ISSN 1725-2482

doi:10.3000/17252482.C_2011.248.por

Jornal Oficial

da União Europeia

C 248

European flag  

Edição em língua portuguesa

Comunicações e Informações

54.o ano
25 de Agosto de 2011


Número de informação

Índice

Página

 

I   Resoluções, recomendações e pareceres

 

PARECERES

 

Comité Económico e Social Europeu

 

472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011

2011/C 248/01

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o O papel e as prioridades da política de coesão na Estratégia Europa 2020 (parecer exploratório a pedido da Presidência húngara)

1

2011/C 248/02

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre as Estratégias de consolidação inteligente da política orçamental — O desafio da identificação de motores de crescimento na Europa. Como explorar ao máximo o potencial de emprego das nossas economias à luz da necessidade premente de ajustamento orçamental (parecer exploratório solicitado pela Presidência húngara)

8

2011/C 248/03

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Empoderamento e integração social dos Romes na Europa (parecer exploratório)

16

2011/C 248/04

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre as Repercussões das políticas da UE nas oportunidades de emprego, nas necessidades de formação e nas condições de trabalho dos trabalhadores no sector dos transportes (parecer exploratório)

22

2011/C 248/05

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Desenvolvimento sustentável da política europeia de transportes e o planeamento das RTE-T (parecer exploratório solicitado pela futura Presidência polaca)

31

2011/C 248/06

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Contributo da sociedade civil para a Parceria Oriental

37

2011/C 248/07

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Integração da política da água nas demais políticas europeias (parecer exploratório a pedido da Presidência húngara)

43

2011/C 248/08

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre O papel e a relação da UE com a Ásia Central e o contributo da sociedade civil

49

2011/C 248/09

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Para um Acordo de Associação UE-Mercosul: Contributo da sociedade civil organizada

55

2011/C 248/10

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre O Diálogo Intercultural e os Romes: O papel essencial das mulheres e da educação (aditamento a parecer)

60

 

III   Actos preparatórios

 

COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU

 

472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011

2011/C 248/11

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: A tributação do sector financeiro[COM(2010) 549 final]

64

2011/C 248/12

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu, ao Comité das Regiões e ao Banco Europeu de Investimento: Conclusões do quinto relatório sobre a coesão económica, social e territorial: o futuro da política de coesão[COM(2010) 642 final]

68

2011/C 248/13

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão dirigida ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu, ao Comité das Regiões e aos Parlamentos Nacionais: Reapreciação do orçamento da UE[COM(2010) 700 final]

75

2011/C 248/14

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Estratégia da União Europeia para a Região do Danúbio[COM(2010) 715 final]

81

2011/C 248/15

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Regulamentação inteligente na União Europeia[COM(2010) 543 final]

87

2011/C 248/16

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre Livro Verde — Política de auditoria: as lições da crise[COM(2010) 561 final]

92

2011/C 248/17

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social, ao Comité das Regiões e ao Banco Central Europeu: Um enquadramento da UE para a gestão de crises no sector financeiro[COM(2010) 579 final]

101

2011/C 248/18

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Reforçar o regime de sanções no sector dos serviços financeiros[COM(2010) 716 final]

108

2011/C 248/19

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Livro Verde — Reduzir os trâmites administrativos para os cidadãos: Promover a livre circulação dos documentos públicos e o reconhecimento dos efeitos dos actos de registo civil[COM(2010) 747 final]

113

2011/C 248/20

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera as Directivas 89/666/CEE, 2005/56/CE e 2009/101/CE no que respeita à interconexão dos registos centrais, registos comerciais e registos das sociedades[COM(2011) 79 final — 2011/0038 (COD)]

118

2011/C 248/21

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Uma abordagem global da protecção de dados pessoais na União Europeia[COM(2010) 609 final]

123

2011/C 248/22

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre a Plataforma Europeia contra a Pobreza e a Exclusão Social: um quadro europeu para a coesão social e territorial[COM(2010) 758 final]

130

2011/C 248/23

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Comunicação sobre a migração[COM(2011) 248 final]

135

2011/C 248/24

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao controlo dos perigos associados a acidentes graves que envolvem substâncias perigosas[COM(2010) 781 final — 2010/0377 (COD)]

138

2011/C 248/25

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões relativa às oportunidades e desafios do cinema europeu na era digital[COM(2010) 487 final]

144

2011/C 248/26

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Reforma das regras da UE em matéria de auxílios estatais aplicáveis aos serviços de interesse económico geral[COM(2011) 146 final]

149

2011/C 248/27

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos pneumáticos dos veículos a motor e seus reboques bem como à respectiva instalação nesses veículos (codificação) [COM(2011) 120 final — 2011/0053 (COD)]

153

2011/C 248/28

Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados no ambiente (codificação) [COM(2011) 189 final — 2011/0080 (COD)]

154

PT

 


I Resoluções, recomendações e pareceres

PARECERES

Comité Económico e Social Europeu

472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011

25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/1


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «O papel e as prioridades da política de coesão na Estratégia Europa 2020» (parecer exploratório a pedido da Presidência húngara)

2011/C 248/01

Relator: Etele BARÁTH

Em 15 de Novembro de 2010, o representante permanente da República da Hungria junto da União Europeia, Peter GYÖRKÖS, solicitou ao Comité Económico e Social Europeu, em nome da futura Presidência húngara, um parecer exploratório sobre as:

O papel e as prioridades da política de coesão na Estratégia Europa 2020.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social que emitiu parecer em 31 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 16 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 141 votos a favor, 9 votos contra e 22 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Recomendações e observações

1.1   Recomendações

1.1.1   O CESE considera que a resposta da União Europeia à crise, a filosofia da Estratégia Europa 2020, os seus objectivos e iniciativas emblemáticas apontam o caminho certo, e que as medidas e os instrumentos propostos são prometedores. A estratégia, juntamente com o Pacto Euro +, versa essencialmente sobre as mudanças qualitativas indispensáveis e os factores de potencial crescimento.

1.1.2   A UE continua a aprofundar e consolidar o seu processo de integração. O CESE considera que, se a União Europeia e os seus Estados-Membros desejam reforçar a integração, deverão introduzir, até 2020, mudanças qualitativas decisivas nas suas instituições e nos seus sistemas jurídico e financeiro. Tudo isto requer, ao mesmo tempo, estabilidade duradoura (longo prazo), melhoria da competitividade (potencial de crescimento) e consolidação do processo de recuperação (coesão territorial, económica e social).

1.1.3   O CESE já salientou, em vários pareceres, que a política de coesão constitui um «valor histórico» da União e os seus três objectivos – convergência, melhor competitividade regional graças à criação de empregos e à intensificação da cooperação territorial – devem ser preservados e reforçados. De facto, as regiões e os países europeus menos desenvolvidos devem aumentar o investimento em infra-estruturas e outros elementos de capital necessário para acelerar o potencial crescimento.

1.1.4   Se, por um lado, o CESE está convicto de que os recursos financeiros para apoiar a política de coesão deram, em grande medida, bons resultados, por outro, considera que eles podem e devem ser reestruturados e desenvolvidos, e, sobretudo, poderia melhorar-se a eficácia e a eficiência do financiamento e da utilização dos recursos. É preciso harmonizar os instrumentos da política de coesão e a Estratégia Europa 2020 de modo a não prejudicar a política europeia de coesão.

1.1.5   O CESE recomenda que, ao reexaminar os objectivos e os instrumentos actuais da política de coesão, se estude a possibilidade de os adequar aos elementos da Estratégia Europa 2020, como segue:

1.1.5.1   Objectivos e instrumentos actuais da política de coesão

Política de coesão

Objectivos

Fundos Estruturais e Instrumentos

 

 

Convergência/Crescimento sustentável

FEDER

FSE

Fundo de Coesão

 

 

 

 

Competitividade regional e emprego

FEDER

FSE

 

 

 

 

 

Cooperação Territorial Europeia

FEDER

 

 

1.1.5.2   Europa 2020: três prioridades

a)

Crescimento inteligente - desenvolver uma economia baseada no conhecimento e na inovação;

b)

Promover uma economia mais eficiente, mais verde e mais competitiva;

c)

Crescimento inclusivo: fomentar uma economia com níveis elevados de emprego que assegure a coesão social e territorial.

1.1.5.3   O CESE propõe que a política de coesão deve insistir claramente nos objectivos societais, sociais e de solidariedade e na utilização dos fundos estruturais para o investimento, em estreita cooperação com os outros fundos europeus. Caso contrário, a insistência da Estratégia Europa 2020 num forte crescimento económico, que em si é perfeitamente legítimo, poderia relegar para segundo plano a coesão social e territorial.

1.1.5.4   Se, nos Fundos Estruturais, se inverter a ordem dos objectivos relativos à competitividade e dos relativos ao crescimento, e se o conceito multi-fundos se tornar o factor determinante, os objectivos da Estratégia Europa 2020 e os da coesão passarão a ser compatíveis e os Fundos Estruturais da UE poderão contribuir mais eficazmente para melhorar a competitividade regional.

Estratégia UE-2020

Política de coesão

(estrutura revista)

«Objectivos/instrumentos»

Iniciativas emblemáticas

Objectivos/instrumentos

Fundos Estruturais e Instrumentos

 

 

 

 

Crescimento inteligente

Agenda Digital para a Europa, União da Inovação, Juventude em Movimento

Competitividade regional e emprego

 

 

 

Investigação/Inovação/Educação/Sociedade Digital

Maior competitividade/Localização mais atractiva, desenvolvimento do capital humano/Educação, etc. Inovação/Sociedade do conhecimento

Crescimento sustentável

Uma Europa eficaz na utilização dos recursos, Uma política industrial para a era da globalização

Convergência

 

 

 

Energias verdes/sociedade atenta ao ambiente, Desenvolvimento das redes / instalações de pequena dimensão

Desenvolvimento do ambiente e das infra-estruturas para edificar as bases do crescimento, desenvolvimento das capacidades institucionais

Crescimento inclusivo

Uma agenda para novas competências e empregos, Uma plataforma europeia contra a pobreza

Cooperação Territorial Europeia

 

 

 

Igualdade de acesso/mais e melhores empregos.

Cooperação local, regional e macroregional

1.1.6   O CESE reconhece que a harmonização estrutural atrás proposta pressupõe que se proceda a profundas mudanças, à focalização na definição de objectivos pormenorizados; convém, nomeadamente, fixar objectivos complementares de competitividade e estender a cooperação territorial ao apoio a desenvolvimentos macrorregionais. Se não for possível estabelecer um vínculo directo entre a Estratégia 2020 e a política de coesão da UE, os seus objectivos, os seus meios e a sua execução poderão ser consideravelmente afectados.

1.1.7   A harmonização estrutural poderia ocorrer se a UE reconhecesse à coesão e à política de coesão, em sentido lato, uma prioridade ao mesmo nível do da competitividade, o que, a ser assim, se deveria reflectir na forma como se atribuem os recursos a essas duas prioridades. Não obstante, não se trata apenas de continuar a gastar dinheiro na coesão, mas em gastá-lo mais eficazmente.

1.1.7.1   O CESE pede urgentemente que se melhorem as propostas sobre o regime de condicionalidade ex ante e ex post para controlar a eficácia e a eficiência da política de coesão da União. No entanto, este regime não deve pôr em causa a simplificação dos instrumentos da coesão, antes reduzir os custos de execução e reforçar previsibilidade. O CESE espera que as mudanças institucionais e administrativas conduzam a um sistema mais simples e mais eficiente. É preciso desenvolver um modelo que permita avaliar as interacções que se produzem na realização dos objectivos da Estratégia Europa 2020, dos programas nacionais de reformas e da política de coesão com base nas características específicas das regiões e dos países beneficiários desta política.

1.1.8   O CESE é de opinião de que todas as políticas devem contribuir para o êxito da Estratégia Europa 2020. A comunicação sobre a reapreciação do orçamento da União propõe uma nova programação estratégica da política de coesão. O CESE aprova sem reservas que a Comissão Europeia elabore um quadro estratégico comum (QEC) que transforme os objectivos e as metas da Estratégia «Europa 2020» em prioridades de investimento. Este marco estratégico cobriria todos os fundos da UE e integraria ainda todos os demais instrumentos financeiros da UE.

1.1.9   O CESE reitera que o Fundo Social Europeu, enquanto instrumento da União Europeia para o investimento nos recursos humanos, deveria apoiar as três prioridades da Estratégia Europa 2020, isto é, crescimento inteligente, crescimento sustentável e crescimento inclusivo. O emprego, a formação, a inclusão activa e as políticas de igualdade de oportunidades são os elementos centrais desta abordagem.

1.1.10   O CESE considera que para realizar os objectivos reforçados é necessário consolidar a estrutura institucional do FSE e torná-lo mais eficiente, sem que isso implique mais encargos administrativos. É importante que o FSE tenha um papel de primeiro plano na melhoria da situação dos grupos sociais particularmente desfavorecidos (imigrantes, minorias, pessoas portadoras de deficiência, população romani) e na garantia de condições adequadas para a sua integração.

1.1.11   O CESE faz notar que a coordenação das políticas financiadas pelos diferentes fundos com os instrumentos e os objectivos da coesão da Estratégia Europa 2020 pode ter influência nos objectivos iniciais e afectar a sua integração territorial, o que por sua vez pode conduzir a mudanças nos objectivos e à emergência de novos pontos vista durante a sua execução. É necessário criar mecanismos iterativos de planeamento, orientação e controlo. A noção central do processo iterativo é que no «acordo de colaboração» não se deve definir unicamente as fases preparatórias de desenvolvimento, mas também a totalidade do processo de aplicação, suas condições e avaliação de eficácia; no entanto, as partes devem saber que os objectivos globais dos comités de gestão podem mudar em função das avaliações constantes dos beneficiários.

1.1.12   O Comité insiste em que, para realizar os objectivos da Estratégia UE 2020, é necessário uma maior coordenação ao nível da gestão de cada um dos fundos, em particular do Fundo de Coesão, dos Fundos Estruturais e dos fundos para a inovação.

1.1.13   O Comité pensa que, a longo prazo, e para evitar contradições, muitos argumentos pesam a favor da integração de todos os elementos da política estrutural da União (por exemplo, Europa 2020, política de coesão, PAC, BEI.) num conjunto coerente de políticas gerais da União, que poderia designar-se UE 2050. Isto permitiria reforçar a coordenação e a cooperação política e técnica sem pôr termos às diferentes políticas. É certo que isto será difícil de conseguir enquanto algumas políticas continuarem a ser da competência da UE e outras se mantiveram sob a alçada dos Estados-Membros. Reforçar a dimensão regional pode ser a melhor maneira de realizar gradualmente o objectivo pretendido.

1.1.14   O desenvolvimento de uma Europa policêntrica composta por sítios inteligentes ligados em rede exige um trabalho de equipa que só será possível se houver cooperação entre todas as partes. A cooperação nas regiões transnacionais e as estratégias de desenvolvimento macrorregionais que reúnem as partes interessadas de diferentes países podem ser uma das pistas a seguir.

1.2   Regiões e coesão

1.2.1   O CESE considera que a competitividade da UE depende, em grande medida, do aumento da competitividade das regiões.

1.2.2   Para o CESE a cooperação macrorregional emergente é determinante sob vários aspectos. Como já teve ocasião de salientar em vários pareceres (respeitantes às regiões do Mar Báltico e do Danúbio), as ajudas concedidas no âmbito dos Fundos Estruturais podem permitir traçar estratégias no quadro das redes transeuropeias, tanto materiais como imateriais, de que a União Europeia precisa para consolidar a competitividade e melhorar a atractividade do seu território.

1.2.3   O futuro da União Europeia e o reforço da sua unidade política dependem de ela ser capaz, ou não, de superar a abordagem regional, baseada em dados estatísticos, confinada nas fronteiras nacionais e cristalizada na sua dimensão territorial. É evidente que os progressos tangíveis realizados nos últimos anos no sentido da sentido da regionalização, de programas complexos, de ligações horizontais e do reforço dos sistemas produtivos locais (clusters) constituem a via através da qual as dimensões social e territorial da economia europeia poderão desenvolver-se.

1.2.4   Para o Comité, não faz qualquer sentido realizar, no quadro de políticas diferentes, objectivos perfeitamente paralelos, ou mesmo, por vezes, totalmente coincidentes; não faz qualquer sentido criar um outro conjunto de instrumentos para além dos da coesão, já relativamente bem consolidados.

1.2.4.1   A próxima década será, cada vez mais, a década das regiões funcionais. Com um ou mais centros, com laços transfronteiriços territoriais horizontais ou com laços económicos verticais, com possibilidades jurídicas, financeiras e institucionais de «cooperação reforçada», o regionalismo poderá trazer uma nova dimensão à Europa inteligente. No entanto, porque há e continuará a haver regiões com atraso de desenvolvimento, é necessário avançar um programa que lhes permita recuperar o atraso.

1.2.5   Na opinião do CESE, o caminho a seguir passa necessariamente por transformar a economia europeia para assegurar o seu êxito a nível mundial, fomentar o seu potencial de crescimento, reduzir as assimetrias regionais, apoiar as microempresas e as PME que operam nas regiões periferias, libertar novos recursos, sensibilizar os cidadãos para as questões do ambiente z os hábitos saudáveis, elevar a qualidade da educação, motivar as novas gerações, fomentar a inovação, incentivar a participação cidadã e consolidar a identidade europeia.

1.3   Cidades e aglomerados urbanos

1.3.1   O CESE realça que a competitividade da Europa depende fortemente das cidades metropolitanas e das regiões metropolitanas, no âmbito das quais as empresas podem tirar partido das economias urbanas e das redes de ligação aos mercados mundiais. De maneira geral, as áreas urbanas podem ser motores de crescimento e focos de criatividade e inovação. A taxa de crescimento e a criação de emprego podem aumentar se estiver reunida uma massa crítica de empresas, universidades e investigadores. Os problemas urbanos, relacionados quer com a degradação ambiental quer com a exclusão social, exigem uma resposta específica e o envolvimento directo das colectividades locais.

1.3.2   Assim, convém desenvolver uma agenda urbana ambiciosa que identifique com mais clareza os recursos financeiros destinados à resolução das questões urbanas e que atribua às colectividades locais um papel reforçado de concepção e aplicação das estratégias de desenvolvimento urbano.

1.3.3   Os sistemas urbanos são complementados, consoante a sua situação geográfica, por diferentes zonas de atracção. O CESE não pode aceitar que se continue a manter o tradicional antagonismo entre cidade e campo. As vantagens que podem resultar das parcerias entre zonas urbanas e zonas rurais dependem fortemente de factores locais e, em última análise, de factores contextuais.

1.4   Zonas rurais e agricultura

1.4.1   O CESE considera que, no âmbito da Estratégia Europa 2020, a política de coesão, por um lado, e a política agrícola comum, por outro, desempenham um papel de primeiro plano, em especial no que diz respeito ao desenvolvimento integrado do território. A agricultura – importante fonte de dinamismo económico – continua a ser um sector estratégico para a UE quer do ponto de vista da segurança alimentar, quer em razão do seu potencial de crescimento e emprego nas zonas rurais, como também pelo seu contributo no combate às alterações climáticas.

1.4.2   Nesta perspectiva, as duas políticas devem orientar as suas sinergias para objectivos comuns e integrados, com vista a transformar a União Europeia numa economia inteligente, sustentável e inclusiva, caracterizada por níveis elevados de emprego, produtividade e coesão social.

1.4.2.1   O CESE considera que, nas zonas rurais, os sítios inteligentes e ligados a nível mundial têm um papel a desempenhar na concretização do relançamento apontado na Estratégia Europa 2020. Tal como nas zonas urbanas, as redes constituem uma forma de organização de primeiro plano para as empresas e o desenvolvimento regional.

2.   Conclusões

2.1   O CESE aprova que as referências políticas da Estratégia Europa 2020 às necessidades de inovação baseadas nas alterações climáticas, na eficiência energética, nas energias renováveis, na saúde e na evolução demográfica, têm ligações estruturais com os objectivos de coesão fixados nos domínios da educação, da investigação e desenvolvimento, da sociedade digital, que constituem uma ponte, igualmente a nível territorial, entre os objectivos da política de coesão e a Estratégia Europa de 2020.

2.1.1   Por outro lado, verifica que há uma contradição entre os vários conceitos e as noções utilizadas na prática. Ao legitimar a territorialidade dos processos de coesão, o Tratado de Lisboa deu ao fenómeno regional uma nova dimensão. A maneira como a política regional vai definir no futuro o que é a «região» não será uma questão banal. É necessária uma definição que permita delinear um quadro comum, quer do ponto de vista territorial e institucional, quer do ponto de vista dos instrumentos jurídicos e financeiros pertinentes, a fim de assegurar o crescimento sustentável e dinâmico da Europa.

2.1.1.1   O CESE reconhece que a emergência de estratégias macrorregionais é um processo muito positivo, que pode ser equiparado ao conceito de coesão territorial consagrado no Tratado de Lisboa. Importa conseguir uma complementaridade entre as políticas regionais em sentido restrito e a cooperação entre regiões europeias mais amplas ou mais afastadas, mas que têm interesses comuns em matéria de cooperação.

2.2   A intersecção entre determinados «grupos» de programas definidos em termos espaciais (regional, territorial, interurbano) indica em que zonas há actividades «motrizes», de desenvolvimento, ou seja zonas que dispõem de um ou vários grandes núcleos urbanos, sem no entanto excluir ou marginalizar outros. Os «centros de excelência» europeus, que são definidos em função de competências de inovação características de certos sectores económicos, não são uma soma fortuita de aptidões e competências individuais acumuladas numa aglomeração, mas sobretudo de conhecimentos reunidos por meio de vínculos claramente definidos no espaço físico.

2.2.1   Não pode haver «excelência» sem desenvolvimentos quantitativos no âmbito dos objectivos essenciais da coesão: ambiente, infra-estruturas, educação, formação. A característica principal destas áreas é a sua abertura; a participação pode fazer-se livremente, mas, por razões de qualidade, as oportunidades a longo prazo criam-se em torno dos centros de gravidade. A previsibilidade assenta justamente na estabilidade, numa projecção histórica das aptidões pluridimensionais dos territórios.

2.3   Para que a inovação tenha êxito, é indispensável apoiar novas formas de democracia. É preciso desenvolver as formas habituais de «concertação social» e, com a ajuda de instrumentos da democracia participativa, libertar as competências e encorajar a apetência e a vontade da sociedade civil de participar, em conformidade com os princípios fundamentais dos tratados da UE.

2.4   A inovação consiste, de resto, em pôr em prática novas ideias e sugestões, antecipando a concorrência e superar os processos previsíveis graças ao conhecimento. A sua complexidade permite-lhe combinar, em toda a sua diversidade, as competências humanas, as capacidades técnicas e as relações económicas. É natural que os centros urbanos, como pólos, ofereçam as condições que constituem o espaço vital sem o qual tudo é pura abstracção.

2.5   É por esta razão que os sistemas e políticas de apoio financeiro devem incluir, com base em análises territoriais, um apoio paralelo e concertado que se destina à inovação e à recuperação do atraso.

2.6   Embora seja certo que a Estratégia Europa 2020 é um programa político global de crescimento, competitividade, sustentabilidade e estrutura, acontece que, numa perspectiva mais alargada, vista à escala mundial, é, simultaneamente, um programa para ajudar a Europa a ser competitiva num mercado global.

2.7   Os objectivos da Estratégia Europa 2020 e os da política de coesão são coerentes com o que precede. No entanto, no atinente à Europa 2020, o quadro institucional da sua implementação carece de elementos financeiros e jurídicos comuns e novos que, interagindo, poderiam contribuir para aumentar a eficácia. O argumento de que uma revisão e integração dos instrumentos da coesão acelerariam a criação de uma Europa orientada para a inovação, de uma Europa «inteligente» está correcto, mas, apenas se os instrumentos forem alargados, apoiando-se nas sinergias criadas pela integração das várias fontes de financiamento.

3.   Debate

3.1   A renovação política e económica da Europa foi acelerada pela crise do final da última década.

3.1.1   Em parte devido à crise mundial, a União Europeia necessita de proceder a uma integração económica reforçada. Trata-se, segundo o Comité, de um processo positivo mas difícil, pois a colaboração dos 27 Estados-Membros não se faz sem dificuldades. Apesar dos problemas que lhe estão associados, esta integração económica (e necessariamente política) reforçada tem como directriz a criação de uma «política económica da UE», assente em três pilares:  (1)

a)

Estabilidade

Através do Pacto de Estabilidade e de Crescimento, a UE estende o controlo comum dos sectores que constituem um risco para a estabilidade e cria mecanismos de gestão das crises, isto é o Fundo Europeu de Estabilidade Financeira e o Mecanismos Europeu de Estabilidade (FEEF e MEE).

b)

Crescimento e competitividade A

UE adoptou, para o efeito, a Estratégia Europa 2020 e o Pacto Euro+.

c)

Coesão

A União Europeia instaurou a política de coesão e a política agrícola comum para reduzir as disparidades sociais, económicas e territoriais.

3.2   Os documentos e as estratégias de base adoptados ao longo da década contêm uma fórmula para renovação, ao estabelecerem condições e instrumentos que os dirigentes políticos da UE e dos Estados-Membros têm o dever de utilizar. Os vários instrumentos estão disponíveis para, ao serem utilizados conjuntamente, levem à estabilidade, ao crescimento e à competitividade e ponham em prática a coesão.

3.3   A coordenação da Estratégia Europa 2020 e da política de coesão já encerra em si uma dicotomia. Deixa antever um perigo inerente, isto é a oposição entre a liberdade da economia de mercado e o nivelamento social e territorial. O perigo é ainda maior agora dado que, quando os recursos são poucos, um faz-se em detrimento do outro. Para reforçar a coesão haveria que melhorar as condições propícias ao crescimento e à competitividade. No actual contexto da globalização, os Estados-Membros e as regiões menos desenvolvidos não podem perder mais tempo.

3.4   As finanças públicas, por seu turno, foram duramente atingidas pela crise em numerosos Estados-Membros, e será difícil consolidá-las num momento em que os custos do envelhecimento demográfico já se fazem sentir. Em suma, a maior parte dos países da UE tem pela frente tempos difíceis.

3.5   A Estratégia Europa 2020 não distingue – e é bom que assim seja - as reformas estruturais susceptíveis de ser aplicadas a longo prazo, por um lado, e as medidas a tomar a com vista a uma renovação a curto prazo, por outro.

3.6   O êxito da Estratégia Europa 2020 não pode ficar dependente de factores conjunturais. São precisamente os recursos investidos em lentas transformações estruturais que «comandam» os sectores que, pela sua inovação e competitividade, são susceptíveis de renovar o próprio sistema.

3.7   Os elementos do potencial de crescimento e os objectivos da Estratégia Europa 2020 podem ter correspondência em vários aspectos (o que é positivo), mas há também algumas divergências involuntárias.

3.7.1   Entre os objectivos da Estratégia Europa 2020 (do ponto de vista do potencial de crescimento), o aumento das taxas de emprego e a melhoria do nível de qualificações correspondem aos aspectos quantitativos e qualitativos da mão-de-obra. Os objectivos relativos às despesas com a investigação e o desenvolvimento, assim como o relativo ao clima e à energia prendem-se com a qualidade dos capitais investidos e com a sustentabilidade ambiental. Paralelamente, a estratégia não especifica alguns dos factores que determinam a quantidade e a qualidade dos capitais necessários nem os factores determinantes da qualidade (investimentos e seu nível técnico), nem a produtividade total dos factores. A estratégia atribui especial importância às despesas com a investigação e o desenvolvimento, mas não aborda com profundidade suficiente a inovação, e em especial a inovação social, que não é o mesmo do que investigação e desenvolvimento.

3.7.2   Com base nestes elementos, verificamos que a Estratégia Europa 2020 reflecte uma abordagem económica que corresponde às características e necessidades das economias desenvolvidas de crescimento lento, dotadas de consideráveis capacidades em matéria de investigação e desenvolvimento e nas quais a taxa de investimento é relativamente baixa, visto que há muito a mesma se revelou suficiente para concretizar as reformas estruturais necessárias. Nos países desenvolvidos, não há dúvida de que a investigação, o desenvolvimento e a inovação desempenham um papel muito importante no crescimento económico. Embora não se oponha necessariamente à competitividade, a coesão, vista desta forma, relega-a para segundo plano.

3.7.3   No entanto, para que os novos Estados-Membros da UE com um nível de desenvolvimento económico baixo recuperem o atraso, são necessários investimentos, nomeadamente em infra-estruturas. Nesses países, a principal fonte de crescimento económico é o investimento, cabendo à investigação e desenvolvimento um papel menor. O documento da Comissão (2) menciona, é certo, a coesão, mas o projecto não dá a ênfase necessária à recuperação do atraso dos Estados-Membros menos desenvolvidos.

3.8   É impossível analisar a Estratégia Europa 2020 sem conhecer os recursos financeiros que vão ser atribuídos. Por um lado, existe uma «zona cinzenta» entre 2010 e 2013, período durante o qual estarão em vigor as actuais perspectivas financeiras, mas nem sempre permitirão cumprir os objectivos da Estratégia Europa 2020 (por exemplo, em matéria de estratégia digital). Por outro lado, os objectivos aprovados no âmbito da Estratégia Europa 2020 determinam, em grande parte, as despesas do próximo orçamento da União Europeia. Com base nestas observações, é de recomendar que se estabeleça uma relação entre os objectivos da Estratégia Europa 2020 e as prioridades do quadro financeiro.

3.9   Várias análises demonstram que a energia investida na recuperação é largamente compensada, para além de outras inúmeras vantagens, ou seja:

em primeiro lugar, pode demonstrar-se que os investimentos a cargo do orçamento da União conduzem a um crescimento superior à média dos resultados financeiros e dos resultados económicos da União, graças a transferências tecnológicas avançadas, a uma percentagem importante das importações nos investimentos, a uma mão-de-obra qualificada, a infra-estruturas mais baratas e a investimentos que beneficiam de ajuda financeira e se apoiam em infra-estruturas modernas;

em segundo lugar, o alargamento do mercado interno, a generalização das actividades de serviços e o crescimento da base de conhecimentos contribuem significativamente, por si só, para as actividades de inovação;

em terceiro lugar, para o sector das PME, as ajudas financeiras que podem ser obtidas através dos Fundos Estruturais traduzem-se num um mercado, em acesso aos mercados, e em ajuda ao desenvolvimento;

por último, podem ter um impacto considerável relativamente à integração e recuperação de que poderão beneficiar os grupos sociais mais desfavorecidos, excluídos de diversas maneiras do mercado do emprego.

3.10   O CESE lamenta que a Comissão, em vez de apresentar um cenário de crescimento maximizando o potencial do mercado único, se tenha concentrado numa consolidação orçamental drástica enquanto requisito para o crescimento. Convém dar mais atenção aos motores de crescimento que permitirão aos Estados-Membros consolidarem os seus orçamentos e voltarem a trilhar a via do crescimento sustentável. Para tal, o Comité entende que uma política macroeconómica que combine aspectos da oferta e da procura deve fazer parte integrante de qualquer estratégia económica europeia virada para o futuro.

3.11   Seria bom que os programas fossem determinados por clusters financeiros criados com base na previsibilidade da eficácia e numa análise de riscos. Este é certamente um passo necessário, já que a globalização vai muito para além dos condicionalismos territoriais e que a projecção mundial das «alavancas» de inovação que se estão a desenvolver em determinadas regiões vão continuar a reforçar-se.

3.11.1   É necessário que as regiões possam dispor livremente dos seus recursos financeiros e, ao afectar tais recursos, decidir, por si próprios que prioridades conferir aos diferentes factores de desenvolvimento; além disso, em função do seu envolvimento em processos inovadores e do valor acrescentado, devem poder decidir que apoio financeiro conceder ou suprimir.

Bruxelas, 16 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Ver Tratado de Lisboa, artigo 3.o, n.o 3, e artigo 174.o.

(2)  COM(2010) 2020 final.


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/8


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre as «Estratégias de consolidação inteligente da política orçamental — O desafio da identificação de motores de crescimento na Europa. Como explorar ao máximo o potencial de emprego das nossas economias à luz da necessidade premente de ajustamento orçamental» (parecer exploratório solicitado pela Presidência húngara)

2011/C 248/02

Relator: Gérard DANTIN

Em 15 de Novembro de 2010, o representante permanente da República da Hungria junto da União Europeia, Peter GYÖRKÖS, solicitou ao Comité Económico e Social Europeu, em nome da futura Presidência húngara, um parecer exploratório sobre as:

Estratégias de consolidação inteligente da política orçamental — O desafio da identificação de motores de crescimento na Europa. Como explorar ao máximo o potencial de emprego das nossas economias à luz da necessidade premente de ajustamento orçamental.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social que emitiu parecer em 31 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 164 votos a favor, 2 votos contra e 9 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1   A crise económica e financeira, que teve início em 2007 e se acentuou em 2008, teve graves repercussões para as finanças públicas dos países europeus, agravando, em especial, a sua situação orçamental.

1.2   Actualmente, a necessidade de aliviar os orçamentos públicos dos custos resultantes de diversos planos de retoma económica, da ajuda aos bancos – como foi o caso em alguns Estados-Membros – e de um fraco crescimento, que não havia sido suficientemente tido em conta nas políticas económicas anteriores à crise, leva a que numerosos Estados-Membros reduzam a despesa pública. Deste modo, corre-se o risco de os Estados recuarem na redistribuição da riqueza através dos sistemas de solidariedade colectiva, quer se trate da protecção social ou dos serviços públicos.

1.3   O rápido retorno ao equilíbrio, além dos custos sociais elevados que tal implica, corre o risco de levar a um crescimento fraco por um longo período de tempo, sobretudo por causa da falta de procura, que por sua vez acentuará os défices orçamentais. Tais medidas levarão, por conseguinte, à contracção da procura, produzindo «um efeito de bola de neve», que poderá empurrar a economia europeia «para uma espiral sem fim».

1.3.1   Uma política orçamental «inteligente» deve quebrar esta espiral.

1.4   Uma consolidação orçamental «inteligente» consiste num equilíbrio «inteligente» entre as despesas e as receitas e entre a oferta e a procura. O crescimento sustentável deve ser o principal objectivo da política económica e de todas as outras políticas.

1.4.1   O crescimento sustentável deve, por conseguinte, ser um dos objectivos prioritários da UE.

1.5   Para tal, impõe-se nomeadamente:

1.5.1

Criar regulamentação mais ambiciosa e completa dos mercados financeiros, a fim de travar a especulação, cuja persistência a longo prazo acabaria por aniquilar todos os esforços destinados a uma «consolidação inteligente do orçamento».

1.5.2

Conduzir uma política orçamental ao serviço do crescimento,

que constitua um empréstimo europeu com vista ao financiamento de projectos de infra-estruturas através da mobilização da poupança,

que crie euro-obrigações, possibilitando a redução, sobretudo, do custo de refinanciamento dos Estados da zona euro em dificuldade,

que preveja o máximo de elasticidade para o período destinado à consolidação, dado que um «big-bang» comprometeria as perspectivas de crescimento.

1.5.3

Colocar a política fiscal ao serviço do crescimento,

de modo a reforçar a coordenação entre as políticas fiscais dos Estados-Membros, em conformidade com os tratados europeus,

melhorando a cooperação contra a fraude fiscal através da utilização optimizada da Eurofisc,

transferindo a pressão fiscal graças a novas fontes de receitas, como os impostos sobre as transacções financeiras, a tributação da energia, das instituições financeiras e das emissões de CO2 – criando uma nova organização do comércio dos direitos de emissão.

1.5.4

Criar impostos destinados a internalizar as externalizações geradas pelo comportamento do sector financeiro, desde que contribuam para o estabelecimento de condições mais justas no processo de desenvolvimento e de harmonização do mercado interno europeu.

1.5.4.1

A Comissão Europeia prevê, e o Comité aprova, a realização de um estudo de impacto com o intuito de definir a potencial estrutura e as modalidades de aplicação desta tributação. De qualquer modo, não deverá ser tomada nenhuma decisão sobre esta tributação sem que sejam conhecidos os resultados deste estudo.

1.5.5

Inventar o crescimento do futuro,

aplicando a Estratégia Europa 2020 que visa, em particular, o desenvolvimento do crescimento sustentável e inclusivo, assente numa coordenação reforçada das políticas económicas, combatendo os principais pontos de estrangulamento do crescimento, incluindo os referentes ao funcionamento do mercado interno,

definindo e aplicando uma política industrial ambiciosa e eficiente, que vise prioritariamente os sectores de elevado valor acrescentado, da alta tecnologia e com um forte potencial de crescimento, tanto no domínio da indústria como no dos serviços,

criando um verdadeiro Small Business Act europeu,

promovendo a tríade do crescimento que inclui a formação, a investigação e a inovação». Para tal, há que

continuar e intensificar os investimentos na educação e na I&D, não obstante as restrições orçamentais, sob pena de se avançar para o empobrecimento da UE,

velar pela adequação das formações e das qualificações ministradas às necessidades do mercado de emprego;

adaptar a legislação fiscal de forma a incitar a indústria a investir mais em investigação, desenvolvimento e inovação,

facilitar o trabalho e a cooperação dos investigadores e inovadores em toda a UE, assegurando a concretização do «Espaço Europeu de Investigação»,

reduzir ou mesmo eliminar uma série de obstáculos: o acesso das PME ao financiamento, os preços dos direitos de propriedade intelectual, a realização com a maior urgência de um acordo sobre a aplicação da patente europeia a partir de uma cooperação reforçada,

dar mais alcance, mais recursos e mais missões «aos pólos de competitividade». Neste sentido, a criação de uma rede europeia é provavelmente a melhor forma de melhorar a relação entre a investigação e a inovação.

1.6   Ao aplicar estas políticas, quando estas dependem unicamente da decisão de cada país, importa ter em conta as amplas disparidades do desempenho económico dos 27 Estados-Membros. As taxas de crescimento do PIB, os níveis de desemprego e a sua evolução, os níveis de endividamento nacional e os montantes investidos em I&D variam muito, ainda que seja possível vislumbrar padrões comuns.

2.   Introdução

2.1   A Presidência húngara solicitou ao Comité Económico e Social Europeu a elaboração de um parecer exploratório sobre as Estratégias de consolidação inteligente da política orçamental – O desafio da identificação de motores de crescimento na Europa. Como explorar ao máximo o potencial de emprego das nossas economias à luz da necessidade premente de ajustamento orçamental.

2.2   O Comité acolhe favoravelmente esta consulta.

2.3   Com efeito, a problemática proposta ao CESE para reflexão faz parte das suas preocupações e do trabalho que vem realizando desde o início da crise financeira.

2.4   O presente parecer permitirá actualizar as reflexões anteriores do Comité, que servirão de base à elaboração do presente trabalho, cujo objectivo consistirá em desenvolver tais reflexões no intuito de responder ao tema da consulta (1).

2.5   Para tal, após uma breve análise dos motivos da crise, examinar-se-á o seu impacto e os riscos económicos e sociais de uma consolidação orçamental «não inteligente», para – por último – formular propostas favoráveis ao desenvolvimento de um crescimento sustentável, único factor capaz de relançar a economia europeia.

3.   A crise e suas repercussões

3.1   A crise económica e financeira, que teve início em 2007 e se acentuou em 2008, teve graves repercussões para as finanças públicas dos países europeus. Por um lado, muitos governos tomaram medidas destinadas a salvar o sistema financeiro. Por outro lado, tomaram medidas orçamentais importantes para limitar tanto quanto possível a gravidade da recessão, através de planos de relançamento, os quais tinham por objectivo completar a acção dos estabilizadores automáticos para evitar o colapso da actividade económica, mas também agravaram a situação do orçamento em numerosos países.

3.2   Embora, durante a crise financeira, a despesa pública maciça tenha permitido manter a liquidez dos mercados, actualmente a necessidade de aliviar os orçamentos dos custos resultantes da ajuda aos bancos – como foi o caso em alguns Estados-Membros – e das medidas discricionárias leva a que o aumento do desemprego e as medidas de austeridade suplementares adoptadas em vários países representem, no seu conjunto, uma ameaça para o crescimento económico.

3.3   Esta situação levou a que o défice público na União Europeia aumentasse consideravelmente. De acordo com as estimativas do Eurostat, teria passado de 2,3 % do PIB em 2008 para 7,5 % em 2010 na UE e de 2 % a 6,3 % na zona euro. Simultaneamente, o rácio da dívida pública teria passado de 61,6 % do PIB em 2008 para 80 % na UE e de 69,4 % para 78,7 % na zona euro. O crescimento expectável em 2010 é de 0,7 % em 2010, a taxa de desemprego na UE passará provavelmente de 7,1 % em 2007 para 9,1 % em 2009, com uma previsão de 10,3 % no final de 2010, ou seja, quase 25 milhões de pessoas, das quais cerca de 8 milhões perderão o emprego devido à crise.

3.4   Além disso, as acções levadas a cabo em determinados Estados-Membros, que consistem essencialmente na redução da despesa pública para equilibrar rapidamente o orçamento e reduzir a dívida, correm o risco de estas levarem os Estados a recuarem na redistribuição da riqueza através dos sistemas de solidariedade colectiva. Há, portanto, que manifestar uma enorme preocupação no que diz respeito ao desmantelamento dos sistemas de protecção social e dos serviços públicos, quando precisamente o seu papel de estabilizadores automáticos e de amortecedores eficazes da crise foi unanimemente enaltecido.

3.4.1   Para o Comité, é essencial salvaguardar o capital social europeu e o capital natural, que são factores incontornáveis de crescimento.

3.4.2   Seria devastador para a credibilidade da UE (e dos Estados-Membros) oferecer aos seus cidadãos o espectáculo de uma Europa que demonstrou a sua determinação para tomar medidas importantes em prol do sector financeiro e bancário – como foi o caso em alguns Estados-Membros –, responsável pela crise actual, e que, por outro lado, quando se trata de lutar contra o abrandamento do crescimento, o forte aumento do desemprego e os processos de precariedade, assim como de garantir a solidariedade através dos sistemas de protecção social e dos serviços públicos, tenha uma acção inoperante que penaliza os cidadãos europeus, quando estes são totalmente alheios às causas da crise económica e financeira. Esta situação acentuaria inevitavelmente o fosso já existente entre os cidadãos e a UE.

3.5   O rápido retorno ao equilíbrio do orçamento consiste, antes de mais, na redução da despesa pública. Além do custo social que tal implica, pode levar a um crescimento fraco – sobretudo por causa da falta de procura – durante um longo período, acompanhado de um desemprego persistente e mesmo crescente, provocando, por conseguinte, uma erosão da competitividade mundial da Europa.

3.5.1   O rigor orçamental pode levar à contracção da procura e, por arrastamento, à recessão e a novos défices susceptíveis de empurrar a economia europeia «para uma espiral sem fim»…

3.5.2   Tal contracção da procura será tanto mais forte quanto maior o agravamento das desigualdades (por exemplo, em França entre 1998 e 2005, o salário médio de 0,01 % das pessoas mais bem pagas aumentou 51 %) e menor o poder de compra das famílias devido à situação económica, mas também à diminuição significativa da parte correspondente dos salários na distribuição do valor acrescentado. De facto, o FMI estimou que, em 2007, a participação dos salários no PIB havia passado, na Europa, de 73 % em 1980 para 64 % em 2005.

4.   Para uma consolidação orçamental inteligente

4.1   A questão não é tanto a de saber se é oportuno reequilibrar os orçamentos, mas sobretudo determinar «como», «quem paga» e «a que ritmo», para que o crescimento aumente com vigor.

4.1.1   Uma consolidação orçamental «inteligente» consiste num equilíbrio «inteligente» entre despesas e receitas e entre oferta e procura. Para conseguir uma saída airosa da crise, há que, incontornavelmente, encontrar a via do crescimento no âmbito de uma política expansionista, criando um contexto favorável ao consumo e ao investimento.

4.1.2   A consolidação orçamental resulta, em parte, também das exigências da política monetária, que deve ser conduzida de forma a atingir os seus próprios objectivos de estabilidade dos preços e de confiança dos mercados, continuando a criar as condições necessárias para o crescimento económico.

4.2   Uma política orçamental ao serviço do crescimento

4.2.1   A Europa já enfrentava um crescimento insuficiente antes da actual crise. O objectivo visado de crescimento anual de 3 % que, naturalmente, constitui a base da Estratégia de Lisboa foi atingido em apenas duas ocasiões. De forma geral, esta falta de crescimento não foi suficientemente tida em conta nas políticas económicas e orçamentais definidas pelos governos. Foi superada recorrendo ao empréstimo público e privado, tendo assumido o sector financeiro uma grande responsabilidade nesta operação, como, por exemplo, nos empréstimos imobiliários. O crescimento sustentável deve, pois, constituir o principal objectivo da política económica e de todas as outras políticas. Neste contexto, uma consolidação orçamental que preveja uma atribuição eficaz dos recursos financeiros poderá ser a via para o reequilíbrio dos orçamentos públicos a médio prazo sem colocar entraves ao objectivo de um crescimento elevado.

4.2.2   A crise financeira e a insuficiente capacidade da economia da UE para reagir ao choque mostram a necessidade de haver uma reorientação da política económica. Na opinião do CESE, uma articulação macroeconómica mais ajustada e susceptível de manter o equilíbrio entre uma política económica orientada para a procura e a oferta deve fazer parte integrante da estratégia europeia. Por conseguinte, num mundo dominado pela finança, que favorece os investimentos a curto prazo e, portanto, sujeito ao risco de abrandamento do progresso tecnológico, há que voltar costas ao crescimento baseado em grande parte nas «bolhas especulativas» e virar-se de novo para o crescimento baseado no consumo e no investimento, em particular nos sectores inovadores da economia real (2), privilegiando modos de produção com baixo teor de carbono e menos devoradores dos recursos naturais.

4.2.3   Poderia ser instituído um empréstimo europeu destinado a financiar projectos europeus de infra-estruturas. Seria um instrumento essencial que permitiria captar uma poupança actualmente disponível, e que não é utilizada, para apoiar a economia europeia. Este esforço deve se acompanhado de uma abordagem coordenada da política industrial (3) a favor da competitividade, de acordo com as orientações da Estratégia Europa 2020 (4). Nesta perspectiva, o Comité congratula-se com a declaração feita no Parlamento pelo presidente da Comissão, em 14 de Dezembro de 2010, em que afirmou que «insistiria» na apresentação de planos destinados a introduzir empréstimos obrigatórios. No entanto, a criação de empréstimos obrigatórios não deveria ser uma alternativa ou substituir a criação de euro-obrigações.

4.2.4   O Comité é a favor da criação de euro-obrigações, porque, além de elas permitirem o financiamento de grandes projectos de infra-estruturas com o objectivo de modernizar a Europa, criando emprego e relançando o crescimento, como o poderiam fazer os empréstimos obrigatórios, reduziriam os custos do refinanciamento dos países da zona euro em dificuldades, dando uma dimensão europeia ao mercado dos empréstimos do Estado. A criação de euro-obrigações seria a afirmação, face ao mercado e após a criação do Fundo Europeu de Estabilidade Financeira, da solidariedade interna da União Europeia e, ao mesmo tempo, a prova do seu empenho político a favor da união económica e monetária e da irreversibilidade do euro.

4.2.4.1   Note-se que esta prática, habitual nos EUA através do Ministério do Tesouro e que foi aprovada em 2009 pelo Parlamento Europeu e pelo FMI, permitiria mediante a redução do serviço da dívida dar, aos países da zona euro em dificuldades, margem de manobra para estimular o crescimento.

4.2.5   Os Estados-Membros que têm uma balança de transacções correntes excedentária e/ou uma dívida pública pouco elevada deviam proceder a uma política expansionista para estimular a procura. De modo geral, tal não se faz, sobretudo, por receio de penalização pelas agências de notação. «O papel destas agências é fundamental […] e não pode, por isso, ser deixado sem supervisão» (5). «O CESE está, por outro lado, preocupado com […] as dívidas soberanas, em particular, por não se ter conseguido criar um organismo europeu para avaliar as dívidas desta natureza» (6).

4.3   Crescimento e fiscalidade

4.3.1   A fiscalidade, desde que contribua para o bom funcionamento do mercado interno, a competitividade e a redução da carga suportada pelas finanças públicas, etc., é um factor que favorece o crescimento. O Comité lamenta que em matéria de consolidação orçamental a Comissão tenha quase só em conta a despesa, negligenciando a receita. Com efeito, tal faz-se muitas vezes em detrimento das pessoas socialmente desfavorecidas, refreando o crescimento e asfixiando a procura.

4.3.2   De acordo com os tratados da UE, importa reforçar na UE a coordenação das políticas fiscais dos Estados Membros, por exemplo, harmonizando a matéria colectável e definindo taxas mínimas, especialmente nos sectores em que a base tributável é a mais móvel a nível internacional e o risco de evasão fiscal e de concorrência fiscal entre Estados-Membros é maior. Tal coordenação a nível europeu deve ter por objectivo, em especial, proteger e incrementar as receitas fiscais (7).

4.3.3   Melhorar a cooperação administrativa é igualmente essencial para lutar eficazmente contra a fraude fiscal. Um primeiro passo neste sentido é a criação da Eurofisc como rede descentralizada aberta a todos os Estados-Membros, que tem em vista uma acção rápida e certeira para lutar contra a fraude no domínio do imposto sobre o valor acrescentado (8). No seu parecer sobre este tema, o CESE sublinhou a necessidade de estabelecer contactos e cooperar com os outros organismos empenhados na luta contra a criminalidade organizada e o branqueamento de capitais (9).

4.3.4   Há que transferir a pressão fiscal para novas fontes de receitas, como os impostos sobre as transacções financeiras, a tributação da energia, das instituições financeiras e das emissões de CO2  (10) – criando uma nova organização do comércio dos direitos de emissão –, etc. Este tipo de impostos poderia produzir um «duplo dividendo»: a curto e médio prazo, aliviar os orçamentos públicos e, a longo prazo, contribuir para a reorientação dos recursos para os investimentos sustentáveis na economia real, em geral, e nas tecnologias e nos sectores ecológicos, em particular (11). Também poderia ser útil para dotar de recursos próprios o orçamento da UE. (12)

4.4   Tributação do sector financeiro

4.4.1   A tributação do sector financeiro pode, efectivamente, dotar os mercados financeiros de uma maior estabilidade e eficácia, ao reduzir a sua volatilidade e os efeitos nefastos de uma assunção de riscos excessivos (13). Parece, pois, razoável que se criem impostos destinados a internalizar as externalizações geradas pelo comportamento deste sector, desde que contribuam para o estabelecimento de condições mais justas no processo de desenvolvimento e de harmonização do mercado interno europeu.

4.4.2   Impostos sobre as transacções financeiras

4.4.2.1   O CESE aprovou o princípio de um imposto sobre as transacções financeiras no seu parecer sobre o Relatório do Grupo De Larosière (14): «O CESE reputa fundamental passar-se de uma visão a curto prazo para uma visão a longo prazo, na qual os bónus deixem de ser calculados com base em actividades especulativas. Posto isto, o CESE apoia a ideia de tributar as transacções financeiras». «O objectivo deste imposto é a obtenção de receitas públicas. Esta nova fonte de receitas poderá ser utilizada no apoio ao desenvolvimento económico dos países em desenvolvimento, no financiamento das políticas climáticas destes mesmos países ou na redução dos encargos para as finanças públicas. Esta melhoria das finanças públicas implica que o sector financeiro reembolse as ajudas públicas recebidas. A longo prazo, as receitas deverão constituir uma fonte genérica nova de receitas públicas» (15). Além disso, um imposto sobre as transacções financeiras tem igualmente efeitos de alavanca bem-vindos, dado que obrigam a mudanças de comportamento dos actores do mercado.

4.4.2.2   Note-se que, neste contexto, o presidente da Comissão Europeia, numa declaração de 8 de Setembro de 2010, defendeu o princípio de um imposto sobre as actividades financeiras.

4.4.2.3   Na esteira de posições anteriores, o Comité considera que a UE e os Estados-Membros necessitam actualmente de um imposto sobre as transacções financeiras para reunir receitas destinadas a corrigir os desequilíbrios orçamentais, financiar medidas de relançamento para estimular o crescimento e lutar contra as actividades puramente especulativas.

4.4.3   Impostos sobre as actividades financeiras

4.4.3.1   O imposto sobre as actividades financeiras (16), na sua forma mais lata (método por adição), diz respeito à totalidade dos benefícios e das remunerações da actividade empresarial dos estabelecimentos financeiros, independentemente dos produtos que comercializam.

4.4.3.2   Poderia ser considerado como um imposto sobre o valor acrescentado gerado pelas sociedades do sector financeiro para contrabalançar o contributo fiscal mais fraco deste sector devido à isenção de IVA para grande parte das suas operações.

