas de conservação especial suficientes no que respeita ao habitat das espécies referidas no anexo I da directiva aves bem como das espécies migratórias que frequentam esse sítio, e

- em terceiro lugar, de não ter adoptado as medidas adequadas para evitar que nesse sítio ocorram perturbações susceptíveis de afectar as referidas espécies bem como uma deterioração do seu habitat.

Quanto à classificação em ZPE

11 A Comissão refere que a riqueza ornitológica da zona das Basses Corbières, que se encontra num corredor de passagem de migração de importância europeia, justificou que as autoridades francesas a inscrevesse como zona importante para a conservação das aves selvagens (a seguir «ZICA»). A área assim designada de ZICA tinha uma superfície de 47 000 ha. A zona das Basses Corbières, por um lado, abrigava diversas espécies incluídas no anexo I da directiva aves, designadamente um casal de águias-de-Bonelli, de que só existem cerca de vinte casais no território francês, e, por outro, era um sítio importante na migração das aves de rapina.

12 O Governo francês reconhece que a classificação das Basses Corbières em ZPE sofreu atrasos devido a um contexto local de grande conflitualidade. No entanto, graças ao trabalho de um mediador mandatado pelo Governo francês, fora possível classificar uma parte importante do sítio das Basses Corbières em ZPE. O Governo francês recorda, por outro lado, que, nos termos do artigo 4.° da directiva aves, na interpretação que dele fez o Tribunal de Justiça, compete-lhe classificar em ZPE os territórios que lhe parecem mais adequados em número e em área à conservação das aves. Assim, as autoridades francesas não eram obrigadas a classificar em ZPE a totalidade da zona repertoriada no inventário nacional das ZICA. Esse governo também sustenta que a águia-de-Bonelli é a espécie mais notável da zona em termos de interesse ornitológico. Quanto às espécies migratórias, essa zona era mais uma zona de passagem do que uma zona de paragem ou de alimento. É verdade que, nessa zona, era possível observar algumas espécies num momento de paragem da migração, para aí descansarem ou se alimentarem. No entanto, na região das Basses Corbières não existia grandes zonas de concentração, como acontecia nas zonas húmidas do litoral.

13 A este respeito, importa recordar, em primeiro lugar, que, de acordo com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, um Estado-Membro não pode invocar disposições, práticas ou situações da sua ordem jurídica interna para justificar a inobservância das obrigações e prazos fixados por uma directiva (v., designadamente, acórdão de 18 de Março de 1999, Comissão/França, C-166/97, Colect., p. I-1719, n.° 13).

14 Em segundo lugar, é de jurisprudência constante que a existência de um incumprimento deve ser apreciada em função da situação do Estado-Membro, tal como se apresentava no termo do prazo fixado no parecer fundamentado (v., designadamente, acórdão Comissão/França, já referido, n.° 18). Ora, é certo que, antes de terminado o prazo fixado no parecer fundamentado, nenhuma parcela do sítio das Basses Corbières fora classificada em ZPE.

15 Em terceiro lugar, não se contesta a existência, no sítio das Basses Corbières, de zonas naturais com interesse ornitológico específico, quanto mais não seja em razão da presença da águia-de-Bonelli, que é uma espécie incluída no anexo I da directiva aves. A este respeito, importa sublinhar que as autoridades francesas procederam, em Janeiro de 1999, à classificação em ZPE de dois sítios de nidificação da águia-de-Bonelli, que representam uma área total de cerca de 360 ha e que já haviam sido objecto de dois regulamentos do prefeito relativos à conservação do biótopo dessa espécie. Um desses sítios abrange as comunas de Tautavel e de Vingrau, o outro as comunas de Maury, de Planèzes e de Raziguières (França).

16 Em contrapartida, não se demonstrou existirem espécies migratórias susceptíveis de justificar a classificação do sítio das Basses Corbières em ZPE, nos termos do artigo 4.°, n.° 2, da directiva aves. Na verdade, todas as espécies que a Comissão referiu para o efeito como espécies migratórias, como o falcão-abelheiro, o milhafre-preto, o milhano, o abutre, a águia-cobreira, o tartaranhão-ruivo-dos-pauis, o tartaranhão-azulado e o tartaranhão-caçador integram o anexo I da directiva aves. Ora, o artigo 4.°, n.° 2, dessa directiva só se aplica às espécies migratórias não incluídas no anexo I.

17 Por conseguinte, sem que seja necessário, no caso em apreço, abordar a questão de saber qual a área que a ZPE no sítio das Basses Corbières devia ocupar para que fiquem satisfeitas as obrigações resultantes da directiva aves, há que declarar que a República Francesa não classificou, no prazo fixado, em ZPE, na acepção do artigo 4.°, n.° 1, da directiva aves, nenhum território do sítio das Basses Corbières. Por conseguinte, o pedido da Comissão deve, sob este aspecto, ser acolhido dentro dos limites anteriormente fixados.

Quanto às medidas de conservação especial

18 Relativamente às medidas de conservação especial exigidas pelo artigo 4.°, n.° 1, da directiva aves, a Comissão sustenta que as medidas que as autoridades francesas adoptaram relativamente ao sítio das Basses Corbières eram insuficientes. Em especial, os três regulamentos do prefeito relativos à conservação do biótopo da águia-de-Bonelli nesse local, embora refiram nos seus anexos outras espécies de aves selvagens para além da águia-de-Bonelli, apenas visavam, nas suas disposições, esta última espécie e só para ela previam medidas especiais. Com efeito, esses regulamentos não garantiam uma protecção suficiente e completa de todas as espécies de aves que deviam ser protegidas no referido sítio ao abrigo da directiva aves, tanto no que respeita ao regime de protecção instaurado como no que respeita à sua dimensão geográfica.

19 Segundo o Governo francês, esses três regulamentos de protecção do biótopo garantem uma protecção completa das espécies de aves presentes nas zonas em causa. A este respeito, indica, designadamente, que as medidas de protecção previstas nos referidos regulamentos, para o conjunto das zonas em causa, consistem, fundamentalmente, numa proibição da prática da escalada sob todas as formas, de 15 de Janeiro a 30 de Junho, e, de um modo mais geral, numa proibição de todas as actividades que possam afectar a integridade do biótopo. Essas medidas satisfaziam os objectivos de conservação não só da espécie mais notável das Basses Corbières, que é a águia-de-Bonelli, mas também das outras espécies características desse biótopo. Por outro lado, as zonas delimitadas pelos regulamentos de protecção do biótopo correspondiam aos biótopos favoráveis, de um modo geral, às espécies rupestres que partilham o seu território com a águia-de-Bonelli.

20 No que respeita à alegada insuficiência do regime de protecção resultante das medidas de conservação especial adoptadas pelas autoridades francesas, importa, de qualquer modo, declarar que, embora seja verdade que cada um dos três regulamentos de protecção do biótopo tem por objectivo principal garantir a conservação do biótopo da águia-de-Bonelli e, portanto, a protecção dessa espécie, também não deixa de ser verdade que as suas disposições, na medida em que estabelecem, de forma mais ou menos circunstanciada, a proibição de actividades susceptíveis de afectar a integridade dos biótopos em causa, são benéficos para toda a avifauna que frequenta as zonas abrangidas por essa regulamentação.

21 Por outro lado, de nenhum elemento dos autos resulta que o regime instaurado pelos três regulamentos de protecção do biótopo é insuficiente na perspectiva das exigências da conservação de uma qualquer espécie de ave presente nas zonas abrangidas por esses regulamentos.

22 Assim, há que rejeitar a acusação relativa à insuficiência do regime de protecção resultante das medidas de conservação especial adoptadas pelas autoridades francesas.

23 No que respeita à alegada insuficiência da dimensão geográfica das referidas medidas de conservação especial, importa sublinhar que o Groupe ornithologique du Roussillon (a seguir «GOR») apresentou, em Março de 1999, uma proposta de classificação em ZPE de sectores situados na ZICA «Basses Corbières». Dessa proposta resulta que a zona, com uma superfície de 950 ha, compreendida entre a Serre de Vingrau-Tautavel até ao trou de Cavall tinha vocação para ser classificada em ZPE. Essa zona está completamente integrada na ZICA LR 07 que corresponde ao sítio das Basses Corbières a que a Comissão se refere no caso em apreço e que foi delimitada em 1991, a pedido do Ministério do Ambiente, pelo GOR e pelo Groupe de recherche et d'information sur les vertébrés et leur environnement.