4.4.3.3   A receita gerada a nível europeu poderia ser consagrada ao saneamento do orçamento dos Estados-Membros.

4.4.4   A Comissão Europeia prevê, e o Comité aprova, a realização de um estudo de impacto com o intuito de definir a potencial estrutura e as modalidades de aplicação desta tributação e de avaliar o leque de novas reformas do sector financeiro relacionadas com o sistema de garantia de depósitos, as novas exigências em matéria de fundos próprios e de liquidez, etc. Neste contexto, há que encontrar um equilíbrio justo entre, por um lado, o objectivo de lutar contra os desequilíbrios orçamentais e, por outro, o de preservar a capacidade do sector bancário para conceder empréstimos e contribuir para o crescimento económico e a criação de emprego. De qualquer modo, não deverá ser tomada nenhuma decisão sobre esta tributação sem que sejam conhecidos os resultados deste estudo.

5.   Inventar o crescimento do futuro

5.1   A Europa está confrontada com grandes ameaças, como seja:

um mundo dominado pela finança que escapa à democracia política, parcialmente desligado da economia real, que privilegia os investimentos a curto prazo que geram o risco de abrandamento do progresso técnico. O abandono dos investimentos reais a favor de investimentos financeiros trava também a criação de emprego e o aumento das receitas, da procura e dos orçamentos públicos;

a desagregação dos modelos sociais existentes, combinada com os riscos de um frente a frente entre os Estados Unidos e os grandes países emergentes, de que a Europa ficaria excluída, e que teria implicações no mercado de trabalho. Para enfrentar os desafios actuais é necessário identificar os eixos políticos capazes de perspectivar o crescimento do futuro.

5.2   Para alcançar um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo, a União dotou-se da Estratégia Europa 2020. A nova estratégia, assente numa coordenação reforçada das políticas económicas, visa combater os principais pontos de estrangulamento do crescimento na UE, incluindo os referentes ao funcionamento do mercado interno e às infra-estruturas, bem como a necessidade de uma política energética comum e de uma política industrial nova e ambiciosa. O Conselho Europeu frisou que todas as políticas comuns, incluindo a política agrícola comum e a política de coesão, terão de apoiar a estratégia e que esta incluirá uma forte dimensão externa (17).

5.3   O CESE criou um comité de pilotagem que trabalha em estreita colaboração com as suas secções especializadas, com a CCMI, os CES nacionais e com os observatórios sobre a aplicação da estratégia, e mais em particular sobre as sete Iniciativas Emblemáticas destinadas a estimular os progressos em matéria de crescimento e emprego. Neste contexto, o Comité emitirá pareceres sobre as Iniciativas Emblemáticas para alcançar os cinco objectivos da estratégia. Deve ser levada a cabo uma reflexão profunda sobre os sectores, os actores e as acções prioritárias para determinar a forma de aplicar esta nova estratégia.

5.4   Os sectores prioritários. Em termos sectoriais, sem pretensão de sermos exaustivos, é oportuno enumerar alguns motores deste crescimento, em parte já existentes actualmente, mas sobretudo em gestação, dado que têm um elevado valor acrescentado, um forte potencial de crescimento e são de alta tecnologia, referindo-se o seu conteúdo tanto à indústria como aos serviços:

Energia com baixo teor de carbono, transportes e edifícios ecológicos, etc., que induzem a «empregos ecológicos» (18);

«A economia grisalha»: engenharia biotecnológica ao serviço da saúde, ciências da vida (19), etc.;

Biotecnologia (20);

Sociedade digital, nanotecnologias (21), robótica, etc.;

Agronomia e hidráulica para satisfazer a limitação das terras de cultivo, repensar também os processos de fabricação para que sejam mais parcos em matérias-primas, o tratamento das terras raras, etc.;

Investigação em todos os sectores industriais sobre processos e métodos com baixo teor de carbono com vista a uma nova concepção da política industrial;

etc.

5.4.1   A educação deve igualmente ser um sector prioritário de apoio a todos os outros sectores. Ela é um dos elementos indispensáveis ao crescimento, favorecendo a formação de um capital humano imprescindível ao seu desenvolvimento. Deste ponto de vista, convém velar pela adequação entre as qualificações e as necessidades do mercado de trabalho.

5.5   Acções prioritárias ao serviço do crescimento

5.5.1   O reforço do mercado único europeu deve ser uma prioridade da UE, no âmbito da Estratégia Europa 2020. O CESE é de opinião que só assim será possível alcançar metas significativas em matéria de crescimento económico forte, apoiado e mais justo no desenvolvimento dos Estados-Membros.

5.5.2   Aplicação de uma política industrial eficiente

5.5.2.1   O sentido da expressão «política industrial» mudou muito ao longo dos anos. É importante identificar os três princípios que permitem defini-la com rigor e numa perspectiva adaptada à época.

Primeiro, há que precisar os sectores a privilegiar (22). De seguida, os modos de acção deverão ser obviamente muito diversificados. Nalguns casos, como por exemplo o da energia, tratar-se-á de grandes projectos europeus. Noutros casos, de financiamento de capital. Ou ainda, no caso de novas empresas e empresas em desenvolvimento, de ajudar à emergência de novas tecnologias. Em todo o caso, esta política industrial devia ser concebida tendo por objectivo quer o mercado interno europeu quer as exportações.

Por fim, o imperativo é encontrar os meios de financiar esta política industrial e o crescimento a longo prazo que esta possa induzir num período de reajustamento orçamental. Uma das alavancas consistiria em orientar massivamente a poupança europeia para investimentos produtivos a longo prazo (23), rentáveis económica e socialmente, isto é, ricos na criação de emprego. A dificuldade pode residir na existência de uma forte aversão ao risco. Esta poderia ser superada mediante acordos específicos de partilha de risco entre os investidores públicos e privados, em que o investidor público assume o risco principal a longo prazo como um ressegurador. Existe uma outra via: a criação de um grande empréstimo europeu (24).

5.5.2.2   Contudo, para desenvolver um sistema produtivo equilibrado e sólido, é obvio que há que recorrer a duas políticas principais: a política fiscal e a política de emprego. Relativamente à primeira, remete-se para o ponto 4.3.1 e, quanto à segunda, o principal obstáculo será a activação do potencial de participação no mercado de trabalho e, por isso, a integração massiva de jovens e dos mais velhos. Ao mesmo tempo, há também que disponibilizar uma ampla oferta de serviços de elevada qualidade para o acolhimento de crianças, a fim de apoiar os pais na sua actividade profissional (25).

5.5.3   Um Small Business Act europeu

5.5.3.1   Trata-se de uma proposta lançada em muitas ocasiões, nunca perfeitamente realizada e, no entanto, necessária. O Small Business Act americano, por exemplo, é um instrumento de grande eficácia, dado que permite financiar a inovação e o investimento tradicional e garantir uma parte dos contratos públicos às PME. O tema diz respeito às novas empresas e às empresas de crescimento rápido. O Small Business Act europeu, como o seu homólogo americano, deve aplicar um leque de instrumentos relativos aos contratos públicos e ao financiamento. Por conseguinte, o CESE propõe um Small Business Act para a Europa que seja ambicioso (26).

5.5.4   Uma política de educação, investigação, desenvolvimento e inovação

5.5.4.1   Remete-se neste ponto para os numerosos pareceres elaborados pelo Comité (27). O Comité sempre afirmou que a I&D e a inovação são actividades fundamentais que determinarão, no futuro, o lugar da Europa no mundo em função da prioridade e dos meios que esta conceda a tais disciplinas.

5.5.4.2   Nesta época de restrições orçamentais, a UE e os Estados-Membros devem continuar a investir na educação, na I&D e na inovação. Estes investimentos não só não devem ser abrangidos pelos cortes orçamentais, como devem ser aumentados (28). Não o fazer, levaria inevitavelmente ao empobrecimento da UE, sinónimo de perda de emprego e de degradação do nível de vida dos seus cidadãos.

5.5.4.3   A União Europeia deveria velar por uma melhor adaptação da legislação fiscal ao objectivo de criar medidas para incitar a indústria a investir mais na investigação e no desenvolvimento (29). Esta adaptação deveria, em particular, facilitar o apoio ao desenvolvimento das PME orientadas principalmente para a I&D nos primeiros anos da sua actividade. Dado o papel estratégico das PME na economia da União Europeia, o CESE recomenda que os Estados-Membros se socorram da melhor combinação possível de incentivos fiscais para facilitar a sobrevivência e o crescimento das PME no âmbito das suas economias (30). Simultaneamente, convém promover ou intensificar os projectos comuns entre organismos de investigação e as PME, sob a égide, por exemplo, de instituições públicas de investigação (nacionais ou europeias), tendo em vista apoiar a cooperação entre estes actores.

5.5.4.4   Para que a I&D seja eficiente, os investigadores e os inovadores devem poder trabalhar e cooperar em toda a UE com a mesma facilidade com que o fazem dentro das fronteiras nacionais. Para tal, o «Espaço Europeu de Investigação» (31), que deve estar concluído dentro de quatro anos, deverá criar as estruturas necessárias para uma autêntica e livre circulação do conhecimento, que é o efectivo valor acrescentado da União para os sectores nacionais da investigação.

5.5.4.5   Por outro lado, é necessário reduzir, ou mesmo eliminar, uma série de obstáculos: há que melhorar o acesso ao financiamento, especialmente para as PME, os preços dos direitos de propriedade intelectual devem ser acessíveis, os objectivos devem ser mais ambiciosos e os orçamentos importantes atribuídos aos contratos públicos devem ser utilizados de forma estratégica. No futuro próximo, seria oportuno conseguir com a maior urgência um acordo sobre a patente europeia. O estabelecimento de uma cooperação reforçada sobre este assunto poderia ser uma solução transitória a considerar.

5.5.4.6   De acordo com a Estratégia de Lisboa, a UE deveria dedicar 3 % do PIB à I&D, dois terços dos quais deveriam proceder do sector privado. Estamos muito longe disso. Porém, a consecução deste objectivo é importante, dado que permitiria criar até 2020 cerca de 3,7 milhões de postos de trabalho e aumentar o PIB anual em 800 000 milhões de euros até 2027 (32). Esta meta deve ser mais do que nunca a prioridade da União.

5.5.4.7   Por último, a criação de pólos de competitividade foi uma iniciativa muito positiva em vários países europeus. Para conseguir maior alcance, mais recursos e mais missões, a criação de uma rede europeia é provavelmente a melhor forma de melhorar a relação entre a investigação e a inovação, dado que a gestão associa de modo adequado todas as partes interessadas.

6.   A sociedade civil

6.1   Há que sublinhar que, pelas numerosas implicações na vida quotidiana dos cidadãos, resultantes dos ajustamentos orçamentais e da busca de vias de crescimento, o diálogo social e o diálogo civil devem ser exemplares, tanto a nível dos Estados-Membros como da União Europeia.

6.2   A sociedade civil, nomeadamente os CES nacionais e organismos similares, deve ser consultada e participar antes da tomada de decisões. Deve existir um elevado grau de parceria social, pois não haverá escolhas viáveis e com êxito a médio e longo prazo sobre um tema tão sensível sem a aceitação das reformas por parte dos cidadãos.

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Ver os pareceres do CESE sobre A crise financeira e o seu impacto na economia real, JO C 255 de 22.9.2010 p. 10, e sobre Relançamento da economia: situação e iniciativas práticas, JO C 48 de 15.2.2011, p. 57.

(2)  Ver parecer do CESE sobre A Estratégia de Lisboa após 2010, JO C 128 de 18.5.2010, p. 3.

(3)  Ver ponto 5.5.1.

(4)  Ver a carta do presidente do CESE ao presidente da Comissão de 31 de Março de 2010.

(5)  Ver ponto 1.1 do parecer do CESE sobre Agências de notação de crédito, JO C 117 de 17.11.2009, p. 117.

(6)  Ver ponto 1.4 do parecer do CESE sobre Agências de notação de risco, JO C 54 de 19.2.2011, p. 37.

(7)  Ver nota de pé de página n.o 2.

(8)  Regulamento 904/2010 do Conselho relativo à cooperação administrativa e à luta contra a fraude no domínio do imposto sobre o valor acrescentado (reformulação), JO L 268 de 12.10.2010, p. 1.

(9)  Ver ponto 1.10 do parecer do CESE sobre Proposta de regulamento do Conselho relativo à cooperação administrativa e à luta contra a fraude no domínio do imposto sobre o valor acrescentado (reformulação), JO C 347 de 18.12.2010, p. 74.

(10)  Ver nota de pé de página n.o 2.

(11)  Ver nota de pé de página n.o 4.

(12)  Reapreciação do orçamento da UE- COM(2010) 700 final de 19.10.2010.

(13)  Ver COM(2010) 549 final, Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões - A tributação do sector financeiro.

(14)  Ver parecer do CESE sobre o Relatório do Grupo De Larosière, JO C 318 de 23.12.2009, p. 57.

(15)  Ver parecer do CESE sobre Imposto sobre as Transacções Financeiras, JO C 44 de 11.2.2011, p.81. Síntese e conclusões, ponto 1.10.

(16)  Proposta do Fundo Monetário Internacional.

(17)  Ver Conclusões do Conselho Europeu de 25 e 26 de Março de 2010 e Conclusões do Conselho Europeu de 17 de Junho de 2010.

(18)  Ver parecer do CESE sobre Promover empregos ecológicos sustentáveis para o pacote da UE respeitante à energia e às alterações climáticas, JO C 44 de 11.2.2011, p. 110.

(19)  Ver parecer do CESE sobre Ciências da vida e biotecnologia — Uma estratégia para a Europa - Relatório de progresso e orientações para o futuro, JO C 234 de 30.9.2003, p. 13.

(20)  Ver parecer do CESE sobre Comunicação da Comissão «Uma visão estratégica das ciências da vida e da biotecnologia: Documento de consulta, JO C 94 de 18.4.2002, p. 23.

(21)  Ver parecer do CESE sobre Nanociências e Nanotecnologias: Plano de Acção para a Europa 2005-2009, JO C 185 de 8.8.2006, p. 1.

(22)  Ver ponto 5.4.

(23)  Ver ponto 4.2.3.

(24)  Ver nota de pé de página n.o 19.

(25)  Ver parecer do CESE sobre a Análise Anual do Crescimento: Uma resposta global da UE à crise, JO C 132, de 3.5.2011, p. 26, pt. 4.2.

(26)  Ver parecer do CESE sobre Think Small First um Small Business Act para a Europa, JO C 182 de 4.8.2009, p. 30.

(27)  Em particular, os pareceres relativos ao 7.o programa-quadro de I&D, nomeadamente, o parecer sobre Proposta de decisão do Parlamento Europeu e do Conselho que cria um Programa-quadro para a Competitividade e a Inovação (2007-2013), JO C 65 de 17.3.2006, p. 22.

(28)  Iniciativa emblemática no quadro da Estratégia Europa 2020 - União da Inovação - COM(2010) 546 final de 6.10.2010.

(29)  Ver parecer do CESE sobre Para uma utilização mais eficaz dos incentivos fiscais em favor da investigação e do desenvolvimento (I&D), JO C 10 de 15.1.2008, p. 83.

(30)  Ver ponto 3.5 do parecer do CESE sobre Libertar e reforçar o potencial da Europa para a investigação, o desenvolvimento e a inovação, JO C 325 de 30.12.2006, p. 16.

(31)  Ver os pareceres do CESE sobre Investigadores no Espaço Europeu da Investigação: Uma profissão, múltiplas carreiras, JO C 110 de 30.4.2004, p. 3, e sobre Livro Verde — O Espaço Europeu da Investigação: Novas perspectivas, JO C 44 de 16.2.2008, p. 1.

(32)  Ver P. Zagamé (2010), The Cost of a non-innovative Europe [Os Custos de uma Europa não-inovadora].


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/16


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Empoderamento e integração social dos Romes na Europa» (parecer exploratório)

2011/C 248/03

Relator: Ákos TOPOLÁNSZKY

Em carta datada de 15 de Novembro de 2010, o embaixador Péter Györkös solicitou ao Comité Económico e Social Europeu, em nome da Presidência húngara e em conformidade com o artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, que elaborasse um parecer exploratório sobre

Empoderamento e integração social dos Romes na Europa.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania que emitiu parecer em 27 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 16 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 138 votos a favor, 3 votos contra e sem abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

O COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU:

1.1   saúda e acolhe sem reservas todos os esforços até agora envidados pela União Europeia para reduzir a segregação dos Romes (1) e favorecer a sua integração social, mediante as resoluções e os actos regulamentares elaborados pelas suas instituições, a criação de estruturas de cooperação, bem como a afectação de recursos dos fundos estruturais e de outros instrumentos financeiros;

1.2   chama, por outro lado, a atenção para o facto de estes esforços, no seu conjunto, não terem permitido dar uma resposta decisiva à discriminação sofrida por muitos romes nem melhorar a sua qualidade e perspectivas de vida. Aliás, em alguns aspectos, a sua situação piorou mais ainda;

1.3   sublinha que esta situação difícil apenas poderá ser alterada através de uma estratégia integrada, coordenada e coerente à escala europeia, bem como de um programa de acção determinado e sistemático que abranja todos os domínios políticos e se aplique à escala nacional, a fim de dotar os indivíduos e as respectivas comunidades das competências e do poder de decisão necessários para forjarem o seu próprio destino (empoderamento). Deverá ser possível pôr em prática este programa de acção a nível local (subsidiariedade);

1.4   congratula-se, por isso, com as propostas avançadas na comunicação (2) da Comissão Europeia relativa a um quadro europeu para as estratégias nacionais de integração dos Romes até 2020 e dá grande importância à sua aplicação consistente a nível europeu e nacional. Pretende ser um parceiro empenhado neste processo;

1.5   entende, porém, que esta estratégia há muito aguardada não está à altura das expectativas que suscitou. Com efeito, poderia ser mais ambiciosa, específica e bem estruturada;

1.6   considera que os elementos a seguir indicados poderiam ser propostos aos Estados-Membros como os três pilares, a executar de forma coordenada, de uma política de integração dos Romes realista e exequível que reflectisse específica mas não exclusivamente a natureza dos problemas e as prioridades estratégicas para a sua abordagem:

a)

uma política de integração sem distinção de raça e etnia, focada na concentração dos problemas sociais e na redução da pobreza e da privação extremas;

b)

uma política em prol do empoderamento dos que se consideram membros de uma dada comunidade romani, e que permita celebrar a inclusão social alcançada;

c)

políticas gerais e publicidade contra o racismo;

1.7   destaca a necessidade de envolver representantes da sociedade civil, peritos e os parceiros sociais no processo de consulta, elaboração e execução das políticas, e realça a necessidade vital de envolver activamente representantes e membros das comunidades romani na planificação e na aplicação a todos os níveis (UE, nacional, regional e local), em sintonia com a intenção expressa na comunicação adoptada pela Comissão;

1.8   sublinha a necessidade de firmeza na representação do interesse geral e apela, por isso, a uma programação e aplicação sistemáticas, bem como a uma coordenação das políticas. Frisa igualmente a importância da elaboração das políticas a nível local e de abordagens diferenciadas e assentes em necessidades específicas, para além da apresentação de informações objectivas e de uma avaliação coerente numa base permanente e sistemática;

1.9   chama a atenção do Conselho para a necessidade de encontrar uma solução para restituir aos Romes que, por qualquer motivo, já não o têm, o atestado de nacionalidade, que é o garante de um acesso sem discriminação à cidadania europeia, bem como de manter esta injustiça no topo da agenda enquanto não estiver resolvida.

2.   Introdução

O COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU:

2.1   concorda com a avaliação da situação no relatório da Comissão Europeia sobre os Romes na Europa (3) e com as propostas constantes da comunicação sobre A integração social e económica dos ciganos na Europa  (4);

2.2   apoia o parecer do Comité das Regiões sobre A integração social e económica dos Romes na Europa  (5), segundo o qual há que reconhecer a importância estratégica particular das colectividades e comunidades locais, prestar-lhes apoio e realizar uma política regional integrada;

2.3   reitera a proposta já avançada no seu parecer exploratório sobre a Integração de minorias — Os Romes  (6), em particular a proposta de alargar a utilização dos processos delineados no método aberto de coordenação. Confirma também a posição assumida na Resolução sobre A situação dos Romes na União Europeia  (7), relativamente à defesa dos direitos fundamentais de todos os europeus e de combater em todos os países a discriminação, o racismo e a xenofobia;

2.4   reitera a mensagem veiculada no seu parecer sobre Integração e a agenda social, segundo a qual há que intensificar esforços para combater a discriminação aplicando os instrumentos legislativos existentes e reforçando as políticas públicas e os compromissos sociais para a integração (8);

2.5   concorda largamente com a análise da situação e as propostas apresentadas pelo Parlamento Europeu no seu relatório sobre a Estratégia da UE a favor da integração dos ciganos  (9);

2.6   aprova plenamente e perfilha os valores da não-discriminação e da integração dos indivíduos excluídos enunciados na Estratégia de Lisboa e na Carta dos Direitos Fundamentais da UE;

2.7   subscreve os dez princípios básicos comuns definidos no âmbito da colaboração na Plataforma Integrada para a Inclusão dos Romes, que obtiveram já ampla aceitação, e chama a atenção para a necessidade de os aplicar, nomeadamente a nível nacional (10);

2.8   regozija-se com a disponibilização dos fundos estruturais e de outros instrumentos de financiamento nacionais, regionais e locais para apoiar a execução de políticas de integração dos Romes. Propõe que, a bem do empoderamento social, se assegure o financiamento de tais políticas através de procedimentos ajustados e de assistência técnica adequada que leve em conta os múltiplos aspectos da questão, como o acesso aos cuidados de saúde, a formação profissional, o emprego e a habitação (11);

2.9   congratula-se com as propostas avançadas na comunicação da Comissão Europeia relativa a um quadro europeu para as estratégias nacionais de integração dos Romes até 2020 e dá grande importância à sua aplicação consistente a nível europeu e nacional. Pretende ser um parceiro empenhado neste processo;

2.10   entende, porém, que o documento, há muito aguardado, não correspondeu plenamente às expectativas que tinha suscitado. O CESE está em crer que o sistema de objectivos precisa de ser mais bem definido e indicar mais explicitamente as tarefas que se impõem no futuro. Sublinha a importância de um debate social aberto à escala europeia sobre esta questão. Com vista a garantir o seu sucesso, o CESE frisa a necessidade vital de mecanismos de avaliação e de indicadores de desempenho. Entende, por isso, que as conclusões que o Conselho adoptou em Maio e que o Conselho Europeu aprovará em Junho se revestem de particular importância, tanto de um ponto de vista social como operacional;

2.11   constata que a exclusão e a discriminação dos Romes tem um custo social importante e comporta despesas públicas significativas, ao passo que a sua integração tem claras vantagens económicas (12);

2.12   apoia e participa nas actividades da Rede EURoma, da Década da Integração dos Romes, da Cimeira sobre a Inclusão dos Romes, da Cimeira da Igualdade, da Plataforma Integrada da União Europeia para a Inclusão dos Romes, da Plataforma Europeia contra a Pobreza e a Exclusão Social, bem como noutras formas de cooperação, em que representa os valores da sociedade civil em sentido lato;

2.13   sublinha que a União Europeia e as suas instituições já empreenderam esforços substanciais em matéria de regulamentação, de orientação e de financiamento com vista a enquadrar, adoptar e aplicar políticas de integração em prol dos Romes;

2.14   cumpre-lhe, no entanto, registar o facto de estes esforços, no seu conjunto, não terem permitido dar uma resposta decisiva à discriminação sofrida por muitos Romes nem melhorar a sua qualidade e perspectivas de vida – em alguns aspectos, aliás, a sua situação piorou mais ainda. Embora a grande maioria dos Romes sejam cidadãos da UE, com os mesmos direitos e obrigações que qualquer outro cidadão dos Estados-Membros, há que reconhecer que ainda são vítimas de uma discriminação constante e profunda no que diz respeito ao mercado de trabalho, à educação, à habitação e aos cuidados de saúde, bem como ao acesso aos serviços públicos e à liberdade de circulação;

2.15   está ciente da existência de diferenças significativas entre os vários grupos de Romes. De facto, embora muitos estejam bem integrados no meio onde vivem, seja este urbano ou rural, outros há que vivem em situações de pobreza e de privação extremas, bem como de exclusão permanente. Finalmente, há uma minoria que leva uma existência nómada muito própria que não é bem aceite pela sociedade;

2.16   defende que é essencial empoderar as pessoas que vivem em situação de pobreza e são vítimas de discriminação. A verdadeira autodeterminação requer liberdade de escolha. Para uma aplicação bem-sucedida das políticas de integração, é decisivo que os indivíduos possuam a força, os instrumentos e a autoridade para forjarem o seu próprio destino. É por isso que a política, na sua globalidade, a par dos seus domínios específicos de actuação, deve promover a capacidade de autodeterminação, no quadro do Estado de direito;

2.17   está firmemente convicto de que não é necessário conceder aos Romes direitos especiais, mas de que é importante respeitar a sua cidadania europeia, assegurando-lhes, ao mesmo tempo, os direitos fundamentais da UE e os direitos dos cidadãos, zelar pelo seu respeito e sancionar qualquer violação aos mesmos, sobretudo nos casos em que os responsáveis pelo cumprimento da lei actuam de modo injusto e discriminatório;

2.18   faz notar que, entre os Romes, as mulheres, as crianças, os idosos e os deficientes sofrem a exclusão de forma desproporcionada e que a crise social e económica só vem acentuar estes fenómenos negativos;

2.19   crê que a resolução destes problemas terá de passar por um programa estratégico integrado, coordenado e coerente, seguindo uma abordagem firme e sistemática em todos os domínios políticos. Congratula-se com o facto de os órgãos e as instituições da UE (incluindo o CESE) estarem a trabalhar em conjunto com o Governo húngaro, que actualmente exerce a Presidência do Conselho, no sentido de criar as condições necessárias para o efeito. Recomenda a realização de uma Conferência Ministerial durante a Presidência polaca para debater as experiências e os resultados obtidos;

3.   Recomendações políticas  (13)

O COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU:

3.1   constata que a abordagem tradicional à definição dos Romes enquanto grupo-alvo assenta nas percepções da maioria em relação a este povo. Uma tal abordagem poderá ser útil – por exemplo, do ponto de vista da investigação – e eficaz para avaliar a natureza da exclusão social. Contudo, qualquer método de identificação dos Romes baseado em traços raciais exteriores viola os direitos humanos fundamentais e, nomeadamente, o direito de os indivíduos definirem a sua própria identidade, para além de ser improdutivo e politicamente insustentável;

3.2   preconiza que, ao contrário das abordagens tradicionais, os Estados-Membros respeitem os valores fundamentais do quadro estratégico adoptado, satisfazendo, ao mesmo tempo, a exigência de «focalização específica, mas não exclusiva» dos dez princípios básicos adoptados pela Plataforma Integrada Europeia para a Inclusão dos Romes. No âmbito dos quatro domínios de actuação em destaque na comunicação da Comissão (educação, emprego, saúde e habitação), os Estados deverão integrar três ângulos políticos e estratégicos reveladores da natureza dos problemas e das possibilidades de acção que, no seu conjunto, constituem os três pilares de uma política de integração dos Romes realista e exequível:

a)

uma política de integração sem distinção de raça e etnia, focada na concentração dos problemas sociais e na redução da pobreza e da privação extremas;

b)

uma política em prol do empoderamento dos que se consideram membros de uma dada comunidade romani, e que permita celebrar a inclusão social alcançada;

c)

políticas gerais e publicidade contra o racismo;

3.3   uma política de integração sem distinção de raça e etnia – acesso universal, focada na concentração dos problemas sociais e na redução da pobreza e da privação extremas:

3.3.1

em vez de se concentrar nos traços étnicos ou raciais, uma política de integração não discriminatória deve tratar os problemas associados à exclusão social, independentemente das características raciais, nomeadamente em matéria de educação, emprego (incluindo diferentes formas de emprego, como o empreendedorismo e as actividades não assalariadas), saúde e habitação, tal como referido na comunicação da Comissão. Deverá ter em conta a concentração espacial das desvantagens socioeconómicas, independentemente da composição (étnica ou outra) do grupo de indivíduos excluídos, e na linha da Estratégia de Lisboa, dar prioridade à resolução de dois problemas específicos;

3.3.2

a primeira prioridade é a aplicação consistente do critério de «pleno acesso». Além de eliminar efeitos discriminatórios no plano jurídico, a noção de «pleno acesso» também engloba exigências em termos de acessibilidade física e de utilizabilidade, de adequação às necessidades, de acessibilidade dos preços, bem como de cumprimento das normas de qualidade. Além de remover obstáculos jurídicos, pretende-se aproximar os serviços públicos das zonas residenciais com maior concentração de população romani e melhorar as ligações de transportes às instituições e aos serviços a que aquela tem direito a aceder, dadas as suas circunstâncias;

3.3.3

a concentração da exclusão pode assumir duas formas principais: 1) em termos espaciais e residenciais, e 2) em termos institucionais, na interacção entre prestadores de serviços (incluindo serviços públicos) e clientes socialmente excluídos (efeito de segregação institucional);

3.3.4

é possível diluir a concentração da exclusão, em primeiro lugar, apostando em melhorias específicas das condições institucionais e das zonas residenciais mais pobres e menos conformes às normas e, em segundo, reduzindo os casos de isolamento mediante reformas em prol da integração institucional e a promoção deliberada dos contactos e das interacções;

3.3.5

o pleno acesso é um elemento-chave dos objectivos fundamentais da Estratégia de Lisboa. Nesse sentido, as actividades relativas ao mercado de trabalho e a outros aspectos sociais, o reforço da mobilidade e a promoção da educação continuam a ser prioridades. Os documentos estratégicos dos últimos anos têm posto uma tónica renovada e mais forte na saúde – em particular, na saúde pública –, nas políticas de habitação e de desenvolvimento urbano, insistindo na supressão das zonas de habitação isoladas, dos acampamentos e de outros locais de segregação, fomentando em simultâneo as economias locais, as iniciativas das próprias comunidades, as micro-empresas (trabalho não assalariado), as pequenas e médias empresas e os serviços municipais geridos pelo sector público ou pelo sector privado (ONG). A harmonização das estratégias de luta contra a pobreza infantil com as estratégias em prol dos Romes é uma questão prioritária (apoiando o acesso das mães ao emprego; reforçando a responsabilização municipal pela educação das crianças; assegurando um acesso mais pleno a estabelecimentos pré-escolares e promovendo a aprendizagem precoce, sem esquecer subsídios e incentivos à educação e à formação complementar de crianças, cujos pais vivem em situação de pobreza);

3.4   uma política em prol do empoderamento dos que se consideram membros de uma dada comunidade romani, e que permita celebrar a inclusão social alcançada;

3.4.1

é imprescindível que os indivíduos que reclamam uma mesma identidade possam, por iniciativa própria, com os pares por si eleitos e enquanto comunidade, forjar o seu próprio caminho e preservar a língua, a cultura e os costumes que estão na base da sua identidade. É por este motivo que a estratégia nacional de integração dos Romes deve tornar possível a quem reclama a identidade romani desenvolver a sua própria comunidade, respectivo espaço público (meios de comunicação) e organizações, e velar pelo seu funcionamento – o mesmo se aplicando a quaisquer outros grupos minoritários vítimas de exclusão social. É igualmente importante que as instituições e os órgãos, estatais e não estatais, de organização própria dos Romes beneficiem das mesmas possibilidades de organização de que usufruem outras minorias étnicas. O eventual apoio financeiro que lhes for concedido também deverá ser correspondente aos seus números, na mesma proporção aplicável a outras minorias nacionais;

3.4.2

para tal, a interculturalidade – enquanto forma de interacção e de comunicação vital nos dois sentidos – e a integração – no plano dos princípios, da teoria e das boas práticas comunitárias e institucionais na Europa – terão de se tornar um factor real de acção e uma parte integrante do quotidiano;

3.4.3

o elemento-chave das políticas de acção positiva consiste em dar a possibilidade aos indivíduos pertencentes a minorias de se fazerem ouvir e representar. Há que apoiar os instrumentos e as abordagens que os ajudam a pôr em evidência as suas desvantagens sociais e lutar politicamente para inverter estes problemas;

3.4.4

as políticas de empoderamento devem apoiar acções positivas para promover a inserção no mercado de trabalho dos Romes, incluindo a sua ascensão a altos cargos nas empresas, na administração pública, na política, na comunicação social, nas ciências e nas artes, ajudando-os simultaneamente a montar as suas próprias pequenas e médias empresas.

3.5   Política anti-racista

3.5.1   O grupo-alvo da estratégia contra o racismo é a sociedade no seu conjunto. A sua dimensão política é animada pela convicção de que, num mundo dinâmico, em desenvolvimento, justo e humano, a posição dos indivíduos na sociedade é fundamentalmente um produto das suas competências e talentos, e não de privilégios ou desvantagens de berço, que não deverão determinar as suas possibilidades de singrar na vida. Da mesma forma, os cidadãos não devem ter de sofrer os efeitos negativos da exclusão de que são vítimas. As características herdadas e não alteráveis, como o sexo, a proveniência e a religião não devem ser causa de discriminação. Para que tais princípios se apliquem na prática, o instrumento mais eficaz é constituído pela legislação antidiscriminação. A aplicação plena da legislação europeia contra a discriminação à escala nacional, nos diferentes domínios de actuação e nos sistemas regulamentares, também contribuiria para esse objectivo. Porém, a eficácia de tal legislação não se deve apenas às sanções que aplica e ao seu efeito dissuasor, mas também ao facto de os cidadãos cumpridores da lei, que correspondem à maioria numa sociedade democrática, se esforçarem por viver no respeito do espírito e da letra da lei.

3.5.2   Dado que custa mais «dissuadir» as pessoas ou desmantelar os seus preconceitos e racismo por via da argumentação racional, as políticas anti-racistas assentam sobretudo em modelos comportamentais e em esquemas de comunicação que difundem uma imagem positiva dos modelos de comunicação não violenta, da cooperação e da resolução de problemas com base em interesses racionais, ao mesmo tempo que condenam formas de comportamento agressivas e racistas baseadas nos preconceitos e no ódio. Os formadores de opinião, nomeadamente a elite política e mediática, detêm a este nível uma responsabilidade muito particular.

3.6   Reforçar a estratégia, assente em dados objectivos

3.6.1   Nas duas últimas décadas, a UE realizou progressos importantes em diversos domínios políticos no atinente à avaliação objectiva da exclusão social e da luta contra a exclusão, integrando os seus resultados nas políticas sociais. A disponibilidade de dados é uma condição imprescindível para a aplicação e a avaliação das políticas adequadas. Apesar dos esforços realizados até ao momento, escasseiam ainda dados relativos tanto à população em geral como a grupos-alvo. Tendo em conta os objectivos da estratégia, cumpre realizar progressos nos domínios a seguir expostos.

3.6.2   «Política de integração sem distinção de raça e etnia»: no desenvolvimento de métodos de avaliação das várias formas de pobreza e de privação, há que envidar esforços para medir a concentração da exclusão e para evidenciar o impacto das medidas aplicadas com base nas políticas em causa. O Comité recomenda que o Eurostat e os serviços de estatística dos Estados-Membros acrescentem aos indicadores de exclusão indicadores de pobreza e de exclusão extremas e que desenvolvam os princípios para um método de quantificação e de tratamento estatísticos que permitam aferir a pobreza e a privação extremas.

3.6.3   Nesta base, cumpre aos Estados-Membros identificar, no âmbito das suas estratégias, as unidades territoriais (zonas urbanas, bairros de lata, centros das cidades, acampamentos, bairros isolados, povoamentos rurais, etc.) que apresentam uma concentração particularmente elevada de formas de exclusão e de exclusão extrema em zonas habitadas, independentemente de, aos olhos da opinião pública, serem áreas povoadas por Romes. O Comité preconiza que os Estados-Membros elaborem estratégias de planeamento urbano para suprimir estas zonas ou torná-las habitáveis e criem mecanismos com base nos dados comprovados necessários ao acompanhamento destas estratégias.

3.6.4   «Política de empoderamento dos Romes»: só se poderão identificar eventuais desvantagens se quem reclama uma dada identidade étnica solicitar a sua inscrição nos registos nacionais como pertencente à minoria em causa. Não se dando esse caso, há que proibir categórica e firmemente toda e qualquer referência nos registos nacionais a uma dada raça com base em traços raciais. Tendo em conta a natureza particularmente delicada dos dados relativos às minorias étnicas, é importante assegurar por todos os meios possíveis a máxima protecção dos dados pessoais e, em simultâneo, a máxima divulgação dos dados agregados relativos às minorias.

3.6.5   Paralelamente à redução da exclusão e da pobreza e à atenuação das suas formas mais extremas, o CESE recomenda apoiar programas linguísticos, culturais, educativos e comunitários em prol da comunidade romani que vão verdadeiramente ao encontro das necessidades dos seus membros.

3.6.6   «Política anti-racista»: com base em estudos realizados à escala da UE e a nível nacional, deverá ser possível acompanhar a evolução dos preconceitos em relação aos Romes, a sua prevalência nos diferentes grupos sociais e o impacto das políticas no desenvolvimento de preconceitos étnicos e do racismo. Há que realizar campanhas de sensibilização orientadas para o grande público destinadas a combater as atitudes marginalizantes e os preconceitos racistas observáveis na população. Por outro lado, cumpre também velar pelo seu acompanhamento regular.

3.6.7   O CESE preconiza vivamente o acompanhamento não só das tendências em termos de preconceitos e de racismo mas também dos efeitos positivos e dos benefícios sociais de iniciativas públicas e da sociedade civil, das boas práticas destinadas a combater os preconceitos contra os Romes e a xenofobia e a melhorar a integração e a inclusão intercultural.

3.7   Aspectos de interesse geral na aplicação a nível nacional

3.7.1   Complexidade: o Comité salienta a necessidade de, em inúmeros domínios, conceber medidas destinadas a reforçar o papel positivo dos Romes na sociedade, a melhorar as suas condições de vida e a promover a sua integração. Tais medidas têm de passar a ser políticas sistemáticas. Para tal, há, em primeiro lugar, que conjugar e unificar elementos de diferentes domínios políticos. Em segundo, há que organizar relações intersectoriais de boa governação. Em terceiro, há que proceder a uma aplicação sistemática a nível político. Tal requer de todas as partes envolvidas na aplicação uma abordagem única e concertada.

3.7.2   Todos os elementos dos programas devem estar interligados de forma coerente (coerência) e integrada (consistência). O terceiro aspecto essencial da aplicação é a planificação e o estabelecimento de prioridades (sequencialidade) – por outras palavras, só se poderão alcançar objectivos realistas através de um percurso faseado bem concebido e por etapas sucessivas. Para tal, é necessária uma autoridade de coordenação dotada das competências adequadas e que funcione devidamente.

3.7.3   A planificação e a execução das políticas de integração devem pôr a tónica nas necessidades reais, de maneira diferenciada e flexível, tendo em devida conta as especificidades locais (regionais). As estratégias de integração devem ser planeadas e aplicadas como «vias de dois sentidos», com base em esforços e influências recíprocos, e visando benefícios mútuos para todos.

3.7.4   Uma condição essencial para o recurso a concursos públicos e a fundos europeus é a simplificação das condições de adjudicação dos contratos e de prestação de contas. Uma aplicação cuidadosamente concebida deverá dar a devida atenção ao reforço de capacidades, à coordenação apropriada e ao apoio de uma vontade política empenhada. É igualmente crucial a participação dos representantes das partes interessadas no processo de planificação.

3.7.5   Aplicação assente em dados objectivos – indicadores: as políticas devem demonstrar a sua eficácia de modo inequívoco e comprovável, nomeadamente na medida em que cumpriram os seus objectivos iniciais. Não devem expor os cidadãos a danos e a riscos maiores do que os que visa enfrentar, nem ser desnecessariamente onerosas. É nesse sentido que foram envidados esforços importantes – mas não suficientes – para que esta política assentasse mais fortemente em dados comprovados. No atinente à integração dos Romes, é particularmente importante poder avaliar não só os programas mas também a política na sua totalidade. É essencial, pois, promover, a nível nacional e à escala da UE, uma cultura de avaliação, um sistema de requisitos mais exigente, o estabelecimento normalizado de indicadores estatísticos de desempenho socioeconómico e social, aplicados sempre ao grupo-alvo pertinente, bem como a organização de um dispositivo institucional de avaliação com base científica. Há que assegurar recursos adequados para o efeito.

3.7.6   O CESE apoia a execução do quadro europeu para as estratégias nacionais de integração dos Romes até 2020 e de políticas nacionais que para ele contribuam. Gostaria, contudo, de participar no acompanhamento e na avaliação destas políticas com base no mandato da sociedade civil de que é detentor e nas ligações inerentes que o unem às organizações da sociedade civil dos Estados-Membros. Pretende participar na mediação entre as instituições da UE e a sociedade civil organizada e ser um parceiro activo na Plataforma Integrada para a Inclusão dos Romes, bem como noutras formas de diálogo estruturado.

3.7.7   Participação e representação: uma política de integração é inconcebível, em teoria ou na prática, sem a participação intensa dos interessados. Por isso, é necessário evitar processos paternalistas de restrição de direitos. Importa, ao invés, assegurar uma participação tão diversa e próxima quanto possível das organizações romani, dos representantes da sociedade civil local, de peritos e dos parceiros sociais nos processos de decisão, aplicação e acompanhamento, tal como consta claramente da comunicação da Comissão e de outros documentos pertinentes. Nas zonas visadas, as medidas positivas que garantam a participação política dos grupos particularmente desfavorecidos (mulheres, mães solteiras, falantes de uma língua estrangeira, deficientes, etc.) revestem-se de importância capital.

3.7.8   A validade, a credibilidade e a eficácia das políticas estão essencialmente associadas ao grau de participação e de apropriação dos seus principais destinatários. É por este motivo que importa implicar os representantes da comunidade romani à escala europeia, nacional e local na elaboração e na aplicação das políticas destinadas a promover a sua integração (inclusão pela participação).

3.7.9   A exclusão social e as suas formas extremas estão muitas vezes associadas – de formas diferentes em diferentes Estados-Membros – a comportamentos, modos de vida e hábitos que se afastam das normas sociais seguidas pela maioria da população (como viagens, actividades específicas como a recolha e a comercialização de artigos usados ou determinados ofícios artesanais). Importa dedicar especial atenção a tais particularidades na elaboração das estratégias nacionais. Contudo, pode acontecer igualmente que as atitudes atribuídas ao grupo étnico sejam totalmente desviantes e criminosas. Assegurar a coabitação pacífica entre normas culturais opostas, envidando esforços constantes para manter as tensões e os antagonismos decorrentes de atitudes e de hábitos divergentes dentro dos limites do quadro jurídico, é um objectivo que define o carácter inclusivo específico das estratégias nacionais e constitui, ao mesmo tempo, o desafio particular a que estas devem corresponder. Para tal, importa prever um espaço de comunicação aberto e procedimentos acessíveis também aos principais interessados, no âmbito dos quais os profissionais do multiculturalismo – incluindo pessoas de origem ou de identidade romani – e os assistentes sociais terão um papel de destaque a desempenhar, a nível dos serviços públicos e dos programas comunitários (mediação, prevenção, serviços de reconciliação, etc.), tal como referido na comunicação da Comissão.

3.8   Perspectivas para o futuro

3.8.1   O CESE entende que, graças aos esforços conjuntos das suas instituições, dos governos dos Estados-Membros e das colectividades e comunidades locais, a UE se poderá encontrar agora num ponto de viragem histórico. De facto, poderá finalmente surgir uma política favorável ao grupo étnico europeu mais excluído e mais desfavorecido, baseada numa abordagem comum susceptível de se traduzir não num falhanço dispendioso, mas em resultados inteligentes e humanos. O Comité pretende, pela sua parte, apoiar plenamente este processo e a sua aplicação.

Bruxelas, 16 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Este documento baseia-se na definição apresentada no parecer do CR sobre A integração social e económica dos romes na Europa (JO C 42 de 10.2.2011, p. 23): «[…] o termo “rome” utilizado neste documento é um conceito abrangente que inclui igualmente outros grupos da população com características culturais semelhantes e uma história de marginalização e de exclusão social da sociedade europeia (sinti, ciganos, itinerantes, kalè, camminanti, ashkali, etc.)».

(2)  COM(2011) 173 final.

(3)  SEC(2010) 400 final.

(4)  COM(2010) 133 final.

(5)  Parecer do Comité das Regiões sobre A integração social e económica dos romes na Europa (JO C 42 de 10.2.2011, p. 23).

(6)  JO C 27 de 3.2.2009, pp. 88-94.

(7)  JO C 48 de 15.2.2011, p. 1.

(8)  JO C 347 de 18.12.2010, p. 19-27.

(9)  Parlamento Europeu, INI/2010/2276, 24.11.2010.

(10)  Destacam-se, em particular, os seguintes princípios: «Focalização explícita, mas não exclusiva», «Abordagem intercultural» e «Aspirar à integração transversal».

(11)  Fundo Social Europeu, Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, Instrumento de Assistência de Pré-Adesão, Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural / Banco Mundial, Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento.

(12)  «A grande maioria dos Romes em idade activa carece de escolaridade suficiente para poder participar com sucesso no mercado de trabalho. […] Em consequência, os países europeus estão a perder anualmente centenas de milhões de euros em produtividade e em contribuições fiscais para os governos. […] As receitas fiscais anuais derivadas da correcção desta assimetria laboral são muito superiores ao custo total de investir na educação pública de todas as crianças romani. […] A percentagem de Romes na população das classes trabalhadoras aumentará em virtude do rápido envelhecimento das populações maioritárias na Europa Oriental e Central. A igualdade de participação dos Romes no mercado de trabalho é essencial para fazer frente aos custos crescentes das pensões de reforma, da saúde e de outras despesas associadas ao envelhecimento.»Economic costs of Roma exclusion [Custos económicos da exclusão dos Romes], Banco Mundial, 2010.

(13)  Esta secção aborda as recomendações sobre as políticas no seu conjunto ou no respectivo contexto, mas por uma questão de concisão, não poderá aprofundar as questões relativas a cada política.


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/22


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre as «Repercussões das políticas da UE nas oportunidades de emprego, nas necessidades de formação e nas condições de trabalho dos trabalhadores no sector dos transportes» (parecer exploratório)

2011/C 248/04

Relator: André MORDANT

Em 17 de Novembro de 2010, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre as

Repercussões das políticas da UE nas oportunidades de emprego, nas necessidades de formação e nas condições de trabalho dos trabalhadores no sector dos transportes

(parecer exploratório).

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-Estruturas e Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 24 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho) o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 150 votos a favor, 2 votos contra e 8 abstenções, o seguinte parecer:

O sector dos transportes enfrentará alguns desafios no futuro próximo, nomeadamente a escassez de recursos petrolíferos e a possível subida dos preços do petróleo, a necessidade de melhorar a eficiência energética, o imperativo de contribuir para o combate às alterações climáticas e a transição para uma economia de baixo carbono, bem como o envelhecimento da população e o seu impacto na disponibilidade de pessoal qualificado, por um lado, e as diferentes exigências em matéria de mobilidade, por outro. Esta evolução é tida em conta no parecer do CESE.

1.   Recomendações e conclusões

1.1   O CESE salienta que o sector dos transportes, como importante sector empregador que representa 4,4 % de toda a população activa da UE, terá um importante potencial de emprego para a Europa do futuro. Este sector também é vital para o desenvolvimento económico, a mobilidade dos cidadãos, a inclusão social e a coesão económica e social no espaço europeu.

1.2   O CESE recomenda que se motivem as mulheres e os jovens para as oportunidades de emprego existentes no sector dos transportes através de medidas que melhorem a qualidade do emprego em todos os modos de transporte e as condições de trabalho, da formação e da aprendizagem ao longo da vida, das perspectivas de carreira, da protecção da saúde e da segurança do trabalho e que contribuem para um melhor equilíbrio entre a vida profissional e a vida privada.

1.3   O CESE recomenda que, com o apoio da Comissão Europeia, todos os modos de transporte façam um inventário das oportunidades de formação existentes e analisem as necessidades futuras de formação, a nível nacional e regional, bem como a nível das empresas. Importa prestar uma atenção especial à formação contínua.

1.4   O CESE considera que devem ser garantidas suficientes acções de formação de elevada qualidade em centros de formação e/ou no meio empresarial, o que exige cooperação entre os parceiros sociais, as regiões e os centros de formação em todos os modos de transporte. A cooperação, a nível europeu, entre os centros de formação é fortemente recomendada pelo CESE, que entende que os formandos não devem suportar os custos da sua formação profissional, sendo isto especialmente relevante para o objectivo da promoção das carreiras no sector dos transportes.

1.5   O CESE recomenda a introdução de legislação da UE sobre a certificação profissional e as cartas de condução para o pessoal de bordo dos comboios e o pessoal de cabina das aeronaves como meio para assegurar empregos de qualidade, a qualidade dos serviços e a segurança, bem como para facilitar a mobilidade dos trabalhadores no espaço europeu.

1.6   O CESE considera que a Directiva 2003/59/CE também constitui um exemplo positivo e solicita à Comissão Europeia que adopte mais legislação sobre formação obrigatória e contínua sobre os outros modos de transporte.

1.7   Para promover as profissões do sector dos transportes, o CESE recomenda que se empreendam acções coordenadas a nível nacional, regional e local, para dar a conhecer o funcionamento do sector dos transportes e promover as profissões desse sector, por exemplo, nos estabelecimentos de ensino.

1.8   O CESE sublinha que a capacidade das profissões do sector dos transportes para atrair as mulheres depende, em grande medida, de incentivos que permitam adaptar a indústria dos transportes às necessidades específicas das mulheres trabalhadoras. Recomenda que os diferentes sectores e empresas da indústria dos transportes desenvolvam políticas que facilitem o exercício, naquela indústria, de actividades profissionais por parte das mulheres.

1.9   Tendo em conta as alterações demográficas e o envelhecimento da população activa, o CESE preconiza que o sector e as respectivas empresas analisem a estrutura etária dos seus trabalhadores e as suas necessidades futuras em termos de mão-de-obra, para desenvolver e adaptar a formação, a organização do trabalho e as medidas para melhorar a saúde ocupacional em função das necessidades dos diferentes grupos etários.

1.9.1   O CESE também recomenda que se insista mais na ofertas de perspectivas de carreira para os trabalhadores do sector dos transportes, para tornar este sector atractivo para os jovens.

1.9.2   O CESE recomenda que o sector marítimo promova a evolução do estatuto de marinheiro para o estatuto de oficial.

1.9.3   O CESE preconiza que o sector dos transportes envide mais esforços para oferecer perspectivas de carreira aos condutores de autocarros, por exemplo lugares de chefes de equipa ou de gestores do tráfego.

1.10   O CESE considera que a segurança pessoal dos trabalhadores dos transportes e dos passageiros e a prevenção contra agressões e violência física constituem um importante desafio e recomenda energicamente uma política de tolerância zero em relação à violência.

1.10.1   O CESE recomenda a adopção de medidas preventivas, por exemplo, a nível das infra-estruturas (por exemplo, áreas de estacionamento seguras, acessíveis e em número suficiente para os transportes rodoviários de mercadorias, bem como estações de comboios, metropolitano, carros eléctricos e autocarros, de boa qualidade). A UE deverá apoiar, no plano financeiro, as medidas ligadas a estas infra-estruturas.

1.10.2   O CESE recomenda a contratação de um número suficiente de trabalhadores devidamente qualificados e formados para o exercício de funções nas estações e a bordo dos transportes públicos, como medida preventiva contra a violência.

1.10.3   O CESE preconiza a criação de uma Agência Europeia para a Segurança Rodoviária.

1.11   Tendo em conta o artigo 9.o do Tratado de Lisboa e a Carta dos Direitos Sociais Fundamentais, a Comissão Europeia deve favorecer uma política social para os transportes. O CESE entende que quaisquer outras iniciativas de liberalização que venham a ser adoptadas devem pressupor uma análise aturada das consequências sociais das medidas de liberalização anteriores, uma avaliação significativa do respectivo impacto social e incluir uma garantia intrínseca de que a concorrência não se baseará em custos de mão-de-obra mais baixos, mas na qualidade dos serviços.

1.11.1   O CESE recomenda, no caso dos concursos (por exemplo, para serviços de assistência em escala nos aeroportos) ou de todos os tipos de serviços de transporte, que seja garantida a segurança do emprego através de uma transferência obrigatória de pessoal para novos operadores e a salvaguarda do nível de condições de trabalho e de remuneração graças à manutenção da aplicação das disposições da contratação colectiva em vigor no local de fornecimento do serviço) (1). Para o efeito, o CESE recomenda a introdução de uma cláusula social.