24 Segundo o GOR, que o Governo francês reconhece ser uma associação naturalista independente da administração que desde há longos anos tem dado provas de seriedade científica e de objectividade, a referida zona, que já sofreu degradações por volta de 1990, deve considerar-se como a classificar em ZPE, designadamente em virtude da presença de grandes aves de rapina, como a águia-de-Bonelli, a águia-real, o falcão-peregrino e o bufo-real, bem como de um corvídeo como a gralha-de-bico-vermelho. A presença dessas espécies na zona em causa é relativamente antiga, como decorre dos diferentes elementos juntos aos autos. A águia-real, que se encontra nesta zona desde Janeiro de 1998, parece ser a espécie cuja chegada foi mais recente.

25 Cabe igualmente sublinhar que o inventário das zonas de grande interesse para a conservação das aves selvagens, mais comummente conhecido sob a sigla IBA (ou seja, Inventory of Important Bird Areas in the European Community), inclui nomeadamente a zona em questão. A este propósito, importa recordar que o Tribunal de Justiça considerou que este inventário, apesar de não ser juridicamente vinculativo para os Estados-Membros em causa, contém elementos de prova científica que lhe permitem apreciar em que medida um Estado-Membro respeitou a sua obrigação de classificar em ZPE os territórios mais apropriados em número e em superfície para a conservação das espécies protegidas (v. acórdão de 19 de Maio de 1998, Comissão/Países Baixos, C-3/96, Colect., p. I-3031, n.os 69 e 70).

26 Ora, da economia do artigo 4.° da directiva aves decorre que sempre que uma zona determinada satisfizer os critérios para ser classificada em ZPE, deve ser objecto de medidas de conservação especial susceptíveis de garantir, designadamente, a sobrevivência e a reprodução das espécies de aves mencionadas no anexo I dessa directiva.

27 No caso em apreço, das cartas apensas aos autos resulta que, dos três regulamentos de protecção do biótopo adoptados para o sítio das Basses Corbières, só um é relativo à zona indicada pelo GOR como devendo ser classificada em ZPE e que esse regulamento só se refere a uma parte da zona. Além disso, os 231 ha protegidos pelo referido regulamento não estão inteiramente incluídas nessa zona.

28 Por outro lado, a parte da referida zona não abrangida pelo regulamento em causa não é objecto de uma qualquer medida de conservação especial.

29 Nestas condições, não existindo elementos de prova capazes de pôr em causa a justeza da proposta do GOR de classificar em ZPE a zona de 950 ha compreendida entre a Serre de Vingrau-Tautavel e o trou de Cavall, é forçoso declarar que, como uma parte considerável dessa zona não beneficia de um regime de conservação especial, as medidas de conservação especial adoptadas pelas autoridades francesas no que respeita à sua dimensão geográfica são insuficientes.

30 Por conseguinte, sem que, no caso em apreço, seja necessário abordar a questão de saber se existem outras zonas do sítio das Basses Corbières com vocação para ser classificadas em ZPE, revela-se que a República Francesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 4.°, n.° 1, da directiva aves ao não adoptar medidas de conservação especial suficientes no que respeita à sua dimensão geográfica. Segue-se que o pedido da Comissão também deve, sob este aspecto, ser acolhido dentro dos limites anteriormente definidos.

Quanto às perturbações e deterioração causadas pelas pedreiras de calcário de Vingrau e de Tautavel

31 Segundo a Comissão, dado que, a partir da data de entrada em vigor da directiva habitats, ou seja, 10 de Junho de 1994, as obrigações do artigo 6.°, n.os 2 a 4, dessa directiva vieram substituir, por força do seu artigo 7.°, as obrigações decorrentes do artigo 4.°, n.° 4, primeiro período, da directiva aves, o respeito das referidas obrigações da directiva habitats impõe-se desde essa data no que toca ao sítio das Basses Corbières, embora este não tenha ainda sido classificado em ZPE ao abrigo do artigo 4.°, n.os 1 e 2, da directiva aves.