1.11.2   Em relação à implementação do Céu Único Europeu, incluindo os Blocos Funcionais do Espaço Aéreo e o programa SESAR (programa de implementação do Céu Único Europeu), o CESE solicita aos Estados-Membros que realizem proveitosas consultas com os parceiros sociais e todas as outras partes interessadas no sentido de serem adoptadas medidas equilibradas para atingir estes objectivos e evitar a perda de postos de trabalho.

1.12   O CESE entende que a legislação social no sector dos transportes deve ser eficazmente controlada e executada, devendo eventuais infracções ser sujeitas a sanções eficazes, baseadas em regras harmonizadas. Devem ser reforçadas as competências das autoridades de execução competentes e impõe-se uma melhor coordenação e cooperação.

1.13   O CESE recomenda a introdução de legislação da UE para efeitos do controlo regular dos horários de trabalho e de descanso dos trabalhadores móveis dos transportes ferroviários que efectuam serviços de transporte transfronteiriços. O CESE salienta a necessidade de uma melhor aplicação das disposições da Directiva relativa ao destacamento de trabalhadores, especialmente no caso dos transportes rodoviários que fornecem serviços de cabotagem.

1.14   O CESE recomenda que se preste especial atenção aos factores que promovem um melhor equilíbrio entre a vida profissional e a vida privada dos trabalhadores móveis da indústria dos transportes. Há que melhorar a legislação social da indústria dos transportes em matéria da carga horária de trabalho.

1.14.1   O CESE preconiza a introdução de medidas legislativas complementares para regulamentar a actividade das tripulações das embarcações utilizadas no alto mar e em águas interiores, de modo a garantir qualidade e segurança.

1.14.2   O CESE recomenda uma utilização mais judiciosa e rigorosa das orientações relativas aos auxílios estatais para o sector marítimo, reforçando a relação entre a concessão de subsídios públicos ou isenções fiscais e as garantias de emprego e obrigações de formação.

1.14.3   O CESE entende que as instituições europeias e a Agência Europeia para a Segurança da Aviação (AESA) devem intensificar a cooperação com as partes interessadas para conseguir regras sobre limites de tempos de voo para as tripulações das aeronaves, orientadas para a segurança e com base científica.

1.14.4   O CESE recomenda a adopção, para os vários modos de transporte, de uma legislação sectorial específica em matéria de saúde e segurança no trabalho, uma vez que a legislação geral da UE em matéria de saúde e segurança muitas vezes não tem em conta as condições específicas que caracterizam o sector dos transportes.

1.14.5   O CESE entende que é importante dispor de uma legislação adequada que permita evitar a transferência de registo de contratos de trabalho.

1.15   O CESE apoia energicamente o diálogo social. A nível europeu, os diferentes comités sectoriais do diálogo social devem desempenhar um papel mais importante na avaliação do impacto social das propostas da Comissão numa fase inicial e na apresentação das suas próprias observações e propostas políticas para os diferentes modos de transporte.

1.15.1   O CESE recomenda que a Comissão Europeia, através da Direcção-Geral da Mobilidade e dos Transportes (DG MOVE), coopere de forma mais eficaz com os comités sectoriais do diálogo social e tenha oportunamente em conta a experiência dos parceiros sociais.

1.16   O CESE considera que as instituições europeias e os parceiros sociais da UE não dispõem de dados estatísticos nem de análises comparativas suficientes em matéria de emprego e de condições de trabalho para os diferentes modos de transporte. Por conseguinte, apoia a criação de um Observatório Social, do Emprego e da Formação para o sector dos transportes, destinado a prestar informações fundamentais que permitam uma melhor avaliação ex post do impacto social das medidas adoptadas no contexto da política dos transportes, para apoiar os parceiros sociais europeus no âmbito do diálogo social sectorial a nível da UE.

2.   O sector dos transportes é um importante empregador na União Europeia

2.1   Do ponto de vista quantitativo, há que reconhecer a importância do emprego no mercado dos transportes, que, em 2007, contava 9,2 milhões de trabalhadores, ou seja, o equivalente a 4,4 % do total da mão-de-obra da UE. Estes dados incluem os trabalhadores afectos a condutas de transporte de produtos (oleodutos e gasodutos), agências de viagens e operadores turísticos, bem como os que prestam serviços auxiliares de transporte, como a movimentação de carga e descarga, o depósito e a armazenagem de mercadorias.

2.2   AeparOs diferentes modos de transporte, nomeadamente, o transporte rodoviário de mercadorias, o transporte rodoviário de passageiros, os caminhos-de-ferro, as vias navegáveis interiores, os transportes marítimos e a aviação empregam, respectivamente, cerca de 2,9 milhões, 1,9 milhões, 864 000, 43 400, 184 000 e 409 000 trabalhadores. Os serviços auxiliares de transporte, por sua vez, empregam cerca de 2,3 milhões de trabalhadores (2).

2.3   No período de 2004 a 2007, o número total de trabalhadores do sector dos transportes registou um aumento contínuo, passando de 8,6 para 9,2 milhões nos 27 Estados-Membros da UE. Este aumento verificou-se sobretudo a nível do transporte rodoviário de mercadorias e de passageiros e nos serviços auxiliares. O emprego no sector dos transportes ferroviários sofreu uma redução drástica de 117 000 trabalhadores, passando de 981 848 trabalhadores em 2004 para 864 000 em 2007 (3).

2.4   O emprego no sector dos transportes foi gravemente afectado pela crise económica de 2008 e 2009, sobretudo a nível do transporte de mercadorias.

2.5   As futuras tendências do emprego no sector dos transportes dependem de um conjunto de factores como o desenvolvimento de actividades comerciais e económicas, uma população em envelhecimento e os padrões de mobilidade das pessoas, avanços tecnológicos, abastecimento e preços da energia, bem como medidas em prol de transportes sustentáveis (transferência modal, ou seja, passar a viajar, por exemplo, nos transportes públicos em vez de usar a viatura particular, evitar os transportes) (4), recorrer a modos de transporte alternativos como, por exemplo, a bicicleta (5).

3.   Características do emprego no sector dos transportes: Baixo índice de atractividade – Um problema para o futuro

3.1   O sector dos transportes não tem uma reputação imaculada como sector empregador e os postos de trabalho que oferece são tidos como pouco convidativos. Ambos os inquéritos sobre as condições de trabalho na Europa realizados, respectivamente, em 2000 e 2005 pela Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho, confirmaram, nas suas análises sectoriais, que o sector dos transportes faz parte dos sectores mais desfavoráveis, a julgar pelos indicadores sobre as condições de trabalho.

3.2   Os indicadores avaliados como menos favoráveis no terceiro inquérito (2000) incluem: condições ambientais, ergonomia, horários de trabalho atípicos, longos períodos de trabalho, elevadas exigências profissionais, ausência de fiscalização das condições de trabalho, trabalho não qualificado, baixo índice de flexibilidade na execução das tarefas, discriminação.

3.3   Os indicadores utilizados no quarto inquérito (2005) (apenas referentes aos transportes terrestres) incluem: carga horária, horários de trabalho atípicos, equilíbrio entre as horas de trabalho e os compromissos familiares e sociais, fiscalização das condições de trabalho, trabalho qualificado, violência, stress e problemas músculo-esqueléticos (6).

3.4   A maior parte dos empregos no sector dos transportes implica mobilidade (motoristas, pilotos e assistentes de bordo de diferentes sectores) ou postos de trabalho directamente ligados à circulação, como o controlo do tráfego. Os condutores de veículos e os operadores de equipamentos móveis representam a categoria mais importante de trabalhadores na UE (45 % em 2006) (7). As ausências regulares e, por vezes, muito longas do local de residência e o trabalho por turnos com carácter regular vão contra as exigências crescentes dos trabalhadores em termos de um correcto equilíbrio entre a vida profissional e a vida privada. Além disso, o salário auferido na maioria destas profissões e ocupações é baixo.

3.4.1   O CESE considera que o desconforto das condições de repouso não é aceitável e que, pelo contrário, é preciso procurar obter, em todos os casos, condições de repouso satisfatórias para o pessoal de todos os modos de transporte.

3.5   O sector é fortemente dominado pelo género masculino, sendo um dos que apresentam o maior índice de segregação entre os géneros, com apenas 21,1 % de mulheres (82,2 % dos trabalhadores dos transportes terrestres são homens). A investigação provou que, a um aumento na taxa de emprego das mulheres se encontra, muitas vezes, associada uma melhoria das condições de trabalho para ambos os géneros.

3.6   Os transportes são, a justo título, considerados uma actividade perigosa. A segurança operacional e a segurança ocupacional estão intimamente ligadas, em especial no caso dos motoristas. Os acidentes fatais são igualmente uma realidade no caso dos técnicos de manutenção (por exemplo, nos trabalhos de manutenção das vias no sector ferroviário), nas manobras ferroviárias de posicionamento das composições e nos acidentes a bordo de navios. Além disso, verificam-se casos de violência e agressões físicas (furtos de mercadoria nos transportes rodoviários, agressões físicas nos transportes públicos de passageiros por estrada e via férrea, e mesmo actos de pirataria nos sector dos transportes marítimos).

3.7   O padrão demográfico no sector dos transportes é preocupante. A média de idade dos trabalhadores dos transportes é elevada. A maioria irá aposentar-se nos próximos 10 a 20 anos. Apenas 17,5 % da mão-de-obra pertencem ao grupo etário dos 15 aos 29 anos, sendo que 57,5 % dos trabalhadores do sector têm entre 30 e 49 anos de idade (2006) (8).

3.8   Muitos sectores já hoje acusam uma grave penúria de profissionais, sobretudo para desempenhar funções móveis. Tendo em conta o envelhecimento da população na Europa e a concorrência entre sectores e empresas para atraírem trabalhadores (jovens), esta situação irá colocar o sector dos transportes perante sérias dificuldades no futuro. Há que aumentar a atractividade do sector através de ofertas de formação interessantes, de perspectivas de carreira dentro do mesmo sector e de uma melhoria das condições de trabalho. O sector dos transportes deverá ir ao encontro das necessidades dos trabalhadores jovens e das mulheres no que respeita a um maior equilíbrio entre a vida profissional e a vida privada. É possível conseguir uma melhor integração das mulheres no sector dos transportes através de acções positivas que exijam pelo menos novas infra-estruturas sanitárias, vestiários e alojamento, bem como uma avaliação mais razoável do horário de trabalho contínuo, do stress e da fadiga relacionados com cada modo de transporte.

4.   Necessidades de qualificação e formação – Mas também perspectivas de carreira

4.1   Os trabalhadores com um nível médio de qualificação compõem a maior parte do sector dos transportes e da logística. Em todos os países da UE, este grupo representa 58 % do total. A quota-parte de trabalhadores com baixo nível de qualificação situa-se nos 28 % em toda a UE. Nos novos Estados-Membros, o nível de qualificação é superior, tendo 81 % dos trabalhadores do sector dos transportes uma qualificação média e apenas 7 % uma qualificação baixa. Catorze por cento de todos os trabalhadores dos transportes e logística na UE possuem uma qualificação superior (2006). «Contudo, olhando para as transformações operadas entre 2000 e 2006, conclui-se que os requisitos em termos de qualificação têm vindo a tornar-se mais exigentes em todo o sector. Observou-se um declínio da percentagem de profissionais com baixo nível de qualificação em quase todas as profissões» (9).

4.2   A evolução tecnológica e um maior recurso às TIC em todos os sectores dos transportes implicam exigências de formação mais elevadas e, em especial, mais formação contínua. A aprendizagem ao longo da vida tem pouca relevância para a maior parte das profissões do sector dos transportes com nível educativo médio e baixo. Uma mais forte orientação para as necessidades dos clientes exige competências que normalmente não faziam parte da formação de base nas profissões do sector dos transportes que estavam mais orientadas para os aspectos técnicos. A segurança operacional e no trabalho exige uma formação contínua, assim como, por exemplo, uma condução ecológica.

4.3   A evolução demográfica e a estrutura etária pouco favorável que se verifica no sector dos transportes exigem, além de novas estratégias de organização do trabalho, um maior investimento em acções de formação contínua adaptadas e destinadas à população activa mais velha. Em especial, a profissão de motorista é uma ocupação que, muitas vezes, não permite ao profissional manter-se no activo até à idade da aposentação devido a problemas de saúde derivados das funções exercidas.

4.4   Ofertas de formação aliciantes e melhores perspectivas de carreira dentro do sector e/ou das empresas constituem medidas importantes para atrair os jovens para os sectores dos transportes. Interessa, por exemplo, promover a evolução da condição de marinheiro para o estatuto de oficial no sector dos transportes marítimos. Os motoristas de autocarros dos transportes públicos locais deveriam ter mais hipóteses de passar a exercer funções de gestão do tráfego ou mesmo assumir a chefia de uma equipa. A formação deverá ser encarada como um investimento para o futuro.

5.   Condições de trabalho – Os trabalhadores móveis dos transportes são … móveis

5.1   Um grande problema nos transportes directamente ligado ao estabelecimento do mercado interno dos transportes e à desregulamentação dos sectores dos transportes é, por definição, a elevada mobilidade dos trabalhadores móveis, o que propicia a deslocalização dos postos de trabalho no sector dos transportes, bem como práticas de dumping social a um nível mais elevado do que noutros sectores. Não foi prestada suficiente atenção à legislação social, nem às medidas sociais de acompanhamento ou às medidas de salvaguarda para evitar práticas de dumping social.

5.2   As empresas têm explorado intensamente a liberdade de estabelecimento e a abertura dos mercados dos transportes a nível, por exemplo, das vias navegáveis interiores, no transporte rodoviário ou no sector marítimo, para se estabelecerem em países da UE com custos de mão-de-obra mais baixos e contribuições mais baixas para a segurança social, além de vantagens fiscais, sem prestarem serviços nesses países. Há empresas que se servem das diferenças sociais e salariais entre países como vantagem competitiva, de que resultam dificuldades em matéria de rastreabilidade dos contratos de trabalho, em assegurar regimes de segurança social e em controlar e aplicar as regras em matéria de saúde e segurança. Para evitar o dumping social, é necessário garantir a aplicação do princípio do país de acolhimento, ou seja, a aplicação das condições sociais do país em que o serviço é fornecido.

5.3   O debate sobre transportes sustentáveis e internalização dos custos externos (ambientais) colocou na agenda a questão da razoabilidade dos preços dos transportes. Mas um preço justo dos transportes deveria incluir também um preço justo para empregos de qualidade no sector, pois é essencial para que haja:

serviços de qualidade;

segurança;

atractividade do sector dos transportes.

5.4   Deveria ser garantido um preço socialmente justo para empregos de qualidade no sector dos transportes através de medidas regulamentares e do diálogo social.

5.5   Quer se trate de transportes de passageiros públicos ou privados, os utentes também exigem serviços de qualidade, segurança durante os trajectos e protecção contra agressões e violência.

6.   Actividades da Comissão relativas ao aspecto social dos transportes

6.1   Na sua comunicação de 2006 intitulada Manter a Europa em Movimento, a Comissão enuncia um dos objectivos da política de transportes da UE: «No domínio social, a política da UE promove a melhoria da qualidade do emprego e melhores qualificações para os trabalhadores do sector europeu dos transportes» (10).

6.2   O estudo de avaliação sobre o desempenho da política comum dos transportes (11) e, em particular, a sua missão 1.6 («Aspectos sociais») enuncia um conjunto de iniciativas legislativas e documentos de índole política da Comissão no domínio social dos transportes. Estes baseiam-se, em parte, em negociações e iniciativas dos parceiros sociais europeus. Contudo, o relatório indica que é difícil proceder a uma avaliação devido à falta de dados ou porque as medidas acabaram de ser introduzidas, não tendo ainda produzido efeitos.

6.3   Pode concluir-se que:

6.3.1

os estudos de avaliação de impacto da Comissão dão prioridade à avaliação económica e não analisam suficientemente o impacto social das iniciativas da UE. É difícil inverter a situação após a introdução das alterações.

6.3.2

a Comissão deveria efectuar uma análise prévia cuidadosa das consequências sociais das suas propostas e propor medidas sociais de acompanhamento ao apresentar propostas para uma maior liberalização do mercado dos transportes.

6.3.3

faltam dados e informações fiáveis à escala europeia sobre o mercado de trabalho da indústria dos transportes e sobre as condições de trabalho reais nos diferentes sectores dos transportes; as informações estatísticas da Nomenclatura Estatística das Actividades Económicas Europeias (NACE) sobre o emprego são demasiado gerais para uma análise adequada dos diferentes sectores; os poucos estudos comparativos que existem sobre certos aspectos do sector ficam rapidamente desactualizados, pelo que seria necessário dispor de um observatório social para o sector dos transportes, que deveria ter um acesso sistemático aos dados das inspecções do trabalho dos Estados-Membros.

6.3.4

continuam a ser necessárias mais iniciativas legislativas para resolver os problemas existentes. É indispensável uma colaboração estreita com os diferentes Diálogos Sociais Europeus a nível sectorial e a Comissão deveria, em qualquer caso, avaliar e utilizar os conhecimentos do diálogo social e envolver os parceiros sociais numa fase precoce.

7.   Oportunidades de emprego, necessidades de formação e condições de trabalho – Os diferentes sectores dos transportes

7.1   Transportes rodoviários

7.1.1   Este sector enfrenta dificuldades crescentes de contratação de motoristas. Trata-se do maior desafio com que o sector dos transportes rodoviários se depara. É impossível ignorar o facto de que esta situação resulta das condições em que os motoristas e a indústria têm de operar. Na perspectiva dos motoristas, a elevada pressão laboral, os horários de trabalho incómodos e uma remuneração abaixo da média fazem dos transportes rodoviários um sector com fraca cotação social. Por outro lado, os operadores – especialmente as pequenas e médias empresas – têm de sobreviver num ambiente dominado por uma concorrência intra-sectorial feroz, a que se junta o impacto de factores externos como a crise económica e os elevados preços dos combustíveis.

7.1.2   A Directiva 2003/59/CE introduz uma formação obrigatória de base e contínua para motoristas profissionais. A directiva entrou em vigor para o transporte de passageiros em Setembro de 2009 e para o transporte de mercadorias em Setembro de 2010. O objectivo consiste não apenas em melhorar a segurança rodoviária, mas também em aumentar a qualidade da profissão. Trata-se de um bom exemplo de uma medida regulamentar que terá um impacto positivo adicional no estatuto dos motoristas, contribuindo, a prazo, para tornar a profissão mais aliciante, especialmente num contexto em que os grandes progressos tecnológicos que se verificam no sector exigem a contratação de motoristas profissionais muito competentes. Todavia, tudo depende agora do modo como os Estados-Membros aplicarem a directiva. Para tal, o desafio reside na oferta de um número suficiente de acções de formação de elevada qualidade, na qualidade das áreas temáticas da formação e no financiamento da formação de base e contínua. Em relação a este último aspecto, têm-se verificado situações em que os custos da formação inicial e/ou contínua incumbem ao motorista, o que, a médio prazo, só irá agravar ainda mais as dificuldades que o sector tem tido para contratar pessoal.

7.1.3   O sector dos transportes rodoviários possui legislação social própria. A enorme dificuldade está na falta de aplicação da regulamentação em matéria de horários de trabalho, condução e repouso, embora a legislação tenha sido melhorada e haja controlos mais frequentes. O mesmo é válido para a aplicação da Directiva relativa ao destacamento de trabalhadores aos profissionais dos transportes rodoviários que fornecem serviços de cabotagem.

7.1.4   Aplicação da legislação da UE em matéria de transportes rodoviários sem excepções a todo o sector, garantindo igualdade de condições em termos de concorrência leal, segurança rodoviária e saúde e segurança no trabalho;

7.1.5   Adopção, pelos responsáveis políticos da UE, de medidas que conduzam a uma verdadeira sustentabilidade desta indústria, promovendo incentivos que permitam aos operadores investir em novas frotas e tecnologias; reforço das capacidades dos Estados-Membros em matéria de aplicação da legislação relativa aos transportes rodoviários; adopção de medidas para elevar o nível de qualificação da profissão de motorista, o que contribuirá automaticamente para uma melhoria da imagem da profissão;

7.1.6   Melhoria das infra-estruturas rodoviárias, em especial, criação de zonas de estacionamento e áreas de serviço (infra-estruturas de repouso) seguras e a preços acessíveis. Parte das receitas da Eurovinheta poderia ser utilizada para melhorar a qualidade desses locais, o que seria benéfico tanto para as empresas (segurança das mercadorias) como para os motoristas profissionais;

7.1.7   Criação de uma Agência Europeia para a Segurança Rodoviária encarregada de salvaguardar as necessidades e exigências acima indicadas (12).

7.2   Transportes públicos urbanos

7.2.1   Na UE, há cerca de 1 milhão de trabalhadores ao serviço dos transportes públicos urbanos (dados da UITP). Em termos potenciais, as oportunidades de emprego são elevadas, dependendo das políticas de fomento dos transportes colectivos nos grandes aglomerados urbanos, municípios e zonas rurais.

7.2.2   Contudo, também os transportes públicos a nível local estão confrontados com problemas de contratação e de envelhecimento da mão-de-obra. Os trabalhadores dos transportes públicos são, na sua maioria, motoristas. Boas condições de trabalho, um melhor equilíbrio entre o trabalho e a vida privada e oportunidades de ascensão na carreira são alguns dos elementos que permitiriam atrair as mulheres e os jovens para o sector.

7.2.3   A Directiva 2003/59/CE, relativa à formação dos motoristas, aplica-se aos serviços de transportes públicos de autocarros.

7.2.4   Para além do financiamento, um dos maiores desafios para os transportes públicos prende-se com a prestação de serviços de qualidade. A relação entre a qualidade no trabalho (boas condições laborais) e a qualidade dos serviços é objecto do Diálogo Social Europeu a nível sectorial.

7.2.5   Acresce que a violência e as agressões constituem um grave problema para os transportes públicos de passageiros. Uma política de tolerância zero em relação à violência protege os passageiros e os trabalhadores e contribui para tornar os transportes públicos mais atractivos.

7.3   Transportes ferroviários

7.3.1   O sector ferroviário está a ser objecto de uma reestruturação contínua acompanhada de um aumento da produtividade e de uma diminuição do número de postos de trabalho, de que são exemplo o pessoal de vendas nas estações, os assistentes de bordo no transporte regional de passageiros e a redução no uso de vagões únicos, que exigem uma mão-de-obra intensiva, em proveito de comboios completos, menos exigentes em termos de mão-de-obra. As novas tecnologias como o Sistema Europeu de Gestão do Tráfego Ferroviário (ERTMS), ou os sistemas automáticos de acoplamento e posicionamento das carruagens/vagões, constituem tecnologias de racionalização do trabalho que irão afectar sobretudo o pessoal responsável pelo controlo do tráfego ou as profissões ligadas às operações de preparação das composições. Contrariamente à tendência actual, a promoção da produção de vagões únicos para o transporte de mercadorias constitui uma alternativa ambiental credível em relação ao transporte rodoviário e cria emprego (13).

7.3.2   Os operadores que entram agora pela primeira vez no mercado dos transportes ferroviários de mercadorias concentram-se em comboios completos com uma baixa intensidade de mão-de-obra, ao passo que o investimento no desenvolvimento de uma nova infra-estrutura e na melhoria das redes actuais vão criar emprego nos serviços de manutenção e de apoio para esta nova infra-estrutura.

7.3.3   Neste caso, as oportunidades de trabalho resultantes do aumento do volume de transportes ferroviários ou de uma transferência modal representarão benefícios não só para os maquinistas. No entanto, também o sector ferroviário se depara com problemas de contratação de pessoal, incluindo técnicos com formação académica (engenheiros), a par de uma estrutura demográfica desfavorável nas empresas.

7.3.4   Necessidades de formação

O aumento do tráfego transfronteiriço exige um reforço da formação em matéria de regulamentação nacional no domínio da segurança, bem como a aprendizagem de línguas estrangeiras por parte dos maquinistas e dos assistentes de bordo;

Um elevado nível de segurança e serviços de elevada qualidade devem ser assegurados através da certificação dos assistentes de bordo;

A introdução de novas tecnologias como o Sistema Europeu de Gestão do Tráfego Ferroviário (ERTMS) modifica o perfil dos maquinistas e dos técnicos de controlo do tráfego, na medida em que passam a necessitar de mais formação em tecnologias da informação;

A tendência do sector do transporte ferroviário de mercadorias para a detenção de múltiplas competências implica que se definam novas profissões e se desenvolvam cursos de formação em conformidade;

A reestruturação do sector está ligada a uma multiplicidade de actores e de novas interfaces. Será necessário mais pessoal no sector administrativo da gestão. O envelhecimento progressivo dos trabalhadores actualmente ao serviço dos transportes ferroviários e os crescentes problemas de contratação exigem o desenvolvimento de programas adequados de formação e aprendizagem ao longo da vida para diferentes grupos etários de trabalhadores.

7.3.5   Condições de trabalho

A actual pressão no sentido de um aumento da produtividade e a contenção de custos no sector resultam num declínio das condições de trabalho e na divisão da mão-de-obra em dois grupos. Com a abertura dos mercados e um maior número de serviços transfronteiriços, é necessário garantir a supervisão e aplicação das regras relativas aos horários de trabalho, de condução e de repouso, bem como relativas ao nível de qualificação dos maquinistas.

7.4   Transportes por vias navegáveis interiores

7.4.1   Este é considerado um modo de transporte ecológico, cujos potenciais não são ainda explorados na íntegra. Todavia, os níveis da água têm vindo a descer nos principais rios, o que representa um enorme desafio para o sector. Estão a ser investigados novos modelos de embarcações, bem como novos sistemas de entrega de mercadorias (em plataformas flutuantes).

7.4.2   Existe uma grave penúria de mão-de-obra neste sector (tanto no Reno como no Danúbio), afectando de igual modo o transporte de passageiros e de mercadorias. A geração mais jovem não é atraída para o sector devido à dificuldade em conciliar a vida profissional com a vida privada, aos horários de trabalho cansativos e às nada aliciantes condições de trabalho (em especial, longos períodos de ausência do lar). Falta um enquadramento legislativo/regulamentar efectivo, o que resulta na deslocalização destes serviços para países que se servem das diferenças fiscais entre países e das condições sociais e salariais para obter vantagens competitivas, como acontece, por exemplo, no caso da UE, em Malta e Chipre.

7.4.3   Estes problemas têm sido abordados no contexto do diálogo social e, a nível da UE, através de diversas iniciativas:

PLATINA = plataforma de acção do programa NAIADES – diferentes pacotes de trabalho abordam os chamados estrangulamentos na indústria;

Jobs & skills (empregos e competências) = pacote de trabalho da UE para tornar o sector mais aliciante;

EDINNA (educação para a navegação interior) = foi estabelecida uma plataforma europeia para todos os centros de formação profissional;

trabalho de harmonização dos perfis profissionais da UE (capitão e marinheiro) – esta constituirá a base formal para regras mínimas uniformizadas de formação em transportes por vias navegáveis interiores na UE;

trabalho em matéria de normas europeias de formação e certificação no domínio da navegação interior (STCIN).

7.4.4   A Comissão Central para a Navegação no Reno (CCNR) funciona como centro de saber em matéria de transportes por vias navegáveis interiores na Europa e, em colaboração com a Comissão Europeia, procede-se à harmonização do certificado de habilitações dos mestres fluviais através do sistema de reconhecimento mútuo. Refira-se, a título de exemplo, que a CCNR realiza duas vezes por ano, a pedido da Comissão Europeia, um estudo do mercado e publicação dos respectivos resultados, incluindo aspectos sociais e económicos, de modo a garantir a disponibilidade de informação fiável. Em cooperação com a CCNR, tem sido investigado e desenvolvido um sistema de identificação único que permitirá não apenas identificar, mas também controlar/registar os períodos de trabalho/repouso e tempos livres, e o grau de ensino/formação/certificação de qualquer trabalhador.

7.5   Transportes aéreos

7.5.1   Dar continuidade à aviação comercial enquanto serviço essencial na economia da UE é fundamental para apoiar a coesão social e o desenvolvimento regional. É possível reforçar a competitividade da indústria europeia dos transportes aéreos a nível internacional tirando partido de todas as vantagens do modelo social europeu. As empresas deverão garantir a correcta aplicação da legislação social da UE e dos Estados-Membros, bem como das convenções colectivas, para proteger o emprego e evitar o dumping social. Deverão ser empreendidos esforços especiais a nível do diálogo social nas empresas e à escala nacional, de modo a encontrar soluções para fazer face aos desafios com que hoje se depara a aviação civil.

7.5.2   É necessário oferecer segurança, intrínseca e extrínseca, eficiência e qualidade dos serviços, num espírito de obrigações de prestação de um serviço público e um ambiente de confiança, de responsabilidade e de cooperação entre empregadores e trabalhadores aos níveis apropriados. O objectivo fulcral deveria consistir no estabelecimento de uma indústria da aviação civil socialmente e ecologicamente sustentável.

7.5.3   O CESE pretende que seja considerada a implementação do Céu Único Europeu, incluindo os Blocos Funcionais do Espaço Aéreo e o programa SESAR, em que o factor humano e o diálogo social são decisivos para o sucesso do sector. Os Estados-Membros deveriam iniciar uma consulta efectiva junto dos parceiros sociais e de todas as outras partes interessadas com vista à adopção de medidas equilibradas para atingir estes objectivos e evitar a perda de postos de trabalho (14).

7.5.4   Todos os trabalhadores da aviação civil e, em especial, os responsáveis pelas operações de assistência em escala não deverão ser alvo de um tratamento menos favorável do que outros trabalhadores europeus. Essa não é a situação actual, por exemplo, nos casos em que são abertos concursos públicos, os trabalhadores deveriam, em todos os casos, beneficiar da protecção dos direitos de transferência.

7.5.5   A UE deve apoiar medidas de reconhecimento e validação das qualificações neste sector. Todos os intervenientes deverão actuar em conjunto, inclusivamente através de negociações, e investir na formação profissional e na qualificação. Mediante uma abordagem faseada e através da celebração de acordos, é possível alcançar os melhores níveis de formação na UE, permitindo a instituição de regras mais específicas a todos os outros níveis e a continuação do trabalho relativo à validação da formação profissional, podendo estar previsto o envolvimento de todas as outras partes interessadas (instituições europeias, autoridades nacionais, etc.).

7.5.6   Por último, à luz do acima exposto, é também crucial que a segurança aérea continue a ser a principal prioridade da acção legislativa na Europa. Em relação a esta, as instituições europeias e a AESA deverão consultar as partes interessadas para a consecução de regras sobre limitações de tempo de voo e de requisitos em matéria de repouso para a tripulação das aeronaves, baseados em princípios científicos e orientados para a segurança, que consigam eliminar a fadiga resultante de horários de trabalho sobrecarregados, da rotação dos turnos e dos fusos horários. A fadiga é um perigo para a segurança da aviação, porque faz baixar a atenção e o desempenho. O cansaço é uma resposta normal a muitas condições que são comuns às operações aéreas devido à privação do sono, ao trabalho por turnos e a longos períodos de trabalho.

7.6   Transportes marítimos

7.6.1   O principal desafio no sector dos transportes marítimos prende-se com o declínio a longo prazo que se verifica no emprego dos trabalhadores marítimos europeus, acompanhado da perda de saber-fazer marítimo europeu. Continua a haver um recurso cada vez maior aos pavilhões de conveniência e à contratação de tripulações de baixo custo provenientes de países em desenvolvimento. O comércio internacional efectuado por embarcações pertencentes a operadores europeus e por eles controladas é dominado, na quase totalidade, por tripulações sem residência na UE, com particular incidência no pessoal subalterno. A conferência do CESE sobre a atractividade das profissões marítimas (11/03/2010) analisou todos os motivos pelos quais as profissões marítimas não são aliciantes, destacou a necessidade de melhorar a formação do pessoal marítimo e promoveu a acção da UE neste domínio.

7.6.2   Também os transportes marítimos se caracterizam por uma mão-de-obra envelhecida. Os oficiais são retidos nos seus postos para além da idade normal de aposentação, sobretudo devido à actual escassez de profissionais graduados e ao facto de as empresas não estarem dispostas a facilitar aos trabalhadores marítimos a ascensão de postos subalternos à categoria de oficiais.

7.6.3   No entanto, um projecto desenvolvido no quadro do diálogo social europeu provou que o problema não é a escassez de estagiários dispostos a abraçar a carreira de marinheiro, mas a falta de oportunidades de emprego e de formação a bordo para jovens europeus. Há uma necessidade extrema de criar um ambiente propício à contratação e à formação de trabalhadores marítimos europeus e à progressão na carreira para passarem de marinheiros a oficiais. Tal poderá ser encorajado através de uma utilização mais judiciosa e rigorosa do quadro dos auxílios estatais, nomeadamente através do reforço do elo existente entre a concessão de ajudas públicas ou isenções fiscais, por um lado, e as garantias de emprego e obrigações de formação, por outro lado.

7.6.4   Os armadores estão a desviar as suas actividades para fora da Europa, investindo cada vez mais em centros de formação e academias navais em países terceiros, especialmente no Extremo Oriente. É preciso desenvolver uma rede de institutos de formação e ensino na Europa, para criar sistemas educativos no domínio da navegação que sejam reactivos e adaptáveis às necessidades emergentes em matéria de competências profissionais. Quanto a este último aspecto em particular, faz todo o sentido analisar modos de aprendizagem mais versáteis e combinados, tanto para efeitos da formação de base como para a aprendizagem ao longo da vida. O sistema de ensino e o mercado de trabalho deveriam dar resposta à necessidade de percursos de carreira mais flexíveis (transição do mar para terra firme e vice-versa), incluindo, além das competências específicas do sector, módulos de aprendizagem e formação nas áreas da administração de empresas, da gestão dos negócios e do comércio.

7.6.5   Quanto às condições de trabalho, os problemas actuais resultam da precariedade do emprego, do recurso crescente a agências de emprego e de relações laborais directas inexistentes ou remotas entre os trabalhadores marítimos e as empresas de navegação. É comum que as embarcações não ofereçam as condições de trabalho e de conforto que seriam exigíveis, incluindo condições de alojamento adequadas para mulheres e cadetes, bem como os necessários meios de comunicação. Além disso, os níveis inadequados de contratação de pessoal conduzem a um aumento da fadiga e comprometem uma operação segura da embarcação. Refiram-se ainda os problemas de pirataria e de violência contra trabalhadores marítimos que contribuíram para deteriorar a imagem do sector e a vontade de abraçar uma carreira ligada ao mar.

7.6.6   No transporte marítimo de cabotagem entre o continente europeu e as ilhas e entre as várias ilhas, o CESE preconiza um reforço das obrigações de serviço público, a fim de impulsionar a coesão económica, social e territorial, sem que a regulamentação sobre os auxílios estatais prejudique a prestação de serviços de interesse económico geral.

7.6.7   Entre as iniciativas que conviria implementar urgentemente citem-se:

examinar a viabilidade de uma nova iniciativa da UE que abranja o comércio no interior da União, sob a forma de uma proposta legislativa melhorada relativa às condições de operação das tripulações;

examinar a viabilidade de uma revisão do quadro dos auxílios estatais, colmatando lacunas no modo como os mesmos são concedidos, de modo a garantir que o dinheiro dos contribuintes da UE é gasto, essencialmente, para apoiar o emprego dos trabalhadores marítimos da UE, a sua formação e a inclusão no âmbito de aplicação de toda a legislação de protecção social que actualmente os exclui;

a ratificação da Convenção do Trabalho Marítimo da OIT de 2006 e a aplicação da mesma através de um controlo efectivo por parte do Estado do porto;

uma metodologia uniforme e coerente da UE para a recolha de dados sobre o emprego dos trabalhadores marítimos.

7.7   Sector portuário

7.7.1   Tal como no caso de outros sectores dos transportes, também a análise do emprego nas instalações portuárias enferma de uma falta de dados estatísticos e quantitativos. Reconhecendo esse problema, a DG MOVE encomendou recentemente um estudo sobre o emprego em portos. Contudo, tal poderá não ser suficiente para colmatar as lacunas de modo sistemático e tanto o Eurostat como os Estados-Membros deveriam ser convidados a contribuir para este exercício. A nível dos portos, um problema de fundo prende-se com a própria definição de trabalhador portuário. Historicamente, um trabalhador portuário era um estivador que usava essencialmente a sua força física para carregar e descarregar mercadorias, mas a utilização de contentores e as melhorias tecnológicas conduziram a uma diversificação do trabalho nos portos que tornou mais difícil a formulação de uma definição. A situação tornou-se ainda mais complicada pelo facto de cada vez mais técnicos de logística trabalharem no recinto do porto, mas com condições de trabalho muitas vezes inteiramente diferentes. O CESE considera que uma liberalização obrigatória dos serviços portuários seria simplesmente inaceitável.

7.7.2   Necessidades de formação: as disposições e os requisitos em matéria de formação para trabalhadores portuários variam muito no espaço europeu, havendo países que desenvolveram sistemas completos de formação e outros com uma oferta de formação muito limitada. A maior parte das grandes empresas desenvolveu os seus próprios regimes de formação e a maioria das grandes instalações portuárias possui os seus próprios centros de formação. As pequenas empresas e os pequenos portos, porém, enfermam de uma falta de formação adequada, com consequências muito negativas em matéria de segurança. Um grande desafio para a formação ministrada nos portos prende-se com a necessidade de adaptar os regimes de formação existentes aos rápidos avanços tecnológicos, ou até de se lhes antecipar.

7.7.3   Convinha ponderar a criação de um quadro comum para a formação (identificação dos elementos e módulos que deverão constar de cada programa de formação e permitir aos países com regimes mais limitados melhorar os seus programas de formação). De modo geral, pode dizer-se que é necessária mais formação para elevar o grau de competitividade dos portos da UE e torná-los locais de trabalho mais seguros. Outro elemento consiste na ligação entre formação e emprego de maior qualidade: os trabalhadores portuários são profissionais e as disposições em matéria de formação deveriam ser concebidas de maneira a garantir um percurso profissional e a permitir a aquisição de competências múltiplas por parte dos trabalhadores. A formação em operações portuárias deveria ser gerida em conjunto pelos parceiros sociais e as autoridades públicas, como já acontece em muitos portos.

7.7.4   Condições de trabalho: a segurança continua a ser uma questão particularmente crítica nos portos, igualmente no que se refere aos contentores. É necessário melhorar a participação de sinistros, incluindo também a melhoria dos dados sobre os sinistros, bem como um relatório detalhado dos mesmos (causas, locais, etc.). A comunicação das ocorrências deveria ser feita de modo uniforme em todo o espaço europeu (seria importante chegar a um acordo quanto à definição de sinistro, etc.).

7.7.5   Além disso, outro problema é a falta de aplicação da legislação em matéria de saúde e segurança no local de trabalho. Presentemente, não existe na UE legislação que trate especificamente da saúde e segurança nas instalações portuárias, aplicando-se a directiva-quadro geral. Conviria avaliar cuidadosamente a necessidade de apresentar regulamentação sectorial específica a este respeito. Acresce que a melhoria das condições de trabalho nos portos passa pelo recurso a melhores práticas de diálogo social a nível local, nacional e europeu. No contexto particular das mutações industriais (por exemplo, privatização dos portos), este diálogo deveria conduzir a soluções negociadas, de modo a prevenir consequências adversas a nível das condições de trabalho.

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Ver também o considerando 17 associado aos artigos 4.o, n.o 5, e 4.o, n.o 6, do Regulamento (CE) n.o 1370/2007 relativo aos serviços públicos de transporte de passageiros por via férrea e estrada.

(2)  Statistical Pocketbook (brochura estatística) 2010 da DG MOVE.

(3)  Statistical Pocketbooks (brochuras estatísticas) 2006, 2007/2008, 2009 e 2010 da DG TREN.

(4)  O estudo encomendado pela DG EMPL sobre «Investir no futuro dos empregos e das competências» analisa alguns cenários.

(5)  Estudo TRANSVISION baseado em cenários (evolução no sector dos transportes até 2050) sem estimativas sobre o desenvolvimento do emprego. http://ec.europa.eu/transport/strategies/studies/doc/future_of_transport/2009_02_transvisions_report.pdf.

(6)  Terceiro e quarto inquéritos sobre as condições de trabalho na Europa efectuados pela Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho; análises sectoriais de 2002 e 2009; http://www.eurofound.europa.eu/surveys/index.htm.

(7)  Ver nota 2.

(8)  Estudo encomendado pela DG EMPL sobre «Investir no futuro dos empregos e das competências – Cenários, implicações e opções previsíveis».

(9)  Ver nota 5.

(10)  Comunicação COM(2006) 314 - Manter a Europa em Movimento, página 3.

(11)  Avaliação da política comum dos transportes (PCT) de 2000 a 2008. http://ec.europa.eu/transport/strategies/studies/strategies_en.htm.

(12)  Ver também o parecer do CESE TEN/430 sobre Rumo a um espaço europeu de segurança rodoviária.

(13)  Ver também o parecer do CESE TEN/356 sobre as Imposições aos veículos pesados de mercadorias.

(14)  JO C 132 de 3.5.2011, p 94.


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/31


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Desenvolvimento sustentável da política europeia de transportes e o planeamento das RTE-T» (parecer exploratório solicitado pela futura Presidência polaca)

2011/C 248/05

Relator: Jacek KRAWCZYK

Em 30 de Novembro de 2010, a futura Presidência polaca da União Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre o

Desenvolvimento sustentável da política europeia de transportes e o planeamento das RTE-T

(parecer exploratório).

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, que emitiu parecer em 24 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião de 15 e 16 de Junho de 2011 de (sessão de 15 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 154 votos a favor, com 7 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE sempre apoiou o programa das redes transeuropeias de transporte, e reafirma esse apoio uma vez mais. No entanto, salienta que as necessidades da Europa alargada em matéria de infra-estruturas de transporte são maiores e que é necessário reflectir sobre como adaptar a política e os instrumentos existentes aos futuros desafios.

1.2

Para o Comité, o objectivo final é a formulação de uma política de transporte cuja aplicação gere coesão social e económica, conjugando as ambições do crescimento económico em termos de um aumento dos transportes, (segundo a Comissão, o tráfego vai aumentar cerca de 20 % entre 2005 e 2020), de coesão, da criação de empregos e de desenvolvimento sustentável com recursos financeiros limitados.

1.3

Na prática, porém, o Comité não pode senão concluir que dos 92 projectos seleccionados no âmbito do convite à apresentação de propostas de 2007, abrangidos pela revisão intercalar do programa de trabalho plurianual para o período de 2007-2013 e representando cerca de dois terços do orçamento total da RTE-T (5,3 mil milhões de euros, de um total de 8 mil milhões), só um pequeno número se situa nos novos Estados-Membros.

1.4

O Comité gostaria de salientar que se o objectivo da UE é criar um mercado único dos transportes verdadeiramente integrado na Europa e levar por diante a política de coesão, é necessário modificar radicalmente a forma como as redes são seleccionadas. Os Estados-Membros deveriam propor redes para a RTE-T com base em critérios claros definidos pela Comissão.

1.5

Atendendo à actual dependência do sector dos transportes em relação aos combustíveis fósseis, o Comité recomenda que a futura política de transportes europeia procure realizar os quatro objectivos principais seguintes:

promoção de modos de transporte com baixos níveis de emissões de carbono;

eficiência energética;

segurança, complexidade e independência da oferta; e

redução do congestionamento do tráfego.

1.6

Neste contexto, o Comité aconselha que sejam seleccionados os combustíveis renováveis melhores e mais ecológicos (que reduzem as emissões de CO2 dos escapes), que se dê preferência à co-modalidade e que se introduza o conceito de internalização dos custos externos para todos os modos de transporte. O CESE julga preocupantes as restrições financeiras aos projectos da RTE-T a nível europeu, que poderão não dar incentivos suficientes a que os Estados-Membros participem nestes projectos. Por isso, o CESE remete para os seus pareceres anteriores (1), em que defende que é necessário explorar novas formas de financiamento público.

1.7

O CESE recomenda igualmente que se recorra cuidadosa e selectivamente às parcerias público-privadas (PPP) para assegurar o financiamento da RTE-T, tomando em consideração o facto de os Estados-Membros terem níveis de experiência diferentes no que respeita à utilização das PPP e reconhecendo a necessidade de mobilizar os instrumentos financeiros da UE (por exemplo, os Fundos Estruturais e o Fundo de Coesão, as RTE, o BEI) como parte de uma estratégia de financiamento coerente que reúna os financiamentos da União Europeia e dos sectores público e privado nacionais. A fim de permitir que os poderes públicos tenham a liberdade de escolher entre participar em PPP ou não, o CESE recorda a sua posição de que a definição de PPP nos procedimentos do Eurostat sobre a dívida pública deve ser revista (2).

1.8

O Comité recomenda que a revisão das orientações relativas às RTE-T contemple também os estrangulamentos e as lacunas, a fim de se incentivar o desenvolvimento equilibrado das infra-estruturas de transportes em todas as regiões da União, especialmente na parte oriental, tendo em vista a coesão económica e social. Assim, o CESE acolhe o Livro Branco da Comissão sobre o Roteiro do espaço único europeu dos transportes – Rumo a um sistema de transportes competitivo e económico em recursos, que dedica especial atenção a este aspecto específico e tira conclusões para medidas concretas a tomar nos próximos anos.

1.9

Deve prestar-se especial atenção à chamada política de vizinhança, isto é, às ligações entre as partes oriental e meridional da União Europeia, concentrando a acção principalmente na rede, e não em projectos de infra-estruturas isolados.

1.10

O Comité sugere que sejam assinados «contratos-programa» entre a União Europeia e cada Estado-Membro com base numa RTE-T redefinida, estabelecendo compromissos mútuos no que respeita o financiamento e os prazos de conclusão. O Comité entende que a sociedade civil deve ser envolvida no processo de preparação de «contratos-programa», a fim de melhorar a eficiência da futura execução dos projectos aprovados.

1.11

O Comité entende que o desenvolvimento sustentável da política de transporte da UE pode ser grandemente beneficiado através do diálogo social e/ou do diálogo entre as partes interessadas sobre os corredores transeuropeus de transporte já em funcionamento ou em construção. O CESE apela para que esses diálogos sejam reactivados.

1.12

O Comité recomenda que se esclareça o que se entende por sustentabilidade. Na sua opinião, sustentabilidade inclui – para além do contributo fundamental para o crescimento económico – não só objectivos ambientais como a protecção do clima, a poluição sonora e atmosférica e a conservação de recursos, mas também questões sociais relacionadas com os transportes, tais como os direitos dos trabalhadores, as condições de trabalho e o acesso aos transportes públicos a um preço comportável para todos os cidadãos, incluindo os idosos e as pessoas com deficiência, tendo em conta o seu direito à mobilidade bem como a um acesso equitativo a infra-estruturas físicas e a informação. Também deve ter em conta a política de vizinhança no que diz respeito ao desenvolvimento da infra-estrutura de transporte.

1.13

O Comité considera que uma estratégia baseada na inovação, em incentivos e em infra-estruturas (estratégia dos três «I») é a forma mais eficaz, em termos de custos, de alcançar o desenvolvimento sustentável.

1.14

No que respeita ao desenvolvimento sustentável da política de transporte da União Europeia e do planeamento da RTE-T, o Comité recomenda que sejam examinadas as possibilidades de eliminar os actuais entraves injustificáveis aos modos de transporte, de modo a permitir a utilização plena da sua capacidade. Importa encorajar um melhor planeamento da mobilidade de forma a promover comportamentos compatíveis com o desenvolvimento sustentável. O desafio consiste em influenciar a mobilidade e a intensidade do transporte nas nossas economias.

1.15

O Comité apoia sem reservas a abordagem proposta pela Comissão no Livro Branco no que diz respeito a uma maior coordenação a nível europeu. A fim de alcançar os ambiciosos objectivos definidos no domínio do desenvolvimento das RTE-T, sujeitas a sérias limitações financeiras, será necessária uma política europeia em matéria de infra-estruturas muito mais integrada e devidamente coordenada, desde o planeamento estratégico até à execução final de cada projecto. É chegado o momento de começar a mostrar resultados.

2.   Introdução

2.1

No quadro da futura Presidência polaca do Conselho da União Europeia, que decorrerá no segundo semestre de 2011, foi solicitado ao CESE que elaborasse, entre outras coisas, um parecer exploratório sobre o Desenvolvimento sustentável da política europeia de transportes e o planeamento das RTE-T.

2.2

Dada a importância do tema e a necessidade de garantir o direito fundamental à mobilidade, e considerando que o sector dos transportes gera 10 % da riqueza da União Europeia em termos de PIB e assegura mais de 10 milhões de empregos, e que, simultaneamente, o crescimento constante da mobilidade impõe graves condicionamentos aos sistemas de transportes, dando origem a congestionamentos, a acidentes e a poluição, o CESE aceitou, com grande compreensão, o pedido da futura Presidência polaca.

2.3

A Comissão Europeia preparou um novo Livro Branco sobre os transportes em que descreve os seus planos para a próxima década e prevê a existência de um sistema de transportes diferente em 2020, com um espaço europeu único dos transportes, mercados abertos, infra-estruturas mais ecológicas e tecnologias com baixos níveis de emissões de carbono.

2.4

Um elemento importante do novo sistema de transportes é a RTE-T. É por esta razão que se deve dedicar muito mais atenção à revisão das orientações da UE relativas à RTE-T.

2.5

Como parte da revisão das orientações relativas à RTE-T, a Comissão propõe a criação daquilo que denomina uma rede de base, sobrepondo-se a redes de transportes básicas coerentes e amplas, e abrangendo nós e ligações estratégicas.

2.6

A Comissão sustenta que esta espinha dorsal de um sistema de transportes europeu integrado ajudaria a resolver problemas sistemáticos ao nível do planeamento da RTE-T. Torna-se urgente resolver esses problemas devido ao aumento do tráfego entre Estados-Membros, que deverá duplicar até 2020.

2.7

Para a União Europeia, o desafio consiste em formular uma política cuja aplicação permita conjugar as metas do crescimento económico em termos de aumento dos transportes, coesão, criação de empregos e desenvolvimento sustentável.

2.8

Para superar este desafio, será útil examinar as razões pelas quais os projectos seleccionados no passado não foram tão bem sucedidos como se esperava.

2.9

Em termos gerais, o Comité, tendo em conta o papel fundamental da RTE-T na formulação de uma política de transportes eficiente e na criação de uma rede coerente de infra-estruturas na União Europeia, concorda com a Comissão quanto à pertinência das seguintes razões:

actualmente, a RTE-T consiste na justaposição de troços nacionais mal interligados; os troços transfronteiriços e os estrangulamentos graves constituem lacunas na rede de infra-estruturas;

a inexistência de redes coerentes interoperáveis em todos os Estados-Membros da União Europeia, especialmente no sector ferroviário e no que respeita à utilização de sistemas de transportes inteligentes em todos os modos de transporte;

a tradição que existe nos Estados-Membros de utilizar regras e normas de funcionamento baseadas em tradições e legislação de longa data, que prejudicam a eficácia dos enormes investimentos em infra-estruturas. O Comité defende que estas regras e normas devem ser consentâneas com um elevado nível de segurança e de qualidade;

a inexistência de integração intermodal – por exemplo, a ausência de redes físicas integradas e de pontos de transbordo intermodal que funcionem bem significa que as capacidades para operações de transportes intermodais são insuficientes;

as discrepâncias que subsistem no desenvolvimento das infra-estruturas de transportes entre os vários Estados-Membros da União Europeia;

a inexistência de acessibilidade suficiente aos transportes em algumas regiões europeias.

2.10

A fim de ter em conta as deficiências do passado, as principais questões a considerar para se poder beneficiar de uma RTE-T funcional, interoperável e intermodal são claras, nomeadamente criar uma rede de elevada qualidade em todos os Estados-Membros, prestando especial atenção aos troços transfronteiriços, estrangulamentos e nós, facilitando as operações intermodais através da integração de todos os modos de transportes e promovendo o bom funcionamento através da harmonização das regras de exploração, que devem assegurar um elevado nível de segurança e qualidade.

2.11

Uma abordagem deste tipo permitirá também ir ao encontro dos objectivos mais gerais da política de transportes e superar os desafios que a Europa enfrenta no que respeita à eficiência dos recursos e ao clima.

3.   Observações na generalidade

3.1

O CESE congratula-se com o facto de a Comissão estar a preparar uma nova política em matéria de redes transeuropeias de transportes susceptível de contribuir para a coesão social e económica entre todas as regiões do território da União Europeia, incluindo as periféricas, coesão essa que só será possível alcançar havendo uma infra-estrutura de transportes eficiente que estabeleça a ligação entre elas.