32 Em resposta à questão colocada pelo Tribunal de Justiça a este respeito, a Comissão sustenta que, como o artigo 7.° da directiva habitats em nada modifica o artigo 4.°, n.os 1 e 2, da directiva aves, os fundamentos que conduziram o Tribunal de Justiça a alargar o regime de protecção do artigo 4.°, n.° 4, primeiro período, da directiva aves às zonas não classificadas em ZPE são igualmente pertinentes no que toca ao regime de protecção a que se refere o artigo 6.°, n.os 2 a 4, da directiva habitats, que lhe sucedeu. Além disso, a Comissão alega que, se as disposições do artigo 7.° da directiva habitats devessem ser interpretadas no sentido de só terem pretendido que as obrigações decorrentes do seu artigo 6.°, n.os 2 a 4, fossem aplicáveis apenas às ZPE efectivamente classificadas como tais pelas autoridades nacionais ao abrigo do artigo 4.°, n.os 1 e 2, da directiva aves, daí resultava uma dualidade de regimes de protecção dificilmente justificável. Com efeito, o regime de protecção definido na directiva aves era mais rigoroso do que o que decorre da directiva habitats. Ora, era paradoxal colocar as zonas com interesse ornitológico que não foram objecto de uma medida nacional de classificação em ZPE sob um regime de protecção mais rigoroso do que o aplicável às zonas efectivamente classificadas em ZPE pelos Estados-Membros.

33 A Comissão refere que a realização do projecto de abertura e exploração de pedreiras de calcário no território das comunas de Vingrau e de Tautavel incluído no sítio das Basses Corbières pode causar perturbações que afectam as espécies presentes nesse sítio bem como uma deterioração do seu habitat. Em especial, relativamente à águia-de-Bonelli, a abertura das pedreiras implicava o desaparecimento de uma parte do seu território de caça e podia perturbar a sua reprodução em razão dos transtornos visuais e sonoros ligados à actividade das pedreiras.

34 A Comissão também alega que, no caso em apreço, mesmo que só se optasse, para efeitos da determinação das zonas que deviam beneficiar do regime de protecção especial, pelas que foram classificadas em ZPE pelas autoridades francesas e que correspondem aos territórios abrangidos pelos dois regulamentos de protecção do biótopo citados no n.° 15 do presente acórdão, revela-se que o projecto de exploração da pedreira da sociedade OMYA pode afectar de forma significativa estas zonas, cuja interesse ornitológico ninguém contesta.

35 Nestas condições, segundo a Comissão, devia ter-se procedido a uma avaliação adequada das incidências do projecto a nível da conservação do sítio em causa. Ora, o estudo de impacto prévio à autorização de exploração da pedreira, datado de 1994, não satisfaz esta exigência.

36 A República Francesa também tinha violado a obrigação de adoptar medidas compensatórias adequadas. Com efeito, segundo a Comissão, a fixação de caça para a águia-de-Bonelli, o seguimento científico dessa espécie, a criação de um merlão, bem como a elaboração de um plano de gestão do meio natural, para além de não dizerem respeito às outras espécies de aves que exigem protecção, não podiam compensar as perturbações e deteriorações causadas, pois estas não foram avaliadas.

37 Como não houve avaliação adequada das incidências do projecto de pedreiras no sítio a classificar em ZPE na comuna de Vingrau e que, além disso, um impacto negativo estava longe de poder ser afastado, as autoridades francesas deviam ter-se recusado a dar o seu acordo a este projecto, a menos que demonstrassem não existir mais nenhuma solução de substituição e que existia um interesse público maior capaz de justificar o projecto. Ora, a Comissão refere diversos relatórios provenientes de universidades qualificadas que concluem pela existência de soluções equivalentes ao jazigo de Vingrau. De qualquer forma, nem a sociedade OMYA nem as autoridades francesas se tinham seriamente debruçado sobre essas soluções.

38 O Governo francês sustenta que a Comissão não apresentou qualquer elemento de prova, de natureza científica ou outra, demonstrativo de que as pedreiras perturbam significativamente o casal de águias-de-Bonelli, bem como as outras espécies. De qualquer modo, esse governo contesta que a abertura e exploração das pedreiras possam ter graves consequências para as espécies presentes no sítio. A este respeito, alega, antes de mais, que em nenhum dos estudos científicos efectuados se concluiu que a exploração das pedreiras podia acarretar semelhantes consequências para a avifauna e, designadamente, para a águia-de-Bonelli, e, a seguir, que essa exploração foi objecto, previamente, de um estudo de impacto aprofundado em que se chegou à conclusão que o projecto não tinha efeitos significativos a nível do ambiente, e, por último, que tinham sido postas em prática importantes medidas de precaução destinadas a evitar os eventuais efeitos negativos do projecto sobre o ambiente.

39 O Governo francês refere que a águia-de-Bonelli já aí existia antes do início da exploração, em 1968, da pedreira de Tautavel e que desde então aí se manteve sem que a exploração de calcário se tenha revelado perturbadora para a espécie. Nada no seguimento desta espécie, efectuada pelas associações locais de protecção das aves independentes da administração, permitia afirmar que a deslocação da exploração de Tautavel para Vingrau podia ter efeitos negativos, não sendo, de qualquer modo, a zona de nidificação da águia-de-Bonelli afectada pelos dois locais de exploração.

40 Relativamente ao território de caça da águia-de-Bonelli, este governo recorda que, no referido estudo de impacto, se precisa, por um lado, que a área necessária à exploração das pedreiras não devia perturbar gravemente os hábitos dessa espécie, que dispõe de um território de caça de alguns quilómetros quadrados, e, por outro, que foram tomadas algumas medidas de precaução para favorecer o desenvolvimento da pequena caça de que se alimenta essa águia.

41 No que respeita a eventuais soluções de substituição para a pedreira actualmente explorada pela sociedade OMYA no território das comunas de Vingrau e de Tautavel, o Governo francês sustenta que foram seriamente estudadas por essa sociedade, mas que não são de modo algum equivalentes a este jazigo.

42 Em resposta à questão colocada pelo Tribunal de Justiça quanto à aplicabilidade do artigo 6.°, n.os 2 a 4, da directiva habitats a zonas ainda não classificadas em ZPE, o Governo francês, que reconhece não ter alegado a inaplicabilidade dessas disposições ao sítio das Basses Corbières, sustenta que a aplicação dessas obrigações em vez das constantes do artigo 4.°, n.° 4, primeiro período, da directiva aves, tal como prevista no artigo 7.° da directiva habitats, só respeita às zonas já classificadas em ZPE ao abrigo da directiva aves.

43 Importa, em primeiro lugar, examinar se o artigo 6.°, n.os 2 a 4, da directiva habitats deve ser aplicada às zonas que não foram classificadas em ZPE quando o deviam ter sido.

44 A este propósito, importa sublinhar que a letra do artigo 7.° da directiva habitats indica expressamente que o seu artigo 6.°, n.os 2 a 4, se aplica, em substituição do artigo 4.°, n.° 4, primeiro período, da directiva aves, às zonas classificadas ao abrigo do artigo 4.°, n.os 1 ou 2, desta última directiva.

45 Segue-se que, de acordo com uma interpretação literal dessa passagem do artigo 7.° da directiva habitats, só as zonas classificadas em ZPE ficam sob a alçada do artigo 6.°, n.os 2 a 4, dessa mesma directiva.

46 Por outro lado, a letra do artigo 7.° da directiva habitats esclarece que o artigo 6.°, n.os 2 a 4, dessa directiva substitui o artigo 4.°, n.° 4, primeiro período, da directiva aves a partir da entrada em vigor da directiva habitats ou da data da classificação, por um Estado-Membro, ao abrigo da directiva aves, se esta última data for posterior. Esta passagem do artigo 7.° parece corroborar a interpretação segundo a qual a aplicação do artigo 6.°, n.os 2 a 4, pressupõe a classificação em ZPE da zona em causa.

47 Revela-se, portanto, que as zonas que não foram classificadas em ZPE quando o deviam ter sido continuam a ficar sob a alçada do regime próprio ao artigo 4.°, n.° 4, primeiro período, da directiva aves.

48 Os argumentos em sentido contrário invocados pela Comissão não podem ser acolhidos.

49 Assim, o facto de, tal como resulta da jurisprudência do Tribunal de Justiça (v., designadamente, acórdão de 2 de Agosto de 1993, Comissão/Espanha, C-355/90, Colect., p. I-4221, n.° 22), o regime de protecção do artigo 4.°, n.° 4, primeiro período, da directiva aves se aplicar às zonas não classificadas em ZPE que o deviam ter sido, não implica, por si só, que o regime de protecção a que se refere o artigo 6.°, n.os 2 a 4, da directiva habitats se substitua ao primeiro regime citado quando se trate das referidas zonas.

50 Por outro lado, no que respeita ao argumento da Comissão extraído de uma dualidade dos regime aplicáveis, há que sublinhar que o facto de as zonas indicadas no número anterior do presente acórdão estarem, por força do artigo 4.°, n.° 4, primeiro período, da directiva aves, sujeitas a um regime mais rigoroso do que o previsto no artigo 6.°, n.os 2 a 4, da directiva habitats no que respeita às zonas classificadas em ZPE não parece injustificado.