3.2

Tendo isto presente, o Comité está convencido de que o desenvolvimento e a realização progressiva de uma rede transeuropeia como infra-estrutura de base necessária aos fluxos comerciais e à livre circulação de pessoas no mercado interno continuam a ser um objectivo político vital para a União Europeia, cuja realização contribuirá para a aproximação das partes ocidental e oriental da União e para a criação do futuro Espaço Único Europeu dos Transportes.

3.3

O último documento oficial publicado sobre a execução do programa RTE-T foi a revisão intercalar da carteira de projectos do programa plurianual RTE-T, publicada em Outubro de 2010. O referido documento contém uma avaliação de 92 projectos que representam aproximadamente dois terços do orçamento total da RTE-T (5,3 mil milhões de euros de um total de 8 mil milhões de euros). Atendendo à localização desses projectos, o Comité lamenta que apenas uma parcela muito pequena se localize na parte oriental da União.

3.4

Um dos motivos é a falta de recursos financeiros adequados nos novos Estados-Membros. Um outro é a diferença entre as condições a cumprir para obter financiamento ao abrigo do Fundo de Coesão e do Fundo Social Europeu em comparação com o financiamento das RTE-T. O Comité recomenda que seja efectuada uma análise do atraso no desenvolvimento da infra-estrutura nos novos Estados-Membros, assim como do baixo nível de candidaturas e de execução do financiamento das RTE-T nesses países.

3.5

O Comité salienta que, se o objectivo da União Europeia é criar um verdadeiro mercado único integrado dos transportes na Europa, é necessária uma mudança radical na forma como os projectos de redes relativos à RTE-T são seleccionados. O desafio consiste em influenciar a mobilidade e a intensidade do transporte nas nossas economias.

3.6

O Comité está ciente de que, no quadro da Estratégia Europa 2020, o desenvolvimento da RTE-T tem de visar a criação de um sistema de transportes eficiente em termos de utilização de recursos, construído com base na inovação e que tenha em conta os desafios das alterações climáticas, da sustentabilidade social e do ambiente.

3.7

A esse propósito, o Comité recorda que nos últimos anos elaborou uma série de pareceres sobre estes temas, tais como os pareceres sobre o Livro Verde — Revisão da política relativa à RTE-T — Para uma melhor integração da rede transeuropeia de transportes ao serviço da política comum de transportes  (3), a Comunicação da Comissão – Um futuro sustentável para os transportes: rumo a um sistema integrado, baseado na tecnologia e de fácil utilização e Pontos de partida para a política europeia de transportes após 2010  (4), Tornar o transporte marítimo e o transporte por via navegável interior mais ecológicos  (5), Transportes rodoviários em 2020: Expectativas da sociedade civil organizada  (6), a Proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho relativo à rede ferroviária europeia para um transporte de mercadorias competitivo  (7), a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que visa facilitar a aplicação transfronteiras das regras de segurança rodoviária  (8), a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Estratégia de internalização dos custos externos  (9), a Comunicação da Comissão sobre a promoção do transporte por vias navegáveis interiores NAIADES – Programa de acção europeu integrado para o transporte por vias navegáveis interiores  (10), e a Política Europeia de Transportes no quadro da Estratégia de Lisboa pós-2010 e da Estratégia de Desenvolvimento Sustentável  (11).

3.8

No seu parecer sobre o Livro Verde — Revisão da política relativa à RTE-T — Para uma melhor integração da rede transeuropeia de transportes ao serviço da política comum de transportes, o Comité afirma: «Quanto ao problema do aumento das emissões de CO2 e às lacunas nas infra-estruturas e da organização do transporte de mercadorias, o CESE partilha da tese da Comissão segundo a qual haverá que buscar verdadeiras soluções co-modais capazes de gerar sinergias de que o utilizador possa beneficiar».

3.9

No seu parecer sobre A Política Europeia de Transportes no quadro da Estratégia de Lisboa pós-2010 e da Estratégia de Desenvolvimento Sustentável, o CESE considera que, devido à dependência do sector dos transportes em relação aos combustíveis fósseis e ao facto de estes serem limitados, a futura política europeia de transportes deve assegurar a competitividade do sector como parte da Estratégia Europa 2020 e procurar realizar quatro objectivos principais:

a promoção de modos de transporte com baixo teor de carbono,

a eficiência energética,

a segurança e a independência do aprovisionamento, e

a redução do congestionamento do tráfego.

3.10

É nítido que a Europa se encontra perante um dilema: por um lado, quer criar um mercado único integrado dos transportes para os 27 Estados-Membros, o que implica o investimento de montantes enormes em infra-estruturas, porque as infra-estruturas são a base da solidariedade; por outro lado, existem condicionamentos, nomeadamente limitações orçamentais e metas para a redução das emissões de gases com efeito de estufa e de outras substâncias poluentes.

3.11

O CESE já apresentou sugestões nos vários pareceres supracitados com vista a superar o referido dilema, sugestões essas que também têm um efeito directo e palpável nos custos: seleccionar os combustíveis renováveis melhores e mais ecológicos, que permitem reduzir substancialmente as emissões de CO2 dos escapes, dar preferência à co-modalidade, introduzir o conceito de internalização dos custos externos relativamente a todos os modos de transporte e, por último, mas não menos importante, introduzir outros instrumentos de financiamento, incluindo o uso selectivo e judicioso de parcerias sector público/sector privado, para financiar a RTE-T. Para tal há que ter em conta que os Estados-Membros têm níveis de experiência diferentes no que respeita à utilização das PPP e reconhecer a necessidade de mobilizar os instrumentos financeiros da UE (por exemplo, os fundos estruturais e o Fundo de Coesão, as RTE, o BEI) como parte de uma estratégia de financiamento coerente que reúna os financiamentos da União Europeia e dos sectores público e privado nacionais. A fim de permitir que os poderes públicos tenham a liberdade de escolher entre participar em PPP ou não, o CESE recorda a sua posição de que a definição de PPP nos procedimentos do Eurostat sobre a dívida pública deve ser revista (12).

3.12

O CESE julga preocupantes as restrições financeiras aos projectos da RTE-T a nível europeu, que poderão não dar incentivos suficientes a que os Estados-Membros participem nestes projectos. Por isso, o CESE remete para os seus pareceres anteriores (13), em que defende que é necessário explorar novas formas de financiamento público.

3.13

No que respeita às emissões de CO2, embora os transportes representem uma parcela significativa (24 %) das emissões de CO2 da União Europeia, o Comité deseja salientar que se deve dedicar especial atenção à dimensão urbana dos transportes. As cidades representam mais de 70 % da população da União Europeia, sendo responsáveis por um quarto de todas as emissões de CO2 do sector dos transportes, e continuam a crescer. A fim de tornar os transportes mais sustentáveis, as cidades devem nitidamente assumir a sua responsabilidade e ser apoiadas aos níveis regional, nacional e internacional. Por outro lado, o transporte de longo curso de mercadorias na UE é, em grande medida, efectuado em importantes corredores co-modais. Por conseguinte, tornar esses corredores de transporte mais eficazes e sustentáveis deve ser uma prioridade. Importa encorajar uma melhor organização da mobilidade de forma a promover comportamentos compatíveis com o desenvolvimento sustentável.

3.14

Apesar de a UE ter problemas ao nível do financiamento e de as novas infra-estruturas não serem frequentemente bem aceites a nível local, e apesar do impacto ambiental dos investimentos em causa, são necessárias novas infra-estruturas para colmatar as lacunas e suprimir os estrangulamentos na rede existente. Nos novos Estados-Membros, sobretudo, continua a haver numerosos estrangulamentos e lacunas.

3.15

O Comité está convencido de que, para além disso, e a fim de melhorar a co-modalidade, as actividades e os fundos devem concentrar-se de um modo geral em nós do sistema de transportes tais como as plataformas de transbordo, porque esses nós têm vindo progressivamente a tornar-se estrangulamentos, pelo que merecem especial atenção, tal como os corredores que os ligam. As tecnologias e os sistemas de transportes inteligentes podem constituir uma grande ajuda, sobretudo nas cidades. Um dos desafios consiste em utilizá-los e integrá-los nos diferentes modos de transporte.

3.16

A revisão das orientações relativas à RTE-T deve também ter em conta os estrangulamentos e os hiatos, a fim de incentivar o desenvolvimento equilibrado e sustentável das infra-estruturas de transportes em todas as partes da União, especialmente na parte oriental, onde continua a verificar-se uma escassez de ligações ferroviárias e rodoviárias de elevada qualidade e onde continuam a ser necessárias soluções co-modais para uma série de estrangulamentos importantes nas ligações e nos nós existentes.

3.17

Embora concorde com a ideia da Comissão de se definir uma estratégia de base para os corredores transfronteiriços mais importantes da rede, o Comité também defende que se devem continuar a disponibilizar fundos da UE para o desenvolvimento de uma rede abrangente no futuro – em particular nos Estados-Membros elegíveis para o efeito do Fundo de Coesão – em condições semelhantes às previstas nas actuais Perspectivas Financeiras.

3.18

Isto coaduna-se com a ideia de que não é possível alcançar a coesão social e económica sem se construírem todos os elementos que faltam para completar a RTE-T e sem melhorar de forma sustentável os elementos das actuais e futuras redes que se encontram em mau estado.

3.19

No que toca à segurança, o Comité chama a atenção sobretudo para a importância de melhorar a concepção das infra-estruturas, incluindo os túneis.

3.20

O CESE estima que há que colocar maior ênfase na transparência na execução de projectos RTE-T, não só durante as consultas ou selecção, mas também durante as fases de realização do trabalho. Embora reconheça que a responsabilidade principal neste contexto cabe aos governos nacionais, o CESE encoraja a Comissão a ser mais incisiva no seu diálogo com os parceiros nacionais, impondo níveis de transparência mais elevados na execução do projecto e a publicação periódica de mais informação sobre a situação física e financeira dos diferentes projectos individuais.

4.   Observações na especialidade

4.1

O Comité entende que o desenvolvimento sustentável da política de transporte da UE pode ser grandemente beneficiado através do diálogo social e/ou do diálogo entre as partes interessadas sobre os corredores transeuropeus de transporte já em funcionamento ou em construção. O CESE apela para que esses diálogos sejam reactivados.

4.2

No contexto de uma nova RTE-T, o Comité apela para que seja tida explicitamente em conta a chamada política de vizinhança, isto é, as ligações para leste e para sul da União Europeia, embora a Comissão e os Estados-Membros devam concentrar-se principalmente na rede e não em projectos de infra-estruturas isolados. Isto contribuirá também para a promoção da solidariedade entre os Estados-Membros.

4.3

Quanto ao futuro planeamento da RTE-T, no seu parecer sobre o Livro Verde — Revisão da política relativa à RTE-T — Para uma melhor integração da rede transeuropeia de transportes ao serviço da política comum de transportes  (14), o Comité diz subscrever a abordagem da Comissão referida no Livro Verde, que se baseia no princípio de que cada modo de transporte deve ser utilizado de acordo com as suas vantagens comparativas em cadeias de transporte co-modal e de que cada modo desempenha, portanto, um papel importante na consecução dos objectivos da Comunidade em matéria de alterações climáticas. O objectivo deve ser a transição para a cadeia de transporte mais respeitadora do ambiente.

4.4

Relativamente a este aspecto, o Comité deseja recordar o conceito de «corredores verdes», introduzido pela Comissão no Plano de Acção para a Logística do Transporte de Mercadorias, em 2007. Este conceito visa criar soluções logísticas sustentáveis baseadas na co-modalidade, com reduções documentadas do impacto no ambiente e no clima, níveis elevados de segurança e qualidade e uma forte eficiência, através de plataformas de demonstração ao longo dos corredores internacionais com fluxos concentrados de mercadorias. O Comité deseja articular este conceito com os corredores co-modais de alto nível da rede de base da RTE-T, que possivelmente seriam adequados para esse tipo de desenvolvimento através da cooperação entre parceiros dos sectores público e privado.

4.5

A Comissão afirma que o actual sistema devia ser radicalmente alterado. Os novos Estados-Membros não beneficiam de financiamento por parte da UE da mesma maneira que os antigos Estados-Membros. Para criar condições equitativas, terão de ser encontradas novas formas de financiamento.

4.6

O Comité duvida que os argumentos utilizados pela Comissão para justificar a selecção dos projectos a financiar sejam válidos. A Comissão sustenta que «estes projectos ajudam-nos a prepararmo-nos para as futuras prioridades do sector dos transportes: nomeadamente, tornar os transportes mais ecológicos, ligar as partes oriental e ocidental da Europa, e prestar apoio a parcerias entre os sectores público e privado». Podemos, pelo menos, questionar o melhoramento das ligações entre as partes oriental e ocidental, e o CESE também gostaria que fossem tidas em conta possibilidades de financiamento que não as PPP.

4.7

A ideia da Comissão de nomear coordenadores europeus para reforçar a cooperação internacional, juntamente com a incidência no apoio a longo prazo aos projectos de infra-estruturas mais importantes e a criação de uma agência de execução, deveria ter contribuído para uma maior transparência e para o desenvolvimento efectivo da RTE-T. Mas tanto a análise dos coordenadores europeus como os resultados da revisão intercalar da carteira de projectos do programa plurianual confirmam que os progressos alcançados até à data têm sido fragmentados devido à falta de cooperação e coordenação entre os Estados-Membros.

4.8

O Comité sugere que, no contexto de uma RTE-T redefinida, sejam assinados «contratos-programa» entre a UE e cada Estado-Membro estabelecendo compromissos mútuos no que respeita ao financiamento e aos prazos de conclusão. Esses contratos-programa devem abranger não só as infra-estruturas da RTE-T, mas também as infra-estruturas secundárias que os Estados se comprometam a concluir a fim de garantir o bom funcionamento das redes principais e servir melhor a população. O Comité entende que a sociedade civil deve ser envolvida no processo de preparação de «contratos-programa», a fim de melhorar a eficiência da futura execução dos projectos aprovados.

4.9

Na sua revisão intercalar da carteira de projectos do programa plurianual RTE-T para o período de 2007-2013, a Comissão conclui que dos 92 projectos que constituem a carteira 21 são projectos transfronteiriços, sendo o transporte ferroviário o que recebe mais apoio, seguido do transporte por via navegável interior, enquanto, no seu documento sobre a nova política para a rede transeuropeia de transportes, a Comissão conclui que, de um modo geral, os projectos relativos aos transportes rodoviários e aéreos e, em menor grau, os projectos relativos aos transportes marítimos têm tido um desempenho bastante positivo, em comparação com os projectos relativos aos transportes ferroviários e por vias navegáveis interiores.

4.10

O Comité aconselha a Comissão a esclarecer o que se entende por sustentabilidade. Para poder determinar se um projecto proposto satisfaz os requisitos de «sustentabilidade», é necessário compreender claramente qual é o conteúdo deste conceito, de preferência em termos quantitativos.

4.11

Tendo isto presente, o Comité gostaria de salientar que a sustentabilidade abrange (para além do seu contributo fundamental para o crescimento económico) não só objectivos ambientais tais como a protecção do clima, a poluição sonora e atmosférica e a conservação de recursos, mas também questões sociais no domínio dos transportes, como, por exemplo, os direitos dos trabalhadores, as condições de trabalho, o acesso aos transportes públicos em geral a um preço comportável, especialmente para os idosos e as pessoas com deficiência, tendo também em conta o seu acesso a infra-estruturas físicas e a informação.

4.12

O Comité gostaria de declarar que apoia uma estratégia baseada na inovação, em incentivos e em infra-estruturas – a chamada estratégia dos três «I» – como sendo a forma mais eficaz em termos de custos de alcançar o desenvolvimento sustentável:

inovação: desenvolver e implementar ainda mais medidas técnicas e práticas de funcionamento «na fonte», a fim de reduzir o impacto ambiental dos transportes;

incentivos: promover uma rápida introdução das melhores tecnologias e práticas disponíveis por parte de todos os modos de transporte;

infra-estruturas: garantir a fluidez do tráfego, bem como a sua segurança e eficiência, conjugando a utilização das infra-estruturas existentes com um investimento adequado em novas infra-estruturas, a fim de eliminar estrangulamentos e hiatos.

4.13

O CESE observa que uma forma de conseguir o desenvolvimento sustentável da UE é através de uma abordagem integrada das redes transeuropeias (RTE). Está convicto de que a aplicação de uma abordagem integrada das redes transeuropeias permite acelerar a realização das infra-estruturas correspondentes previstas e reduzir os seus custos de construção em relação aos que seria necessário suportar caso não se tivesse em conta o efeito das sinergias possíveis entre as diferentes redes (15).

4.14

Perante as crises económicas na Europa e o orçamento limitado disponível para a RTE-T, o Comité considera que é necessário assegurar a cooperação e coordenação entre os diferentes instrumentos de financiamento da RTE-T, nomeadamente para encontrar novas fontes de financiamento e novos mecanismos de crédito.

4.15

O Comité apoia sem reservas a abordagem proposta pela Comissão no Livro Branco no que diz respeito a mais coordenação a nível europeu. A fim de alcançar os ambiciosos objectivos definidos para as RTE-T, sujeitas a sérias limitações financeiras, será necessária uma política europeia em matéria de infra-estruturas muito mais integrada e devidamente coordenada, desde o planeamento estratégico até à execução final de cada projecto.

4.16

O CESE considera que o Livro Branco foi publicado num momento muito oportuno: deverá permitir que seja formulada uma mensagem política vigorosa no contexto da revisão do orçamento da União Europeia a realizar proximamente. O financiamento futuro do desenvolvimento das infra-estruturas de transportes da União Europeia deve ir ao encontro das ambições realistas associadas à criação de um espaço único europeu dos transportes dentro do prazo mais curto possível.

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  JO C 48 de 15.2.2011, pp. 57-64 (Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Relançamento da economia: situação e iniciativas práticas) e JO C 132, de 3.5.2011, pp. 99-107 (Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece um espaço ferroviário europeu único e a Comunicação da Comissão relativa ao estabelecimento de um espaço ferroviário europeu único).

(2)  JO C 51 de 17.2.2011, pp. 59-66 (Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Como mobilizar o investimento privado e público com vista ao relançamento da economia e à mudança estrutural a longo prazo: desenvolver parcerias público-privadas).

(3)  JO C 318 de 23.12.2009, p. 101.

(4)  JO C 255 de 22.9.2010, p. 110.

(5)  JO C 277 de 17.11.2009, p. 20.

(6)  JO C 277 de 17.11.2009, p. 25.

(7)  JO C 27 de 3.2.2009, p. 41.

(8)  JO C 77 de 31.3.2009, p. 70.

(9)  JO C 317 de 23.12.2009, p. 80.

(10)  JO C 318 de 23.12.2006, p. 218.

(11)  JO C 354 de 28.12.2010, p. 23.

(12)  JO C 51 de 17.2.2011, pp. 59-66 (Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre Como mobilizar o investimento privado e público com vista ao relançamento da economia e à mudança estrutural a longo prazo: desenvolver parcerias público-privadas).

(13)  JO C 48 de 15.2.2011, pp. 57-64 (Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o Relançamento da economia: situação e iniciativas práticas) e JO C 132, de 3.5.2011, pp. 99-107 (Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece um espaço ferroviário europeu único e a Comunicação da Comissão relativa ao estabelecimento de um espaço ferroviário europeu único).

(14)  JO C 318 de 23.12.2009, p. 101.

(15)  JO C 204 de 9.8.2008, p. 25 (Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Comunicação da Comissão – Redes transeuropeias: Para uma abordagem integrada).


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/37


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Contributo da sociedade civil para a Parceria Oriental»

2011/C 248/06

Relator: Gintaras MORKIS

Por carta de 15 de Novembro de 2010, o Conselho da União Europeia, solicitou ao Comité Económico e Social Europeu, em conformidade com o artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, que elaborasse um parecer exploratório sobre o

Contributo da sociedade civil para a Parceria Oriental.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Relações Externas que emitiu parecer em 25 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária (sessão de 16 de Junho), o Comité adoptou, por 133 votos a favor, 1 voto contra e 1 abstenção, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e Recomendações

1.1   O Comité Económico e Social Europeu (CESE) atribui grande importância à Parceria Oriental enquanto necessidade estratégica e investimento político da UE, do qual os cidadãos da União Europeia e os seus países parceiros poderão beneficiar no futuro. Os acontecimentos ocorridos na região do Mediterrâneo provaram que a sociedade civil continua a ter um papel essencial na transição para a democracia, na reforma constitucional e no desenvolvimento das instituições. Por conseguinte, para que este processo seja coroado de êxito, torna-se essencial apoiar e ter devidamente em conta o contributo da sociedade civil para a Parceria Oriental.

1.2   O CESE saúda os progressos alcançados na aplicação da iniciativa da Parceria Oriental, que foi lançada oficialmente em Maio de 2009. Todos os países da Parceria Oriental melhoraram e intensificaram as suas relações com a UE através do diálogo sobre os acordos de associação, as zonas de comércio livre, a facilitação das disposições aplicáveis aos vistos e a cooperação no domínio da segurança do aprovisionamento de energia e outras questões (infelizmente, na sequência dos acontecimentos ocorridos após as eleições presidenciais de Dezembro de 2010, houve um grande retrocesso nas relações da Bielorrússia com a UE).

1.3   Contributo da sociedade civil para o segmento multilateral da Parceria Oriental

1.3.1   Participação nas plataformas temáticas intergovernamentais da Parceria Oriental

1.3.1.1   O CESE foi convidado a participar em três das quatro plataformas temáticas intergovernamentais da Parceria Oriental, o que lhe permite expressar as opiniões da sociedade civil nestas plataformas. Contudo, o CESE gostaria que a Comissão o convidasse a participar e a colaborar na Plataforma Temática 3 sobre a segurança do aprovisionamento energético, na medida em que dispõe de conhecimentos sobre o tema.

1.3.1.2   Considera que representantes dos grupos de trabalho relevantes do Fórum da Sociedade Civil no âmbito da Parceria Oriental deveriam poder participar nas reuniões das plataformas temáticas intergovernamentais.

1.3.2   Fórum da sociedade civil no âmbito da Parceria Oriental

1.3.2.1   O Comité também acolhe favoravelmente a criação, em Novembro de 2009, do Fórum da Sociedade Civil no âmbito da Parceria Oriental. O Comité considera que as plataformas nacionais do Fórum da Sociedade Civil no âmbito da Parceria Oriental constituem um instrumento perfeitamente adequado à concretização da Parceria Oriental nos países parceiros mediante a inclusão da sociedade civil, mas lamenta o facto de as entidades patronais, os sindicatos e outras organizações socioeconómicas (agricultores, consumidores) não serem sequer (ou pouco) envolvidos a nível nacional nas actividades das plataformas nacionais.

1.3.2.2   Uma vez que os parceiros sociais ainda não estão devidamente representados no Fórum da Sociedade Civil no âmbito da Parceria Oriental, o Comité apela a que se reveja o regulamento interno do Fórum, em particular as disposições relativas ao procedimento de selecção, de modo a permitir uma participação mais ampla dos representantes dos trabalhadores e dos empregadores, bem como dos representantes de outros grupos de interesse, tanto da UE como dos países parceiros.

1.3.2.3   O Comité insta a que se reveja a concepção do Fórum com vista a uma configuração das suas actividades mais eficiente e a uma utilização mais eficaz dos fundos disponíveis. A ênfase poderia passar a ser colocada no desenvolvimento de medidas continuadas e orientadas para projectos (no contexto dos grupos de trabalho do Fórum e das plataformas nacionais).

1.3.2.4   O Comité propõe aumentar o número de representantes da UE com o objectivo de estimular o intercâmbio de experiências e promover o alinhamento com os valores europeus. O Comité Económico e Social Europeu, com os seus 344 membros que representam as organização da sociedade civil da UE, reúne todas as condições para assumir um papel activo na concretização dos objectivos da Parceria Oriental no âmbito do Fórum da Sociedade Civil, desde que o regulamento do Fórum da Sociedade Civil preveja uma participação mais ampla e permanente quer no Fórum quer no Comité de Direcção.

1.3.2.5   Tendo em conta o crescente impacto do Fórum da Sociedade Civil e, em especial, a acção das plataformas nacionais, o Comité está disposto a contribuir para o melhor funcionamento do Fórum. Considera também que se tornou necessário criar um secretariado, sobretudo no contexto do trabalho do Comité de Direcção.

1.3.2.6   Se o Fórum não for capaz de eliminar as falhas estruturais no seu funcionamento, será necessário, na opinião do CESE, prever outras formas de mobilização dos agentes socioeconómicos dos países da Parceria Oriental para a concretização dos objectivos da Parceria Oriental.

1.4   Consolidação da sociedade civil nos países parceiros e contributo para o segmento multilateral da Parceria Oriental

1.4.1   O Comité acompanha com toda a atenção os acontecimentos no Sul do Mediterrâneo. Está convencido de que a UE deveria apoiar o processo de democratização e estabilização naquela região. Ao mesmo tempo, o CESE apela a uma actuação equilibrada e programada a longo prazo face aos vizinhos a Sul e a Leste da UE, inclusivamente no que se refere aos auxílios financeiros às reformas políticas e económicas, à adaptação às normas da UE e ao fortalecimento da sociedade civil.

1.4.2   No entender do Comité, um financiamento insuficiente poderá eventualmente frustrar a expectativa de a Parceria Oriental se vir a tornar um instrumento importante para promover o alinhamento com os valores europeus. Nesse sentido, o CESE acolhe favoravelmente a proposta da Comissão de revisão da Política Europeia de Vizinhança (PEV), mas lamenta que a comunicação sobre «Uma nova estratégia para uma vizinhança em mutação» não insista na criação de mecanismos para a consulta da sociedade civil nos países abrangidos pela PEV e não faça qualquer referência à própria instituição da sociedade civil da UE nem ao papel que o CESE pode desempenhar neste processo.

1.4.3   O CESE acolheria com agrado uma proposta que visasse a criação de fundo europeu para a democracia e de um mecanismo de apoio à sociedade civil Contudo, insta a Comissão a tirar ensinamentos da experiência do Instrumento para a Sociedade Civil nos Balcãs Ocidentais para que possam ser evitados alguns problemas.

1.4.4   O Comité considera que a cooperação com organizações independentes dos países parceiros se reveste de extrema importância. No entanto, também se tornou necessário cooperar com as organizações existentes dependentes dos governos, apoiando simultaneamente a criação de sindicatos e de organizações de empregadores independentes capazes de participar num verdadeiro diálogo social, de disseminar as ideias de democracia e de direitos humanos e laborais, e de perseguir os outros objectivos da iniciativa da Parceria Oriental.

1.4.5   O CESE considera que reforçar o diálogo entre os governos e a sociedade civil a nível nacional é condição prévia para a democratização das sociedades da Parceria Oriental e para o seu alinhamento com os valores europeus. É particularmente necessário reforçar o papel da sociedade civil na elaboração e na aplicação dos planos de acção da PEV.

1.4.6   O Comité defende a criação de um mecanismo de consulta da sociedade civil em todos os países da Parceria Oriental, tais como conselhos económicos e sociais ou organizações similares, tendo em conta as especificidades de cada país parceiro. Em alguns países da Parceria Oriental, as plataformas nacionais já existentes do Fórum da Sociedade Civil no âmbito da Parceria Oriental poderiam constituir uma boa base para este processo. O CESE está disposto a partilhar a sua experiência com a sociedade civil nos países da Parceria Oriental.

1.4.7   O Comité é de opinião que, nos acordos de associação que são negociados entre a UE e os países parceiros, deveriam ser incorporadas disposições sobre a constituição de instâncias comuns da sociedade civil, encarregadas de seguir de perto a aplicação dos referidos acordos.

1.4.8   Tendo em conta as negociações e as conclusões do Acordo de Comércio Livre Global e Aprofundado (ACLGA), o comité considera que a sociedade civil tanto da UE como dos países parceiros deve participar numa avaliação do impacto na sustentabilidade a realizar antes das negociações, e que os mecanismos da sociedade civil devem ser incluídos no futuro ACLGA a fim de monitorizar a aplicação das disposições em matéria de desenvolvimento sustentável.

1.5   O Comité acalenta a esperança de que o ano de 2011 se venha a revestir de importância decisiva para a Parceria Oriental, uma vez que a Presidência húngara e, em especial, a Presidência polaca do Conselho deveriam dar a esta iniciativa novos impulsos.

1.6   O Comité dirige estas recomendações aos chefes de Estado e de Governo e espera que a Cimeira da Parceria Oriental, a realizar na Polónia no Outono de 2011, faça jus à contribuição que a sociedade civil prestou nos últimos dois anos, bem como aos progressos alcançados, mas procedendo igualmente nessa ocasião a uma avaliação crítica dos aspectos menos positivos, relacionados com a fraco envolvimento dos parceiros sociais e às deficiências no funcionamento do Fórum da Sociedade Civil.

2.   Contributo da sociedade civil para o segmento multilateral da Parceria Oriental

2.1   Para a União Europeia, é importantíssimo que haja estabilidade nos países vizinhos a Leste, bem como boa governação, previsibilidade política e crescimento das suas economias. Por sua vez, os países da Europa Oriental e do Sul do Cáucaso estão também muito interessados em estreitar e dinamizar as relações com a UE. Nestes países, o principal factor que contribui para um alinhamento com a UE reside nos valores e na convergência da legislação e das regulamentações. A Parceria Oriental deve, portanto, ser considerada um investimento político por parte da União Europeia que beneficiará os cidadãos da UE e promoverá o progresso em geral nos países parceiros.

2.2   Participação nas plataformas temáticas intergovernamentais da Parceria Oriental

2.2.1   Na comunicação da Comissão Europeia sobre a Parceria Oriental, chamou-se a atenção para a necessidade de atribuir um papel especial à participação da sociedade civil. O CESE foi convidado a participar em três das quatro plataformas temáticas intergovernamentais da Parceria Oriental (Plataforma 1 – Democracia, boa governação e estabilidade; Plataforma 2 – Integração económica e convergência com a políticas sectoriais da UE; e Plataforma 4 – Contactos entre as populações), o que lhe permite expressar as opiniões da sociedade civil nestas plataformas. No entanto, o Comité, não obstante o seu empenho nas questões relacionadas com a energia, não foi convidado a participar na importante Plataforma Temática dedicada à «Segurança energética».

2.2.2   O CESE considera que as plataformas progrediram na concretização dos objectivos da iniciativa da Parceria Oriental, embora lamente que a participação da sociedade civil seja limitada. Considera que representantes dos grupos de trabalho relevantes do Fórum da Sociedade Civil no âmbito da Parceria Oriental deveriam poder participar nas reuniões das plataformas intergovernamentais. Tal permitiria à sociedade civil manter-se informada acerca das actividades das plataformas e, assim, elaborar recomendações mais concretas e praticáveis. O Comité insta a Comissão a iniciar negociações com os países parceiros tendo em vista a introdução de alterações ao regulamento das plataformas intergovernamentais para que o Fórum passe a ter um estatuto de participação permanente nessas Plataformas.

2.2.3   O Comité considera que as plataformas poderiam estar relacionadas com projectos que se revestem de interesse para a sociedade civil. Para ilustrar uma forma de inclusão das associações económicas na Parceria Oriental, cite-se o exemplo do Programa EAST-INVEST, executado em conjunto pelo Eurochambres e por parceiros dos países da Parceria Oriental. Trata-se de um novo projecto trienal orientado para a Parceria Oriental, que tem por objectivo facilitar as relações comerciais e impulsionar o desenvolvimento económico e o investimento na região dos países vizinhos a Leste. Participaram no projecto 21 câmaras de Estados-Membros da UE, nomeadamente na concretização dos objectivos da Plataforma Intergovernamental 2 dedicada à integração económica e à convergência com a política da UE. O projecto está dotado de um orçamento total de 8,75 milhões de euros, dos quais 7 milhões provêem da Comissão Europeia. Resta esperar que, através deste projecto, seja possível alcançar os objectivos visados e que o mesmo preste um importante contributo para a concretização dos objectivos da Parceria Oriental. Este exemplo pode ser utilizado para projectos concretos entre a UE e organizações de países parceiros noutros sectores, como os agricultores, os consumidores, as organizações de defesa do ambiente, etc.

2.2.4   O Comité considera também que uma participação sólida das empresas na iniciativa emblemática das PME no quadro da Plataforma 2, assim como a realização de reuniões organizadas por empresas para empresas, poderiam resultar na organização de um Fórum Empresarial no âmbito da Parceria Oriental, que aumentaria o apoio das organizações empresariais às negociações dos ACLGA.

2.2.5   O Comité assinala que o diálogo social não está incluído nas actividades de nenhuma plataforma, embora faça parte do acervo da União Europeia.

2.3   Fórum da sociedade civil no âmbito da Parceria Oriental

2.3.1   A proposta da Comissão de constituição de um Fórum da sociedade civil colheu grande aceitação.

2.3.2   Todavia, a maior parte dos membros do Fórum da Sociedade Civil no âmbito da Parceria Oriental é constituída por grupos de reflexão e organizações não governamentais que não representam toda a variedade da sociedade civil. São muito poucas as organizações dos países parceiros que representam os interesses dos empresários e dos trabalhadores, assim como dos parceiros sociais, ou seja, das organizações económicas e dos sindicatos ou de outros grupos de interesse socioeconómicos (agricultores, consumidores, meios científicos e académicos, etc.).

2.3.3   No Comité de Direcção, que integra 17 membros, os parceiros sociais dos países parceiros nem sequer estão representados.

2.3.4   Ao longo de ano e meio, foram criadas em todos os países parceiros plataformas nacionais do Fórum da Sociedade Civil, nas quais eram supostas reunir-se as organizações da sociedade civil de cada um dos países para a concretização dos objectivos da Parceria Oriental.

2.3.5   O Comité saúda expressamente a criação de plataformas nacionais do Fórum da Sociedade Civil no âmbito da Parceria Oriental e o contributo que estas deram para o processo da Parceria Oriental. Alguns exemplos merecem destaque:

A Plataforma bielorrussa criou «Roteiros no âmbito da Parceria Oriental para a Bielorrússia» em Julho de 2010;

A Plataforma azerbaijana realizou diferentes manifestações sobre temas com interesse para o Governo e a sociedade civil, por exemplo, a adesão do Azerbaijão à OMC, as fontes energéticas alternativas e renováveis e a eficiência energética, bem como a situação das pequenas e médias empresas;

O Conselho Nacional de Participação, que serviu de Plataforma Nacional moldava antes da constituição formal dessa plataforma, poderia participar em todas as reuniões do gabinete de ministros da República da Moldávia e aí defender a posição do Conselho de Participação em relação às decisões governamentais sobre medidas políticas planeadas.

Mas o Comité lamenta o facto de os parceiros sociais, também nestas plataformas, não serem sequer (ou pouco) envolvidos a nível nacional nas actividades das plataformas nacionais, o que os impossibilita de abordar o tema dos direitos sociais.

2.3.6   O Comité identificou vários problemas no modo de funcionamento do Fórum e propôs colaborar com o Comité de Direcção para melhorar a forma de trabalhar do Fórum.

2.3.7   A actual composição do Fórum não corresponde à ideia da Comissão, exposta no seu documento de base, de que a participação no Fórum da Sociedade Civil no âmbito da Parceria Oriental deveria estar aberta a todas as organizações da sociedade civil, ou seja, organizações de cidadãos, sindicatos, associações de empregadores, associações profissionais, organizações não governamentais, grupos de reflexão, fundações sem fins lucrativos, organizações/redes nacionais e internacionais da sociedade civil, bem como a outras partes interessadas da sociedade civil dos países da Parceria Oriental, mas também dos Estados-Membros da UE e de organizações/redes internacionais. Também seria possibilitada a participação de organizações da sociedade civil provenientes de países terceiros. O CESE e as instituições congéneres dos países terceiros deveriam desempenhar um importante papel, sobretudo em relação às empresas, ao emprego e às questões laborais e sociais. As principais organizações dos empregadores e trabalhadores expressaram a sua preocupação face a esta situação numa carta, datada de 19 de Maio de 2010, endereçada aos membros do Fórum. Altos representantes do CESE e da Comissão Europeia reuniram-se para debater a questão da composição do Fórum e o facto de alguns dos objectivos da Parceria Oriental, em particular os relacionados com a integração económica, só poderem ser realizados se todos os parceiros relevantes forem envolvidos nas actividades do Fórum.

2.3.8   O Comité considera também que importa reforçar em grande escala o papel que as organizações da sociedade civil da UE têm no Fórum. A sua representação é limitada não só devido ao número relativamente pequeno de participantes da UE no Fórum (das 230 organizações convidadas a participar no Fórum da Sociedade Civil, que teve lugar em Berlim, apenas 80 eram oriundas da UE) e no Comité de Direcção (7 em 17 representantes). A participação da sociedade civil da UE é, portanto limitada do ponto de vista territorial. A maioria das organizações provêm de Estados membros situados nas proximidades das fronteiras a Leste. São muito poucas as organizações da sociedade civil da UE que levam a cabo projectos ou programas especiais destinados aos parceiros da Parceria Oriental.

2.3.9   O Comité está disposto a fazer uso das capacidades, experiências, conhecimentos e contactos de que dispõe, como contributo para corrigir as dificuldades existentes no Fórum da Sociedade Civil. Os 344 membros do Comité representam um vasto potencial que pode ser utilizado para dar maior destaque à causa da Parceria Oriental nas instituições da UE, em todos os Estados-Membros e em todos os sectores da sociedade civil, incluindo, em particular, os parceiros sociais.

2.3.10   Para poder desempenhar este papel, é necessário que o Comité esteja devidamente representado nas estruturas do Fórum da Sociedade Civil. O actual regulamento não prevê uma participação permanente e eficiente do CESE no Fórum da Sociedade Civil, pelo que deverá ser alterado a fim de permitir uma maior e permanente participação do CESE no Fórum.

2.3.10.1   Reforçar a participação do CESE e de outros agentes socioeconómicos poderá também contribuir para que haja uma participação mais equilibrada nos grupos de trabalho do Fórum da Sociedade Civil. Actualmente, uma grande parte das organizações participa nos grupos de trabalho dedicados aos temas « Democracia, boa governação e estabilidade» e «Contactos entre populações». Os grupos de trabalho que se debruçam sobre os temas «Integração económica e convergência com as políticas da UE» e «Ambiente, alterações climáticas e segurança energética» não têm número suficiente de participantes, o que não reflecte a importância que estas questões revestem para a aplicação bem-sucedida da Parceria Oriental. O Comité considera que, também aqui, pode dar um contributo.

2.3.10.2   O CESE defende que o trabalho do Fórum dever-se-ia orientar mais para projectos. Alguns grupos de trabalho, como o dedicado ao tema «Integração económica e convergência com as políticas da UE», tentaram desenvolver projectos específicos, mas sem sucesso devido à falta de financiamento e ao número insuficiente de parceiros. O CESE poderá usar o seu potencial e as suas capacidades administrativas para desenvolver projectos concretos. Estudos e projectos elaborados conjuntamente podem também ajudar a reforçar o contributo da sociedade civil para a Parceria Oriental.

2.3.10.3   O CESE propõe que o Comité de Direcção seja eleito por um período de dois anos a fim de melhorar a sua eficiência e deixar-lhe tempo suficiente para a implementação de projectos e ideias. Além disso, o Comité considera imprescindível criar um secretariado para o Comité de Direcção.

2.3.11   Se o Fórum não for capaz de eliminar as falhas no seu funcionamento, o CESE considera necessário prever outras formas de mobilização dos agentes socioeconómicos para a consecução dos objectivos da Parceria Oriental.

3.   Consolidação da sociedade civil nos países parceiros e contributo para o segmento multilateral da Parceria Oriental

3.1   Os mais recentes acontecimentos no Norte de África e no Próximo Oriente mostraram claramente que os regimes também fracassam quando, apesar de desempenharem um papel importante para a segurança e a estabilidade na região e são apoiados financeiramente pelas democracias ocidentais, negligenciam a situação económica e social da população, desrespeitando os direitos e liberdades das pessoas. À comunidade mundial apenas resta olhar com preocupação para o futuro político da região e fazer suposições sobre as consequências globais. Os acontecimentos mais recentes nesta região devem ser analisados criteriosamente, sendo necessário avaliar as lições daí tiradas e chegar a conclusões.

3.1.1   Os países parceiros do Leste europeu diferem muito em termos da sua situação política e das condições em que se encontram as organizações da sociedade civil. Os países apresentam um estado de desenvolvimento diferente em termos de democracia, direitos humanos e liberdades cívicas. O seu nível económico e social, e mesmo a sua orientação geopolítica, não são uniformes. Igualmente díspares são os esforços destes países no tocante à sua aproximação à UE e aos objectivos que norteiam a sua participação na Parceria Oriental. A sociedade civil também não dispõe em todos estes países parceiros das mesmas hipóteses de participação na Parceria Oriental. Assim, os países parceiros em causa deverão primeiramente ser examinados antes de se poder determinar que progressos terão feito e em que medida a sociedade civil é envolvida nesta iniciativa, ou que oportunidades lhe são oferecidas para o efeito.

3.2   De todos os países parceiros do Leste, foram sobretudo a Ucrânia, a República da Moldávia e a Geórgia que souberam tirar partido do potencial da Parceria Oriental em determinados sectores. Caso, porém, aumente ainda mais a distância que separa estes três países dos restantes Estados parceiros da Europa Oriental, poderá ficar comprometida a sustentabilidade da Parceria Oriental enquanto projecto regional desenvolvido no Leste da Europa. Neste contexto, a Comissão Europeia e a sociedade civil nos restantes três países deverão prestar um importante contributo de modo a que o fosso não se alargue ainda mais. Os maiores problemas constatam-se sem dúvida na Bielorrússia, mas é especialmente por causa da situação política interna deste país que a sua integração na Parceria Oriental não deveria ser posta em causa.

3.3   O Comité reconhece que, no âmbito da Parceria Oriental, a realização de missões em domínios como a segurança regional, a estabilidade, a integração económica, a protecção ambiental, a segurança do aprovisionamento energético, os contactos entre as populações, etc. só é concebível se, nos países parceiros, forem respeitados os direitos humanos e a liberdade de associação, e houver um genuíno diálogo social e civil. Por essa razão, é especialmente necessário dedicar maior atenção a estas questões no caso da Bielorrússia, embora, numa perspectiva global, também se verifiquem problemas neste domínio noutros países parceiros.

3.4   Não se pode negar que, nos países da Parceria Oriental, existe uma falta de verdadeiro diálogo social e de mecanismos de consulta à sociedade civil. Acontece que, muitas vezes, apenas podem intervir, enquanto parceiras no diálogo social e civil, as organizações criadas e mantidas pelas autoridades governamentais. O Comité compreende que a cooperação com organizações independentes dos países parceiros se reveste de extrema importância. No entanto, também se tornou necessário cooperar com as organizações existentes reconhecidas e, por vezes, dependentes dos governos, apoiando-as nos seus esforços de progresso e, simultaneamente, criando sindicatos e organizações de empregadores independentes (se ainda não existirem) capazes de participar num verdadeiro diálogo social, de disseminar as ideias de democracia e de direitos humanos e laborais, e de perseguir os outros objectivos da iniciativa da Parceria Oriental.

3.5   Por um lado, um envolvimento mais activo da sociedade civil poderia impulsionar a concretização dos objectivos da Parceria Oriental nos países parceiros e, por outro, a Parceria Oriental e a participação da sociedade civil poderiam contribuir para o seu fortalecimento. Na concepção de programas para reforçar a capacidade administrativa, o sector público deveria ser esclarecido sobre o significado da sociedade civil e dos parceiros sociais e inteirar-se das experiências da UE e dos seus Estados-Membros a nível do envolvimento da sociedade civil no processo decisório. As experiências das organizações nos países da Europa Central afiguram-se extremamente úteis para o fortalecimento das capacidades das organizações estatais e não estatais dos países da Parceria Oriental. O CESE está também disposto a pôr os seus conhecimentos ao serviço dos governos dos países da Parceria Oriental no sentido de criar um quadro legislativo propício ao diálogo social e civil.

3.6   Assim, o CESE congratula-se com a proposta da Comissão de revisão da Política Europeia de Vizinhança, mas lamenta que a comunicação sobre «Uma nova estratégia para uma vizinhança em mutação» não insista na criação de mecanismos para a consulta da sociedade civil nos países abrangidos pela PEV e não faça qualquer referência à própria instituição da sociedade civil da UE nem ao papel que o CESE pode desempenhar neste processo.

3.7   A proposta que visa a criação de um fundo europeu para a democracia e de um mecanismo de apoio à sociedade civil é também acolhida favoravelmente pelo CESE, pois permitirá, indubitavelmente, reforçar a participação da sociedade civil na vida política. Simultaneamente, o CESE insta a Comissão a tirar ensinamentos da experiência do Instrumento para a Sociedade Civil e de outras formas de apoio à sociedade civil no quadro da assistência de pré-adesão. O CESE, no seu contributo para a Revisão do apoio da UE à sociedade civil nos Balcãs Ocidentais e na Turquia, que a Comissão está a elaborar, salientou que é necessário prestar mais atenção aos parceiros sociais, em particular aos sindicatos, que, em alguns casos, foram quase completamente ignorados. Concretamente, isto significa centrar-se mais não só em projectos, mas também no desenvolvimento institucional e na sustentabilidade das organizações em geral.

3.8   De modo a determinar o grau de integração das organizações da sociedade civil na Parceria Oriental e o nível da sua participação nas conquistas do diálogo com os governos nacionais, o CESE solicitou a essas organizações o preenchimento de um breve questionário. Os resultados deste inquérito revelam uma falta de diálogo entre os governos nacionais e as organizações da sociedade civil, inclusivamente no que se refere aos acordos de associação e à aplicação dos planos de acção da PEV. Os governos consultam as organizações demasiado pouco sobre questões ligadas à Parceria Oriental. Neste domínio, as principais fontes de informação são as delegações da Comissão Europeia nos países em causa e os meios da comunicação social. Como é natural, a situação varia de país para país. O país em que o diálogo entre as autoridades e a sociedade civil está mais avançado é a República da Moldávia e a situação mais crítica a este respeito verifica-se na Bielorrússia. O Comité defende a criação de um mecanismo de consulta da sociedade civil em todos os países da Parceria Oriental, tais como conselhos económicos e sociais ou organizações similares. As plataformas nacionais já existentes do Fórum da Sociedade Civil no âmbito da Parceria Oriental poderiam ser envolvidas neste processo. O CESE está disposto a apoiar a sociedade civil nos países parceiros na criação de instituições de diálogo civil contribuindo com a experiência adquirida com os recentes alargamentos.

3.9   O Comité é de opinião que, nos acordos de associação que são negociados entre a UE e os países parceiros (estão em curso negociações com todos os países parceiros excepto a Bielorrússia), deveriam ser incorporadas disposições sobre a constituição de instâncias comuns da sociedade civil, para a sociedade civil ter a possibilidade de seguir de perto a aplicação dos referidos acordos. Estas instâncias podem ser consultadas pelos Conselhos de Associação criados pelos Acordos de Associação ou elaborar recomendações por iniciativa própria. O ideal seria que participassem, na qualidade de observadores, nas reuniões dos Conselhos de Associação. Deveriam ser compostos por representantes da sociedade civil e incluir parceiros socioeconómicos e ONG. O CESE deveria estar devidamente representado.

3.10   A Comissão Europeia já iniciou negociações sobre um Acordo de Comércio Livre Global e Aprofundado (ACLGA) com a Ucrânia e estão previstas negociações com a Geórgia, a Arménia e a República da Moldávia, logo que estejam reunidas condições para tal. Este acordo poderá ter um impacto significativo no ambiente empresarial e nas condições sociais dos países parceiros. Por conseguinte, o diálogo permanente com a sociedade civil durante o processo de negociação reveste-se da maior importância.

3.11   Quanto às negociações e conclusões do ACLGA, o Comité considera que a sociedade civil deveria participar numa avaliação de impacto na sustentabilidade a realizar antes das negociações. Tal contribuiria para uma maior sensibilização do público quanto aos benefícios do ACLGA. Além disso, os mecanismos da sociedade civil deveriam ser incluídos no futuro ACLGA para possibilitar a monitorização das disposições relativas ao desenvolvimento sustentável.

3.12   Quase dois anos após a introdução da Parceria Oriental continua por esclarecer como esta poderá completar a iniciativa regional para a Sinergia do Mar Negro (2007), porque em ambas as iniciativas participam praticamente os mesmos países. Ao nível da sociedade civil, poder-se-ia estabelecer uma cooperação entre o Fórum da Sociedade Civil no âmbito da Parceria Oriental e o Fórum de ONG do Mar Negro.

3.13   A contribuição do Comité Económico e Social Europeu para a Parceria Oriental

3.13.1   O CESE atribui grande importância à Parceria Oriental enquanto necessidade estratégica e investimento político da UE, do qual beneficiar os cidadãos da União Europeia e os seus países parceiros poderão beneficiar no futuro.

3.13.2   Há já cinco anos que o CESE se ocupa da situação da sociedade civil em todos os países parceiros, sobretudo no tocante a aspectos como liberdade de associação, disposições de notificação, regras e procedimentos fiscais, liberdade de expressão e funcionamento das consultas tripartidas. Em relação aos seguintes temas, o Comité elaborou pareceres pertinentes, tendo formulado todo um conjunto de recomendações: «Um novo enquadramento para as relações da UE com os seus vizinhos orientais e meridionais» (1); «A sociedade civil na Bielorrússia» (2); «As relações entre a União Europeia e a República da Moldávia: Qual o papel da sociedade civil?» (3); «Relações UE-Ucrânia: Um novo papel dinâmico para a sociedade civil» (4); «Ligação em rede das organizações da sociedade civil na região do mar Negro» (5); «Participação da sociedade civil na execução dos planos de acção da PEV nos países do Sul do Cáucaso» (6). A pedido da Presidência checa, o Comité preparou um parecer exploratório sobre o tema Inclusão da sociedade civil na Parceria Oriental.

3.13.3   O CESE estabeleceu contactos com as organizações da sociedade civil nos países da Parceria Oriental e organizou uma série de seminários sobre a importância de desenvolver um diálogo social e consultar a sociedade civil. Nestas ocasiões, insistiu na necessidade de envolver a sociedade civil na implementação dos planos de acção da PEV.

3.13.4   O CESE organiza com periodicidade anual seminários sobre a Ucrânia, em conjunto com o Conselho Económico e Social Tripartido Nacional da Ucrânia, sobre temas de interesse comum e espera que, nos próximos anos, seja possível realizar eventos deste tipo também com outros países da Parceria Oriental. O CESE está disposto a facilitar a organização de seminários anuais de reanálise da sociedade civil em todos os países da Parceria Oriental com o objectivo de avaliar os progressos alcançados na implementação dos planos de acção da PEV.

3.13.5   O CESE apoia a prioridade dada à Parceria Oriental pela actual Presidência húngara e pela próxima Presidência polaca e contribui com dois outros pareceres, nomeadamente sobre o tema Aprovisionamento energético: Política de vizinhança para garantir a segurança do aprovisionamento da UE e sobre a Parceria Oriental e a dimensão oriental das políticas da UE, com especial ênfase na política agrícola da UE. O CESE espera que estes três pareceres sobre a Parceria Oriental tenham amplo acolhimento e contribuam para a consecução de alguns dos objectivos da Parceria Oriental.

Bruxelas, 16 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  JO C 80 de 30.3.2004, p. 148-155.

(2)  JO C 318 de 23.12.2006, p. 123-127.

(3)  JO C 120 de 16.5.2008, p. 89-95.

(4)  JO C 77 de 31.3.2009, p. 157-163.

(5)  JO C 27 de 3.2.2009, p. 144-151.

(6)  JO C 277 de 17.11.2009, p. 37-41.


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/43


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Integração da política da água nas demais políticas europeias» (parecer exploratório a pedido da Presidência húngara)

2011/C 248/07

Relatora: An LE NOUAIL MARLIÈRE

Em 13 de Novembro de 2010, a futura Presidência húngara solicitou ao CESE a elaboração de um parecer exploratório sobre a

Integração da política da água nas demais políticas europeias.

A Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, responsável pela preparação dos correspondentes trabalhos do Comité, adoptou o seu parecer em 20 de Maio de 2011, sendo relatora An Le Nouail-Marlière.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho) o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 106 votos a favor, 26 votos contra e 8 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões

1.1   Escorado na sua experiência e nos seus conhecimentos em matéria de ambiente e agricultura e de desafios relacionados com o impacto das alterações climáticas na Europa – inundações que alternam com períodos de seca, com a consequente deterioração dos recursos hídricos, do solo das infra-estruturas e das actividades económicas e sociais – o CESE recomenda que se aborde de forma exaustiva e transversal os problemas, integrando as dimensões ambiental, económica e social.