51 A este respeito, importa recordar, à semelhança do advogado-geral no n.° 99 das suas conclusões, que um Estado-Membro não pode beneficiar do não respeito das suas obrigações comunitárias.

52 Ora, se fosse lícito a um Estado-Membro que, em violação da directiva aves, não classificou em ZPE um sítio que o devia ter sido, invocar o artigo 6.°, n.os 3 e 4, da directiva habitats, esse Estado poderia beneficiar de tal vantagem.

53 Com efeito, como não existe nenhum acto formal de classificação desse sítio em ZPE, é particularmente difícil à Comissão exercer, em conformidade com o artigo 155.° do Tratado CE (actual artigo 211.° CE), um controlo eficaz sobre a aplicação, pelos Estados-Membros, do processo previsto no artigo 6.°, n.os 3 e 4, da directiva habitats e declarar, eventualmente, a existência de eventuais incumprimentos às obrigações que daí decorrem. Em especial, aumentaria sensivelmente o risco de as autoridades nacionais aceitarem, em violação do referido processo, planos ou projectos não directamente ligados ou necessários à gestão do sítio e atentatórios da sua integridade, que escapem ao controlo da Comissão e provoquem danos ecológicos graves, ou mesmo irreparáveis, em oposição às exigências de conservação desse sítio.

54 As pessoas singulares ou colectivas que, perante os órgãos jurisdicionais nacionais, podem invocar os interesses decorrentes da protecção da natureza, designadamente da avifauna selvagem, ou seja, principalmente, as organizações de protecção do ambiente, ver-se-iam confrontadas com dificuldades comparáveis.

55 Tal situação podia pôr em causa a realização do objectivo de protecção específico da avifauna selvagem a que se refere o artigo 4.° da directiva aves, como interpretado pela jurisprudência do Tribunal de Justiça (v., designadamente, acórdão de 11 de Julho de 1996, Royal Society for the Protection of Birds, C-44/95, Colect., p. I-3805, n.os 23 e 25).

56 Tal como o advogado-geral substancialmente referiu no n.° 102 das suas conclusões, a dualidade dos regimes aplicáveis, respectivamente, às zonas classificadas em ZPE e às que o deviam ter sido incita os Estados-Membros a efectuar classificações, na medida em que eles se concedem assim a possibilidade de recorrer a um processo que lhes permite adoptar, por razões imperativas de interesse público, inclusive de natureza social ou económica, e mediante determinadas condições, um plano ou projecto atentatório de uma ZPE.

57 Do que precede decorre que o artigo 6.°, n.os 2 a 4, da directiva habitats não se aplica às zonas que não foram classificadas em ZPE, embora o devessem ter sido.

58 Por conseguinte, há que rejeitar a acusação decorrente da violação do artigo 6.°, n.os 2 a 4, da directiva habitats.

59 Importa, portanto, declarar que, ao não classificar em ZPE nenhum território do sítio das Basses Corbières e ao não adoptar, relativamente a esse sítio, medidas de conservação especial suficientes quanto à sua dimensão geográfica, a República Francesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem nos termos do artigo 4.°, n.° 1, da directiva aves.

60 Quanto ao demais, deve negar-se provimento ao pedido.

Decisão sobre as despesas


Quanto às despesas

61 Nos termos do artigo 69.°, n.° 2, Regulamento de Processo, a parte vencida deve ser condenada nas despesas, se tal tiver sido requerido. Todavia, segundo o artigo 69.°, n.° 3, primeiro parágrafo, se as partes obtiverem vencimento parcial, o Tribunal pode determinar que as despesas sejam repartidas entre as partes, ou que cada uma das partes suporte as suas próprias despesas. Como a Comissão só obteve ganho de causa relativamente a uma parte do seu pedido, há que proceder à repartição das despesas.

Parte decisória


Pelos fundamentos expostos,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA

(Sexta Secção)

decide:

62 Ao não classificar em zona de protecção especial nenhum território do sítio das Basses Corbières e ao não adoptar, relativamente a esse sítio, medidas de conservação especial suficientes quanto à sua dimensão geográfica, a República Francesa não cumpriu as obrigações que lhe incumbem nos termos do artigo 4.°, n.° 1, da Directiva 79/409/CEE do Conselho, de 2 de Abril de 1979, relativa à conservação das aves selvagens.

63 Quanto ao demais, o pedido é julgado improcedente.

64 Cada uma das partes suportará as suas próprias despesas.

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