1.2   Considera da máxima importância que a UE se tenha dotado de uma política da água graças à directiva-quadro relativa à água, e incita os Estados-Membros e as instituições europeias a consolidarem esta política, dado que a água é um bem de primeira importância para os cidadãos, a indústria e a agricultura, os órgãos de poder local, em primeiro lugar devido ao papel fundamental que desempenha para a vida à face da Terra e, em segundo lugar, devido aos seus aspectos económico, social e ambiental.

1.3   Recomenda, portanto, que lhe seja dada uma importância central em todas as políticas europeias.

1.4   Com base nas necessidades e nos compromissos específicos do mundo rural e agrícola no período de discussão sobre o futuro da PAC após 2013, o CESE recomenda que os fundos referentes ao primeiro pilar estejam mais condicionados às políticas da água, de acordo com um dispositivo de «ecocondicionalidade» (1) e se aumente o número de medidas agro-alimentares do segundo pilar e as subvenções destinadas à protecção da água, de forma a atingirem níveis suficientes que atraiam os agricultores.

1.5   Considerando que numerosos cidadãos europeus sem alojamento ou mal alojados continuam a estar privados de água corrente e ou potável gratuita, o Comité chama a atenção para a problemática da água na luta contra a pobreza e na ambição de a erradicar.

1.6   Assinala a dimensão internacional e extra-europeia da política ambiental europeia através da estratégia da UE, da sua abordagem comercial e, ao mesmo tempo, ambiental e de desenvolvimento, bem como as suas implicações nas estratégias mundiais em matéria de ambiente, tanto no seu território (bacias transnacionais), como nas suas políticas externas (2).

1.7   Incita os Estados-Membros da UE a ratificarem a Convenção da ONU de 1997 (3).

1.8   No domínio do mercado interno, os direitos fundamentais, a integração e a coesão social e a saúde são factores que requerem uma análise aprofundada do impacto e do custo de uma eventual política da água que não integre as dimensões social, ambiental e económica.

1.9   Esta integração exige que se assegure a coerência das estratégias em curso entre os diferentes interesses territoriais dos Estados-Membros e entre domínios (emprego, saúde, ambiente, agricultura intensiva ou biológica, energia, ordenamento do território, financiamento das políticas públicas, etc.) e actores (utilizadores e consumidores particulares e industriais, agricultores), todos eles em geral afectados por estas políticas.

1.10   De um modo geral, a gestão dos recursos hídricos na Europa tem-se centrado numa abordagem da oferta e do abastecimento. Neste momento, a UE necessita de se dotar de novos meios que lhe permitam antecipar as respostas a dar face às catástrofes naturais ou associadas à actividade humana que ameaçam e degradam os recursos hídricos a curto prazo.

1.11   Recordando a função fundamental dos solos e dos vegetais enquanto tampão em relação às águas de precipitação, o Comité convida o Conselho a relançar a adopção da Directiva Solos na medida em que ela é indispensável para uma política da água eficaz (4).

1.12   Necessita, também, de desenvolver uma abordagem sustentável da gestão da água, centrada especialmente na poupança para preservar e proteger este recurso através de uma utilização mais eficaz – nova organização das captações e utilização de novas tecnologias.

1.13   Embora seja ainda, em grande parte, natural, o ciclo da água compreende etapas artificiais que são possíveis devido às novas tecnologias, mas que não devem escamotear a necessidade de uma reflexão democrática sobre opções. Com efeito, é preciso abordar as captações numa perspectiva mais equitativa que responda quer às exigências e à concorrência entre sectores económicos, quer à necessidade de preservar os ecossistemas de água doce, e o facto de se tratar de um direito fundamental dos cidadãos.

1.14   A gestão integrada das bacias hidrográficas é essencial para preservar e gerir os recursos. Favorece a participação das várias partes interessadas na identificação e aplicação de medidas que respondam aos desafios a nível regional, as quais implicam muitas vezes compromissos entre diferentes interesses e sectores – planeamento urbano, zonas de extensão das inundações, uso dos solos, nomeadamente para fins agrícolas, industriais e energéticos.

1.15   O Comité sublinha que seria interessante definir um quadro de subvenções públicas europeias, com o mesmo volume de dotações e/ou um volume superior, destinadas a preservar o interesse público colectivo territorial, como por exemplo a recuperação de zonas húmidas, ou a preservar a biodiversidade, nomeadamente quando da análise da reforma das regras da UE em matéria de auxílios estatais aplicáveis aos serviços de interesse económico geral (5).

1.16   Encoraja os Estados-Membros e as colectividades territoriais a serem mais vigilantes e exigentes quanto a condições de transparência e de reversibilidade das delegações de serviços públicos ou de interesse geral, tanto nos domínios jurídico como económico: propriedade pública, arrendamento, tarifação, reinvestimento, manutenção das infra-estruturas.

1.17   Alerta para a necessidade de antecipar uma gestão dos recursos humanos e sociais de maneira igualmente integrada: formação inicial e contínua, certificação e reconhecimento das qualificações, gestão previsional, global e integrada, para facilitar a mobilidade profissional e geográfica incorporando a dimensão do género, base de dados.

1.18   O Comité recomenda que o diálogo social seja encarado como algo que contribui para garantir o conjunto das missões, em toda a sua diversidade e a todos os níveis, do serviço de água e saneamento, tanto no que diz respeito ao estatuto dos trabalhadores como à segurança do pessoal e dos cidadãos.

1.19   Em matéria de informação e de consulta dos utilizadores, os conselhos económicos e sociais constituem um recurso precioso para a consulta, dado que são organismos representativos e independentes e têm experiência e capacidade para organizar audições públicas.

2.   Instrumentos legislativos relativos às políticas da água

2.1   São várias as problemáticas ligadas à política da água, por exemplo, a gestão, conservação e exploração dos recursos, a gestão das catástrofes relacionadas com a água, a protecção dos meios naturais e a saúde pública.

2.2   Segue-se uma lista dos actos legislativos e das políticas mais importantes da UE no domínio da gestão dos recursos hídricos.

Na década de setenta: primeiras iniciativas

1976, Directiva relativa às águas balneares

1980, directiva sobre as águas destinadas ao consumo humano

Na década de noventa: abordagem das principais fontes de poluição na origem

1991, tratamento de águas residuais urbanas

1991, poluição causada por nitratos de origem agrícola

1996, prevenção e controlo integrados da poluição (directiva IPPC)

Desde 2000: expansão, coerência, racionalização

2000, Directiva-Quadro «Água» e directivas derivadas, de 2006 e 2008, relativas às águas subterrâneas e às substâncias prioritárias

2007, directiva relativa às inundações

2007, escassez de água e secas (comunicação)

2.2.1   A Directiva-Quadro Água, Directiva 2000/60/CE, impõe uma gestão integrada das bacias para proteger os recursos no quotidiano, introduzindo o conceito de bacia hidrográfica, e permite igualmente integrar a gestão das águas continentais e costeiras.

2.2.2   Através de um programa de medidas a executar à escala de distritos de bacias hidrográficas, esta directiva, estabelece como objectivo a consecução de um bom nível de qualidade das águas até 2015 (sob reserva das possibilidades de derrogação justificadas), bem como a não deterioração das águas no futuro, mediante:

a prevenção e redução da poluição;

a promoção de uma utilização sustentável da água;

a protecção do ambiente;

a melhoria do estado dos ecossistemas aquáticos e limitação dos efeitos das inundações e das secas.

2.2.3   Incumbe os Estados-Membros de recensearem e classificarem as bacias existentes no seu território, analisar as suas características, identificar as bacias em risco e estudar a influência das actividades humanas nas bacias. Foram elaborados planos de gestão das bacias hidrográficas para evitar a deterioração e a poluição, bem como para melhorar e recuperar as bacias, quer se trate de águas de superfície, de águas subterrâneas ou ainda de zonas protegidas. Pretende-se também reduzir a poluição causada por descargas e emissões de substâncias perigosas. A este propósito a directiva-quadro «água» é completada com a directiva «substâncias prioritárias» 2008.

2.2.4   A deterioração temporária das bacias é objecto de numerosas excepções. Assim, essa deterioração não constitui uma violação da directiva-quadro se resultar de circunstâncias imprevistas ou excepcionais ligadas a acidentes, de causas naturais ou de força maior. As excepções deverão ser objecto de exposição devidamente justificada e fundamentada dos Estados-Membros à Comissão.

2.2.5   Nos termos da directiva, os Estados-Membros são obrigados, de 2010 em diante, a instituir uma política de tarifação para os vários utilizadores da água (particulares, agricultura, indústrias, etc.), de acordo com o princípio de proporcionalidade relativamente à quantidade utilizada, poluidor-pagador e cobertura dos custos.

2.2.6   Cabe aos Estados-Membros fixar as sanções a aplicar em caso de infracção ao disposto na directiva, podendo a Comissão instaurar procedimentos de incumprimento acompanhados de sanções em caso de incumprimento. Todavia, dado que este regime de processos por infracção, que é complexo, não permite uma aplicação estrita de sanções e estas não são suficientemente dissuasivas, seria importante propor uma agravação exponencial de multa por reincidência. (A multa duplica por cada reincidência).

2.2.7   O trabalho realizado no âmbito do Regulamento REACH – registo, avaliação e autorização de substâncias químicas, lista de poluentes de grande risco – deverá permitir reduzir os poluentes na água, proteger os ecossistemas aquáticos e atenuar os riscos para a saúde pública.

2.3   A Comissão aborda o problema da água no âmbito do «exame de saúde» da política agrícola comum

2.3.1   Efectivamente, o «exame de saúde» estabeleceu a obrigação de introduzir «faixas de protecção» ao longo dos cursos de água, nos quais é restringida a utilização de pesticidas, e de afectar parte dos fundos à luta contra a escassez de água. É necessário garantir a aplicação destas medidas. De igual modo, afigura-se importante realizar estudos de impacto sobre a quantidade de água utilizada na produção de biocombustíveis ou biomassa.

2.4   A directiva relativa à prevenção dos riscos e das inundações prende-se com a preservação dos recursos em caso de catástrofes naturais  (6)

2.4.1   A Directiva 2007/60/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa à avaliação e gestão dos riscos de inundações, obriga os Estados-Membros a proceder à cartografia dos perigos e riscos neste domínio, bem como a elaborar planos de gestão dos riscos de inundações, de modo a reduzi-los. A directiva prevê também, ao longo da sua execução, uma cooperação transfronteiriça e um intercâmbio de informações nas regiões hidrográficas transfronteiras comuns.

2.5   O Fundo de Solidariedade da União Europeia indemniza as vítimas de catástrofes naturais

2.5.1   Num seu parecer (7), o CESE indicou melhorias possíveis no funcionamento do Fundo de Solidariedade. De facto, os critérios que determinam as operações elegíveis para a disponibilização dos recursos previstos no artigo 4.o são demasiado restritivos e não têm em conta determinados tipos de prejuízos. O parecer sublinha a importância de incluir nas catástrofes elegíveis as que resultem de situações de acumulação ou de consequências de factos ocorridos durante um período mais prolongado. Estas catástrofes, tais como as secas ou as ondas de calor, derivam da evolução do ambiente, cuja responsabilidade é imputável a todos os membros da UE. O parecer considera que o abastecimento de água e o funcionamento das infra-estruturas deviam ser abrangidos pelo FSUE, mesmo que a catástrofe não resulte de uma ocorrência súbita.

2.6   A Directiva 2008/1/CE relativa à prevenção e controlo integrados da poluição (Directiva PRIP) impõe um quadro para a instalação de unidades de produção industriais e agro-industriais  (8)

2.6.1   Em teoria, esta directiva obriga as instalações industriais a utilizar a melhor tecnologia disponível. Não é, certamente, um instrumento relevante da política europeia da água. Porém, o recente derrame de lamas vermelhas ocorrido na Hungria, que poluiu os solos e rios da região de Ajka, e chegou inclusive ao Danúbio, chamou a atenção para diversas questões ambientais e de protecção dos cursos de água, bem como para questões relativas ao tratamento e indemnização das vítimas de catástrofes e ao nível de vigilância exigido no âmbito da execução das políticas da água. Existem ainda, por exemplo, cerca de 150 instalações ao longo de 3 019 km de margens do Danúbio (9) que constituem, segundo a WWF autênticas «bombas-relógio». Assim, as lamas vermelhas, resíduos do processo que permite produzir o alumínio, não tinham sido tratadas, se bem que a tecnologia exista, seja utilizada noutros locais e diminua sensivelmente a percentagem de 96 % de soda que permanece nos resíduos. Muitas instalações limitam-se a criar bacias de retenção dos resíduos, não procedendo a uma verdadeira despoluição, mas, não raro, essas bacias não têm uma capacidade de retenção adequada ao volume de produção (10). Esta nova obrigação de tratamento com as técnicas disponíveis mais eficazes deve poder completar melhor, de maneira segura e dimensionada as infra-estruturas de armazenamento.

2.7   A Directiva relativa aos contratos públicos nos sectores da água, da energia, dos transportes e das telecomunicações (90/531 e 93/38/CEE) estabelece um enquadramento da exploração dos recursos hídricos por parte de operadores públicos ou privados e fixa as condições de adjudicação dos contratos.

2.7.1   Durante o período de pré-adesão, foi pedido aos países candidatos que adequassem a sua indústria às normas europeias. Vários países haviam alterado a legislação, baixando certos limiares e minimizando determinados problemas ambientais.

2.7.2   Assim, afigura-se imperativo que a UE e os Estados-Membros reforcem os meios que visam fazer aplicar a legislação europeia, de modo a aumentar a informação e a segurança dos seus cidadãos no atinente ao acesso à água e ao saneamento.

2.8   Alterações climáticas e inundações

2.8.1   As recentes inundações ocorridas por toda a Europa suscitaram muitas questões acerca da sua prevenção. A União Europeia dispõe de fundos para conter as catástrofes naturais, mas, paradoxalmente, não possui meios para prevenir e antecipar os riscos de catástrofe decorrentes de comportamentos humanos deliberados ou negligentes. Para serem totalmente eficazes, as políticas ligadas à prevenção spadas inundações deverão fazer parte de políticas mais globais em matéria de ordenamento do território, infra-estruturas, protecção dos ecossistemas e combate às alterações climáticas (11).

2.9   Colaboração transfronteiras: o exemplo do land do Sarre e da Lorena na bacia do «Blies aval»

2.9.1   Foi instituída uma cooperação inter-regional entre vários protagonistas para lançar uma parceria transfronteiras «Inundações», no quadro do projecto Interreg IV-A «Gestão de cheias e estiagens na bacia hidrográfica do Mosela e do Sarre - FLOW MS». O acordo reuniu à mesa as comissões internacionais para a protecção do Mosela e do Sarre (CIPMS), o ministério do Ambiente, da Energia e dos Transportes do land do Sarre (MUEV), a prefeitura da região da Lorena, a subprefeitura de Sarreguemines, quatro municípios alemães e cinco franceses. O objectivo é lidar com as inundações mediante uma prevenção comum e um intercâmbio regular de experiências, pretendendo-se, com isto, coordenar melhor os planos de alerta e de intervenção e adaptar o ordenamento municipal aos riscos de inundações.

2.9.2   Esta cooperação transfronteiras na parte a jusante do Blies visa incentivar a elaboração de cartas de zonas inundáveis e de cartas de riscos de inundações, avaliar os riscos de inundações e emitir recomendações que se concretizem em planos de gestão dos riscos de inundações.

2.9.3   Os rios não param nas fronteiras. As iniciativas locais na gestão, a montante, dos recursos são essenciais, como o demonstram alguns exemplos. Existe cooperação transnacional nas bacias hidrográficas de alguns rios – Reno, Oder, Mosa, Saar, Mosela e Elba. Os países ribeirinhos criaram instituições para garantir uma gestão coordenada dos riscos de inundações, bem como planos de protecção transfronteiras.

2.9.4   A bacia do rio Semois, afluente do Mosa que banha e Bélgica e a França, é um exemplo. Não obstante medidas de prevenção e legislações diferentes, existe um plano de acção desde 2002 para lutar contra as inundações a montante (Bélgica) e a jusante (França). O programa financeiro Interreg III França-Valónia-Flandres (2002-2006) de incentivo à cooperação transeuropeia permitiu federar uma actuação comum, através do «contrato de rio» (instrumento vocacionado para a gestão em comum da água) e de acções de prevenção das inundações lançadas em ambos os lados da fronteira.

2.9.5   Outros projectos, como o EUROTAS e as estratégias transfronteiras para o Danúbio e o Mar Báltico, visam desenvolver métodos comuns a vários países em matéria de gestão do risco de inundações, a longo prazo, e em previsão do tempo real das inundações ou em matéria de preservação de fontes de água doce.

2.9.6   Deste modo, parece ser possível, necessário e adequado que as autoridades locais definam iniciativas de colaboração à escala local e que, seguidamente, sejam apoiadas, nos planos político e financeiro, pela União Europeia.

3.   O estatuto e o papel das colectividades territoriais locais e da sociedade civil

É possível enumerar vários domínios em que os cidadãos europeus são directamente afectados pela integração de uma política europeia da água.

3.1   Impacto da gestão da água e das catástrofes nas populações

3.1.1   A escassez de água, os períodos alternados de seca prolongada, as inundações e a poluição da água têm consequências graves, tais como problemas económicos e sociais, podem conduzir à extinção de certas actividades económicas (como a agricultura), à destruição de postos de trabalho e, consequentemente, ao êxodo da população e à fragilização dos territórios.

3.1.2   A luta contra a poluição química da água é fundamental. Dela depende a saúde das espécies e das pessoas, bem como a transmissão de elementos químicos através da cadeia alimentar. Importa, pois, proceder a uma revisão regular da lista de poluentes cuja utilização esteja proibida ou enquadrada, em conformidade com a directiva relativa a substâncias prioritárias. Tal como salientam os pareceres anteriores do CESE (12), é necessário trabalhar em parceria com os agricultores, a indústria e as associações de defesa do ambiente para enquadrar a utilização de novos produtos e fixar limiares de utilização.

3.2   Utilizações da água

3.2.1   Os sectores da indústria, do turismo e da agricultura estão preocupados com a exploração e a poluição dos recursos hídricos. A urbanização galopante das zonas fluviais ou marítimas exerce igualmente pressão sobre este meio frágil. Na União Europeia, a produção de energia corresponde a 44 % das captações totais de água, utilizadas principalmente para arrefecimento. Das captações de água, 24 % destinam-se à agricultura, 21 % ao abastecimento público e 11 % a fins industriais. Estes números não espelham os diferentes níveis de utilização consoante as regiões. No Sul da Europa, por exemplo, a agricultura representa mais de metade das captações, ascendendo a mais de 80 % em certas regiões, ao passo que, no Oeste, mais de metade da água captada é canalizada para a produção de energia e o arrefecimento (13).

3.2.2   São visíveis as relações de dependência entre a gestão dos recursos hídricos e a produção de energia eléctrica, que devem motivar um trabalho de reflexão por parte da União Europeia. Só uma pequena parcela da água captada é utilizada para produzir energia, acabando a maior parte por ser objecto de descarga a uma temperatura mais elevada. A preservação dos sistemas aquáticos constitui, pois, um enorme desafio. Existem tecnologias capazes de reduzir a quantidade de água utilizada na produção de energia eléctrica ou de recuperar eficazmente a água, mas o custo excessivo obsta à sua utilização. Por conseguinte, é necessário conceder incentivos financeiros à I&D neste domínio, favorecer a utilização destas novas tecnologias e, ao mesmo tempo, integrar a reflexão sobre os investimentos e a sustentabilidade dos seus retornos, associando as vertentes ambiental, social e económica.

3.2.3   As práticas de utilização dos terrenos agrícolas e o planeamento urbano poderão ter um impacto significativo na escassez de água. A utilização descontrolada agrava a exploração das águas subterrâneas ou de superfície, podendo provocar alterações irreversíveis no meio ambiente e criar um ciclo de evoluções socioeconómicas não sustentável, com os consequentes riscos para a segurança alimentar, a energia e a estabilidade social. Várias zonas húmidas importantes, florestas ou planícies aluviais naturais foram drenadas e contidas, realizaram-se obras de regularização e construíram-se canais para sustentar a urbanização, a agricultura, a procura energética e a protecção contra as inundações (14). É necessário que as futuras políticas de ordenamento do território considerem a problemática da água.

3.3   O controlo da procura e proposta de uma oferta duradoura e sustentável

3.3.1   Vários factores influem na procura de água para fins domésticos: a dimensão da população e das famílias, a urbanização, o turismo, os rendimentos, a tecnologia e o comportamento dos consumidores. Além disso, as «fugas» nas redes de distribuição e abastecimento desempenham um papel essencial na determinação da quantidade de água que chega aos utilizadores finais. É preciso reduzir o nível de procura nos casos em que tal é possível. São necessários investimentos para manter e expandir as redes de distribuição, assim como as infra-estruturas de tratamento de águas residuais. Em 2006,10 % da população da UE-25 não estava ainda ligada a um sistema colector de águas residuais, registando-se disparidades significativas entre os diferentes países (15).

3.3.2   O turismo pode aumentar significativamente o consumo de água, nomeadamente durante os meses das férias de Verão, e em especial no litoral sul da Europa, cujas regiões se encontram já sujeitas a uma forte tensão hídrica. A sensibilização dos consumidores deve vir em complemento de outras medidas de preservação dos recursos.

3.3.3   Normas e independência: a reutilização das águas residuais na agricultura pode ser um factor significativo de gestão sustentável da água e deve ser objecto de medidas de segurança em termos de saúde pública, como as outras fontes, através de normas sanitárias estabelecidas pelo legislador, de forma transparente, e controladas, do modo totalmente independente, por entidades de controlo certificadas ou públicas.

3.4   A sociedade civil nas políticas europeias da água

3.4.1   Precedendo a resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas de 26 de Julho de 2010 (16), o Conselho da União Europeia informou, em 22 de Março de 2010, que os vinte e sete Estados-Membros da UE reconhecem o direito à água e ao saneamento, recordando que «todos os Estados têm obrigações em matéria de direitos humanos no que respeita ao acesso à água potável» e reconhecendo que «as obrigações em matéria de direitos humanos no que respeita ao acesso à água potável e ao saneamento estão estreitamente ligadas a determinados direitos humanos, como o direito à habitação, à alimentação e à saúde.»

3.4.2   O direito da sociedade civil a ser informada acerca dos dados relativos à água é um direito essencial. Em 1999, o land de Berlim privatizou as empresas de gestão da água em proveito de Veolia e do conglomerado alemão RWE, o que provocou o aumento dos preços no consumidor. Os contratos de delegação e suas cláusulas subscritas entre as partes no contrato mantiveram-se em sigilo total. Uma iniciativa popular permitiu a organização do colectivo Berliner Wassertisch, que conseguiu recolher um número de assinaturas suficiente para desencadear um referendo popular. O voto popular, com uma taxa de participação de 27 %, pronunciou-se por 98 % a favor da publicação e, sem seguida, da anulação dos contratos secretos. A publicação dos contratos, graças a esta iniciativa, revelou que os lucros dos accionistas das duas empresas eram garantidos através de um sistema de compensação. O land de Berlim (graças ao erário público) garantia, pois, às empresas os lucros nos anos em que não se atingiam os montantes fixados nas cláusulas secretas. Cada vez mais frequentemente, as colectividades territoriais servem-se do termo dos contratos de delegação com sociedades privadas para «remunicipalizar» os serviços da água. No entanto, alguns municípios, e não dos menores, viram-se de tal modo reféns de contratos celebrados nestas condições iniciais e juridicamente desiguais que foram obrigados a manter os operadores privados em regime de participação (17). Poderia garantir-se a melhoria das condições de transparência das delegações de serviços públicos ou de interesse geral e sua reversibilidade, examinando, nomeadamente, os seguintes aspectos:

gestão da água: reinvestimento dos lucros na manutenção e modernização das redes;

as características e a natureza dos pesados investimentos que afectam a entrada no mercado privado e público não deveriam levar a situações de monopólio e ou a acordos e práticas concertadas;

o financiamento das mais importantes empresas privadas da água é constituído essencialmente por financiamentos públicos (18);

condições de trabalho, de emprego e de segurança do pessoal. Tem que haver homens e mulheres em número suficiente, formados e qualificados, que gozem de estatuto único público de trabalhadores assalariados dos serviços da água, saneamento, controlo e repressão das infracções, investigação, etc., de modo a garantir o conjunto das missões em toda a sua diversidade a todos os níveis;

informação e consulta dos utilizadores: os conselhos económicos e sociais constituem um recurso precioso para a consulta pelo facto de serem organismos representativos e independentes e por terem experiência e capacidade para organizar audições públicas.

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Restituição das subvenções em caso de incumprimento dos instrumentos legislativos (Directiva-Quadro Água) e nacionais (transposição) relativos à poluição provocada por nitratos, à qualidade da água, à directiva-quadro europeia sobre a água, de acordo com o princípio do poluidor-pagador.

(2)  Relatório de Informação sobre «Trabalho digno e desenvolvimento sustentável na bacia do Mediterrâneo: Os sectores da água doce, da água do mar e do saneamento»

(3)  Convention on the Law of the Non-navigational Uses of International Watercourses (Convenção sobre o direito da utilização dos cursos de água internacionais para fins que não sejam a navegaçãohttp://untreaty.un.org/ilc/texts/instruments/english/conventions/8_3_1997.pdf

(4)  COM(2006) 232 final – 2006/0086 COD, COM(2009) 665 final.

(5)  COM(2011) 146 final; Parecer do CESE «Reforma das regras da UE em matéria de auxílios estatais aplicáveis aos serviços de interesse económico geral», Ver página 149 do presente Jornal Oficial.

(6)  JO C 195 de 18.8.2006, p. 20.

(7)  JO C 28 de 3.2.2006, p. 69.

(8)  JO C 182 de 4.8.2009, p. 46.JO C 97 de 28.4.2007, p. 12.JO C 80 de 30.3.2004, p. 29.

(9)  WWF/Usine Nouvelle 21.10.2010.

(10)  (Durante anos, a SANOFI AVENTIS, estabelecida em Ivry (França), lançou poluentes nas redes de saneamento do SIAAP, entre os quais benzeno, um produto altamente cancerígeno, por ter bacias de retenção subdimensionadas.)

(11)  JO C 195 de 18.8.2006, p. 20.

(12)  JO C 97 de 28.4.2007, p. 3.

(13)  Water resources across Europe — confronting water scarcity and drought («Recursos hídricos na Europa – Fazer face à escassez da água e à seca»), relatório da Agência Europeia para o Ambiente, ISSN 1725-9177, Fevereiro de 2009.

(14)  «O Ambiente na Europa – situação actual e perspectivas para 2010», Agência Europeia do Ambiente, SOER 2010.

(15)  SOER, pág. 103 + relatório da AEA p. 5 – Comunicado de imprensa do Eurostat de 2006.

(16)  Resolução da Assembleia-Geral das Nações Unidas «The human right to water and sanitation», 26/7/2010, A/64/L.63/Rev.1, see: http://www.internationalwaterlaw.org/documents/intldocs/UNGA_Resolution_HR_to_Water.pdf

(17)  Public Citizen, «Campanha de água para todos», 2007.

«Veolia Environnement: Um perfil de empresa. Relatório especial do Public Citizen no âmbito da Campanha de Água para todos» (http://documents.foodandandwaterwatch.org/Vivendi05.pdf) e

O contrato secreto da privatização da água em Berlim, publicado no diário de Berlim (Die Tageszeitung) na sua edição de sábado, 30 de Outubro de 2010; http://www.taz.de/1/zukunft/wirtschaft/artikel/1/die-raeuberische-wasser-privatisierung/

(18)  http://www.psiru.org/reports/2010-W-EWCS.doc


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/49


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «O papel e a relação da UE com a Ásia Central e o contributo da sociedade civil»

2011/C 248/08

Relator: Jonathan PEEL

Na reunião plenária de 15 e 16 de Setembro de 2010, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do artigo 29.o, n.o 2, do Regimento, elaborar um parecer de iniciativa sobre

O papel e a relação da UE com a Ásia Central e o contributo da sociedade civil.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Relações Externas, que emitiu parecer em 25 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 16 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 112 votos a favor, 5 votos contra e 12 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1   Não há um verdadeiro sentido de afinidade regional entre os cinco Estados da Ásia Central, ao contrário do que acontece na Europa. O CESE exorta a Comissão e outras instituições da UE a continuarem a promover um sentido mais profundo de identidade e de integração regional, encorajando cada Estado a trabalhar mais estreitamente com os seus vizinhos, a fim de reduzir os problemas étnicos e fronteiriços, bem como abrir caminho a um desenvolvimento económico e social mais sustentável.

1.1.1   O CESE crê firmemente na absoluta necessidade de uma estratégia da UE abrangente, coesa e coordenada para desenvolver e estabelecer um contacto efectivo entre a sociedade civil europeia e a da Ásia Central. Actualmente, tal contacto é escasso, requerendo da UE, antes de mais, um nível muito superior de representação diplomática.

1.1.2   Importa aproveitar ao máximo os conhecimentos especializados disponíveis nas instituições europeias, quanto mais não seja no espírito do artigo 11.o do Tratado de Lisboa. O CESE apela, por isso, ao SEAE para que o envolva, sempre que possível, nomeadamente no reforço de capacidades, tendo em conta a experiência que o Comité adquiriu noutras regiões (por exemplo, nos Balcãs e na América Latina).

1.1.3   O CESE recomenda, por conseguinte, a criação de um mecanismo formal através do SEAE que envolva o Comité com vista, em primeiro lugar, a identificar mais claramente os principais interlocutores da sociedade civil existentes em cada Estado, incluindo empresas e sindicatos independentes e efectivos, e, em segundo, ajudar a identificar novas organizações da sociedade civil emergentes e apoiar o seu desenvolvimento. Conviria, para o efeito, que uma pequena delegação do CESE visitasse a Ásia Central.

1.1.4   O CESE apoia firmemente o processo de diálogo bem estruturado da UE em matéria de direitos humanos enquanto primeiro resultado positivo da estratégia da UE para a Ásia Central, mas expressa profundo desapontamento por até agora não ter sido nele incluído. É absolutamente prioritário rectificar esta situação.

1.1.5   Estes esforços destinados a estabelecer contactos interpessoais muito mais estreitos devem incluir o aprofundamento das relações nos domínios da juventude e da educação, tendo em conta que a maioria da população tem menos de 25 anos, bem como uma utilização mais recorrente ao Programa Erasmus Mundus em ambas as regiões. Tal deveria passar pela facilitação na concessão de vistos para fins educacionais, isenção de propinas para os melhores estudantes da Ásia Central, promoção de manuais escolares em inglês, escolas de verão, bem como parcerias a nível do ensino superior e do ensino secundário.

1.2   A questão mais vasta dos direitos humanos está estreitamente associada à promoção de uma maior participação da sociedade civil. Este é um domínio-chave em que a Europa pode prestar – e presta efectivamente – assistência aos países da Ásia Central à medida que eles vão avançando independentemente no seu percurso. Contudo, os verdadeiros focos de atenção devem ser definidos mediante negociação e com sensibilidade cultural. Apesar dos problemas persistentes, cada um dos cinco Estados ratificou as oito convenções fundamentais da OIT (com duas excepções, referidas no ponto 5.4.1). A identificação de como e em que domínios a Europa pode ajudar a Ásia Central a cumprir estes e outros compromissos constitui uma via prática para instaurar a confiança mútua.

1.2.1   O CESE também apoia resolutamente os esforços destinados à conclusão de futuros acordos em matéria comercial com cada um dos cinco Estados. Tal como no caso de outros acordos comerciais recentes da UE, insta à criação de um fórum da sociedade civil para cada país, a fim de incluir a questão do desenvolvimento sustentável e de permitir, como referido, a partilha dos conhecimentos especializados do CESE.

1.3   A este respeito, revestem particular importância as questões associadas, embora complexas, da segurança alimentar, abastecimento de água e aprovisionamento energético. O Comité recomenda que a UE desempenhe um papel mais preponderante no incentivo aos cinco Estados para que envidem esforços conjuntos no sentido de abordarem estes graves problemas de forma global. A Comissão deve clarificar em que medida é que eles estão interligados. A Europa tem uma experiência positiva na ajuda prestada a outros países nos domínios do abastecimento de água e da segurança alimentar, que deve ser plenamente utilizada na Ásia Central para reforçar a confiança.

1.4   O Comité recomenda que, como já anteriormente preconizado (1) em relação às futuras negociações comerciais, a Comissão utilize as 27 convenções enumeradas no seu sistema SPG+ como base para desenvolver com a Ásia Central um comércio mais amplo e não centrado na energia, juntamente com medidas de assistência técnica ao comércio, sempre que adequado.

1.5   O Comité recomenda que se assegurem informações pormenorizadas e recíprocas sobre o desenvolvimento das relações da UE com a Ásia Central e o envolvimento da UE com a Rússia, a China e a Turquia, mas não com o Irão, enquanto vigorarem as sanções contra este país.

1.6   Os países da Ásia Central encerram um importante potencial de reservas energéticas que oferecem à Europa fontes de energia adicionais e complementares (e não alternativas), não obstante as dificuldades existentes em termos de trânsito e de transporte. É importante que a viabilidade de tais ligações assente em razões práticas e económicas.

1.7   A Ásia Central não deve ser o terminal das linhas de transporte e de trânsito da Europa, devendo antes ser encarada como uma estação intermédia no percurso para a China e mais além. Os corredores de transporte propostos pela China e pela UE têm de ser alinhados. Há que desenvolver a antiga «Rota da Seda» enquanto auto-estrada comercial e energética.

2.   Introdução

2.1   Embora o Cazaquistão seja o nono maior país do mundo em superfície, os cinco países da Ásia Central (Cazaquistão, Quirguistão, Usbequistão, Turquemenistão e Tajiquistão) têm no conjunto apenas 61 milhões de habitantes – o equivalente à população do Reino Unido, da França ou da Itália.

2.2   É essencial compreender que estes Estados são recentes e, em larga medida, estão ainda em formação. Apesar de independentes e plenamente reconhecidos, são o resultado da desintegração da União Soviética Em nenhum deles houve um «movimento de libertação nacional» significativo e, em todos, a anterior elite política soviética assumiu o poder enquanto nova elite independente. Contudo, este passado comum constitui um factor positivo de estímulo à coesão regional, que é fraca e está longe de atingir o nível registado na Europa. Trata-se de um conceito que a UE está a começar agora a fomentar na região.

2.3   Além disso, estes Estados estão circunscritos a fronteiras que não foram eles que escolheram nem correspondem a fronteiras naturais. Foram definidos por terceiros e constituídos em repúblicas da União Soviética, o que, por seu turno, gerou tensões étnicas, como as que se registaram mais recentemente no Quirguistão com as pressões exercidas sobre a minoria usbeque. Esta constitui uma grande oportunidade para a UE contribuir com a sua experiência para ajudar a resolver tensões nacionais.

2.4   Estes Estados também herdaram economias planificadas, um modelo que as actuais elites dirigentes têm interesse em manter. Esta esclerose subjacente agravou-se com o ressurgimento de antigas rivalidades estratégicas internacionais (quanto mais não seja devido à proximidade do Afeganistão e do Irão), mas que, crucialmente, ganharam agora contornos económicos devido à descoberta de recursos naturais energéticos ainda não quantificados, nomeadamente petróleo e gás (este último no Turquemenistão, em particular).

2.4.1   Assistiu-se já à emergência de problemas de transmissão hereditária do poder na região (nomeadamente no Cazaquistão). Actualmente, é mais correcto descrever a infra-estrutura administrativa da antiga nomenklatura soviética como uma nomenklatura de clãs ou de famílias. Este é outro domínio no âmbito do qual a UE pode prestar assistência através dos seus programas de apoio à sociedade civil e à governação, promovendo uma função pública mais neutra.

2.5   Antes da subjugação russa no século XIX, a Ásia Central era composta por um grande número de canatos e emiratos muçulmanos acerrimamente independentes, com nomes exóticos, como Bukhara e Khiva, mas também remotos devido às vastas zonas desérticas que os circundavam. Tamerlão edificou o seu enorme império com capital em Samarcanda, cuja população descendia em parte dos exércitos de Gengis Cã e da «Horda de Ouro». Igualmente digna de nota é a forte tradição científica nesta região, particularmente no domínio da astronomia, que remonta à fundação do Observatório de Ulugh Beg, neto de Tamerlão, por volta de 1420. Actualmente, o Cazaquistão continua muito empenhado no programa espacial.

3.   Um novo Grande Jogo?

3.1   Apesar da sua localização inóspita, a Ásia Central adquiriu, como já foi referido, uma enorme importância estratégica. Evocando o «Grande Jogo» do século XIX (época em que a Ásia Central foi palco de rivalidades entre a Grã-Bretanha e a Rússia), esta torna provavelmente a ser hoje em dia a região do globo, tirando a Ásia Oriental, onde tantos interesses vitais ameaçam entrar em rota de colisão.

3.2   Após mais de um século sob o jugo da Rússia, a região permanece ainda fortemente influenciada por este país. O russo é a língua comum, os laços económicos mantêm-se fortes, e a Rússia considera que toda esta zona se integra naturalmente na sua esfera de influência. Em 2010, o Cazaquistão formou uma união aduaneira com a Rússia (e a Bielorrússia), e outros países mostraram-se igualmente interessados. Isto seria um problema para o Quirguistão, o único país da região a pertencer à OMC. O Usbequistão e o Turquemenistão, todavia, mostram-se claramente mais relutantes em relação ao restabelecimento dos laços com a Rússia.

3.3   Também a China está muito empenhada no desenvolvimento, o que se traduziu formalmente na sua adesão à Organização de Cooperação de Xangai (a que também pertencem a Rússia e o Irão). A China tem interesses energéticos estratégicos na região. Em 2010, pôs a funcionar em tempo recorde um gasoduto que parte do Turquemenistão, atravessando o Usbequistão e o Cazaquistão, e em breve se ligará à rede energética interna chinesa. Está profundamente interessada em construir corredores ferroviários e rodoviários estratégicos de ligação ao Ocidente através da Ásia Central, mas, neste momento, estes ainda não estão alinhados com os corredores de transporte europeus de ligação ao Oriente. Importa rectificar esta situação. A antiga «Rota da Seda», que é já um itinerário turístico, poderia ser desenvolvida de modo lucrativo como auto-estrada comercial e energética.

3.4   O Irão e o Afeganistão estão estreitamente ligados por terem fronteiras comuns, a população falar uma língua relacionada com o farsi, como no Tajiquistão, e se terem confrontado recentemente com episódios de fundamentalismo islâmico. Embora todos os Estados da Ásia Central mantenham o fervor religioso firmemente sob controlo, este está a aumentar. A insurreição islâmica foi um factor na guerra civil do Tajiquistão, na década de 90, que muitos temem que reacenda. Para o Irão, dadas as sanções impostas devido à questão nuclear, as relações com o Turquemenistão são particularmente importantes, sendo de salientar a construção de um novo gasoduto estratégico. O tráfico de droga proveniente do Afeganistão é cada vez mais preocupante, mas é, sobretudo, um problema ligado ao consumo final no Ocidente. Para além do incentivo aos funcionários locais, pobres e fáceis de corromper, para actuarem com determinação contra o tráfico de droga, a solução passa por restringir e controlar o mercado ilegal na Europa (e nos EUA).

3.5   A Turquia também exerce uma forte influência na região, a que não é alheio o facto de os tajiques serem uma etnia de origem turca com línguas aparentadas. A Turquia empenhou-se profundamente nesta região pouco depois do colapso da União Soviética e, após alguns contratempos iniciais, está novamente a ganhar importância, passando a ser outro ponto de passagem essencial para as infra-estruturas de transporte de energia para o Ocidente.

3.6   Os EUA estão igualmente muito presentes na região, nomeadamente devido à guerra no Afeganistão.

3.7   Tudo isto nos faz questionar até que ponto a UE se deverá envolver, sabendo que nenhum Estado-Membro deixou na região herança colonial. As necessidades da Europa devem ser encaradas numa perspectiva de longo prazo e tendo plenamente em conta o espectro mais lato das relações da UE.

3.7.1   A UE está já a conduzir negociações importantes com a Rússia e a China, países com os quais celebrou uma parceria estratégica. As negociações de adesão com a Turquia estão em curso, embora os progressos sejam extremamente lentos. Parece, todavia, que as relações da UE com os Estados da Ásia Central são tratadas de modo totalmente independente das relações com estes outros países, o que não faz sentido. Há que assegurar informações pormenorizadas e recíprocas sobre o desenvolvimento das relações da UE com a Ásia Central e o envolvimento da UE com a Rússia, a China e a Turquia. Por outro lado, as relações com a Ásia Central devem desenvolver-se de molde a não comprometer a relação estratégica da Europa com qualquer um destes parceiros-chave. Enquanto estiverem em vigor as sanções contra o Irão, será prematuro associar este país ao processo, embora importe manter presente a equação Irão/Ásia Central.

4.   O envolvimento da UE na Ásia Central

4.1   A UE lançou a sua estratégia para a Ásia Central em Julho de 2007, por iniciativa da Presidência alemã. Pese o tom paternalista, o facto é que os níveis extremamente reduzidos das trocas comerciais estão ainda por aumentar. À excepção do Cazaquistão, que representava em 2009 (como em 2007) 0,9 % das importações da UE e 0,5 % das suas exportações, nenhum dos outros países participou em mais de 0,1 % nas trocas comerciais da UE. Apesar destes números, a UE continua a ser um parceiro comercial fundamental para cada um destes Estados, em especial para o Cazaquistão, do qual a União Europeia é, em volume de trocas, um parceiro comercial mais importante do que a Rússia ou a China.

4.2   Faz todo o sentido que a UE demonstre grande interesse na Ásia Central, sobretudo à luz do seu Programa de Parceria Oriental e da Estratégia para o Mar Negro. Participam efectivamente nestes instrumentos (juntamente com a Turquia) todos os países da antiga URSS, excepto a Rússia, com a qual a UE está a negociar em separado uma nova relação estratégica. Alguns Estados-Membros da UE, particularmente a Lituânia e, cada vez mais, a Alemanha, têm já fortes laços com a Ásia Central. Além disso, o Azerbaijão é amiúde considerado como estando mais próximo da Ásia Central do que os outros países do Cáucaso, quanto mais não seja por razões que se prendem com a energia e com a religião.

4.2.1   A energia é uma questão-chave. Os países da Ásia Central encerram um importante potencial de reservas energéticas que oferecem à Europa fontes de energia adicionais e complementares, não obstante as dificuldades existentes em termos de trânsito e de transporte. É essencial que a UE seja realista quanto ao potencial de aprovisionamento energético da região e que a viabilidade de tais ligações assente em razões práticas e económicas. Igualmente importantes para os próprios Estados, estas fontes de energia natural devem ser encaradas em termos de complemento e de do aprovisionamento existente e não como uma possível forma de aprovisionamento alternativo, nem como um trunfo a utilizar para exercer influência sobre outros países da região.

4.3   Apesar do tom optimista do relatório de progresso de Junho passado, as relações da UE com os cinco Estados da Ásia Central são extremamente fracas. Só no Cazaquistão é que a UE tem uma missão completa e, recentemente, abriram no Quirguistão e no Tajiquistão delegações da UE. No Usbequistão e no Turquemenistão, a UE é representada unicamente pelas «Casas da Europa», cujo pessoal é constituído sobretudo por consultores contratados. Segundo o CEPS (2), 18 Estados-Membros têm embaixadas no Cazaquistão, 10 no Usbequistão, e apenas alguns noutros países da região. Só a Alemanha e a França têm embaixadas nos cincos Estados, a Grã-Bretanha tem em quatro. Nove Estados-Membros não têm qualquer representação nestes países. Para ser bem-sucedida, a estratégia da UE para a Ásia Central exige uma representação da UE muito mais importante, que será um teste preliminar ao novo Serviço Europeu para a Acção Externa (SEAE), apesar das severas limitações orçamentais a que está sujeito. Uma acção comum conduzida pelo SEAE em questões fundamentais como os vistos (pelo menos para os Estados do espaço Schengen) será um desses testes.

4.4   A UE negociou acordos de parceria e cooperação (APC) com os cinco Estados da Ásia Central. Os acordos celebrados com o Cazaquistão, o Quirguistão e o Usbequistão entraram em vigor em 1999, embora o APC com o Usbequistão tenha sido parcialmente suspenso entre 2005 e 2008 na sequência do massacre de Andijan. O acordo com o Tajiquistão (cuja conclusão foi protelada pela guerra civil) só foi ratificado em 2009, enquanto o acordo com o Turquemenistão está ainda por ratificar devido a questões relacionadas com os direitos humanos.

4.5   O Cazaquistão, em particular, está a emergir como um actor fundamental na região. As suas relações com a UE estão a progredir francamente, estimuladas por um interesse crescente de parte a parte. Para a UE, o Cazaquistão é sem dúvida o Estado mais acessível da região, e a sua candidatura empenhada e bem-sucedida à presidência da OSCE (3) constituiu um sinal inequívoco da sua vontade de desempenhar um papel de relevo. Uma outra prova da vontade deste país de se envolver cada vez mais em cenários mais vastos é a sua adesão à união aduaneira com a Rússia e a Bielorrússia e o seu interesse manifesto em aderir à OMC, possivelmente em conjunto com a Rússia. Outro sinal é a emergência de uma importante classe de jovens empresários que aspira a estudar no estrangeiro e é incentivada a fazê-lo, juntamente com o desenvolvimento de uma cultura de sociedade civil e o reforço do seu papel.

4.6   Uma vontade idêntica de crescente visibilidade internacional ainda não se manifestou no Usbequistão, que conserva uma abordagem mais fechada e autoritária, à semelhança do Turquemenistão. No princípio, o Usbequistão parecia ser o país com mais probabilidades de estreitar os laços com a Europa, mas tal não se realizou, nomeadamente após os acontecimentos de Andijan e a abertura do Cazaquistão.

4.7   O Quirguistão, relativamente ao qual persistem grandes apreensões na sequência dos confrontos étnicos em 2010, é, ainda assim, uma sociedade mais aberta com uma sociedade civil mais participativa. Este é também o caso do Tajiquistão, cujas relações actuais com a UE são particularmente fracas. O Tajiquistão é um Estado mais frágil, foi palco de uma guerra civil grave nos anos noventa que poderá deflagrar novamente e enfrenta uma crise alimentar.

5.   O papel da sociedade civil e os direitos humanos

5.1   O papel da sociedade civil é intermitente e varia muito nos cinco Estados. O Quirguistão apresenta o nível mais elevado de participação da sociedade civil, ao passo que o Cazaquistão e o Tajiquistão estão a desenvolver uma cultura de sociedade civil.

5.1.1   Contudo, a sociedade civil tem desempenhado um papel claro no diálogo sobre os direitos humanos da UE. Este processo bem estruturado foi um dos primeiros resultados da estratégia da UE para a Ásia Central nestes três países. Levou à organização de reuniões anuais a nível oficial, com seminários da sociedade civil independentes que reúnem advogados defensores dos direitos humanos, ONG locais e responsáveis da UE e com uma agenda normalizada. Todavia, está ainda por realizar uma avaliação comparativa eficaz que permita aferir os resultados obtidos.

5.1.2   O CESE apoia veementemente este processo, mas manifesta o seu profundo desapontamento pelo facto de o SEAE não ter ainda reputado conveniente incluí-lo. Exorta a Comissão a corrigir esta situação o mais cedo possível, tanto mais que o Comité é um interlocutor com provas dadas e um elemento de ligação à sociedade civil mais vasta, dotado de profundos conhecimentos práticos e experiência amplamente reconhecida.

5.2   Este nível de participação da sociedade civil não tem equivalente no Usbequistão (onde as ONG foram formadas pelo governo), nem no Turquemenistão, onde não há uma sociedade civil verdadeiramente independente.

5.2.1   Importa recordar que antes da independência não havia uma tradição ou um entendimento da sociedade civil enquanto intermediária entre o Estado e o cidadão, nem se conhecia o conceito de ONG. Os sindicatos, as comunidades e as associações juvenis e profissionais faziam parte da estrutura do Estado e pouco contacto tinham com influências externas que permitissem dar forma a novas instituições após a independência. Desde então, porém, muitas instituições se têm vindo a desenvolver de forma mais independente, a par de empresas públicas privatizadas, sindicatos e associações profissionais independentes, particularmente no Cazaquistão e no Quirguistão e, em menor medida, no Tajiquistão.

5.2.2   As iniciativas locais de comunidades rurais e os grupos de auto-ajuda locais surgiram na década de noventa com base nas comunidades locais tradicionais e nos grupos de entreajuda hashar/ashar com base em laços de parentesco, em parte para fazer face ao colapso dos sistemas de protecção social do regime soviético. Todavia, diferem muito das ONG tal como estas são reconhecidas internacionalmente. Também surgiram ONG, mas estavam em grande medida confinadas às grandes zonas urbanas e amiúde dependiam fortemente de apoio financeiro externo (incluindo dos EUA). Cada país evoluiu de forma diferente com diferentes problemas, mas, após as «revoluções coloridas» na Geórgia, na Ucrânia e no Quirguistão, as ONG (muitas vezes consideradas entidades estrangeiras excessivamente bem pagas para os padrões locais) foram severamente limitadas no Usbequistão e desapareceram de facto no Turquemenistão. Recentemente, tem vindo a verificar-se um aumento das disparidades entre as zonas urbanas e as zonas rurais, assim como um aumento da influência e da actividade de índole islâmica.

5.3   Entre as sociedades civis da UE e da Ásia Central escasseiam as contribuições formais e os contactos aprofundados, o que não surpreende dada a quase inexistência de contactos interpessoais entre a Europa e a Ásia Central. Antes de se poder esperar que a sociedade civil da Ásia Central partilhe ou mesmo se identifique com os valores europeus, é necessário dá-los a conhecer, para que eles possam então ser amplamente compreendidos, mas não impostos. O Cazaquistão pode servir de ponte neste domínio, nomeadamente porque é neste país que há melhores contactos entre empresas e entre sindicatos.

5.3.1   O CESE crê firmemente na absoluta necessidade de uma estratégia da UE abrangente, coesa e coordenada para desenvolver um contacto efectivo com a sociedade civil da Ásia Central. Ele próprio está bem posicionado para fazer avançar este projecto; a questão fundamental é saber como contribuir da melhor maneira para fomentar o diálogo e os contactos interpessoais, identificar temas de interesse mútuo e grupos emergentes da sociedade civil e promover as boas práticas, com vista a estabelecer um mecanismo mais formal de promoção de contactos efectivos ao nível da sociedade civil.

5.3.2   É de louvar o trabalho actualmente levado a cabo pelo Serviço Europeu para a Acção Externa (SEAE) na região. Contudo, é essencial aproveitar ao máximo os conhecimentos especializados disponíveis nas instituições europeias. Tal como em relação ao processo de diálogo sobre os direitos humanos, o CESE apela, pois, ao SEAE para que o envolva, sempre que possível, nomeadamente no reforço de capacidades, tendo em conta a experiência que o Comité adquiriu noutras regiões.

5.3.3   Prefiguram-se três vias para o efeito. Em primeiro lugar, o Comité, com a ajuda do SEAE, precisa de conhecer claramente quem devem ser neste momento os seus principais interlocutores. Há que identificar os parceiros empresariais e sindicais independentes e efectivos e estabelecer laços com eles, bem como com outros parceiros relevantes da sociedade civil nos cinco Estados. A Organização Internacional dos Empregadores (OIE) não tem membros na Ásia Central, embora tenha contactos no Cazaquistão. Para este fim (bem como para promover o presente parecer), recomenda-se que uma pequena delegação do CESE visite a Ásia Central.

5.3.4   Além disso, é essencial identificar, encorajar e apoiar no terreno outras organizações emergentes da sociedade civil no seu processo de desenvolvimento. Também aqui o CESE espera que o SEAE o envolva neste processo sempre que apropriado.

5.3.5   O CESE apoia também resolutamente os esforços tendo em vista futuros acordos em matéria comercial com cada um dos cinco Estados. Tal como no caso de outros acordos comerciais recentes da UE, recomenda a criação de um fórum da sociedade civil para cada país, visando uma maior formalização dos laços com a sociedade civil da região, o que também permitiria ao CESE partilhar os seus conhecimentos especializados em matéria de desenvolvimento sustentável com os representantes da sociedade civil pertinentes.

5.3.6   Em terceiro lugar, há que incentivar o aumento de contactos e de intercâmbios entre os jovens e fomentar ainda mais o recurso ao Programa Erasmus Mundus para aprofundar as relações ao nível da educação e promover a mobilidade em ambos os sentidos. Tal deveria passar pela facilitação na concessão de vistos para fins educacionais, isenção de propinas para os melhores estudantes da Ásia Central, promoção de manuais escolares em inglês, escolas de verão, bem como parcerias a nível do ensino superior e do ensino secundário. O Comité congratula-se com a duplicação do orçamento afectado a este domínio para 10 milhões de euros por ano. Contudo, como sublinha o relatório de progresso, a maioria da população da Ásia Central tem menos de 25 anos (não se recordando, por isso, do período soviético).

5.3.7   A sociedade civil tem um papel fundamental a desempenhar em prol da coesão e da integração regionais, elementos importantes para a construção de um ambiente económico e social propício ao bom funcionamento dos mercados, o incentivo à criação de empregos dignos, o desenvolvimento de PME, o reforço das infra-estruturas locais e a redução da pobreza, com o apoio de instituições sólidas dotadas de mandatos claramente definidos. A experiência da sociedade civil nos Estados bálticos, nomeadamente, será de particular relevância neste domínio.

5.3.8   Este processo deve, por seu turno, assentar no compromisso político, na paz e na segurança, no Estado de direito, no progresso da democracia, na boa governação e na estabilidade macroeconómica.

5.4   Contudo, estreitamente associada à promoção da participação da sociedade civil nestes países, em especial no Usbequistão e no Turquemenistão, está a questão dos direitos humanos, domínio em que os progressos são extremamente lentos. Face a uma longa história de domínio autocrático e à ausência de uma tradição de respeito dos direitos humanos, estes terão de desempenhar um papel crescente para que a UE e a respectiva sociedade civil possam desenvolver uma relação de trabalho efectiva com a Ásia Central. Os direitos humanos fazem parte da identidade da Europa e da sua história, sendo este um domínio fundamental em que a Europa sente, a justo título, poder prestar assistência a outros países.

5.4.1   Contudo, os verdadeiros focos de atenção devem ser definidos mediante negociação e com sensibilidade cultural. Cada um dos Estados da Ásia Central subscreveu voluntariamente os direitos humanos universais ao tornar-se membro das Nações Unidas e instituições associadas (por exemplo, a OIT). Ao contrário de muitos outros parceiros comerciais da UE, todos os Estados da Ásia Central já ratificaram as oito convenções fundamentais da OIT, com as seguintes excepções: o Usbequistão não ratificou a Convenção n.o 87 (Liberdade de Associação) e o Turquemenistão não ratificou a Convenção n.o 138 (Idade Mínima). Este último só assinou a Convenção n.o 182 (Trabalho das Crianças) em Novembro de 2010, e o Usbequistão assinou a convenção relativa à idade mínima em 2009. A sua aplicação efectiva já é outra questão. Por conseguinte, o CESE insta a Comissão a, em colaboração com a OIT, centrar os esforços na identificação dos domínios e do modo como a Europa pode ajudar mais eficazmente a Ásia Central a respeitar estes compromissos.

5.4.2   Este processo constitui uma via prática para a instauração de confiança mútua. Embora se possa afirmar que nenhum direito humano é mais fundamental do que outro, persistem problemas concretos associados às liberdades fundamentais do ser humano, ao Estado de direito e às liberdades de reunião, de associação e de expressão. A UE obteve já bons resultados no tratamento de questões como a deficiência.

5.4.3   No entanto, subsistem preocupações e problemas relevantes, e os acontecimentos recentes no Norte de África realçam a importância de desenvolver uma sociedade civil activa e participante e a urgência de tratar estas questões subjacentes de uma forma positiva. O CESE pretende desenvolver um contacto estreito e efectivo e boas relações de trabalho com a sociedade civil da Ásia Central. O recurso a boicotes ou a imposição de condições muito severas dependendo dos progressos realizados não são opções realistas. A situação na região tem sido comparada à da Bielorrússia. Neste país, em Janeiro de 2011, na sequência dos distúrbios ocorridos após as eleições presidenciais realizadas no mês anterior, 158 titulares de cargos de alto nível foram proibidos de entrar na UE e as suas contas bancárias foram congeladas, algo que os cinco Estados da Ásia Central deverão ter bem presente.

5.4.4   No seu parecer sobre a comunicação relativa à Europa Global  (4), o CESE instou a Comissão a utilizar as 27 convenções constantes do seu sistema SPG+ (incluindo as oito convenções fundamentais da OIT) como base para os futuros acordos comerciais da UE. Há que retomar aqui este mesmo objectivo como base para desenvolver com a Ásia Central relações comerciais mais vastas e não relacionadas com a energia, juntamente com a aplicação de medidas de assistência técnica ao comércio, sempre que adequado, encorajando, ao mesmo tempo, a adesão à OMC. Apenas o Quirguistão é membro da OMC, mas a sua adesão em 1998 é hoje, de um modo geral, considerada prematura.

5.5   O anexo A inclui um breve resumo dos actuais problemas em matéria de direitos humanos em cada um dos cinco Estados.

6.   Questões ambientais

6.1   O sistema SPG+ inclui convenções fundamentais em matéria de ambiente. Assumem particular relevância para a Ásia Central as questões afins relativas à segurança alimentar, ao abastecimento de água e ao aprovisionamento energético, domínios em que a UE terá um papel fundamental a desempenhar no incentivo aos cinco países para cooperarem numa abordagem global a estes problemas. A estratégia da UE não clarifica até que ponto estas questões estão interligadas, sendo a questão da água tratada em separado tanto no âmbito da energia como da sustentabilidade ambiental, enquanto a segurança alimentar é encarada como um problema grave em si mesmo.

6.2   Em 2008, o Tajiquistão foi classificado pela FAO como um dos 17 países do mundo «em crise alimentar», o único na Ásia. O abastecimento de água é também uma questão fundamental para a região no seu conjunto, como o atestam a redução do volume de água do mar de Aral, o problema crescente do desaparecimento dos rios e o facto de o algodão ser uma cultura que exige uma utilização de água particularmente intensiva. A experiência adquirida pela UE na ajuda prestada a outros países também deverá contribuir para reforçar a confiança na Ásia Central.

6.2.1   O Tajiquistão, como o Quirguistão, dispõe de água durante a maior parte do ano (embora a má gestão e a danificação dos sistemas de distribuição tenham conduzido a níveis particularmente elevados de desperdício e, consequentemente, a faltas de água), ao passo que os seus vizinhos são afectados pela escassez de água, em particular o Usbequistão (que depende em grande medida de água proveniente do exterior para as suas culturas de arroz e de algodão, exigentes em água, e para ter água potável). Por outro lado, o Tajiquistão possui recursos muito limitados em termos de outras fontes de energia e, acima de tudo, é afectado pela insegurança alimentar, dependendo em larga medida dos seus vizinhos para o aprovisionamento energético e alimentar.

6.2.2   Em 2008, mais de dois milhões de habitantes do Tajiquistão (mais de um terço da população) foram considerados em estado de insegurança alimentar e 750 000 em estado de «insegurança alimentar grave». 64 % da população vive abaixo do limiar de pobreza. Só 7 % do território é próprio para a agricultura.

6.2.3   Infelizmente, o Usbequistão e o Tajiquistão não têm sido bons vizinhos, o que conduziu a um círculo vicioso de privações recíprocas, com a imposição de proibições de exportação de energia e de água, a água que se destinava, nomeadamente, à constituição de reservas nacionais de electricidade, que, em Dushanbe, só estava disponível duas horas por dia num período de frio intenso.

6.3   A crise demonstrou a importância de uma estratégia global, abrangendo a utilização ecológica dos recursos naturais, a redução da pobreza e, acima de tudo, a segurança alimentar, para a promoção do crescimento económico sustentável da Ásia Central no seu conjunto. No entanto, o Comité congratula-se com o facto de a UE já estar fortemente empenhada em ajudar o Tajiquistão e os seus vizinhos a enfrentarem estas crises.

Bruxelas, 16 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  JO C 211 de 19.8.2008, p. 82.

(2)  Centro de Estudos de Política Europeia.

(3)  Organização para a Segurança e Cooperação na Europa, o único elo político e institucional internacional que liga a Europa a todos os Estados da ex-URSS.

(4)  COM(2006) 763 final


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/55


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Para um Acordo de Associação UE-Mercosul: Contributo da sociedade civil organizada»

2011/C 248/09

Relator: José María ZUFIAUR NARVAIZA

Em 16 de Setembro de 2010, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do artigo 29.o, n.o 2, do Regimento, elaborar um parecer de iniciativa sobre

Para um Acordo de Associação UE-Mercosul: Contributo da sociedade civil organizada.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Relações Externas, que emitiu parecer em 25 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 89 votos a favor, 1 voto contra e 3 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Síntese e recomendações

1.1   O CESE considera que a celebração – caso sejam superados os diferendos existentes em matérias como a agricultura, a propriedade intelectual e o desenvolvimento sustentável – de um Acordo de Associação (AA) entre o Mercosul e a UE proporcionaria amplas oportunidades e todo o tipo de benefícios para ambas as partes, num contexto que se caracteriza por profundas mudanças no protagonismo dos actores globais, desafios mundiais de natureza geoestratégica, ambiental, social, energética e de governação, e perante a necessidade premente de abordar profundas reformas do modelo de desenvolvimento, que seja o meio para superar uma crise sistémica, só comparável à que se verificou nos anos 30 do século passado.

1.2   Na sua opinião, só será possível chegar a um acordo se este for equilibrado, beneficiar as duas partes e não sacrificar nenhum sector (como o agrícola ou o industrial), região ou país. O AA não deve, em caso algum, basear-se num mau acordo. Nesse sentido, solicita que as partes negociadoras tenham a vontade política necessária para viabilizar o Acordo de Associação e que se empenhem ao máximo para superar as divergências que afectam, sobretudo, o pilar fundamental do AA, a saber, as questões comerciais. Assim, pede que sejam utilizadas todas as fórmulas e os mecanismos passíveis de contribuir para essa finalidade: reconhecimento de assimetrias, medidas de acompanhamento e de compensação, estabelecimento de excepções, planos de desenvolvimento para apoiar os sectores mais afectados, promoção de investimentos, políticas de inovação, cláusulas compensatórias, transitórias e evolutivas. Além disso, seria necessário incluir todas as políticas da UE nas medidas de acompanhamento.

1.3   Em todo o caso, o CESE insta as partes envolvidas na negociação e, em particular, a União Europeia, a terem em consideração os elevados custos políticos, económicos e de oportunidade que resultariam da não consecução do Acordo.

1.4   O CESE considera essencial que o AA seja ambicioso e abarque todos os aspectos das relações entre a UE e o Mercosul. Neste sentido, é importante abordar os obstáculos reais com que se deparam as empresas, mediante a harmonização da regulamentação, assim como o impacto nas barreiras não comerciais. Especificamente, o AA devia incluir a dimensão social, laboral e ambiental, influenciando o acordo no seu conjunto. Essa dimensão deverá garantir que as relações económicas estão em conformidade com os objectivos sociais e ambientais acordados, sem prejuízo das normas e garantias que regulam o desenvolvimento sustentável. Deverá reflectir, igualmente, o compromisso das partes em relação às regras fundamentais em matéria de direitos sociais e dos trabalhadores, incluindo declarações internacionais, como as da OIT, que determinam que a violação dos princípios e dos direitos fundamentais no trabalho não pode ser utilizada como vantagem comparativa legítima no comércio internacional.

1.5   Solicita que tanto o Fórum Consultivo Económico e Social do Mercosul (FCES) como o próprio CESE, na qualidade de organismos representantes da sociedade civil de ambas as regiões, sejam envolvidos no decurso das negociações, nas avaliações de impacto do AA e nas propostas daí decorrentes (no entender do CESE, é fundamental não só analisar previamente o impacto de um potencial acordo como também definir mecanismos para verificar posteriormente o cumprimento e a evolução das questões acordadas), na elaboração de um capítulo específico do AA relativo à dimensão social, laboral e ambiental, bem como na concretização do Acordo, uma vez assinado, mediante a criação de um Comité Consultivo Misto composto pelos dois organismos representantes da sociedade civil organizada de ambas as partes (1).

2.   Introdução

2.1   As negociações que existiram entre a UE e o Mercosul com vista ao estabelecimento de um Acordo de Associação (AA) estagnaram em 2004 devido a grandes divergências entre as partes sobre o acesso aos mercados e às diferentes expectativas de cada uma em relação aos resultados da Ronda de Doha para o Desenvolvimento (RDD). Em contactos informais, realizados em 2009, constatou-se uma mudança de posição, o que levou as partes a concluir que estavam criadas novas possibilidades de acordo e permitiu que a Cimeira UE-ALC de Maio de 2010 tomasse a decisão de retomar as negociações. Deveria tratar-se de um AA ambicioso que integrasse na dimensão comercial não apenas o comércio de mercadorias, mas também serviços, investimentos, contratos públicos, propriedade intelectual (incluindo as denominações geográficas), facilitação do comércio, medidas sanitárias e fitossanitárias, comércio e desenvolvimento sustentável, concorrência ou instrumentos de protecção do comércio.

3.   Potencialidades e oportunidades do AA

3.1   Com uma população superior a 700 milhões e com mais de 84 mil milhões de euros em trocas comerciais por ano, a concretização de um AA entre a UE e o Mercosul permitiria a constituição de um grande espaço de integração económica, o que poderia beneficiar ambas as partes e gerar externalidades positivas, especialmente para o resto da América Latina.

3.2   A UE é, no seu conjunto, a primeira economia mundial e o bloco do Mercosul situa-se entre as seis maiores economias do mundo. O Mercosul constitui igualmente um espaço de enorme vitalidade, com taxas de crescimento económico anual elevadas nos últimos anos, alcançando os 7 % no Brasil e os 9 % na Argentina, no Uruguai e no Paraguai. Por outro lado, começa a ter uma base económica mais diversificada, com uma forte componente agroalimentar, mas também com uma base industrial crescente, dotada de valiosos recursos energéticos e tecnológicos.

3.3   A União Europeia é o maior parceiro comercial do Mercosul, à frente dos Estados Unidos. Em 2010, a UE fez importações do Mercosul no valor de cerca de 44 mil milhões de euros e exportações de mais de 40 mil milhões. Sublinhe-se que as exportações da UE para o Mercosul já igualam as exportações para a Índia e superam as exportações para o Canadá ou para a Coreia do Sul. Por outro lado, os investimentos que a UE realiza no Mercosul superam os realizados na China, na Índia e na Rússia em conjunto.

3.4   As economias das duas partes são em larga medida complementares, o que é claramente reflectido no perfil do comércio entre elas, com a UE a exportar essencialmente bens manufacturados, bens de equipamento, equipamentos de transporte e produtos químicos, e a importar produtos alimentares e energéticos. Contudo, os intercâmbios estão em constante evolução nas duas partes: por exemplo, a UE aumentou sensivelmente as suas exportações de produtos agrícolas transformados; por outro lado, em 2007-2008, as empresas brasileiras investiram mais na Europa do que as empresas europeias no Brasil. A consecução de um Acordo de Associação teria, portanto, um enorme potencial de criação de riqueza.

3.5   Um AA com o Mercosul permitiria à UE estreitar os laços económicos e geopolíticos com um parceiro estratégico. Através de um acordo birregional, a UE ganharia um avanço em relação a outros concorrentes internacionais, como os EUA e a China. Além disso, o AA reforçaria a Parceria Estratégica com o Brasil – que exclui o aspecto comercial –, país com particular relevância no quadro geopolítico das relações internacionais, pois é membro dos dois principais mecanismos que coordenam os interesses das economias emergentes: BRIC e IBSA (2). Tudo isto resultaria numa maior integração, primeiro, sul-americana e, segundo, latino-americana, num continente que possui reservas cruciais de energia, alimentação e água, três recursos que serão vitais no século XXI. No seu conjunto, o AA poderia contribuir para atenuar a desvalorização económica e geopolítica do Atlântico face ao Pacífico.

4.   Obstáculos e fragilidades do Acordo de Associação

4.1   As vantagens incontestáveis de um Acordo de Associação entre a UE e o Mercosul não fazem esquecer, porém, as dificuldades inerentes a um acordo desta natureza, que podem resumir-se às seguintes quatro categorias: 1) complexidade da agenda das negociações, ou seja, o conteúdo comercial do Acordo; 2) fragilidades estruturais que prejudicam a integração do Mercosul e condicionam o comércio livre; 3) dimensão social e ambiental do AA; 4) grau de vontade política das partes para chegarem a acordo e, por conseguinte, disponibilidade para utilizarem todos os possíveis mecanismos compensatórios, dentro e fora do âmbito do Acordo, para o poder alcançar. As duas últimas categorias são desenvolvidas, respectivamente, nos pontos 5 e 7 do parecer.

4.1.1   No que respeita às questões comerciais, as dificuldades estão bastante bem identificadas. Do ponto de vista europeu, estas centram-se no sector agroalimentar dos países do Mercosul, como indicado nas recentes avaliações de impacto da Comissão (3). Em particular, receiam-se fortes impactos negativos em sectores como o do açúcar, das carnes de bovino, de frango e de suíno, das frutas e dos produtos hortícolas. Considera-se também que há um excessivo proteccionismo para bens industriais (automóveis e produtos químicos) e mesmo para alguns produtos agrícolas transformados (incluindo o vinho), o risco de desrespeito das regras de protecção das denominações de origem, um nível de exigência das regras de segurança alimentar e de protecção do ambiente relativamente baixo e falta de total transparência nos contratos públicos. Após as últimas rondas de negociações, as posições das partes tornaram-se mais favoráveis ao acordo em áreas como o comércio e o desenvolvimento sustentável e nas questões relacionadas com as regras de origem.

4.1.2   Na perspectiva do Mercosul, o sector agrícola também constitui o elemento mais relevante. Em 2004, a Europa ponderava liberalizar, após terminados os períodos transitórios, 86,25 % do total das importações dos produtos agrícolas. É provável que actualmente o limiar de negociação se situe a um nível mais elevado. A possibilidade de fixar quotas torna a negociação mais viável. Além disso, os riscos assinalados pelos sectores agropecuários europeus poderão ser mitigados se a negociação do AA incluir a exigência de um cumprimento razoável dos mesmos níveis de qualidade – ambientais, de segurança alimentar, de bem-estar dos animais, etc. – na produção europeia e nos produtos importados do Mercosul. Por outro lado, o AA não deveria aumentar a dependência alimentar da EU e deveria englobar os instrumentos necessários para evitar um modelo de agricultura intensiva e pouco sustentável. Quanto aos produtos industriais, onde os obstáculos são menores, o entendimento parece ser mais viável, como se verificou, por exemplo, no acordo da UE com a Coreia do Sul sobre a indústria automóvel. Por fim, outros temas, como a propriedade intelectual, que são particularmente delicados para alguns países do Mercosul como o Brasil, poderiam ser objecto de cláusulas evolutivas ou transitórias, com base no estabelecido pela OMC. Neste sentido, o CESE considera que se poderia elaborar, entre outras iniciativas, um programa sobre a propriedade industrial que impulsione a transferência tecnológica e sirva para implantar um sistema de patentes válido entre a UE e Mercosul, susceptível de ser alargado a toda a região latino-americana.

4.1.3   O CESE considera que, apesar das dificuldades, há actualmente melhores condições do que havia anteriormente para se chegar a um acordo que, no seu conjunto, seja equilibrado, beneficie ambas as partes e não prejudique nenhum sector, região ou país (4).

4.2   As fragilidades estruturais do Mercosul têm constituído, historicamente, um entrave considerável à concretização do AA. Entre estas, há que destacar: um défice de redes e estruturas comuns, num território com uma superfície três vezes maior que o da UE, uma baixa percentagem de comércio inter-regional (15 % no Mercosul, 45 % no ACLAN e 66 % na UE) e o predomínio do comércio extra-regional, uma união aduaneira incompleta, uma coordenação limitada das políticas macroeconómicas e a fragilidade das instituições regionais.

4.2.1   Nos últimos anos, sobretudo a partir de 2003 – como consequência do que na altura parecia a possibilidade iminente de alcançar um acordo entre a UE e Mercosul –, o processo de integração regional do Mercosul conheceu um forte impulso, com iniciativas como a incorporação de políticas comuns em áreas como a da energia, da exploração de recursos de gás e petróleo ou da criação de infra-estruturas de comunicação, a adopção de uma política automóvel comum entre a Argentina e o Brasil e a criação do Fundo para a Convergência Estrutural do Mercosul (FOCEM). Aprovou-se igualmente um plano estratégico para a superação das assimetrias no mercado interno e estabeleceram-se medidas de tratamento preferencial e diferenciado para o Paraguai e o Uruguai.

4.2.2   Por sua vez, em 2000, os governos do Mercosul criaram o Grupo de Monitorização Macroeconómica, incumbido do acompanhamento de uma série de parâmetros de convergência macroeconómica e da elaboração de metodologias comuns para a sua utilização.

4.2.3   Tudo isto contribuiu para expandir o comércio inter-regional, melhorar a sua qualidade de produção e captar novos fluxos de investimento estrangeiro directo.

4.2.4   Além disso, nos últimos anos, o Mercosul tem vindo a acentuar a sua dimensão política: criou tribunais de arbitragem e de recurso, passou de um secretariado administrativo para um secretariado técnico, assinou um protocolo sobre direitos humanos, criou o Parlamento do Mercosul (PARLASUL) e designou o seu primeiro Alto Representante Geral. No entanto, o processo de integração económica ainda está debilitado, são muitos os conflitos comerciais e a institucionalidade permanece incipiente.

4.2.5   Merece especial destaque o facto de, em Agosto de 2010, o Mercosul ter finalmente aprovado um novo Código Aduaneiro Comum (com quase 200 artigos), o que implica a eliminação da dupla cobrança da tarifa externa comum (TEC) aplicável aos produtos transfronteiriços. Tal obriga a adoptar uma política comercial comum e a harmonizar outros elementos, como os regimes especiais de importação ou os instrumentos de protecção comercial. Exigirá igualmente a interligação dos sistemas informáticos de gestão aduaneira e a criação de um mecanismo de cobrança e repartição das receitas da TEC. Estes progressos no âmbito da união aduaneira constituem um factor de grande importância, que facilita as negociações entre a UE e o Mercosul.

4.2.6   A conclusão de um AA pode acelerar todo este processo de maior integração económica do Mercosul, regulamentação do mercado interno e reforço da institucionalidade do bloco.

5.   Impacto do Acordo de Associação e medidas compensatórias

5.1   Por incumbência da Comissão Europeia, foi realizado um estudo sobre os impactos da liberalização do comércio entre a UE e o Mercosul, tanto em relação ao AA no seu conjunto, como a três sectores específicos: agrícola, automóvel e florestal. O estudo analisa os possíveis efeitos positivos e negativos do AA e propõe medidas e recomendações para reforçar os efeitos positivos e prevenir ou reduzir todos os eventuais efeitos negativos, tanto no âmbito global do Acordo como nos sectores individuais analisados.

5.2   O CESE recomenda que as partes da negociação tenham em conta essas medidas de acompanhamento, quer no conteúdo comercial do Acordo quer através da componente de cooperação e de programas comuns entre a UE e o Mercosul. Considera igualmente que elas podem fazer parte dos elementos a incluir na agenda de reivindicações do FCES do Mercosul e do CESE, no processo de negociação do AA.

5.3   Considera que, para facilitar o AA, este poderia incluir cláusulas evolutivas que permitam aprofundar e ampliar algumas matérias do acordo birregional em fases posteriores.

5.4   É de opinião que as avaliações de impacto deveriam conferir maior destaque, por um lado, à participação de peritos e de organizações do país parceiro do Acordo e, por outro, à identificação de riscos sociais e ambientais, que actualmente são entendidos como um mero complemento da avaliação económica (5), incluindo a questão da concentração da riqueza e a sua desigual distribuição, que o Acordo pode gerar.

6.   O desenvolvimento sustentável no Acordo de Associação

6.1   Na opinião do CESE, o futuro Acordo de Associação UE-Mercosul deve incluir, de forma transversal a todo o Acordo, uma dimensão social, laboral e ambiental como parte integrante de um acordo destinado a apoiar o desenvolvimento sustentável em ambas as partes, ou seja uma dimensão que complete a dimensão económica e comercial do AA.

6.1.1   O CESE segue, deste modo, a posição oficial das instâncias que dirigem tanto a UE como o Mercosul (6), segundo a qual a liberalização das trocas comerciais deve ser acompanhada de compromissos e acções em matéria social e ambiental.

6.1.2   Neste contexto, o CESE defende que o AA deveria estabelecer as premissas sociais e ambientais a respeitar, para que seja possível criar uma relação comercial e económica que favoreça a coesão económica e social, seja coerente no âmbito de uma estratégia de desenvolvimento sustentável e reforce a competitividade do tecido produtivo local (PME, economia social e microempresas), tendo em conta a sua capacidade para criar emprego.

6.1.3   O CESE considera que a dimensão social e ambiental afecta o AA no seu conjunto. A componente comercial do Acordo, por seu lado, deveria incluir aspectos relacionados com a defesa dos direitos humanos, dos direitos dos trabalhadores, dos direitos sociais e dos direitos ambientais e um artigo específico dedicado às questões relacionadas com o comércio e o desenvolvimento sustentável, designadamente:

exclusão dos fluxos comerciais dos produtos (peixe, madeira) obtidos ilegalmente;

inclusão de iniciativas de comércio justo ou de responsabilidade social das empresas nos programas de comércio e investimento;

compromisso de supervisionar periodicamente o impacto das relações comerciais nos assuntos sociais e ambientais;

interdição da derrogação às leis de protecção social ou de defesa do ambiente, a fim de evitar regalias indevidas no comércio internacional;

prevenção da desflorestação.

7.   As componentes estratégicas do Acordo de Associação UE-Mercosul

7.1   É imprescindível uma vontade política determinada, em primeiro lugar, para conceber e impulsionar o AA não só como um acordo de comércio livre, mas também como um acordo estratégico mais global, que traga vantagens a longo prazo para ambas as partes em matéria de desenvolvimento, segurança, processos migratórios e desafios ambientais. Em segundo lugar, ela é necessária para utilizar todos os mecanismos disponíveis que permitam ter em conta as assimetrias existentes entre ambas as regiões, reduzir os impactos negativos da liberalização em alguns sectores, colmatar o desfasamento que ainda existe no processo de integração no Mercosul e estabelecer a participação social e a transparência como elementos-chave da negociação entre as duas regiões.

7.2   O AA representa uma grande oportunidade para avançar no sentido dos objectivos estratégicos globais, que interessam a ambas as regiões.

7.3   Em primeiro lugar, o AA proporcionaria uma presença política e económica internacional, num contexto em que o poder económico e político está a deslocar-se do Atlântico para o Pacífico. O Mercosul não tem acordos com os Estados Unidos nem com as grandes potências asiáticas, embora tenha assinado acordos de comércio livre com o Chile e com os membros da Comunidade Andina. Além disso, está em curso a integração da Venezuela no bloco. Fora da região sul-americana, tem acordos, inclusivamente de comércio livre, com a África do Sul, a Índia, o Paquistão, a Turquia, o Egipto, Marrocos e Israel. A UE, por seu lado, tem acordos bilaterais com o México, o Chile, a América Central, o Peru, a Colômbia, a África do Sul, as Caraíbas e a Coreia do Sul. Resumindo, um AA entre a UE e o Mercosul faria emergir um bloco birregional com um grande peso específico no novo panorama mundial.

7.3.1   O AA seria igualmente muito importante para promover uma maior integração de toda a região latino-americana. O Acordo seria um grande foco de atracção para outros agrupamentos sub-regionais dos países da América Latina e Caraíbas (ALC), bem como de outros países, como o México ou o Chile. Uma aliança estratégica entre ambas as regiões, os 27 Estados-Membros da UE e os 33 países da ALC, teria um peso relevante nos organismos multilaterais. De igual modo, aumentaria a capacidade de influência no G-20, ao qual pertencem três países latino-americanos (o Brasil, o México e a Argentina) e cinco europeus (a Alemanha, a França, o Reino Unido, a Itália e a Espanha), além da própria UE.

7.3.2   Por fim, graças ao Acordo de Associação, a UE poderia encontrar no Mercosul um aliado estratégico para o seu objectivo de promover a defesa do ambiente a nível mundial. O ambiente é, actualmente, uma das matérias que mais preocupa os governos, os cidadãos e o sistema multilateral. A UE está na vanguarda de políticas e tecnologias ecológicas. Para a América Latina, e em particular para o Mercosul, os recursos naturais são um dos principais pontos fortes, mas a região também é uma das mais ameaçadas pelas alterações climáticas, entre outras coisas, por algumas práticas de agricultura intensiva.

7.3.3   Para garantir um apoio adequado a este último objectivo, seria necessário incluir um forte conteúdo relativo a energia, ambiente, ciência, tecnologia e inovação. Estes domínios deveriam ser prioritários na componente relativa à cooperação para o desenvolvimento. O sexto programa-quadro de Investigação e Desenvolvimento Tecnológico da UE já levou a cabo vários projectos com os membros do Mercosul. Nesta ocasião, seria conveniente que uma tal colaboração fizesse parte integrante do AA. A grande dotação do 7.o PQ (50 mil milhões de euros) poderia dar um importante contributo para o efeito.

8.   A sociedade civil e o Acordo de Associação

8.1   O CESE considera que o carácter inter-regional da negociação e do conteúdo do AA constitui um elemento fundamental e específico destas negociações, bem como um ponto de referência para as relações económicas num mundo cada vez mais aberto às trocas comerciais.

8.2   O CESE reitera os princípios de transparência e de participação, tanto no processo de negociação como no desenvolvimento do AA. Neste sentido, solicita que lhe sejam facultadas informações importantes durante o processo de negociação e permitido o acesso aos negociadores em tempo real para lhes transmitir as propostas do FCES e do CESE.

8.3   Solicita ainda que o Comité seja integrado na elaboração das avaliações de impacto de modo que possa apresentar recomendações sobre as medidas destinadas a eliminar ou a reduzir os impactos negativos do processo de liberalização comercial e apela à criação, após a assinatura do Acordo, de um observatório de carácter técnico para analisar de forma permanente os impactos económicos, sociais e ambientais do Acordo de Associação e propor medidas concretas.

8.4   Em consonância com as posições conjuntas do CESE e do FCES, bem como dos próprios pré-acordos realizados durante as negociações anteriores a 2004, o CESE solicita a constituição de um Comité Consultivo Misto da sociedade civil no âmbito do Acordo de Associação, composto por um número igual de membros do CESE e do FCES e cujas funções consultivas obrigatórias devem abranger todas as matérias do AA, incluindo o capítulo comercial e o acompanhamento das questões relativas ao desenvolvimento sustentável.

8.5   Considera indispensável a integração de uma dimensão social no Acordo, de modo que este vá para além dos seus aspectos comerciais e tenha por objectivo global o aumento da coesão social, em particular no que toca ao seu impacto no emprego, na protecção dos interesses das populações locais e dos mais desfavorecidos, na promoção e no respeito dos direitos humanos, na protecção ambiental e nos direitos dos imigrantes e dos trabalhadores em geral. Assim, o Acordo deveria incluir as declarações internacionais, como as da OIT, que determinam que a violação dos princípios e dos direitos fundamentais no trabalho não pode ser invocada nem utilizada como vantagem comparativa legítima no comércio internacional. O objectivo é que o Acordo gere emprego de qualidade, melhore as condições sociais dos trabalhadores e contribua de forma sensível para uma melhor distribuição da riqueza.

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Ver, neste sentido, a Declaração de Assunção sobre as negociações para um Acordo de Associação UE-Mercosul, assinada pelo FCES e o CESE em 22 de Março de 2011, http://www.eesc.europa.eu/resources/docs/2011_decl_pt.pdf.

(2)  BRIC: Brasil, Rússia, Índia, China. IBSA: Índia, Brasil, África do Sul.

(3)  Direcção-Geral de Agricultura e Centro Comum de Investigação da Comissão Europeia, Abril de 2011.

(4)  Tal como reconhecido pelos Chefes de Estado e de Governo reunidos na Cimeira UE-Mercosul de Maio de 2010.

(5)  «Avaliações de impacto da sustentabilidade e política comercial da UE», Evelyne Pichenot (JO C 218 de 23.7.2011, p. 14-18).

(6)  Declaração de Buenos Aires dos Ministros e Autoridades de Desenvolvimento Social do Mercosul, de Julho de 2006. Conselhos Europeus de Fevereiro de 2005 e de 2006.


25.8.2011   

PT

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C 248/60


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «O Diálogo Intercultural e os Romes: O papel essencial das mulheres e da educação» (aditamento a parecer)

2011/C 248/10

Relatora: Anne-Marie SIGMUND

Em 24 de Fevereiro de 2009, o Comité Económico e Social Europeu decidiu, nos termos do artigo 29.o, parágrafo A, das Disposições de Aplicação do Regimento, elaborar um aditamento a parecer sobre

O Diálogo Intercultural e os Romes: O papel essencial das mulheres e da educação.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania que emitiu parecer em 27 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 16 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 127 votos a favor e 2 votos contra, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O Comité adopta a última frase da comunicação da Comissão de 5 de Abril de 2011 (1) como regra da sua acção no contexto das presentes propostas.

1.2

Sublinha que a partir de agora, em vez de se desenvolver mais estratégias para os Romes e elaborar análises sobre os Romes, há que adoptar medidas de aplicação concretas com os Romes ou as organizações que os representam.

1.3

O Comité está disposto, no limite das suas competências, a participar nessas medidas ou a promover, como até agora, iniciativas em estreita cooperação com as organizações de Romes (por exemplo, audições e conferências).

1.4

O Comité reforçará as suas relações com as instituições, organizações e outros organismos activos neste domínio e trabalhará no sentido de uma acção conjunta (2).

1.5

O Comité considera o diálogo intercultural como um instrumento apropriado para alcançar a integração ou participação dos Romes, tanto no que se refere ao papel desempenhado pelas mulheres romani neste processo como no domínio da educação e formação.

1.6

Sempre que possível, o Comité procurará participar em iniciativas locais ou lançá-las ele próprio, através das suas redes activas.

2.   Contexto e abordagem

2.1

No seu parecer exploratório de 9 de Julho de 2008 (3), o CESE apresentou uma série de recomendações para agilizar a integração da minoria romani na Europa. Foi proposta uma abordagem dual à educação das crianças romani, coordenada entre a UE e os níveis nacionais, e a Comissão foi instada a aplicar uma estratégia global e a financiar campanhas de sensibilização. Uma participação activa de representantes dos Romes no processo foi considerada a única alternativa viável.

2.2

A Comissão Europeia (4) adoptou esta recomendação, assinalando que o CESE (5) identificara que «a integração das questões dos ciganos em todas as políticas europeias e nacionais pertinentes constitui a via mais promissora para a inclusão».

2.3

O princípio subjacente ao presente aditamento de parecer é o do diálogo intercultural, baseado na ideia de que as duas partes, neste caso a minoria romani na Europa e a população europeia não romani, estabelecem voluntariamente um diálogo sem preconceitos. Este diálogo intercultural requer que se examinem tanto as semelhanças como as disparidades nas tradições e estilos de vida, a fim de compreender melhor a realidade efectiva e encontrar soluções exequíveis.

2.4

Em termos de conteúdo, o presente parecer centra-se na educação e formação enquanto primeiro pilar da integração (6) e o que o CESE considera mais prioritário, e neste contexto, aborda igualmente o papel particular das mulheres na integração dos Romes.

2.5

O Comité apoia a estratégia da Plataforma Europeia para a Inclusão dos Romes, em especial os dez princípios básicos comuns para a inclusão dos Romes estabelecidos pela plataforma em 2009 (7).

3.   Observações na generalidade

3.1

Um dos lemas mais utilizados para apresentar o projecto de integração europeu é Unidade na Diversidade. Neste contexto, os Romes são um exemplo significativo da diversidade cultural da Europa, um aspecto que é ainda mais enriquecido pelo facto de os próprios Romes (8) reflectirem várias identidades culturais (9).

3.2

Desde 1999 (10), o Comité tem defendido uma definição mais ampla da cultura, abrangendo não só a arte, a tradição e o património cultural, mas também, por exemplo, a educação, a ciência e a investigação. Nesta perspectiva, a educação e a formação têm também uma importância especial para o diálogo intercultural, em especial com os Romes.

3.3

Às objecções que surgem contra o multiculturalismo (11), o Comité responde que embora os seus pontos de vista estejam correctos em muitos sentidos prestam-se, porém, a interpretações erradas, na medida em que não se aplicam a uma sociedade como a da União Europeia, que está vinculada por uma «cultura dominante» (12) comum.

3.4

Em harmonia com esta visão da cultura enquanto reconhecimento de valores comuns, cabe concluir que a identidade europeia está principalmente relacionada com uma identidade cultural, como confirmado pelo artigo 2.o do Tratado da União Europeia, a chamada «cláusula de valores». O diálogo intercultural é, por isso, o instrumento apropriado para contribuir a longo prazo para a integração em geral e dos Romes em particular. O Comité considera que a tolerância deve ser alvo de especial atenção.

3.5

Tolerância significa o direito dos outros a serem diferentes e engloba o exercício desse direito bem como a sua aceitação. Isto aplica-se tanto aos Romes como aos não Romes. No entanto, no diálogo intercultural, há uma outra dimensão fundamental da tolerância: não se trata apenas de resolver potenciais conflitos entre diferentes padrões, mas também de ser sensível a outros modos de vida, criando, assim, a empatia necessária para a coexistência.

3.6

As iniciativas da Comissão Europeia e do Parlamento para melhorar a situação dos Romes (13) são instrumentos excelentes para estabelecer as bases das medidas e dos programas legislativos e políticos. No entanto, essas medidas são de natureza descendente, que não obterão os resultados desejados se não forem acompanhadas pelas iniciativas ascendentes correspondentes da sociedade civil, se necessário com o apoio dos órgãos públicos ao nível local, regional e nacional.

3.7

Face a isto, o Comité congratula-se com a recente comunicação da Comissão, em particular, apoia as suas afirmações sobre a necessidade de acção imediata e sublinha que esta toca não só às autoridades públicas ao nível local, regional e nacional, mas também, e sobretudo, a todos os intervenientes da sociedade civil dos dois lados.

3.8

Até agora têm sido despendidos montantes consideráveis a nível internacional e da UE na integração dos Romes. Os resultados, porém, não têm sido de forma alguma proporcionais aos montantes investidos até agora. Na opinião do Comité, isto deve-se ao facto de, apesar de várias iniciativas, conferências e reuniões terem sido, e ainda serem, realizadas ao nível da UE, estas actividades são insatisfatórias em termos da aplicação das medidas propostas, ainda que o seu conteúdo seja um êxito, devido, também, à falta de envolvimento ao nível local dos Romes afectados e das suas organizações de representantes.

3.9

O Comité gostaria de, no âmbito das suas competências, ajudar a solucionar este desfasamento entre boas propostas estratégicas e medidas de aplicação tácticas não apropriadas. Assim, esforçar-se-á por desempenhar a sua função de ponte com os cidadãos, utilizando as suas redes e as organizações dos seus membros para aproveitar os eventos organizados localmente para promover uma maior disponibilidade para aceitar os serviços oferecidos e satisfazer os compromissos assumidos.

4.   O papel das mulheres romani

4.1

De vários relatórios infere-se que, nas famílias romani, a educação dos rapazes em idade pré-escolar cabe, em geral, às mães (14), ao passo que após a entrada na escola o pai também participa na educação. A educação das raparigas, mesmo após a entrada na escola, mantém-se da responsabilidade das mães. No entanto, dado que a etapa que mais marca as crianças é principalmente a idade pré-escolar, é importante para todas elas que em casa as preparem para a escola. Por isso, são necessárias medidas para interessar as mães na importância da educação e formação dos filhos, em particular das raparigas, e oferecer-lhes orientação para que proporcionem uma preparação concreta aos seus filhos antes da entrada na escola.

4.2

Estas medidas, porém, só serão bem sucedidas quando existirem ofertas (sobretudo a nível local) que tenham em conta as diferentes tradições. Para tal, as autoridades públicas têm a obrigação de oferecer programas de formação apropriados e evitar a segregação.

4.3

Além disso, será necessário levar a cabo programas de reforço de competências e de conhecimentos (capacity building) que capacitem as mulheres romani para desempenhar verdadeiramente este papel importante.

4.4

Nas famílias romani tradicionais vivem várias gerações sob o mesmo tecto: os avós também têm influência sobre a educação das crianças e, em muitos casos, mais até do que os pais. Por isso, é importante envolver os avós que, sem dúvida, servem de modelo para as gerações futuras.

4.5

Se se conseguir aproveitar a força transformadora das mulheres romani para o futuro dos seus filhos, obter-se-á também um efeito suplementar: este tipo de medidas e iniciativas concretas contribuirão para destruir os estereótipos sobre as mulheres romani. Demasiadas vezes elas são apresentadas como objectos, seja como vítimas de discriminação, de violência doméstica ou qualquer outro tipo de maus-tratos ou desprezo. Obviamente, trata-se de indicações importantes que não se podem ignorar. Por isso, é também evidente que são necessárias medidas apropriadas contra este tipo de abusos. Não obstante, para além destas considerações, o Comité estima também pertinente sublinhar o papel activo que as mulheres romani desempenham na sua comunidade e a importância que podem adquirir, ultrapassando os limites daquela, enquanto cidadãs activas, ou seja, enquanto participantes no diálogo intercultural.

4.6

O Comité apoiará as iniciativas que façam justiça a esta concepção que as mulheres romani tenham do seu próprio papel e, dentro das suas capacidades, contribuirá para que essas mulheres tenham acesso à informação e aos instrumentos que lhes possam facilitar o desempenho da sua função para a integração das suas famílias.

4.7

Por conseguinte, o Comité procurará oportunidades que lhes permitam, através da sua participação em eventos locais, não só divulgar informações concretas mas também fomentar a vontade de participar.

5.   Educação e formação

5.1

O objectivo é garantir a inserção social dos grupos desfavorecidos da comunidade romani, sem que isso implique a perda da sua identidade cultural de Rome. Receber uma boa educação é extremamente importante por dois motivos: em primeiro lugar, a educação pode e deve transmitir aos cidadãos, homens e mulheres, valores fundamentalmente comuns que possibilitem que diferentes grupos étnicos possam conviver sem fricções. Um destes valores é também a abertura a outras culturas. Em segundo lugar, a educação pode ser um instrumento importante de integração, dado que, teoricamente, implica uma interacção entre diferentes culturas. Embora nunca seja demasiado tarde para adquirir novos conhecimentos e qualificações, é essencial começar a receber uma boa educação o mais cedo possível na vida. Uma percepção adequada de si mesmo por uma criança e a consciência do seu papel num grupo mais amplo e, mais tarde, na sociedade em geral são elementos fundamentais para uma vida bem sucedida.

5.2

As medidas e as políticas deviam visar a obtenção e a garantia de um acesso equitativo a uma educação de alto nível para os Romes e os demais grupos minoritários, já que, no fundo, o objectivo é dotá-los das competências necessárias para o mercado de trabalho, incluindo as competências sociais. As pessoas devem ter a possibilidade de organizar a sua vida de forma autónoma e agir como cidadãos responsáveis conscientes das suas obrigações e direitos e capazes de os exercer.

5.3

Todavia, a ausência de participação no mercado de trabalho não só indica um problema social, mas também tem repercussões económicas consideráveis. Em consequência, as despesas em educação e formação, embora constituam essencialmente um factor de custo, pela sua própria natureza não devem ser consideradas apenas uma simples despesa, mas sim, e sobretudo, um investimento significativo para o futuro.

5.4

No quadro do seu programa de educação e formação para crianças romani, o Conselho da Europa oferece também um programa de formação para mediadores e professores de apoio na escola, no qual a Comissão também participa. O Comité está disposto a actuar como mediador no quadro de uma futura cooperação institucional neste domínio. Por exemplo, pode contribuir para divulgar o programa e os seus resultados através dos canais de comunicação de que dispõe ou apresentar os exemplos de boas práticas do programa nos países que actualmente não participam no projecto do Conselho da Europa.

5.5

Neste contexto, sabe-se que a percentagem de abandono escolar prematuro entre os Romes é desproporcionalmente mais elevado do que o das crianças não romani (15). É, pois, necessário reflectir, em conjunto com as autoridades competentes, sobre medidas que possam ajudar a melhorar esta situação.

6.   Educação: Exemplos ao nível nacional

6.1

A maior parte dos Estados-Membros da UE aprovou leis rigorosas contra a discriminação e em prol da igualdade a fim de adaptar a sua legislação às normas europeias. Apesar disso e infelizmente, a discriminação continua a sentir-se ao nível local e frequentemente as disposições jurídicas nacionais carecem de mecanismos para apresentar reclamações e declarar nulas as práticas discriminatórias quando os afectados se sentem alvo de discriminação. É, porém, de assinalar que a debilidade dos controlos permite que um Estado efectue alterações meramente de cosmética que podem agravar ainda mais os padrões de segregação.

6.2

No entanto, isto não significa que nenhum Estado-Membro da UE se tenha esforçado por melhorar o acesso a determinados direitos fundamentais, incluindo o direito à educação, para os Romes, ou que nenhum sistema jurídico nacional tenha capacidade para proteger os direitos dos Romes. Alguns tribunais municipais ou nacionais já declararam que as práticas de exclusão contra crianças romani violam a legislação nacional contra a discriminação. Já em 2004, antes da adesão da Bulgária à UE, o Tribunal Distrital de Sófia pronunciou-se contra o Ministério da Educação da Bulgária, a administração municipal e os representantes das autoridades escolares e determinou que a segregação privava as crianças romani do seu direito a uma educação em igualdade de circunstâncias (16). Apesar disso, essas sentenças constituem apenas uma reacção a casos específicos e não obrigam o poder local e regional a modificar as práticas discriminatórias que parecem predominar nos sistemas de ensino de muitos países europeus.

6.3

A Hungria assumiu um compromisso político firme e afectou bastantes recursos ao apoio de medidas que melhorem a situação económica e social e a participação dos seus cidadãos romani, ocupando a educação um lugar prioritário (17). As iniciativas de integração da Hungria caracterizam-se sobretudo por serem aplicadas no quadro da política geral de ensino. Opostamente, em países como a Roménia e a Bulgária, a integração dependeu mais das circunstâncias do momento e não revestiu um carácter global (18). No entanto, a abordagem húngara também tem inconvenientes na medida em que subsistem conflitos entre as diferentes medidas de política do ensino e entre a política de educação e as políticas de saúde, social e alojamento. Todos os Estados deviam tomar nota e ter em conta a presença destas possibilidades de conflito.

6.4

Neste contexto, o modelo alemão de educação intercultural e aprendizagem intercultural (aprendizagem em conjunto de pessoas de diferentes origens étnicas (19) merece uma atenção especial.

7.   Síntese

7.1

No tocante aos esforços para melhorar a integração dos Romes, é de lamentar que o conceito de integração da UE se refira exclusivamente aos cidadãos de países terceiros e não seja aplicável aos Romes que, em geral, são cidadãos da União.

7.2

Por isso, continua a ser importante sublinhar, mais uma vez, que, teoricamente, os Romes têm todos os direitos e direitos fundamentais inerentes à cidadania da União. É evidente que os Romes devem cumprir as suas obrigações como qualquer cidadão da União e que o seu incumprimento tem consequências legais. Todavia, por outro lado, há também que recorrer aos mecanismos de sanção previstos quando lhes forem negados os direitos já referidos.

7.3

O Comité frisa mais uma vez a importância que atribui ao estabelecimento de um diálogo intercultural com os Romes. Pela sua própria natureza, um diálogo constitui sempre um processo interactivo que se baseia na paridade entre os interlocutores e permite a participação. No quadro de um diálogo intercultural é possível eliminar preconceitos e criar confiança. O Comité considera que a eliminação de preconceitos e de estereótipos nos dois lados é precisamente uma condição indispensável para dar passos concretos no sentido de uma melhor convivência e uma verdadeira igualdade de oportunidades. O Tratado de Lisboa abriu novas possibilidades ao Comité de criar estruturas para o diálogo civil. No desempenho das tarefas que lhe foram confiadas, o Comité envidará também grandes esforços para fazer avançar o diálogo intercultural com os Romes.

Bruxelas, 16 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  «Chegou agora o momento de transformar as boas intenções em acções mais concretas.» (Comunicação da Comissão sobre «Um quadro europeu para as estratégias nacionais de integração dos ciganos até 2020», COM(2011) 173 final).

(2)  Ver anexo – «Iniciativas, Programas e Estudos» (http://www.eesc.europa.eu/resources/docs/SOC337_additional-info.pdf)

(3)  Parecer exploratório do CESE sobre a Integração de minorias — Os romes, ponto 5.3 (JO C 27 de 3.2.2009, p. 88).

(4)  Comunicação sobre A integração social e económica dos ciganos na Europa, COM(2010) 133 final.

(5)  Parecer exploratório do CESE sobre a Integração de minorias — Os romes, ponto 5.3 (JO C 27 de 3.2.2009, p. 88).

(6)  No contexto dos quatro objectivos de integração definidos pela Comissão, a saber, o acesso à educação, o direito ao emprego, o acesso aos cuidados de saúde, e o direito ao alojamento e aos serviços residenciais básicos associados.

(7)  

1.

Políticas construtivas, pragmáticas e não discriminatórias

2.

Focalização explícita, mas não exclusiva

3.

Abordagem intercultural

4.

Aspirar à integração

5.

Consciencialização para a perspectiva da igualdade entre homens e mulheres

6.

Disseminação de políticas comprovadas

7.

Utilização de instrumentos comunitários

8.

Envolvimento das autoridades locais e regionais

9.

Envolvimento da sociedade civil

10.

Participação activa dos ciganos

(8)  O termo Rome refere-se aqui aos ciganos, Sinti, Viajantes, Kalé, etc.

(9)  Ver neste contexto o parecer CdR 178/2010 fin, do Comité das Regiões.

(10)  Parecer do CES sobre O papel e o contributo da sociedade civil organizada na construção europeiaJO C 329 de 17.11.1999, ponto 5.2.1.

(11)  O modelo de uma «sociedade multicultural» não tem valores gerais vinculativos e é essencialmente um aglomerado de grupos que coexistem.

(12)  Ver Europa ohne Identität? Die Krise der multikulturellen Gesellschaft [Europa sem identidade? A crise da sociedade multicultural], Goldmann Verlag, p. 181, de Bassam Tibi, Prof. Emeritus, Göttingen.

(13)  Ver anexo – «Iniciativas, Programas e Estudos» (http://www.eesc.europa.eu/resources/docs/SOC337_additional-info.pdf), a Comunicação da Comissão sobre Um quadro europeu para as estratégias nacionais de integração dos ciganos até 2020 (COM(2011) 173 final ) e o relatório da eurodeputada Lívia Járóka sobre A estratégia da UE a favor da integração dos ciganos (2010/2276(INI)) (http://www.europarl.europa.eu/sides/getDoc.do?pubRef=-//EP//TEXT+REPORT+A7-2011-0043+0+DOC+XML+V0//PT&language=PT).

(14)  Conferência «Sou uma mulher romani europeia», 11 e 12 de Janeiro de 2010, Atenas.

(15)  Roma Education Fund, Avaliações nacionais, http://www.romaeducationfund.hu/publications/country-assessments; Open Society Institute, No Data-No Progress, Country Findings, Agosto de 2010,

http://www.romadecade.org/files/downloads/General%20Resources/No%20Data%20No%20Progress%20Country%20Findings.pdf.

(16)  Ver http://www.errc.org/cikk.php?cikk=2411&archiv=1.

(17)  Ver KEZDI, G. & SURANYI, E., «A Successful School Integration Program», Roma Education Fund Working Paper No. 2, 2009, que se pode consultar em http://www.romaeducationfund.hu/sites/default/files/publications/a_succesful_school_integration_kezdi_suranyi.pdf.

(18)  Ver European Roma Rights Centre, «The Impact of Legislation and Policies on School Segregation of Romani Children: A Study of Anti-Discrimination Law and Government Measures to Eliminate Segregation in Education in Bulgaria, Czech Republic, Hungary, Romania and Slovakia», ERRC Report, Fevereiro de 2007, que pode ser consultado em http://www.errc.org/en-research-and-advocacy-reports-intro-details.php?article_id=2743.

(19)  Ver Hanna Kipper, «Interkulturelle Pädagogik» 1992, p. 161; Franz Hamburger, «Die Vielfalt der Kulturen als Herausforderung für den Bildungsauftrag der Schule», Frankfurt/Main, 1989.


III Actos preparatórios

COMITÉ ECONÓMICO E SOCIAL EUROPEU

472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011

25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/64


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: A tributação do sector financeiro»

[COM(2010) 549 final]

2011/C 248/11

Relator: Stasys KROPAS

Em 7 de Outubro de 2010, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 113.° do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões - A tributação do sector financeiro

COM(2010) 549 final.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social que emitiu parecer em 31 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 102 votos a favor, 16 votos contra e 28 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1   O CESE saúda as iniciativas globais da Comissão que visam ajudar a recuperar o crescimento, a resiliência e a estabilidade financeira. A estabilidade e a eficácia do sector financeiro e, nesse sentido, a limitação da excessiva tomada de risco, bem como a criação dos incentivos correctos para as instituições do sector financeiro deveriam ser asseguradas por uma regulamentação e supervisão adequadas. A este respeito, o CESE manifestou-se recentemente a favor do desenvolvimento de um fundo de resolução de crises bancárias, como parte do enquadramento da gestão de crises.

1.2   No rescaldo da crise, os governos têm de desenvolver esforços no sentido de uma consolidação orçamental para poderem fazer face aos custos da crise e às consequências sociais e económicas num plano mais geral. O CESE é de opinião que o sector financeiro deveria contribuir, de forma justa e substancial, para estes esforços.

1.3   Como salientado na comunicação da Comissão, um número crescente de Estados-Membros já tomou medidas unilaterais relativamente à tributação do sector financeiro. Adoptaram regimes de tributação diferentes, assentes em bases de imposto distintas, taxas fiscais efectivas diferentes e com âmbitos de aplicação diversos. O CESE considera que se deverá harmonizar a base tributária destes mecanismos orçamentais e coordenar as medidas que visam impedir a tributação dupla. Se a Comissão adoptar iniciativas nesse sentido, deverá ter em conta os diversos impactos que estas poderão ter em cada Estado-Membro, a importância e a estabilidade dos mercados financeiros nacionais, o enquadramento fiscal existente em cada Estado-Membro e o novo imposto que um Estado-Membro possa ter criado sobre o respectivo sector financeiro no rescaldo da crise.

1.4   Novos impostos, requisitos e regulamentos poderão ter múltiplos efeitos no sistema financeiro e na economia em geral. Por conseguinte, importa avaliar cuidadosamente o seu impacto na base de capital e na capacidade dos bancos e das instituições financeiras para desempenharem o seu papel no financiamento da economia e das PME, em particular. A contribuição fiscal total do sector financeiro da UE deve ser comparada com outros sectores. Os efeitos da aplicação de impostos adicionais na competitividade global das instituições financeiras da UE têm de ser tido em conta.

1.5   Dado que as tensões a nível da liquidez e de solvabilidade constituíram um elemento determinante para o despoletar da crise, o CESE recomenda que qualquer novo imposto a ser aplicado às instituições financeiras tenha em conta a capacidade de pagamento e cumprimento de obrigações financeiras das instituições.

1.6   Ao efectuar o estudo de impacto, a Comissão deverá prestar especial atenção ao princípio da proporcionalidade. Isto significa que a carga administrativa decorrente de exigências de cumprimento, imposta aos operadores de mercado e às instituições financeiras, deverá ser proporcional ao objectivo subjacente a este novo imposto. Se a Comissão pretender introduzir um novo imposto no âmbito do modelo do imposto sobre as operações financeiras (IOF) terá de ser coerente com a política que tem vindo a desenvolver nos últimos anos para simplificar os procedimentos fiscais encarados como entraves na fase de pós-negociação. Caso pretenda introduzir um imposto sobre as actividades financeiras (IAF), deverá providenciar para que a base tributária seja compatível com a informação facilmente acessível pelas instituições financeiras no referencial de relato financeiro existente.

1.7   Apesar de reiterar as conclusões e recomendações apresentadas no seu parecer de 15 de Julho de 2010, a favor da introdução de um imposto sobre as transacções financeiras (ITF) (1), o CESE gostaria de salientar que, dado o risco de se estar a favorecer a deslocalização de actividades financeiras para centros financeiros fora da UE, seria preferível um ITF a nível global do que um ITF a nível da UE. Contudo, se a adopção de um ITF a nível global não for viável, o CESE consideraria a adopção de um ITF a nível da UE, tendo em conta os resultados da avaliação de impacto levada a cabo pela Comissão Europeia.

1.8   O imposto sobre as actividades financeiras (IAF) pode apresentar falhas semelhantes às do imposto sobre as operações financeiras (IOF), incluindo um efeito de deslocalização geográfica. O estudo preliminar de impacto a realizar pela Comissão deveria analisar estas questões.

1.9   A introdução de um novo imposto baseado nos fluxos de tesouraria e fora do âmbito do IVA, mantendo inalterado o insatisfatório regime de isenção do IVA, pode criar um sistema fiscal muito complexo para as instituições financeiras. Por conseguinte, em função dos resultados do estudo de impacto a realizar pela Comissão, o CESE considera que se fosse introduzido um novo imposto sobre o sector financeiro baseado em fluxos de tesouraria ou em factores semelhantes, então a Comissão deveria avaliar se não seria preferível inseri-lo no âmbito do IVA, de modo a garantir um tratamento administrativo mais fácil para o sector e atenuar os efeitos negativos do IVA irrecuperável. Importa igualmente ter em atenção os efeitos inesperados que a introdução de um imposto poderá ter no sector financeiro, em particular o desenvolvimento de sistemas alternativos que não estão sujeitos a uma regulamentação, supervisão ou controlo e que podem dar origem a problemas importantes.

1.10   Não se deve ignorar as implicações, a nível da concorrência, da aplicação de novos impostos à indústria bancária, tanto em termos da competitividade do sector bancário face ao sector não bancário como em termos da capacidade da indústria bancária para continuar a cobrir as necessidades financeiras da economia real. Este aspecto assume especial importância numa altura em que a economia tenta emergir da recessão.

2.   Contexto

2.1   No rescaldo da crise, os governos nacionais em todo o mundo enfrentam agora um grave problema com duas faces: por um lado, deverão proceder a uma reforma urgente do sistema financeiro e bancário e, por outro, precisam de novas fontes de receitas.

2.2   Decorre uma reflexão quanto à pertinência de contemplar múltiplos objectivos fiscais, incluindo a redução de externalidades negativas, a consolidação das finanças públicas, a contribuição do sector financeiro para o reembolso dos custos, a observância dos compromissos assumidos perante os países em desenvolvimento e a luta contra as alterações climáticas, e, partindo da suposição de que o sector financeiro não está a ser suficientemente tributado, a existência de um contributo justo e substancial do sector financeiro para os orçamentos públicos. Até à data, o objectivo dos impostos a aplicar ao sector financeiro permaneceu deveras vasto, e a natureza e os mecanismos desses impostos estão ainda a era objecto de análise.

2.3   Em 7 de Outubro de 2010, a Comissão Europeia publicou uma Comunicação sobre a futura tributação do sector financeiro (2), que tem por base um documento de trabalho interno (3) e na qual são previstos dois instrumentos:

A introdução de um imposto sobre as actividades financeiras (IAF) a nível da UE, a fim de gerar receitas para os orçamentos dos Estados-Membros e, ao mesmo tempo, ajudar a garantir uma maior estabilidade dos mercados financeiros. Considera que, se for bem concebido e aplicado, esse imposto não comportará qualquer risco excessivo para a competitividade da UE.

A nível global, a Comissão apoia a ideia de um imposto sobre as operações financeiras (IOF) que, no seu entender, poderia ajudar a financiar a resposta a desafios à escala internacional, como o desenvolvimento ou as alterações climáticas.

2.4   Tendo em conta a natureza global e sistémica da crise financeira, a Comissão também indica a possibilidade de o imposto bancário ter um efeito dissuasor da tomada de riscos excessivos. O imposto iria, a seu ver, complementar adequadamente as reformas a nível da regulamentação e da supervisão na medida em que melhoraria a eficiência, a resiliência e a estabilidade dos mercados financeiros e reduziria a sua volatilidade.

2.5   Como parte do enquadramento da gestão de crises, a Comissão também propôs iniciativas, incluindo a criação de um fundo de resolução de crises nos bancos (4), que já foi objecto de um parecer do CESE (5).

3.   Um contributo justo e substancial do sector financeiro para as finanças públicas

3.1   Devido ao papel que as práticas do sector financeiro tiveram no despoletar da crise, que forçou os governos a resgatar as instituições financeiras, generalizou-se a ideia de que não devem ser os cidadãos ou outros sectores a suportar os custos daí decorrentes. Este sentimento traduz-se no objectivo de levar o sector financeiro a «dar um contributo justo e substancial para os orçamentos públicos». Neste contexto, a Comissão pretende incluir no seu estudo económico uma avaliação de impacto circunstanciada que analise diversas opções de tributação com vista a apresentar uma proposta equilibrada.

O CESE recomenda à Comissão que realize uma sondagem sobre a contribuição fiscal total do sector dos serviços financeiros da UE, aferindo todos os diferentes impostos que as empresas de serviços financeiros já hoje pagam. Tal pode dar uma imagem de conjunto dos pagamentos do imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas, o IVA irrecuperável e os impostos laborais pagos pelos bancos enquanto empregadores. Paralelamente, os impostos pagos pelos trabalhadores deveriam ser incorporados enquanto medida da contribuição económica num sentido mais lato. A ideia seria verificar, por um lado, se há uma simetria entre a tributação e a mais-valia do sector bancário e, por outro, se a contribuição fiscal global do sector bancário é mais baixa ou mais elevada quando comparada com outros sectores-chave. E por último, poder-se-ia considerar a possibilidade de agregar o novo imposto bancário à actual contribuição fiscal total.

3.2   O CESE considera que, na eventualidade de introdução de um imposto sobre o sector financeiro, um tal estudo ajudaria a aferir o seu impacto em termos de âmbito de aplicação e de taxa fiscal efectiva. Deveria examinar minuciosamente a capacidade dos bancos de reconstituírem e fortalecerem a sua base de capital, bem como a capacidade dos bancos para financiar os agregados familiares e as empresas, em especial as PME, na UE.

3.3   Na opinião do CESE, as propostas relacionadas com o modo como a indústria do sector financeiro pode contribuir para fazer face aos custos de quaisquer crises futuras não podem ser consideradas separadamente do debate em curso sobre modificações mais amplas do sistema regulamentar e do vasto leque de medidas que visam reduzir a probabilidade e o impacto de um revés financeiro.

3.3.1   O melhor sistema de tributação do sector financeiro será aquele que consiga, de forma equilibrada, gerar receitas, por um lado, e limitar a tomada de risco, por outro.

4.   Imposto sobre as operações financeiras (IOF)

4.1   O IOF visa servir múltiplos propósitos, nomeadamente: suprimir os efeitos de actividade improdutiva nos mercados financeiros reduzindo a especulação e a volatilidade e, em simultâneo, fazer os dinheiros públicos voltar à procedência.

4.2   O Parlamento Europeu adoptou uma resolução sobre os impostos sobre as transacções financeiras, em Março de 2010, e um relatório sobre o financiamento inovador a nível mundial e europeu (6), em Março de 2011.

4.3   Ao aplicarem o IOF, as autoridades pretendem diminuir o número de operações financeiras arriscadas e especulativas («socialmente inúteis») (7). Poderão igualmente encará-lo como um instrumento para evitar que os bancos cresçam demasiado ou empreendam demasiadas operações de risco no futuro.

4.4   O CESE pronunciou-se sobre o IOF no seu parecer de iniciativa sobre o Imposto sobre as transacções financeiras, incluindo as seguintes conclusões e recomendações:

O objectivo principal deste imposto deve consistir na alteração do comportamento do sector financeiro, nomeadamente através da redução das transacções financeiras especulativas de curto prazo. Deste modo, as actividades do sector financeiro podem operar de acordo com o mecanismo de preços do mercado. O efeito pretendido poderia ser alcançado, na medida em que o IOP teria maior impacto nas transacções mais frequentes.

O segundo objectivo do IOF é a obtenção de receitas públicas. Esta nova fonte de receitas poderá ser utilizada no apoio ao desenvolvimento económico dos países em desenvolvimento, no financiamento das políticas climáticas destes mesmos países ou na redução dos encargos para as finanças públicas. Esta melhoria das finanças públicas implica que o sector financeiro reembolse as ajudas públicas recebidas. A longo prazo, estas receitas deverão constituir uma fonte genérica nova de receitas públicas.

4.5   Uma vez que alguns intervenientes têm referido o perigo de a aplicação do imposto a nível global poder provocar uma deslocalização geográfica, o IOF deveria, numa primeira fase, ser previsto a nível global, como defendido pela Comissão. Contudo, se a adopção de um IOF a nível global não for viável, o CESE seria a favor da adopção de um IOF a nível da UE, tendo em conta os resultados da avaliação de impacto levada a cabo pela Comissão Europeia.

4.6   O CESE considera que um IOF deveria ser concebido de forma a permitir uma fácil cobrança pelos sistemas de depositários centrais. Importa ter em conta os custos ligados à efectivação da cobrança e ao cumprimento de uma ampla base de incidência do IOF, assim como a incerteza jurídica para quem cobra o imposto sobre transacções fora dos mercados regulamentados (over-the-counter, OTC) de valores mobiliários e derivados transaccionados fora da Bolsa.

4.7   Por último, o CESE sublinha que continua a haver um importante número de jurisdições que constituem centros financeiros «offshore», com características pouco transparentes associadas ao segredo bancário e a uma tributação baixa ou inexistente. Dada a facilidade de estabelecer aí sucursais financeiras e de operar através da Internet, é imprescindível que uma maior transparência e uma cooperação efectiva judicial e fiscal sejam obrigatórias, em paralelo com a adopção de um imposto sobre as operações financeiras.

5.   Imposto sobre as actividades financeiras (IAF)

5.1   A principal particularidade do IAF, quando comparado com um IOF, é o facto de se aplicar às empresas do sector financeiro, enquanto o IOF se aplicaria aos operadores dos mercados financeiros. Além disso, enquanto o IOF se aplica à actividade de negociação, que se concentra em escassos centros financeiros, o IAF centra-se nos lucros e remunerações do sector financeiro, que seriam distribuídos de forma mais homogénea.

5.2   A Comissão, com base no relatório do FMI, considera que com a introdução de outro recurso – o imposto sobre as actividades financeiras (IAF) – seria possível melhorar a tributação do sector financeiro e, ao mesmo tempo, reduzir os efeitos externos negativos.

5.3   Ao conceber o IAF, a Comissão pode definir uma base tributária tomando como referência a demonstração financeira.

5.4   Os conceitos utilizados devem ser compreensíveis no âmbito dos quadros contabilísticos existentes, nomeadamente as Normas Internacionais de Relato Financeiro (IFRS) ou os Princípios Contabilísticos Geralmente Aceites (PCGA locais), uma vez que as instituições financeiras podem não aplicar as IFRS.

5.5   Caso o novo imposto se baseie em fluxos de tesouraria, a introdução de um IAF poder-se-á repercutir na liquidez e encarecer os fluxos de tesouraria, tanto mais que as tensões a nível da liquidez constituíram um elemento determinante para o despoletar da crise. É, portanto, aconselhável, quando da definição da base tributária do IAF, prestar especial atenção à capacidade de pagamento e cumprimento de obrigações financeiras das instituições, bem como à interacção entre o IAF e o IVA.

6.   IVA

6.1   No entender da Comissão, a introdução de um novo imposto é sustentada, entre outros, pelo regime de isenção de IVA aplicável ao sector dos serviços financeiros ao abrigo da Directiva 2006/112/CE do Conselho relativa ao sistema comum do imposto sobre o valor acrescentado (Directiva IVA).

6.2   O CESE gostaria de salientar que a principal razão para a isenção é a dificuldade conceptual e prática de medir o valor relacionado com serviços financeiros prestados pelos bancos, como acontece especialmente no caso dos serviços tradicionais de intermediação financeira ligados a depósitos e empréstimos. Estes serviços são tidos em conta através do diferencial entre os juros cobrados pelos empréstimos concedidos e os juros pagos pelos depósitos. Esta margem constitui uma medida composta global dos serviços de intermediação prestados por um banco a aforradores e mutuários que não pode ser prontamente avaliada no caso de transacções individuais para efeitos de aplicação de IVA ou de qualquer outro tipo de imposto sobre o consumo que se baseie no valor de uma transacção. Tem sido difícil desenvolver uma metodologia para atribuir esta margem a transacções individuais para efeitos de aplicação de um IVA de acordo com um método baseado no valor da factura. Questões semelhantes se colocam no caso da tributação dos seguros e de outros tipos de serviços financeiros, por exemplo, câmbio de divisas e negociação de títulos.

6.3   A isenção do IVA aplicada aos serviços financeiros está ligada, na legislação do IVA, à negação – ou limitação – do direito de deduzir o IVA das facturas. Isto significa que as instituições financeiras não podem deduzir na íntegra o IVA incorrido nas suas próprias despesas, que assim se converte num custo puro. O montante deste «custo oculto do IVA» pode ser considerável, porque os serviços subcontratados e as transacções intergrupos sofrem um efeito de cascata decorrente do imposto.

6.4   Em 2007, a Comissão apresentou uma proposta de directiva relativa à reforma do tratamento dado pelo regime do IVA aos serviços financeiros, assente em três pilares, incluindo a proposta de uma opção de tributar os serviços financeiros. O CESE considera que o debate sobre a tributação do sector financeiro não pode ser dissociado da proposta de reforma do regime do IVA (8).

6.5   O CESE encara também com preocupação o âmbito do IAF e a sobrecarga que resultaria da acumulação deste imposto com os montantes de IVA irrecuperável. Apesar de poder ser concebido de modo a visar especificamente rendimentos e/ou riscos económicos, o IAF incide nos lucros totais e nos salários na sua forma mais extensa (IAF adicional). Na opinião do CESE, a haver um novo imposto baseado em fluxos de tesouraria ou em factores semelhantes, a Comissão teria de avaliar se não seria preferível inseri-lo no âmbito do regime do IVA, de modo atenuar os efeitos do IVA irrecuperável e, assim, evitar um aumento dos custos para todos os operadores económicos na Europa.

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Parecer do CESE sobre o Imposto sobre as Transacções Financeiras, JO C 44 de 11.2.2011, p. 81.

(2)  COM(2010) 549/5.

(3)  SEC(2010) 1166/3.

(4)  COM(2010) 254 final.

(5)  Parecer do CESE sobre Fundos de resolução de crises nos bancos, JO C 107 de 6.4.2011, p. 16.

(6)  Resolução do Parlamento Europeu, de 10 de Março de 2010, sobre os Impostos sobre as transacções financeiras: Aplicação na prática e projecto de relatório sobre o financiamento inovador a nível mundial e europeu (2010/2105(INI)).

(7)  Taxing the Speculators [tributar os especuladores], http://www.nytimes.com/2009/11/27/opinion/27krugman.html.

(8)  COM(2007) 746 e 747 final.


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/68


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu, ao Comité das Regiões e ao Banco Europeu de Investimento: Conclusões do quinto relatório sobre a coesão económica, social e territorial: o futuro da política de coesão»

[COM(2010) 642 final]

2011/C 248/12

Relator: Carmelo CEDRONE

Em 9 de Novembro de 2010, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu, ao Comité das Regiões e ao Banco Europeu de Investimento – Conclusões do quinto relatório sobre a coesão económica, social e territorial: o futuro da política de coesão

COM(2010) 642 final.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social que emitiu parecer em 31 de Maio de 2011.

Na 472a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 16 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 133 votos a favor, 7 votos contra e 14 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões

1.1   Em síntese, o CESE apoia os pontos principais estabelecidos pela Comissão Europeia para a política de coesão:

aumentar o valor acrescentado europeu;

reforço da governança;

simplificar e racionalizar os processos de gestão;

melhorar a organização.

1.2   No entender do CESE, tais objectivos são realizáveis, na medida em que simultaneamente:

se reforce a programação estratégica, ajudando os Estados-Membros a completar as reformas institucionais para melhorar a funcionalidade das administrações;

se concentrem os recursos da UE num número reduzido de objectivos prioritários;

se alargue a mobilização económica e social e a participação dos parceiros socioeconómicos na execução da política de coesão;

se introduzam reformas nos princípios da adicionalidade e do co-financiamento;

se torne obrigatória a avaliação de impacto.

1.3   Há que não esquecer, com efeito, que a política de coesão deve contribuir para a melhoria dos serviços e das condições económicas e sociais dos cidadãos, bem como para o desenvolvimento e a redução das disparidades entre as regiões.

1.4   Este processo será favorecido se, no seu conjunto, se melhorarem o tecido económico e as condições das empresas, a sua produtividade e a competitividade, designadamente no caso das PME, das microempresas e das empresas artesanais. Por conseguinte, há que implicar directamente no dito processo as organizações representativas das empresas de vocação territorial ou, sobretudo, as pertencentes aos sectores considerados prioritários pela UE, em conjunto com as organizações sindicais e a sociedade civil.

1.5   Uma via interessante a considerar, à luz da coesão territorial, assim como da coesão infra-territorial, infrarregional e infrassectorial, consistiria no desenvolvimento (com o Objectivo 3) da cooperação transfronteiriça, interregional, canalizando mais recursos para a coesão territorial nas regiões e a estratégia macrorregional das Euro-regiões (Báltico, Mediterrâneo, Adriático, Alpes Adriático-Danúbio, Eixo Atlântico).

1.6   O CESE preconiza que a Comissão e os Estados-Membros consagrem esforços substanciais para fomentar o intercâmbio de informações sobre boas práticas e a prestação de assistência às administrações locais na gestão dos programas, inclusivamente mediante processos de reforma interna para lá dos sectores em causa.

1.7   Com efeito, só através de um maior conhecimento – actualmente insuficiente – dos resultados dos investimentos, e da elaboração de análises de impacto específicas é que será possível identificar as prioridades a estabelecer no âmbito da Estratégia Europa 2020 e assegurar o cumprimento do objectivo da concentração temática.

1.8   O CESE subscreve igualmente a opção de levar em conta a distribuição dos sectores de forte crescimento em todas as regiões europeias, que se subdividem nas regiões do objectivo de convergência, nas regiões em transição e nas regiões do objectivo de competitividade e emprego. Todavia, está ainda por resolver o problema da repartição dos recursos entre as regiões pobres (80 % dos fundos) e as outras (os restantes 20 %), embora uma decisão nesta matéria ajudasse a resolver o problema do co-financiamento.

1.9   O CESE reputa fundamental, em todo o caso, uma coordenação do conjunto das propostas e das políticas referidas pela Comissão, nomeadamente a Estratégia Europa 2020, a política de coesão, a PAC, a política energética, os transportes, o ambiente e a investigação. De salientar, em particular, a necessidade de coordenação entre as acções financiadas pelo FSE e as do FEDER, tanto mais que o FEDER deveria privilegiar a estratégia europeia para o emprego, a realização da Agenda Social, a formação de qualidade, as iniciativas para os jovens e uma formação europeia para os operadores das políticas de coesão.

2.   Propostas

2.1   Propostas políticas

2.1.1   Estratégia Europa 2020: o CESE defende que a política de coesão não deve ser posta ao serviço exclusivo da Estratégia Europa 2020, que, pelo contrário, para ser credível, deveria encontrar formas de financiamento autónomo através da emissão de euro-obrigações.

2.1.2   A política de coesão deve continuar a perseguir os seus objectivos de fundo, como sejam a solidariedade entre povos e territórios e o desenvolvimento.

2.1.3   Cimeira Europeia: a política de coesão e todos os fundos que lhe são afectados devem ser objecto de debate e de um exame anual no âmbito de uma cimeira europeia específica. A necessidade de o fazer prende-se tanto com a relevância estratégica de que se reveste a política de coesão económica e social como com a sua ligação com a política macroeconómica, no âmbito de uma governação económica e social europeia.

2.1.4   Pacto de Estabilidade e sanções: segundo o CESE, há que privilegiar os incentivos em detrimento das sanções para evitar penalizar mais ainda as regiões mais endividadas e, portanto, em maior situação de risco. Espera-se antes que, no âmbito dos projectos de reforma em curso do Pacto de Estabilidade e Crescimento, os investimentos na investigação, na educação e na formação não considerados como despesas correntes devem ser excluídos do orçamento, a fim de não penalizar as regiões menos favorecidas, que são as que mais necessitam de apoio da UE.

2.1.5   Há que estabelecer um número limitado de prioridades, levando em conta os objectivos dos vários fundos, da Estratégia Europa 2020. Deve atender-se em particular às políticas destinadas à consecução do mercado único, para o qual se deverá orientar a política de coesão. As prioridades devem ser estabelecidas no âmbito de uma cimeira europeia, após concertação entre os parceiros públicos e os parceiros socioeconómicos a todos os níveis.

2.1.6   As parcerias socioeconómicas, com a difusão de boas práticas, em paralelo e/ou em conjunto com os acordos entre os parceiros públicos, devem passar a constituir um procedimento normal e obrigatório que acompanha todos os processos de definição, execução e avaliação da política de coesão. Deveriam, como tal, estar directamente ligadas à condicionalidade. O CESE preconiza que o princípio consagrado no artigo 11.o do regulamento geral, que define as regras de parceria, seja alargado a todos os fundos estruturais.

2.2   Propostas técnicas operacionais

2.2.1   As regras de co-financiamento devem ser diferenciadas com base nas condições de desenvolvimento e nas disponibilidades económicas e sociais das zonas e das áreas afectadas pela política de coesão, em especial com base no rendimento, cujos parâmetros de cálculo deveriam ser revistos (1), e no orçamento das regiões.

2.2.2   A condicionalidade ex-ante deve destinar-se a melhorar a qualidade das despesas associadas à realização dos objectivos, tornando mais eficazes as administrações envolvidas, e a maximizar desta forma a utilização dos fundos, evitando que ela se torne numa penalização para, por exemplo, as regiões mais endividadas.

2.2.2.1   Assim, importa que os Estados-Membros empreendam as reformas institucionais necessárias para garantir a adaptação estrutural, a promoção da inovação e a criação de postos de trabalho a fim de combater a exclusão social. O CESE julga igualmente indispensável que a execução dessas reformas decorra em concertação com os parceiros socioeconómicos a todos os níveis, como condição para a concessão de financiamento.

2.2.3   Os indicadores tradicionais para a selecção das áreas de intervenção devem ser integrados com outros parâmetros, como sejam as taxas de emprego, de pobreza e de escolaridade, e o nível de qualificações, de formação profissional, dos serviços e da sustentabilidade ambiental.

2.2.4   A avaliação de impacto deve tornar-se num elemento central da política de coesão, e não apenas como condicionalidade ex-ante, permitindo verificar a eficácia e o nível dos objectivos atingidos. Deverá seguir parâmetros comuns definidos a nível da UE e aplicados obrigatoriamente em todo o território europeu.

2.2.4.1   A análise com base nos resultados: embora seja muito mais interessante do que a análise com base no controlo da gestão financeira, a sua aplicação na prática requererá uma longa preparação e a definição de critérios bem precisos. Os resultados de uma acção, nomeadamente de natureza imaterial, como a formação ou os investimentos no desenvolvimento, só podem ser medidos no tempo. A análise dos resultados exigirá a formação prévia dos responsáveis pelos projectos e das autoridades administrativas, e o CESE propõe que essa fórmula seja posta à prova no período 2011-2013 em algumas regiões seleccionadas em função da qualidade da sua governação em parceria.

2.2.5   A simplificação deve tornar-se no principal objectivo da política de coesão. Pode ser perseguida aliviando os procedimentos administrativos e contabilísticos, melhorando e reforçando os critérios de controlo e de avaliação e reduzindo os procedimentos que acompanham a apresentação dos planos e/ou dos projectos. A revisão dos métodos contabilísticos pode ser efectuada entre todos os interessados, em parceria com o Tribunal de Contas.

2.2.5.1   Há, em particular, que aplicar o princípio «apenas uma vez» (one-stop shop) tanto na fase da apresentação dos projectos, uniformizando os formulários dos vários fundos e entre os próprios fundos, como na fase da auditoria, harmonizando as regras financeiras e as regras dos diferentes programas e realizando um controlo único válido para todas as partes interessadas.

2.2.5.2   A coordenação dos diferentes programas: no interesse da clareza, da simplicidade e da eficácia, é necessário procurar a máxima complementaridade entre todos os programas que envolvam os mesmos intervenientes num mesmo território, quer entre os programas europeus, nacionais e territoriais quer entre os diferentes financiamentos europeus. A falta de coordenação é um dos motivos da baixa taxa de utilização e do reduzido impacto dos fundos estruturais e dos programas da UE no seu todo.

2.3   Formação: é um outro instrumento fundamental, necessário para atingir os objectivos da coesão, incluindo o de uma melhor utilização dos fundos.

3.   Introdução

3.1   Os princípios da coesão e da solidariedade constituem dois dos pilares fundamentais do Tratado que, nos termos do artigo 174.o, afirma: «A fim de promover um desenvolvimento harmonioso do conjunto da União, esta desenvolve e prossegue a sua acção no sentido de reforçar a sua coesão económica, social e territorial».

3.2   Também é de referir um outro ponto particularmente importante à luz dos dois últimos alargamentos: «a União procura reduzir a disparidade entre os níveis de desenvolvimento das diversas regiões e o atraso das regiões mais desfavorecidas».

3.3   Estes dois princípios, que constituem a base da integração dos povos e dos territórios europeus, não deverão nunca ser esquecidos – e muito menos ainda por parte de quem age em nome e por conta da UE.

3.4   No próximo ano, a Comissão Europeia apresentará uma proposta para o novo orçamento europeu após 2013 (tendo já sido publicada uma comunicação nesta matéria em 19 de Outubro de 2010). Contudo, o pedido ao Conselho (Dezembro de 2010), por parte de alguns governos, para não aumentar o orçamento da UE não é um bom prenúncio, ainda que se faça acompanhar de uma proposta legislativa sobre os fundos estruturais.

3.5   O quinto relatório da Comissão Europeia sobre a política de coesão e as suas conclusões, formulado com uma linguagem nova, enquadra-se neste contexto, em estreita ligação com a Estratégia Europa 2020.

4.   Síntese da comunicação da Comissão

4.1   Nas conclusões do quinto relatório, a Comissão Europeia, adoptando uma abordagem algo diferente da habitual, foca diversos temas para que busca respostas e orientações, aguardando a conclusão da consulta que realizou e colocando 13 questões sobre o próprio relatório.

4.2   Principais temas abordados:

4.2.1   Aumentar o valor acrescentado europeu da política de coesão.

4.2.1.1   A Comissão pretende atingir este objectivo mediante:

o reforço da planificação estratégica;

o aumento da concentração temática dos recursos;

a melhoria do desempenho por meio de um conjunto de condições e de incentivos, incluindo o co-financiamento e o pacto de estabilidade;

a melhoria da avaliação, dos efeitos e dos resultados;

a utilização de novos instrumentos financeiros;

(ver as cinco primeiras questões da CE).

4.2.2   Reforçar a governança da política de coesão

4.2.2.1   Este objectivo pode ser atingido através:

da introdução de uma terceira dimensão – a coesão territorial;

da consolidação das parcerias (públicas e privadas);

(ver as questões n.o 6 e 7).

4.2.3   Racionalizar e simplificar os processos de gestão

4.2.4   Tal é exequível através:

da gestão financeira;

da redução do ónus administrativo;

da disciplina financeira;

do controlo financeiro.

(ver as questões n.o 8, 9, 10 e 11)

4.2.5   A organização da política de coesão

(ver as questões n.o 12 e 13)

4.3   Próximas etapas

4.3.1   A Comissão reserva-se a possibilidade de, com base nas respostas ao questionário, aperfeiçoar as propostas constantes do quinto relatório.

5.   Comunicação da Comissão Europeia: observações gerais  (2)

5.1   O quinto relatório da Comissão propõe, com vista a aumentar o valor acrescentado da política de coesão, a introdução de uma série de reformas muito ambiciosas destinadas a melhorar a eficiência ao nível da capacidade financeira dos Estados-Membros e simplificar a sua gestão. O CESE concorda com a abordagem geral adoptada pela Comissão nas propostas de reforma.

5.2   Este esforço deve ser cultivado e valorizado, mas arrisca-se a ser insuficiente se algumas das propostas timidamente apresentadas não se traduzirem em decisões e acções concretas, em particular no atinente à estreita – e quase única – ligação entre os fundos estruturais e a Estratégia Europa 2020.

5.3   Com efeito, não obstante o esforço, a análise da situação não é realista, ainda que sob a capa de uma consulta (algo genérica), que relega para segundo plano as questões de fundo.

5.4   Por exemplo, confiar a «missão» de principal motor do crescimento apenas e só à política de coesão afigura-se um projecto muito ambicioso e aceitável, desde que ela seja radicalmente alterada e haja uma política de acompanhamento duradoura destinada a garantir a sua aplicação – para além de que a União precisa de uma política económica comum.

5.4.1   Caso contrário, a proposta arrisca-se a ser ilusória ou, pelo menos, de alcance limitado. Por conseguinte, com vista à persecução deste objectivo e a fim de evitar uma dispersão do princípio da coesão, conviria que a Estratégia Europa 2020 dispusesse de fundos próprios, inclusivamente através de um empréstimo europeu, devendo inspirar-se no referido princípio. Além disso, haveria que envolver igualmente todas as outras políticas da UE, incluindo a PAC. Só assim é que os fundos estruturais não perderão a sua «vocação» original, tornando-se num dos instrumentos do desenvolvimento territorial. O CESE lamenta que o quinto relatório não mencione a política agrícola, de mesma forma que a PAC não faz referência à política de coesão.

5.5   Na comunicação, a Comissão observa a justo título que o valor acrescentado das políticas de coesão é alvo de debates frequentes nos meios universitários, cuja investigação empírica demonstra muitas vezes que o impacto dessas políticas é difícil de quantificar. Isso pode dever-se ao facto de os indicadores da coesão territorial nem sempre serem escolhidos da forma mais adequada. O Comité considera que deve ser prestada mais atenção a este aspecto do que até à data.

6.   Observações específicas (relativamente aos quatro objectivos estabelecidos pela Comissão)

6.1   Relativamente ao objectivo de reforçar a programação estratégica, a realizar no âmbito de um quadro estratégico, a novidade da proposta da Comissão consiste sobretudo no facto de querer assegurar a coerência e criar uma ligação mais funcional entre os objectivos da Estratégia Europa 2020 e as intervenções definidas a nível nacional através dos programas operacionais.

6.2   O CESE aprecia esta novidade, mas entende que o problema mais premente diz respeito à ligação entre os planos anuais elaborados pelos Estados-Membros e acordados com a UE para a estabilização das finanças públicas (planos nacionais de reforma) e a política de coesão. Trata-se de um tema de grande actualidade, dada a diversidade de regimes administrativos vigentes nos países da UE e os diferentes graus de endividamento público.

6.3   Está por decidir, além disso, se a política de coesão deve permanecer fundamentalmente uma política independente na definição das prioridades e das intervenções a realizar, ou se deve manter-se de alguma forma subordinada às decisões de política económica tomadas a nível nacional com vista à redução da dívida pública. O CESE considera que tanto as principais instituições da UE (Parlamento Europeu, Comissão e Conselho) como os governos nacionais devem considerar muito atentamente este problema, a fim de encontrarem soluções para manter a coerência entre os objectivos da Estratégia Europa 2020 e a nova «governança» da política de coesão que, todavia, não pode estar subordinada à primeira.

6.4   Um segundo aspecto importante, em matéria de programação estratégica, diz respeito à proposta da Comissão de introduzir um novo sistema de condicionalidade ex ante destinado a definir os princípios que os Estados-Membros devem seguir e aplicar para melhorar a eficácia da política de coesão. Face às críticas avançadas por muitos países, parece evidente o esforço da Comissão para introduzir condições capazes de assegurar uma maior eficácia nos investimentos. Há, no entanto, que evitar onerar os procedimentos e «punir» as regiões por erros que não cometeram (o défice dos Estados nacionais).

6.5   O CESE aprova a proposta da Comissão relativa às condições mínimas de acesso a financiamento e destinadas a assegurar a «governança» dos recursos, que inclui igualmente incentivos para que os Estados-Membros realizem as reformas necessárias. Ademais, o CESE preconiza que o principal esforço da Comissão e dos Estados-Membros se oriente em larga medida para a introdução de processos de reforma internos nas instituições e nos sectores mais implicados na política de coesão (ambiente, mercado de trabalho, educação, formação profissional, inovação).

6.6   Só nos casos mais relevantes de irregularidade e/ou não conformidade com os princípios e os regulamentos da política de coesão é que se pode conceber o recurso a sanções ou a medidas análogas por parte da Comissão a um Estado-Membro, com a consequente suspensão/restituição dos financiamentos da UE.

6.7   Um outro aspecto positivo diz respeito à proposta, perfilhada pela Comissão e pelos Estados-Membros, de concentrar os recursos da política de coesão num número limitado de prioridades (ver também parecer ECO/230), na medida em que aqueles não são suficientes para financiar as múltiplas necessidades das regiões com atrasos de desenvolvimento. Com efeito, o CESE crê que a política de coesão poderá ser mais eficaz se for orientada para apoiar iniciativas materiais e imateriais de grande impacto económico, social e territorial.

6.8   Todavia, a definição das prioridades e o teor das iniciativas a financiar são um dos problemas de mais difícil solução, tendo em conta a multiplicidade de solicitações provenientes dos órgãos de poder local e regional que seguem em direcção diametralmente oposta.

6.9   As parcerias, como o CESE já por diversas vezes defendeu (3), podem constituir um verdadeiro valor acrescentado neste contexto. O Comité congratula-se, por isso, com a proposta da Comissão, na condição de que não se trate apenas de parcerias públicas mas também, e muito particularmente, de parcerias económicas, sociais e civis, com a participação concreta dos actores sociais e civis, com direito de voto, em todas as fases e a todos os níveis. Por outro lado, esses parceiros deveriam beneficiar de financiamento para a assistência técnica.

6.10   O CESE concorda com a necessidade de reformar os princípios de adicionalidade e de co-financiamento, para os quais estão previstas reformas capazes de os ligar à necessidade de prever níveis de participação financeira diferenciados, «para reflectir melhor o nível de desenvolvimento, o valor acrescentado para a UE, os tipos de acção e os beneficiários».

6.11   O CESE subscreve igualmente a proposta de instaurar um terceiro nível de regiões, nomeadamente as que se encontram numa situação económica que as coloca num patamar superior a 75 % da média da UE, mas ainda inferior a 100 % (90 %), uma vez que poderia simplificar o controlo e a aplicação do princípio de co-financiamento, tendo em conta a possibilidade de estender a utilização dos recursos, ainda que de forma reduzida, a todas as regiões.

6.12   Para o princípio de adicionalidade, há que identificar melhor os tipos de intervenções que exigem financiamentos nacionais, especificando o seu contributo em termos de valor acrescentado, de impacto no emprego e de estímulos ao crescimento. A redução das prioridades e das intervenções a financiar nos Estados-Membros deveria facilitar e, ao mesmo tempo, tornar mais flexível a aplicação do princípio da adicionalidade.

6.13   Para o segundo princípio, poder-se-iam prever níveis de co-financiamento diferentes – menores no caso das regiões mais divergentes, com o objectivo evidente de facilitar o financiamento de acções específicas de desenvolvimento local, e maiores para as regiões que estão mais próximas da média da UE.

6.14   O terceiro grande objectivo diz respeito à simplificação dos processos de gestão dos programas comuns. Trata-se de um tema consensual para todos os Estados-Membros e a que o CESE sempre fez apelo nos seus pareceres, com vista a facilitar a aplicação dos programas da política de coesão. Este objectivo deve levar em conta a diversidade de normas – administrativas, contabilísticas, etc. – dos Estados e das regiões, não esquecendo, por outro lado, que alterações constantes, particularmente se sobrepostas, levantam entraves e geram atrasos.

6.15   O CESE considera extremamente inoportuna e dificilmente aplicável a proposta de solicitar às autoridades de gestão dos programas a apresentação de um relatório anual das despesas co-financiadas pela UE (juntamente com pareceres de revisores independentes), considerando as modalidades e os prazos actualmente exigidos para despachar os processos de adjudicação por concurso público a nível da UE.

6.16   Se, ao invés, se trata de «reforçar» a responsabilidade dos órgãos de poder nacional e regional, em particular os que se encontram em maiores dificuldades e/ou com maiores atrasos na aplicação, poder-se-ia confiar o controlo dos resultados a estruturas independentes acreditadas a nível europeu, pelo menos dois anos após o início do período de programação. Em caso de responsabilidades administrativas ou de desvios significativos em relações aos resultados esperados, a Comissão poderia decidir, consoante a gravidade das irregularidades constatadas, terminar o programa, suspender os pagamentos ou requerer a restituição das somas já atribuídas.

6.17   As administrações nacionais e regionais devem dar mostras da sua capacidade para programar e gerir eficazmente as despesas co-financiadas. Tal pode ser logrado, não acelerando o controlo dos períodos de despesa (exigindo orçamentos anuais), mas velando por que seja assegurada a qualidade dos investimentos a realizar ou já realizados, por que sejam respeitados os prazos de execução das intervenções e por que sejam aplicados procedimentos eficazes de avaliação e de controlo.

6.18   Há ainda outras inovações importantes que o CESE aprova, nomeadamente em matéria de:

desenvolvimento de novos instrumentos de engenharia financeira a alargar e a estender a sectores que actualmente não beneficiam dela (transportes urbanos, investigação e desenvolvimento, energia e ambiente, telecomunicações, etc.);

introdução de novas formas de parceria público-privadas;

revisão das estratégias de cada um dos fundos estruturais, partindo do FSE e do contributo que este poderia dar para a aplicação da estratégia europeia para o emprego;

reforço da atenção conferida às zonas urbanas;

introdução de incentivos para promover reformas que ajudem os Estados-Membros e as regiões a utilizar mais eficientemente os recursos da UE;

introdução no orçamento da política de coesão de uma reserva a colocar à disposição das regiões que obtiveram os melhores resultados em termos de cumprimento dos objectivos estabelecidos pela estratégia europeia.

6.18.1   O CESE frisa a necessidade de definir atentamente os objectivos, avaliar os recursos disponíveis e descrever caso a caso as modalidades e os prazos de aplicação para cada uma destas novas medidas.

6.18.2   A coerência e a sustentabilidade destas propostas têm de ser cuidadosamente avaliadas à luz dos quatro objectivos principais definidos pela reforma da política, e da sua aplicabilidade efectiva nas regiões e nos territórios ainda muito distantes dos valores médios da UE em termos de desenvolvimento económico, eficiência produtiva, inclusão social e qualidade de vida.

6.19   A Comissão propõe, para as novas perspectivas financeiras, que se aplique, mais uma vez, o critério de 75 % do PIB médio per capita expresso em paridade do poder de compra para determinar a elegibilidade dessas regiões, aplicando o critério da convergência. Em vez disso, o Comité propõe que seja ponderada a possibilidade de introduzir outros parâmetros susceptíveis de reflectirem melhor as condições objectivas de cada região e território da UE.

7.   O orçamento da UE, a política de coesão e a Estratégia Europa 2020

7.1   As perspectivas orçamentais da UE após 2013 não são com certeza encorajadoras. A cimeira do final de 2010 não deixa dúvidas a tal respeito. Alguns Estados (só alguns?), invocando a austeridade decorrente da crise, aduzem justificações para não disponibilizarem mais recursos – ou, quando muito, apenas de modo simbólico –, esquecendo que a política de coesão absorve menos de 1 % do PIB, enquanto alguns Estados-Membros investiram cerca de 24 % do PIB para salvar os bancos!

7.2   O CESE considera que a Estratégia Europa 2020, na qual a União parece estar a apostar tão fortemente, é importante. Há, no entanto, um risco de ela se revelar um fracasso sem um financiamento directo adequado. Seria preferível fazê-lo através de obrigações europeias. Por outro lado, conviria dar um certo espaço de manobra às regiões mais desfavorecidas abrangidas pela coesão, em função das suas especificidades, para favorecer uma integração entre as duas políticas.

7.3   Tal integração poderá ser facilitada através de um melhor conhecimento das necessidades e das prioridades territoriais que poderão ser definidas em relação à Estratégia Europa 2020, a fim de assegurar o cumprimento do objectivo da concentração temática.

8.   O futuro da coesão após 2013: pontos estratégicos

8.1   As propostas sobre o futuro da política de coesão apresentadas pela Comissão para o próximo período de programação, associadas aos objectivos da Estratégia Europa 2020, delineiam um percurso virtuoso que o CESE, como referido, em larga medida perfilha, na medida em que visem tornar mais eficaz uma das políticas de redistribuição económica mais importantes da UE. A consecução de tais objectivos exige, no entanto, que se reúnam algumas condições estratégicas de fundo, para além das que já foram anteriormente apontadas.

8.2   Primeira condição: o CESE entende que os esforços solicitados à Comissão e aos Estados-Membros poderão ter resultados concretos se este projecto se inscrever no âmbito de uma revisão mais geral da arquitectura da «governança» económica europeia e dos objectivos que a UE pretende perseguir tanto a nível europeu como internacional. Trata-se de uma revisão que a crise e os ataques à dívida soberana tornaram ainda mais premente e que obriga a UE a actualizar também a sua política monetária, até agora ajustada em função das zonas mais ricas da UE (estabilidade) em detrimento das menos desenvolvidas e que mais precisam de crescer (crescimento).

8.3   A segunda condição diz respeito a um dos aspectos centrais do projecto de revisão da política de coesão, nomeadamente, a necessidade de lograr uma coordenação funcional e estratégica, de momento praticamente inexistente, entre os vários fundos estruturais. A selecção e respectivo financiamento das intervenções a nível regional devem, por isso, processar-se no âmbito de um diálogo e de uma metodologia de trabalho realizados não só com os Estados-Membros (contratos de parceria) e os parceiros socioeconómicos mas também com o apoio técnico e os recursos dos cinco fundos estruturais, a fim de se obter uma autoridade única para a coordenação e a gestão dos vários fundos.

8.4   Uma terceira condição diz respeito à criação de uma coordenação e de uma sinergia entre as intervenções da política de coesão e as outras políticas com ela relacionadas (políticas sectoriais ambientais e da energia, políticas para a investigação e a inovação, políticas de emprego, etc.) e, por conseguinte, com os outros instrumentos de financiamento da UE (BEI, financiamentos para a inovação, para as redes infra-estruturais, para o desenvolvimento das tecnologias das telecomunicações, etc.). A política de coesão deve passar a constituir o instrumento de um projecto mais vasto destinado a favorecer o desenvolvimento global das regiões e dos territórios, assim como para pôr em prática intervenções e financiamentos sectoriais diversificados, também por parte dos parceiros privados, com base nas necessidades específicas dos territórios.

8.5   A quarta condições diz respeito à possibilidade de, no âmbito desta nova abordagem à «governança» económica europeia, desenvolver formas de cooperação reforçada no atinente a objectivos partilhados relativos a um determinado sector, a uma macrorregião ou ao desenvolvimento de actividades consideradas estratégicas pelos Estados-Membros. Este instrumento, ainda pouco utilizado e valorizado, não obstante estar consagrado no Tratado, facilitaria o processo de decisão e permitiria obter melhores resultados em muito menos tempo para as sinergias e as economias de escala que se viessem a realizar entre os Estados participantes.

8.6   A quinta condição, ainda em matéria de coordenação, diz respeito à necessidade de operar rapidamente – ou seja, antes do início do novo ciclo de programação da política de coesão – uma coordenação interinstitucional (Comissão, Parlamento Europeu, Conselho e os órgãos consultivos, CESE e CR, e parceiros socioeconómicos). Teria por objectivo facilitar o debate e o diálogo entre as instituições da União sobre o futuro da política de coesão antes da versão final das propostas a submeter à aprovação dos organismos competentes. Tal coordenação deve prosseguir e acompanhar a aplicação dos programas e a avaliação dos resultados.

8.7   O CESE advoga o (re)estabelecimento de programas de iniciativa a partir da análise intercalar das políticas estruturais. A eliminação destes programas que se revelaram eficazes, como URBAN, EQUAL e outros, constituiu uma perda para a cooperação territorial temática e para a inovação social, na medida em que esta função não foi retomada no mainstreaming (integração transversal) dos fundos, nem em nenhum outro lado.

8.8   Em todo o caso, o CESE faz votos de que, com base nas medidas aplicadas na sequência das conclusões anexas ao quinto relatório, a Comissão, tendo em vista a próxima reforma, apresente propostas ainda mais corajosas, capazes de introduzir uma verdadeira mudança em relação ao passado.

Bruxelas, 16 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Ver o parecer do CESE sobre a Proposta de Regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que estabelece regras comuns para o fornecimento de informação de base sobre Paridades de Poder de Compra e para o respectivo cálculo e divulgação, JO C 318/08 de 23.12.2006, p. 45.

(2)  COM(2010) 642 final.

(3)  Ver os seguintes pareceres do CESE: Resultados das negociações referentes a estratégias e programas da política de coesão para o período da programação de 2007, JO C 228/26 de 22.09.2009, p. 141; Encorajar parcerias eficazes para a gestão dos programas da política de coesão, com base nas boas práticas do ciclo de 2007-2013, JO C 44/01 de 11.2.2011, p. 1; e Contributo da Política Regional para um Crescimento Inteligente no quadro da Estratégia Europa 2020.


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/75


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão dirigida ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu, ao Comité das Regiões e aos Parlamentos Nacionais: Reapreciação do orçamento da UE»

[COM(2010) 700 final]

2011/C 248/13

Relator: Henri MALOSSE

Co-relator: Gérard DANTIN

Em 19 de Outubro de 2010, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Comunicação da Comissão dirigida ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu, ao Comité das Regiões e aos Parlamentos Nacionais: Reapreciação do orçamento da UE

COM(2010) 700 final.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social, que emitiu parecer em 31 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 16 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 175 votos a favor, 2 votos contra e 5 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1   A reapreciação do orçamento da UE não é uma questão de números, trata-se antes de uma ferramenta em prol de um projecto político. Actualmente, a União Europeia não tem ao seu dispor meios orçamentais que lhe permitam levar a cabo uma estratégia política nem os compromissos que assumiu com o novo Tratado de Lisboa.

1.2   A crise económica e financeira, com origem nos Estados Unidos, afectou com severidade a Europa e desencadeou défices crescentes em cascata na maioria dos Estados-Membros. Esta situação tem repercussões inevitáveis na preparação das perspectivas financeiras para o período 2014 – 2020, de que a União Europeia não pode ser a vítima.

1.3   Assim, é preciso dar provas de imaginação para definir um «orçamento europeu inteligente» que dote a UE dos meios necessários às suas ambições sem que a carga fiscal global que impende sobre os cidadãos e as empresas se torne mais pesada.

1.4   O conceito da «contrapartida justa» deve ser arredado, pois é contrário aos valores de solidariedade e benefício mútuo da integração europeia. Ao invés, importa aplicar a subsidiariedade transferindo para o nível europeu aquilo que deixou de ter sentido e eficácia no plano nacional. O CESE congratula-se com o facto de a Comissão Europeia ter proposto voltar ao princípio dos recursos próprios, que podem ser estabelecidos ex nihilo ou substituir impostos nacionais.

1.5   O orçamento europeu deve ser reforçado e desempenhar um efeito de alavanca. O CESE preconiza uma complementaridade entre os orçamentos nacionais e europeus para obter economias de escala, de forma a alcançar os grandes objectivos políticos da UE. De igual modo, a eficácia das acções da UE será reforçada mercê de um recurso mais sistemático aos empréstimos do BEI, às parcerias público-privado e à criação de euro-obrigações para os investimentos.

1.6   Por outro lado, para demonstrar que o dinheiro será mais bem gasto no plano europeu, a União Europeia deverá encetar uma verdadeira revolução em matéria de procedimentos, hoje demasiado pesados, e concentrar as suas intervenções em projectos com visibilidade para o cidadão.

1.7   Só se pode vencer a aposta de um orçamento ambicioso ganhando a batalha da opinião pública. Daí a pretensão do CESE no sentido da realização e publicação de estudos sobre os custos da não-Europa, no intuito de evidenciar as duplicações de esforços nos orçamentos nacionais. O CESE junta-se assim à iniciativa do Parlamento Europeu, para a qual dará o seu contributo.

1.8   Para ser credível perante os cidadãos europeus, o orçamento da UE deve ser exemplar em matéria de governação, eficácia, transparência e controlo das despesas administrativas.

2.   Com vista a uma nova ambição

2.1   Na sua comunicação, a Comissão não esconde a sua vontade de definir uma abordagem ambiciosa para fundamentar as perspectivas financeiras da UE após 2013. O CESE congratula-se com esse facto, já que o Tratado de Lisboa trilhou caminho para uma União Europeia dotada de forte identidade política.

2.2   O CESE, a par da Comissão, considera que o conceito da «contrapartida justa» ainda está mais desactualizado hoje do que nos primórdios da construção europeia. Esse conceito, que perverteu demasiadas vezes o funcionamento da construção europeia inquinando os respectivos debates, está em grande medida na origem das suas insuficiências, dos seus atrasos e fracassos. É contrário ao espírito de uma União entre os Estados e os povos e a qualquer pensamento económico racional. Com efeito, numa União económica, monetária e política, os benefícios e o valor acrescentado devem por natureza ser lucrativos para todos. Os progressos realizados pela União Europeia radicam todos no efeito multiplicador de uma comunhão, contrário ao conceito da contrapartida justa.

2.3   Com base nessas considerações, já em 2008 o Comité considerou que «à concepção das políticas orçamentais subjaz uma escolha de fundo: o federalismo ou um sistema intergovernamental. É certo que as modalidades de financiamento do orçamento são um dos meios de medir o grau de integração europeia (1)».

2.4   Desse modo, o Comité pretende ainda que se retirem todos os ensinamentos de uma análise objectiva do funcionamento orçamental, tal como existe na actualidade. A Comissão aponta com razão os atrasos registados no lançamento dos programas, as complexidades inerentes ao sistema, a descentralização da execução que não surtiu efeitos positivos. Esses disfuncionamentos devem ser analisados em profundidade com a participação de todos os actores envolvidos, no intuito de se tirarem os ensinamentos necessários à sua correcção.

2.5   O CESE apoia as quatro principais prioridades enunciadas pela Comissão: a consecução de linhas prioritárias de acção fundamentais, o reforço do valor acrescentado, a obrigação de apresentar resultados, a optimização das vantagens mútuas da solidariedade. O CESE deseja igualmente agregar ainda outro imperativo, ou seja, a visibilidade.

2.5.1   O actual balanço das intervenções orçamentais da União Europeia não é satisfatório desse ponto de vista. Essa deficiência constitui um obstáculo à integração europeia, pois dificulta um verdadeiro apoio aos cidadãos e proporciona aos Estados-Membros argumentos para travar o crescimento do orçamento europeu. Conviria obstar a isso, quer ao nível do processo orçamental quer ao nível, assaz opaco para os cidadãos, das realizações operacionais demasiado confidenciais, espalhadas por minúsculos projectos ou dissimuladas no âmbito de co-financiamentos complexos.

2.6   O CESE entende que esse recentrar da política orçamental da UE deve fazer parte directamente do objectivo de renovação do método comunitário, tal como o Comité o reivindicou explicitamente no seu parecer de Outubro de 2010, o qual foi aprovado por ampla maioria (2).

3.   À procura de maior complementaridade entre os níveis nacional e europeu

3.1   O CESE não pode aceitar que o processo de integração europeia, condicionado pelos meios orçamentais que lhe são concedidos, esteja refém da questão da redução dos défices públicos. Essa concepção invalidaria desde logo as ambições políticas da União Europeia decorrentes do Tratado de Lisboa e da Estratégia Europa 2020.

3.2   Assim, o CESE propõe que se organize uma complementaridade entre orçamentos nacionais e orçamento europeu em torno de objectivos comuns, nomeadamente através de contratos de parceria em matéria de desenvolvimento e investimento da Estratégia Europa 2020. Tratar-se-ia de uma combinação «inteligente» dos meios nacionais e europeus para realizar economias de escala, conseguir uma alavancagem e reduzir os défices dos orçamentos nacionais graças aos efeitos positivos da comunhão dos recursos.

3.3   Nessa perspectiva, o Comité insta a Comissão a disponibilizar os meios necessários para actualizar sem mais delongas a avaliação dos custos da não-Europa, que nunca mais voltaram a ser calculados desde que o relatório Cecchini (3) foi apresentado há 23 anos. O Comité congratula-se com a vontade expressa pelo Parlamento Europeu de tomar, ele próprio, uma iniciativa nesta área. Pelo seu lado, o Comité tenciona participar plenamente nos trabalhos nesse domínio e dar o seu contributo activo à almejada actualização.

3.3.1   Pois, de facto, os cidadãos e contribuintes europeus devem ter conhecimento do valor da factura que têm de pagar em virtude da persistente duplicação de custos de compartimentação redundantes, em domínios administrativos e económicos. Deveriam ser informados das «economias de escala» de que as políticas públicas europeias poderiam beneficiar mercê de uma maior integração europeia. Veja-se, por exemplo, a não realização da Europa dos transportes, apesar de constar do Tratado de Roma, que os cidadãos pagam diariamente em atrasos e perturbações, logo numa clara perda de produtividade para as empresas. De igual modo, a insuficiente abertura dos concursos públicos, quando o mesmo relatório Cecchini estimava que a sua abertura à escala europeia fomentaria 2 milhões de novos postos de trabalho.

3.4   O CESE insiste muito particularmente no efeito de arrastamento económico que seria legítimo esperar de uma revalorização do orçamento europeu apoiada nesse tipo de economias de escala. Contrabalançando com ganhos de produtividade os efeitos depressivos das severas remodelações operadas nas finanças públicas dos Estados, seria possível conciliar as necessidades do rigor orçamental face aos défices e as necessidades da retoma económica e social, tirando a Europa da crise e de um crescimento «frouxo».

3.5   O apoio assim conferido à economia repercutir-se-ia então positivamente sobre as receitas fiscais, logo sobre a recuperação das contas públicas. Uma revalorização inteligente do orçamento europeu deveria de facto impelir e manter um círculo económico e orçamental virtuoso, sustentado numa valorização comum das complementaridades mútuas. Valorizar essas complementaridades entre os níveis nacional e europeu torna-se o requisito para uma consolidação sustentável do crescimento e do emprego na Europa.

4.   Recuperar mais autonomia orçamental

4.1   O CESE considera que o aumento do orçamento europeu se afigura não só desejável como necessário face à abrangência dos novos reptos, que carecem de uma resposta comum.

4.2   Assim sendo, apoia a proposta da Comissão Europeia relativa à primazia de um sistema baseado nos recursos próprios, cujos rendimentos chegariam directamente ao orçamento da União Europeia sem transitar pelo nível nacional. O CESE considera que não haverá uma reforma eficaz do orçamento europeu sem serem restabelecidos recursos próprios autónomos devidamente orientados e sustentáveis, em vez das contribuições nacionais, introduzidas em 1980 com um factor de correcção especial a favor do Reino Unido e posteriormente confirmadas no Acordo de Fontainebleau, em 1984, que reavivam o conceito erróneo da contrapartida justa.

4.3   O Comité aprecia a diversidade das propostas relativas a novos recursos apresentadas pela Comissão na sua comunicação, nomeadamente quanto às transacções financeiras e às emissões de CO2. Apesar de não se pronunciar de momento a respeito da natureza de novos recursos próprios, o CESE realça ser necessário que todas as propostas nesse domínio sejam acompanhadas por uma análise de impacto para melhor as avaliar. O Comité deseja que se explore também a possibilidade de transferir impostos ou fracções de impostos existentes ao nível nacional para o nível europeu, como acontece com o IVA. Neste sentido, podia ser encarada uma fracção do imposto sobre as sociedades, caso este dispusesse de base tributária comum, como proposto pela Comissão Europeia.

4.4   O CESE espera que a dita reforma elimine a prazo os factores de correcção nacionais, que deixam de se justificar num orçamento europeu renovado que garantirá um valor acrescentado para todos os Estados-Membros.

4.5   O CESE destaca ainda três princípios que entende serem imprescindíveis para o êxito de uma reforma dos recursos do orçamento europeu:

4.5.1

A carga fiscal na Europa não deve ser aumentada com a reforma dos recursos próprios.

4.5.2

As novas eventuais imposições fiscais europeias não devem ter efeitos discriminatórios demasiado acentuados para determinados Estados, dadas as suas especificidades nacionais, nem devem perturbar as actividades empresariais das sociedades estabelecidas na União Europeia. Além disso, não devem incidir de forma exagerada sobre os cidadãos, mormente os mais desfavorecidos, como acontece em relação ao IVA.

4.5.3

A reorganização deve contribuir para racionalizar e equilibrar melhor a pressão fiscal global, em cumprimento dos objectivos da competitividade e do emprego da União. Para além de que as despesas europeias deveriam estar mais concentradas nas prioridades da UE e nas áreas em que podem ser realizadas economias de escala. Essa condição surge para o CESE como prévia e necessária a um aumento significativo do orçamento europeu.

4.6   O CESE entende, por fim, que, até a União Europeia alcançar um maior grau de integração, se poderiam aplicar fórmulas inovadoras que agregassem, através de agências especializadas ou de qualquer outra fórmula, os orçamentos nacionais ao orçamento europeu em áreas tais como a investigação-desenvolvimento, a inovação, a ajuda ao desenvolvimento, o financiamento das grandes infra-estruturas. Essas fórmulas permitiriam uma integração real das prioridades e dos meios, salvaguardando a respectiva capacidade de controlo de cada nível político de competência, quer nacional quer europeu.

5.   Em prol de intervenções mais direccionadas para o valor acrescentado europeu

5.1   O Comité salienta a necessidade de zelar pela adequação do orçamento europeu aos objectivos e compromissos da Estratégia Europa 2020. O que pressupõe, para além dos meios orçamentais correspondentes, ligações visíveis entre as intervenções previstas por esse orçamento e os diferentes pilares da Estratégia Europa 2020.

5.2   O Comité insiste, em particular, na necessidade de intervenções orçamentais eficientes nos domínios em que a União Europeia empenhou a sua responsabilidade, desde logo a consolidação da União Económica e Monetária, o reforço da solidariedade dos Estados-Membros da UE, assim como a aplicação das novas políticas decorrentes do Tratado de Lisboa: energia e clima, justiça e assuntos internos, e política externa.

5.3   As recentes crises na zona euro realçaram a necessidade de se desenvolver muito particularmente a solidariedade no âmbito da União Económica e Monetária. Os próprios meios disponíveis no orçamento europeu proporcionaram, no momento da emergência, um contributo útil, antecipando inclusive a criação do Fundo de Estabilização. A decisão de integrar esse mecanismo de estabilização no Tratado marca uma nova etapa da solidariedade europeia assim como da sua ambição de integração política e económica, a fim de consolidar duradouramente a União Económica e Monetária, que constitui um avanço central no processo de construção europeia e na coesão económica e social do seu mercado único. Torna-se urgente estimular a retoma da União Económica que ficou na esteira da União Monetária, fragilizando-se. Não haverá a menor perspectiva de êxito para a Estratégia Europa 2020 caso esse desfasamento não seja realinhado. Aliás, essa perspectiva mereceria uma análise mais aprofundada no documento da Comissão.

5.4   A outra grande prioridade relativamente ao orçamento europeu prende-se efectivamente, conforme salienta – e bem – a Comissão, com o reforço das políticas no triângulo mágico composto pela «investigação, inovação e educação», que estão no cerne do desafio da globalização.

5.4.1   Porém, não será com um orçamento que apenas representa 4 % do da investigação pública na Europa que se conseguirá alterar fundamentalmente o estado das coisas perante os reptos mundiais. Há que encontrar meios, mormente financeiros, para transformar os programas europeus em verdadeiras ferramentas capazes de melhorar a competitividade da indústria europeia.

5.4.2   De uma forma ou de outra, a integração dos programas nacionais no programa-quadro europeu de investigação é imprescindível para se obterem economias de escala e um efeito de massificação. De igual modo, seria conveniente assegurar uma concentração em sectores-chave, ter em conta as situações nacionais específicas iniciais e obstar aos disfuncionamentos verificados, nomeadamente, ao peso e à lentidão administrativa.

5.4.3   A política europeia de inovação deve constituir uma base fundamental no cerne da investigação levada a cabo na Europa, quando até aqui foi tratada pela Comissão como um simples subproduto das acções de investigação. A Comissão Europeia devia propor uma mudança de rumo, o que acontece na sua recente Comunicação Iniciativa emblemática no quadro da estratégia Europa 2020 – União da Inovação (COM (2010) 546 final).

5.4.4   O CESE relembra as reivindicações por si apresentadas com vista a uma política muito mais ambiciosa, aliando o apoio ao empreendedorismo, o impulso das redes nacionais de apoio e divulgação da inovação e a política europeia de «agrupamentos» para favorecer a emergência de «campeões europeus» em vez de «campeões nacionais». O Comité congratula-se com a decisão tomada no sentido de instaurar uma coordenação reforçada para criar uma patente comunitária. A sua concretização deverá ocorrer com a brevidade possível para pôr cobro a uma situação que prejudica gravemente a competitividade da UE há décadas.

5.4.5   No campo educativo, o CESE advogou iniciativas mais ambiciosas e nomeadamente a abertura de novas «escolas europeias» ao dispor de todos para sustentar uma identidade europeia reforçada, a emergência de verdadeiras universidades europeias (4), bem como uma política europeia de novas competências para novos empregos (5).

5.4.6   A Comissão Europeia deve dar mais prioridade a análises objectivas dos efeitos das políticas da UE, como na proposta em apreço, e garantir uma correlação precisa com o documento principal.

5.5   A política de coesão económica, social e territorial faz também directamente parte da expressão da solidariedade europeia. O CESE opor-se-á ao desmantelamento desta política que é o símbolo de uma União «entre os povos». O CESE insta, porém, a que seja renovada para adquirir eficácia, nomeadamente através da simplificação dos respectivos modos de gestão, concentrando-se sobretudo em projectos emblemáticos decorrentes de prioridades europeias e assegurando uma colaboração mais estreita entre actores económicos e sociais. Nessa óptica, a UE deve actuar contra a exclusão das camadas mais frágeis da população e dar apoio aos países e regiões mais afastadas e negligenciadas em virtude das suas características específicas, proporcionando-lhes uma participação plena no progresso económico e social. Desse ponto de vista, tendo em conta a situação do emprego, o Fundo Social Europeu constitui o instrumento a privilegiar, mormente em termos do seu financiamento, para a consecução da Estratégia Europeia de Emprego, devendo esta última estar no centro da iniciativa para o Crescimento Inclusivo da Estratégia Europa 2020.

5.6   Uma grande prioridade do orçamento comunitário, directamente ligada ao objectivo de uma União simultaneamente mais eficiente, mais solidária e mais próxima dos cidadãos, refere-se à necessidade de reforçar o investimento em bens públicos europeus. Essa prioridade é referida, e com razão, pela Comissão. Todavia, seria conveniente clarificá-la e concretizá-la. O CESE tenciona, pelo seu lado, aprofundar a reflexão em ligação com os actores económicos e sociais no intuito de esclarecer necessidades e objectivos. Mas o CESE destaca desde já várias exigências nesse campo:

5.6.1   O CESE salienta em primeiro lugar a necessidade de desenvolver serviços de interesse geral genuínos à escala europeia, em complementaridade com as administrações nacionais e em parceria com os utentes europeus, para garantir a cabal organização e segurança da União nas áreas que estão sob a sua responsabilidade colectiva.

5.6.1.1   O que remete nomeadamente para a organização do mercado interno e alfandegário, mas também para novos domínios em relação aos quais os Estados-Membros decidiram transferir-lhe competências: política de imigração e asilo, justiça e assuntos internos, criação de um serviço diplomático europeu e de acção externa, bem como vigilância das fronteiras externas.

5.6.2   O CESE salienta ainda a necessidade de reforçar os investimentos transeuropeus em infra-estruturas, até para apoiar esses serviços europeus de interesse geral e possibilitar que funcionem como deve ser. Desde o Livro Branco da Comissão, apresentado por Jacques Delors em 1993, têm-se acumulado demasiados atrasos, a cujas propostas e metodologia nunca foi dado seguimento. Uma grande parte do território europeu, nomeadamente dos países que aderiram recentemente, continua excluída das grandes correntes de intercâmbio, devido às suas insuficiências. Entre as prioridades de infra-estruturas a realizar, o CESE insiste nos projectos estruturantes como os cadernos de encargos do céu único europeu (6), as linhas ferroviárias de alta velocidade e as redes de canais navegáveis. Grandes investimentos, com dimensão europeia, também se afiguram necessários em termos de política energética para garantir maior independência dos abastecimentos e investir na segurança, na eficiência e nas energias renováveis.

5.6.3   Cabe ainda referir as necessidades de investimentos comuns inovadores para enfrentar os novos desafios da competitividade ou da segurança respeitantes às telecomunicações, ao ambiente e à protecção civil.

5.7   Relativamente à Política Agrícola Comum (PAC), o CESE relembra as suas posições (7) a favor de uma renovação da mesma. Trata-se de a adaptar a novos reptos sem que, contudo, volte a ser nacionalizada nem se abandonem os seus meritórios princípios: solidariedade interna e externa, qualidade das produções alimentares, preferência comunitária, coesão territorial a favor das zonas rurais, em particular as regiões montanhosas e insulares. Com efeito, uma das missões prioritárias da PAC consiste, nomeadamente, em valorizar o papel dos agricultores. Por outro lado, deve contribuir para a gestão sustentável dos recursos naturais, permitindo dar respostas concretas aos grandes desafios inerentes à luta contra as alterações climáticas, à protecção do ambiente e da biodiversidade (8).

5.8   Relativamente à política externa e à ajuda ao desenvolvimento de países terceiros, o CESE relembra as suas posições a favor de uma racionalização das representações da UE e dos Estados-Membros, bem como de um reforço da eficácia da assistência europeia complementarmente às ajudas nacionais e numa parceria mais estreita com os actores económicos e sociais directamente envolvidos.

5.9   Em matéria de ajuda ao desenvolvimento, cuja utilização deve ser rastreável, o CESE considera que seria doravante oportuno juntar programas nacionais e europeus, tanto por razões de eficácia e coerência como para dar maior visibilidade à assistência europeia. Nesse sentido, o CESE recorda que esteve na origem da cláusula constante dos Acordos de Cotonu que reserva 15 % das ajudas do FED para acções levadas a cabo por actores não estatais. Propõe assim que esse princípio seja aplicado e se estenda a todos os programas de desenvolvimento.

6.   À procura de eficácia

6.1   Nesta fase difícil em que se encontram as finanças públicas europeias, o orçamento europeu deve ser exemplo de boa governação. Sem cair na demagogia fácil do custo administrativo das instituições europeias, proporcionalmente bastante menos oneroso do que o das administrações nacionais (veja-se, a Comissão Europeia não tem mais agentes do que a cidade de Paris!), o CESE recomenda que sejam tomadas medidas para dar visibilidade à quota-parte das instituições europeias nas poupanças administrativas encetadas pelos Estados-Membros. Ao mesmo tempo, as instituições, e o próprio CESE, devem estar atentas, aos processos de recrutamento e promoção, aos princípios da igualdade de oportunidades e não discriminação constantes do Tratado. O CESE realça contudo que essa boa governação inclui ainda facultar à sociedade civil europeia meios para participar plenamente no debate europeu.

6.2   As ajudas concedidas pelo orçamento europeu aos Estados-Membros deveriam também elas ser mais condicionadas, nomeadamente quanto ao cumprimento da regulamentação comunitária e das decisões do TJUE por parte dos beneficiários e à verificação da compatibilidade entre as ajudas comunitárias e as regras da concorrência.

6.3   Perante os reptos de convergência das políticas económicas no âmbito da UEM, trata-se também de centrar as ajudas de modo a torná-las conformes com a disciplina do Pacto para o Euro Mais.

6.4   As ajudas concedidas aos países terceiros deveriam ser condicionadas à rastreabilidade das respectivas utilizações financeiras, ao cumprimento dos compromissos assumidos, em particular em relação às reformas económicas e sociais para se adaptarem à abertura, a parcerias mútuas e à participação de actores socioprofissionais da sociedade civil.

6.5   O desenvolvimento do euro e a necessidade de consolidar a coesão da zona euro face aos mercados também abrem oportunidades hoje subaproveitadas em termos de políticas inovadoras de concessão de crédito e de empréstimos à escala europeia, desmultiplicando o impacto das ajudas do orçamento europeu. O CESE preconiza sobretudo uma coordenação reforçada entre o BCE, o Eurogrupo e o BEI. Congratula-se com os resultados encorajadores obtidos pelas primeiras euro-obrigações e deseja um alargamento aos domínios da formação, investigação, indústria e infra-estruturas europeias. Ao mesmo tempo, a constituição deste «erário europeu» podia ser utilizada, sob reserva de condições e disciplina estrita, para «mutualizar» uma parte significativa das dívidas dos Estados-Membros. Com a ajuda destes instrumentos afirma-se a solidariedade interna da União Europeia e, de caminho, sublinha-se o seu compromisso político a favor da irreversibilidade do euro.

6.6   O CESE advoga uma maior identificação de projectos apoiados pela União Europeia de modo a concentrar-se naquilo que comporta mais valor acrescentado europeu. O CESE insta portanto a que se flexibilize o princípio da adicionalidade, entendendo que deveria deixar de ser avaliada projecto a projecto para se processar na globalidade no âmbito de parcerias estratégicas com os Estados-Membros.

6.7   Acelerar os procedimentos destinados a definir prioridades e a conceder créditos será também uma forma de responder a determinadas necessidades. O CESE já recomendou que se explorasse o recurso mais generalizado às agências especializadas ou às «subvenções globais» outorgadas a entidades próximas no terreno, como regiões ou organizações da sociedade civil. Esta última técnica, que conta com a preferência do CESE, já foi comprovada em matéria de política regional e poderia estender-se a todas as acções financeiras da UE.

6.8   No que diz respeito aos grandes projectos de investimento, deverá ser incentivado o recurso aos empréstimos do BEI, assim como a financiamentos privados, no âmbito de um enquadramento jurídico conforme foi exposto num parecer do CESE (9). Desenvolvendo-se noutra escala, permitiria recuperar os atrasos europeus em termos de infra-estruturas e financiar os grandes projectos tecnológicos que condicionam a nossa competitividade na globalização.

6.8.1   Por outro lado, o CESE considera que situações de emergência podem carecer de flexibilidade e mecanismos mais adequados, tal como o Fundo Europeu de Ajustamento à Globalização (10).

Bruxelas, 16 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Parecer CESE sobre a Reforma do orçamento da UE e futuro financiamento; JO C 204 de 9.8.2008, p. 113.

(2)  Parecer CESE sobre A Renovação do Método Comunitário (orientações); JO C 51 de 17.2.2011, p. 29.

(3)  Relatório Cecchini sobre Os custos da não-Europa, Paolo CECCHINI, 1988.

(4)  Parecer CESE sobre Universidades para a Europa; JO C 128 de 18.5.2010, p. 48.

(5)  Parecer CESE sobre Novas Competências para Novos Empregos; JO C 128 de 18.5.2010 p. 74.

(6)  Parecer CESE sobre o Céu Único Europeu; JO C 182 de 4.8.2009 p. 50.

(7)  Parecer CESE sobre Reforçar o modelo agro-alimentar europeu; JO C 18 de 19.1.2011 p. 1.

(8)  Parecer CESE sobre O Futuro da PAC, JO C 132 de 3.5.2011 p. 63.

(9)  Parecer CESE sobre os Investimentos privados e públicos, JO C 51 de 17.2.2011, p. 59.

(10)  Parecer CESE sobre a Reforma do orçamento da UE e futuro financiamento; JO C 204 de 9.8.2008, p. 113.


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/81


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Estratégia da União Europeia para a Região do Danúbio»

[COM(2010) 715 final]

2011/C 248/14

Co-relator: Etele BARÁTH

Co-relator: Mihai MANOLIU

Em 8 de Dezembro de 2010, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social sobre a

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Estratégia da União Europeia para a Região do Danúbio

COM(2010) 715 final.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada da União Económica e Monetária e Coesão Económica e Social que emitiu parecer em 31 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 16 de Junho), o Comité adoptou por 150 votos a favor, 3 votos contra e 20 abstenções o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O Comité Económico e Social Europeu apoia firme e inequivocamente a nova visão da União Europeia em matéria de política macrorregional e, neste quadro, a criação da estratégia europeia para a região do Danúbio. Na qualidade de representante institucional da sociedade civil organizada europeia, o CESE gostaria de desempenhar um papel determinante e na elaboração e na realização desta estratégia, designadamente através do fórum para a sociedade civil previsto no Plano de Acção desta estratégia.

1.2

O interesse e o empenhamento do CESE no que toca às questões relativas à região do Danúbio não são de agora. Com efeito, nos últimos anos, o Comité adoptou numerosos documentos respeitantes a vários domínios, como os transportes ou a protecção do ambiente. O parecer ECO/277, por exemplo, põe em evidência as razões pelas quais o CESE considera importante definir uma estratégia para a região do Danúbio.

1.3

O CESE considera que, no quadro da elaboração da Estratégia para o Danúbio, é necessário ter em conta o papel do rio na formação de uma consciência e de uma identidade comuns «danubianas», processo no qual o diálogo intercultural e a solidariedade ocupam um lugar central. Trata-se de um contributo regional para a formação de uma consciência europeia comum.

1.4

O CESE espera que as suas recomendações reflictam adequadamente o seu próprio empenhamento e o da sociedade civil organizada relativamente à estratégia. Espera, além disso, que a execução da Estratégia para o Danúbio e do seu Plano de Acção, com o apoio do sistema de governação estabelecido, contribua realmente para melhorar as condições de vida e de trabalho de todos os cidadãos desta região, que ele considera como o espelho da Europa, e para reduzir o fosso entre esta região e as regiões mais desenvolvidas da UE. O Comité espera igualmente que a execução da estratégia tenha em conta as exigências em matéria de protecção do ambiente, assegure a preservação dos recursos hídricos e reforce a protecção dos valores culturais da região.

1.5

Note-se que, com os últimos alargamentos da União Europeia, o seu centro geográfico se deslocou claramente para Leste, ao passo que o seu centro de gravidade económico se manteve na Europa Ocidental. A coesão económica, social e territorial – elemento decisivo da Estratégia para o Danúbio e do seu Plano de Acção – e as ideias práticas que servem de base à sua realização contribuem para a supressão deste desequilíbrio. O CESE considera que a nova abordagem macrorregional poderá ser utilizada como modelo por outras regiões da UE.

1.6

O CESE considera que a estratégia e o seu Plano de Acção são abertos, inclusivos e sensíveis aos aspectos sociais, económicos e ambientais e têm devidamente em conta as recomendações das organizações da sociedade civil. A estratégia será tanto mais eficaz quanto mais privilegiar sistematicamente uma abordagem integrada e sustentável em detrimento de uma abordagem sectorial. Recomenda que a estratégia contribua para assegurar a concessão de um tratamento especial aos grupos sociais mais desfavorecidos e integre os instrumentos de luta contra a pobreza.

1.7

O CESE considera que a estratégia reflecte a nova política da UE a nível macrorregional actualmente em fase de elaboração e, por conseguinte, contribui para harmonizar os sistemas de cooperação já existentes a vários níveis e em diversos domínios na região, bem como para reforçar a sua eficácia e eliminar a duplicação de esforços. Afigura-se necessário, no entanto, que haja maior coerência com as novas orientações da política de coesão.

1.8

Em seu entender, o sistema de governação da execução da estratégia deve ser claro, simples e transparente e permitir realizar progressos na consecução dos objectivos. O CESE tenciona promover a exploração exaustiva das possibilidades que o Tratado de Lisboa proporciona, aplicando sistematicamente o princípio da democracia participativa e contribuindo de forma efectiva para a aplicação do Plano de Acção. A participação activa de todas as partes interessadas, de acordo com o princípio de parceria, a garantia da flexibilidade e a realização de revisões periódicas são condições importantes para o sucesso. Neste contexto, o CESE regozija-se com a criação de um Fórum da Sociedade Civil para o Danúbio e com o papel que, de acordo com o plano de acção, o Comité e os seus homólogos nacionais poderão desempenhar neste domínio.

1.9

O CESE considera que a estratégia contribuirá, enquanto política de desenvolvimento macrorregional, para o aprofundamento do processo de integração europeia, em particular no quadro da estratégia «Europa 2020» (para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo) e para aproximar da União Europeia os seis países terceiros da região, apoiando-os nos seus esforços de integração.

1.10

A Comissão elabora a estratégia, partindo do princípio de que a região não beneficiará de qualquer tratamento especial, mesmo que tal possa levar a avanços na política macrorregional da UE. Por conseguinte, a estratégia não deve ser a dos «três nãos», não obstante as seguintes considerações:

1)

A estratégia não prevê qualquer nova ajuda europeia. A região poderá mobilizar fundos internacionais, nacionais, regionais ou privados adicionais, mas será necessário fazer melhor uso dos fundos existentes;

2)

O CESE vê na coordenação dos recursos financeiros e dos objectivos fixados uma melhoria, na qual, mediante uma revisão constante, permitirá criar novas possibilidades de financiamento. Para tal, preconiza a criação de um fundo específico;

3)

A estratégia não exige qualquer alteração da legislação da UE, uma vez que esta legisla para os 27 Estados-Membros e não apenas para uma macrorregião. No entanto, como já teve ocasião de salientar no parecer sobre a Estratégia para o Mar Báltico (1), o CESE recomenda que se reforcem os recursos dos serviços da Comissão para garantir um acompanhamento correcto da Estratégia;

4)

O CESE considera que, sendo necessário, as partes interessadas na cooperação territorial reforçada poderão trazer alterações a nível regional, nacional ou outro, a fim de que certos objectivos específicos sejam tidos em conta;

5)

A estratégia não cria estruturas adicionais que sejam fundamentalmente diferentes das estruturas que fazem parte da prática vigente da UE. A sua execução é feita através de novas estruturas de coordenação para a região e dos organismos existentes, cuja complementaridade deve ser optimizada;

6)

No entender do CESE, importa reduzir, tanto quanto possível; as obrigações administrativas e criar um grupo de investigadores com o objectivo de analisar e examinar cientificamente as questões relativas à Estratégia para o Danúbio, bem como um sistema de bolsas para apoiar os trabalhos deste grupo.

2.   Estratégia da União Europeia para a Região do Danúbio: observações gerais

2.1

O CESE constata que a região do Danúbio mudou consideravelmente, na medida em que uma grande parte da bacia hidrográfica passou a integrar o território da União Europeia. Abrem-se assim novas perspectivas para dar resposta aos desafios e tirar partido do potencial da região. É possível aprofundar o desenvolvimento socioeconómico, a competitividade, a gestão ambiental e o crescimento eficiente em matéria de energia e modernizar a segurança e os corredores de transporte.

2.2

A estratégia (2) visa desenvolver a cultura social e o enorme potencial económico da região e melhorar as suas condições ambientais mediante um quadro de cooperação a longo prazo abrangendo um vasto leque de aspectos.

2.3

O CESE entende que a estratégia da União Europeia para a Região do Danúbio tem um papel de primeiro plano a desempenhar na melhoria do transporte sustentável, na interligação dos sistemas energéticos, na protecção do ambiente, na conservação dos recursos hídricos e na dinamização do clima empresarial. Considera, igualmente, que esta estratégia trará novo valor acrescentado ao promover a coerência entre os diferentes domínios políticos e o reforço da coordenação entre os Estados participantes e ao definir uma abordagem integrada do desenvolvimento sustentável.

2.4

A região do Danúbio é um espaço histórico, social, económico e funcional delimitado pela sua bacia hidrográfica. A estratégia alarga esta abordagem para que as prioridades sejam examinadas de forma integrada. Neste contexto, é necessário interligar os habitantes da região, as suas ideias e as suas necessidades. Até 2020, todos os cidadãos da região devem poder usufruir de melhores perspectivas em termos de ensino superior e de emprego e beneficiar de uma maior prosperidade. Ao definir o crescimento sustentável como prioridade essencial, a estratégia para a região do Danúbio poderá contribuir, em grande medida, para a concretização dos objectivos da Estratégia Europa 2020.

2.5

O CESE espera que, no quadro do exercício em curso e na ausência de novos financiamentos para a execução da estratégia, uma maior harmonização dos programas adoptados pelos países da região do Danúbio possa contribuir para aumentar o impacto dos 100 mil milhões de euros consagrados à região. Para tal, há que definir sinergias e compromissos como, por exemplo, o desenvolvimento de tecnologias verdes de ponta, a colaboração com vista a uma melhor harmonização entre as medidas e o seu financiamento que permita aumentar o impacto no terreno e eliminar a fragmentação.

2.6

Atendendo à actual conjuntura económica, o CESE chama a atenção para a necessidade de seleccionar um número limitado de projectos num intuito de racionalização e de realizar uma análise de eficácia. São necessárias medidas concretas e garantias adequadas entre as partes interessadas para reforçar a cooperação económica e financeira.

2.7

O CESE não exclui a possibilidade de, a nível político, a estratégia prevista para o Danúbio ser aplicada sob a forma de um processo de execução que implique flexibilidade e revisões periódicas e, quando necessário, a atribuição de recursos financeiros adicionais.

2.8

Em seu entender, a coerência relativamente à legislação e às acções da UE constitui um elemento central da estratégia. É necessário desenvolver esforços contínuos para eliminar as disparidades em matéria de execução e superar as dificuldades práticas e organizacionais que estão na origem de resultados insatisfatórios. A «dimensão territorial reforçada» contribuirá para a coordenação da cooperação, a introdução de princípios de organização da coordenação nos regulamentos da UE e a concretização prática das obrigações jurídicas da UE, nomeadamente no que diz respeito ao mercado único e ao ambiente. Ela poderá ser a precursora do estabelecimento de uma «cooperação reforçada».

2.9

O CESE advoga que a estratégia da União Europeia para a região do Danúbio se transforme numa vertente da Estratégia Europa 2020, a qual constitui o compromisso emblemático da UE para com o crescimento inovador, sustentável e inclusivo. Esta evolução poderia abrir um precedente para outras estratégias regionais.

2.10

O CESE concorda que a cooperação regional na zona do Danúbio contribui para a realização dos cinco objectivos principais da Estratégia Europa 2020, isto é, promover o emprego, melhorar as condições para a inovação, a investigação e o desenvolvimento e, em particular, a difusão das tecnologias emergentes, concretizar os objectivos em matéria de alterações climáticas e de energia, melhorar os níveis de educação e promover a inclusão social, em especial reduzindo a pobreza e enfrentando os desafios do envelhecimento.

3.   Estratégia da União Europeia para a Região do Danúbio: mensagens, desafios e problemas

3.1

As grandes mudanças ocorridas em 1989 na Europa Central desencadearam um processo de transformação fundamental da sociedade. Importa atender às situações, uma vez que a região do Danúbio inclui Estados-Membros que aderiram à UE em momentos diferentes, países candidatos e países terceiros. O CESE observa que a maior parte destes países está confrontada com problemas semelhantes, mas não dispõe dos mesmos recursos. O intercâmbio de boas práticas administrativas é importante para tornar a região mais segura e reforçar a sua integração na UE.

3.2

O CESE está muito atento às profundas disparidades económicas, sociais e territoriais que caracterizam a região do Danúbio. As diferenças entre as regiões mais competitivas e as regiões mais pobres, entre os cidadãos mais qualificados e os menos instruídos e entre o nível de vida mais elevado e o nível de vida mais baixo são muito marcadas.

3.3

As comunidades marginalizadas (em particular os Roma, cuja maioria vive na região) deveriam ser as principais beneficiárias das oportunidades que a Estratégia Europa 2020 proporciona. As disparidades em termos de educação e de emprego podem ser superadas. A região do Danúbio pode tornar-se uma área de segurança e de tranquilidade, onde os conflitos, a marginalização e a criminalidade são tratados de forma adequada. É necessário interligar os habitantes da região, as suas ideias e as suas necessidades. No seu parecer sobre a «Estratégia da União Europeia para a região do Danúbio» (3), o CESE já recomendava que se criasse um «Fórum Empresarial do Danúbio», que reunisse os actores económicos e sociais e se transformasse num instrumento importante de cooperação, favorável à coesão económica, social e territorial na região do Danúbio.

3.4

As principais mensagens contidas na proposta de estratégia da União Europeia para a região do Danúbio são as seguintes:

1)

a estratégia é uma iniciativa salutar que visa consolidar a integração da região na UE;

2)

os Estados-Membros e os países terceiros (incluindo os países candidatos ou potencialmente candidatos) comprometem-se ao mais alto nível político;

3)

a Comissão tem um papel essencial a desempenhar para facilitar o processo;

4)

é possível melhorar consideravelmente a utilização dos financiamentos existentes para realizar os objectivos da estratégia;

5)

a estratégia deve conduzir a melhorias visíveis e concretas para a região e seus habitantes.

3.5

O CESE considera que a Estratégia para a Região do Danúbio deve vencer, em primeiro lugar, os principais desafios com que a região está confrontada:

—   Mobilidade: o próprio Danúbio é um corredor importante da RTE-T, mas está subutilizado. Neste sentido, é necessário analisar mais a fundo formas de eliminar os entraves de ordem física e organizacional (Convenção de Belgrado) existentes no próprio Danúbio, levando em conta as decisões de órgãos nacionais e a necessidade de proteger o ambiente e a natureza. Além disso, importa fomentar a intermodalidade e modernizar e alargar as infra-estruturas dos nós de transporte, como os portos fluviais. No entender do CESE, é da máxima importância melhorar as condições de mobilidade dos trabalhadores e garantir a livre circulação dos serviços;

—   Energia: na região do Danúbio, os preços são relativamente elevados e a fragmentação dos mercados traduz-se no aumento dos custos e na diminuição da concorrência. O nível de segurança energética da região é baixo. É fundamental melhorar a eficiência energética, em particular poupando energia e utilizando um maior número de fontes de energia renováveis. Os países que participam na execução da estratégia devem assumir um papel motor na elaboração da política europeia de vizinhança, com vista a garantir a segurança energética;

—   Ambiente: a região do Danúbio é uma bacia hidrográfica e um corredor ecológico de importância internacional, onde a conservação da natureza, o ordenamento do território e o ordenamento hídrico devem assentar numa abordagem regional e global. Há que ter em atenção as exigências sociais e avaliar o impacto ambiental das redes de transporte, dos empreendimentos turísticos e das novas instalações de produção de energia. Importa ter em conta o programa Natura 2000. Os desportos aquáticos e o turismo aquático sustentável, a sensibilização para o respeito da água e da natureza são elementos importantes a ter em consideração na concepção dos corredores verdes. Os riscos são grandes: num contexto em que as inundações, as secas e os casos de poluição industrial de pequena e de grande envergadura são frequentes, a prevenção, a preparação e a capacidade de reacção passam necessariamente por um nível elevado de cooperação e de intercâmbio de informações;

—   Considerações socioeconómicas: a região do Danúbio é caracterizada por uma grande diversidade cultural e linguística, mas também por disparidades socioeconómicas muito significativas. Nela se encontram algumas das regiões mais prósperas da União, mas também algumas das mais pobres. Os contactos e uma cooperação eficaz, tanto a nível financeiro como a nível institucional, são muitas vezes inexistentes. A percentagem de pessoas altamente qualificadas na região do Danúbio é inferior à média da UE-27. A mobilidade é elevada e os melhores elementos abandonam frequentemente a região para procurar condições socioeconómicas mais favoráveis;

—   Segurança, grande criminalidade e criminalidade organizada: persistem problemas significativos. O tráfico de seres humanos e o contrabando de mercadorias são problemas específicos em vários países. A corrupção destrói a confiança do público e entrava o desenvolvimento económico e social.

3.6

O CESE considera que as perspectivas que se oferecem à região do Danúbio são extraordinárias, quer no plano das relações comerciais, quer no da capacidade de desenvolvimento de um sistema de ensino baseado em infra-estruturas municipais sólidas e capazes de dar resposta às futuras necessidades do mercado de emprego, ou ainda da exploração do enorme potencial decorrente das riquezas culturais, étnicas e sociais da região. Nenhum outro rio tem nas suas margens tantas capitais grandiosas. A região dispõe de potencialidades turísticas excepcionais. O mesmo acontece no atinente à utilização de fontes de energia renováveis. O rico património ambiental da região do Danúbio exige que se dê ao critério de sustentabilidade um lugar preponderante em todos os projectos de desenvolvimento.

3.7

As acções nos domínios da inovação, do turismo, da sociedade da informação, das capacidades institucionais e das comunidades marginalizadas darão resultados positivos se forem desenvolvidas conjuntamente. O CESE está convencido de que a melhoria efectiva passa pela comunicação, pela transparência, pela coordenação da planificação, do financiamento e da execução.

3.8

As insuficiências do mercado, que têm origem externa, são evidentes e reflectem-se na falta de investimentos transfronteiras. Os grandes projectos devem ser elaborados e executados de modo sustentável e eficiente, com custos e benefícios partilhados.

3.9

A existência de redes apropriadas, internas ou com ligação a outras regiões da Europa e do mundo, é essencial para a região do Danúbio. Nenhuma zona deve permanecer periférica. Melhorando os eixos Norte-Sul da UE e o acesso dos países que não têm saída para o Mediterrâneo reforçar-se-á a cooperação entre a UE e os países terceiros. O CESE reitera o que já foi dito a este propósito pelos comités consultivos mistos com a Roménia (2002 e 2005) e a ex-República Jugoslava da Macedónia (2010). (2010). As infra-estruturas de energia e de transporte ainda apresentam numerosas lacunas e falhas devido a insuficiências a nível das capacidades e da qualidade ou a uma má manutenção. O CESE solicita à Comissão e às entidades nacionais que elaborem propostas, com a participação da sociedade civil, para colmatar essas falhas e lacunas. É igualmente necessário estreitar os laços entre as pessoas, nomeadamente através da cultura e do turismo.

3.10

Os recursos ambientais são um bem comum que transcende as fronteiras e os interesses nacionais dos países da região. A actividade humana exerce uma pressão crescente sobre estes recursos. A cooperação é fundamental, pois, sem ela, os bons resultados obtidos em determinada zona serão rapidamente anulados pela negligência das outras zonas. Por conseguinte, é necessário reforçar as estruturas de cooperação existentes.

3.11

A estratégia (4) propõe um Plano de Acção  (5) que pressupõe um forte compromisso dos países e das partes interessadas. A estratégia coloca a ênfase numa abordagem integrada de base territorial assente em ligações apropriadas entre as zonas urbanas e rurais. Um acesso equitativo às infra-estruturas e aos serviços, bem como condições de vida comparáveis promoverão a coesão territorial, que é um objectivo insofismável da União.

3.12

No quadro do Plano de Acção, a Comissão, em parceria com os Estados-Membros, as regiões e as outras partes interessadas, seleccionou os projectos (6) que apresentam benefícios imediatos e concretos para os habitantes da região e têm um impacto em toda ou numa parte significativa da macrorregião.

3.13

O CESE considera que os projectos devem, por conseguinte, promover o desenvolvimento sustentável e abranger várias regiões e vários países, associar coerência e sinergias, criando soluções vantajosas para todas as partes e ser realistas, ou seja, propostas tecnicamente exequíveis baseadas num financiamento plausível.

3.14

O CESE concorda com a repartição das questões principais em quatro pilares, cada um dos quais agrupa áreas prioritárias e diferentes domínios de acção, designadamente:

1)

Ligar a região do Danúbio mediante a melhoria da mobilidade e da multimodalidade, das vias fluviais, das redes rodoviárias, ferroviárias e aéreas, para promover as fontes de energia sustentáveis, a cultura e o turismo, bem como as relações interpessoais;

2)

Proteger o ambiente na região, recuperando e mantendo a qualidade das águas, gerindo os riscos ambientais, preservando a biodiversidade, as paisagens e a qualidade do ar e dos solos;

3)

Criar prosperidade na região, desenvolvendo a sociedade do conhecimento através da investigação, do ensino e das tecnologias da informação, e apoiando a competitividade das empresas, nomeadamente através da criação de pólos empresariais e do investimento nos recursos humanos e nas competências;

4)

Reforçar a região do Danúbio, melhorando as capacidades institucionais e intensificando a cooperação e trabalhando em conjunto para promover a segurança e solucionar os problemas derivados da criminalidade grave e da criminalidade organizada.

3.15

No entender do CESE, a região do Danúbio, actualmente em fase de desenvolvimento e de enriquecimento, deve, em primeiro lugar, visar o desenvolvimento coordenado dos eixos de transporte Norte-Sul e das infra-estruturas energéticas deficientes, bem como das redes interligadas, justificado pelos interesses macrorregionais. No entanto, preconiza a criação de um plano de salvaguarda das bacias e dos afluentes do Danúbio em caso de desenvolvimento deste rio como eixo de transporte. A estratégia propõe-se igualmente ligar em rede as PME dos países que fazem parte da região do Danúbio e fixa como objectivo remover os obstáculos à cooperação, com base numa economia verde, nas redes de investigadores e na formação, incluindo a formação profissional.

4.   As questões relativas ao financiamento, à legislação da UE e às estruturas institucionais da União

4.1

A estratégia visa aproveitar o melhor possível os recursos disponíveis mediante a sinergia de esforços, em particular no que diz respeito aos domínios de acção e ao financiamento. As acções são complementares. Todas as partes devem assumir as suas responsabilidades. O reforço da dimensão territorial permitirá seguir uma abordagem integrada, facilitará a coordenação das políticas sectoriais e contribuirá para a criação e o desenvolvimento de agrupamentos europeus de cooperação territorial (AECT) à escala macrorregional.

4.2

O CESE considera que o grupo de trabalho de alto nível que será criado para definir a regulamentação e identificar as principais questões pode dar corpo, juntamente com os coordenadores responsáveis pelos diferentes temas, a esta nova forma de cooperação institucionalizada a nível macrorregional, que é susceptível de ser apoiada pelas alterações legislativas que serão formuladas, se necessário, na região.

4.3

A execução da estratégia assenta, sempre que necessário e em conformidade com os quadros gerais de acção, na mobilização dos fundos existentes em consonância com os objectivos. Foram já disponibilizadas verbas avultadas através de numerosos programas da União (por exemplo, 100 mil milhões de euros dos Fundos Estruturais para o período 2007-2013, e montantes significativos dos através dos instrumentos de assistência de pré-adesão (IPA) e do Instrumento Europeu de Vizinhança e Parceria (IEVP)).

4.4

O CESE chama a atenção para a necessidade de a reorientação dos recursos ser realizada com base numa análise de eficácia, que comprove que os recursos desviados de outros domínios beneficiam a sociedade no seu conjunto.

4.5

O CESE considera que é necessário prestar a devida atenção aos meios de financiamento que associam subvenções e empréstimos. Podem também ser mobilizados recursos nacionais, regionais e locais. Com efeito, é fundamental ter acesso a financiamento de origens diversas, nomeadamente de fontes públicas e privadas que não operam a nível da União. Além de velar por uma utilização mais eficaz dos recursos, é necessário prestar atenção à repartição dos riscos em matéria de financiamento.

4.6

O CESE considera que compete à Comissão coordenar os domínios de acção e que os Estados-Membros, após consulta da Comissão e das agências e dos organismos regionais em causa, devem ser responsáveis pela coordenação de cada área prioritária.

4.7

O CESE está firmemente convicto de que a execução das acções é da responsabilidade de todos, aos níveis nacional, regional, municipal e local. As acções (que definem os objectivos a alcançar) devem assumir a forma de projectos concretos (que são pormenorizados, geridos por um director de projecto, dotados de um calendário e de financiamento).

4.8

O CESE espera que a estratégia forneça um quadro sustentável para a integração estratégica e o desenvolvimento coerente da região do Danúbio, ao definir as acções prioritárias para transformar esta região numa região da UE virada para o século XXI. A estratégia deve ser acompanhada de uma grande mobilização de esforços, de acções de informação e de publicidade suficientes para que os seus objectivos sejam amplamente difundidos e concretizados.

Bruxelas, 16 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  JO C 339 de 14.12.2010, p. 29.

(2)  Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Estratégia da União Europeia para a Região do Danúbio (SEC(2010) 1489 final), (SEC(2010) 1490 final), (SEC(2010) 1491 final).

(3)  JO C 48 de 15.2.2011, p. 2.

(4)  A Estratégia da União Europeia para a Região do Danúbio é enunciada em dois documentos: 1) uma comunicação da Comissão Europeia às outras instituições da UE e 2) o Plano de Acção que acompanha e completa a comunicação.

(5)  Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Estratégia da União Europeia para a Região do Danúbio (COM(2010) 715 final), (SEC(2010) 1489 final), (SEC(2010) 1490 final), (SEC(2010) 1491 final).

(6)  Promover a ideia de um fórum civil do Danúbio que seria um pilar da participação da sociedade civil na estratégia.


ANEXO

ao Parecer do Comité Económico e Social

A seguinte proposta de alteração foi rejeitada em reunião plenária, tendo recolhido, contudo, pelo menos um quarto dos sufrágios expressos:

Ponto 3.8 —   Proposta de alteração n.o4 apresentada por Lutz Ribbe

Ponto 3.8

Suprimir.

«3.8

As insuficiências do mercado, que têm origem externa, são evidentes e reflectem-se na falta de investimentos transfronteiras. ».

Justificação

1.)

Não há dúvida de que a região do Danúbio necessita também de «grandes projectos», embora não se saiba ao certo o que se entende por grandes projectos. Como o ponto 3.9 se refere concretamente a um grande projecto, ou melhor, a um projecto de enorme dimensão, o CESE deve proceder com precaução e evitar dar a impressão de que precisamente os grandes projectos, como descrito no ponto 3.9, são um motor do desenvolvimento.

Pelo contrário, precisamente os projectos de pequena e média dimensão servem também para criar postos de trabalho, ao mesmo tempo que cumprem os objectivos ambientais e de sustentabilidade. Assim, na Bulgária, o desenvolvimento de energias regenerativas está a ser limitado devido ao facto de as redes energéticas não serem suficientes. Investimentos na aplicação de novos conceitos energéticos podem ser úteis, mas provavelmente não é isso o que os autores têm em mente.

2.)

Não é claro o que os co-relatores entendem por «custos e benefícios partilhados». Quem deve arcar com os custos de grandes projectos, quem, e de que forma, quer partilhar os benefícios?

Resultado da votação:

Votos a favor

:

68

Votos contra

:

71

Abstenções

:

26


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/87


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Regulamentação inteligente na União Europeia»

[COM(2010) 543 final]

2011/C 248/15

Relator: Jorge PEGADO LIZ

Em 8 de Outubro de 2010, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do TFUE, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Regulamentação inteligente na União Europeia

COM(2010) 543 final.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo emitiu parecer em 26 de Maio de 2011.

Na 472a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 128 votos a favor, 1 voto contra e 5 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1

O CESE saúda o interesse demonstrado pela Comissão, nesta Comunicação, mas também nos documentos relativos à Estratégia 2020 e ao Single Market Act [Acto para o Mercado Único], relativamente ao aprofundamento dos procedimentos políticos, legislativos e administrativos conducentes a uma mais racional e adequada produção e aplicação do direito comunitário, ao longo de todo o ciclo da sua feitura, desde a origem até à aplicação pelos órgãos competentes dos Estados-Membros e avaliação final do efectivo acatamento e cumprimento pelos últimos destinatários.

1.2

O CESE não entende, no entanto, a necessidade da nova designação utilizada em substituição da consagrada «Melhor Legislar», que não seja por se tratar de um documento de carácter meramente político.

1.3

O CESE congratula-se por ver acolhidas várias sugestões que, sobre esta matéria, tem vindo a fazer nos seus pareceres. Por isso regozija-se com as intenções anunciadas de reforço do escrutínio da subsidiariedade e da proporcionalidade, de um maior rigor nos estudos de impacto, de uma avaliação ex post mais estratégica e integrada, de implicar mais activa e responsavelmente os Estados-Membros e os respectivos parlamentos, prestando-lhes apoio nas suas tarefas próprias no «iter» legislativo. E acolhe com particular satisfação o propósito de assegurar uma maior participação dos cidadãos e outras partes interessadas na elaboração, transposição e aplicação do direito comunitário, designadamente com o aumento do prazo geral das consultas públicas e em agilizar e tornar mais efectivos os procedimentos relativos às infracções.

1.4

O CESE considera, no entanto, que a Comunicação fica aquém do que seria desejável para constituir um elemento adequado à concretização dos aspectos legislativos da implementação da Estratégia 2020, ou simplesmente para a aplicação das medidas prioritárias do Single Market Act.

1.5

O CESE julga imprescindível que a Comunicação seja seguida de um verdadeiro Programa de Acção em que se precisem objectivos, se concretizem medidas, se identifiquem instrumentos e se avaliem impactos, se definam opções e se estabeleça a relação custos/benefícios, a merecer uma alargada discussão prévia com a sociedade civil a nível comunitário, nacional, regional e local.

1.6

O CESE apela, por isso, à Comissão para que, nos desenvolvimentos subsequentes da Comunicação, tenha em especial consideração as orientações de carácter geral que se deixam enunciadas neste parecer e consubstanciam as posições que, de há anos, tem assumido nesta matéria.

1.7

Em particular, o CESE entende que merecem ser melhor definidos aspectos como os relativos ao modo como são realizados os estudos de impacto ex ante por todas as instituições comunitárias com responsabilidade na sua execução, à natureza e composição do órgão encarregado do controle dos estudos de impacto, aos parâmetros utilizados, em especial quando se trate do impacto em direitos fundamentais e ao modo e aos meios para garantir maior transparência. Também os sectores financeiro, da saúde e da segurança social deveriam merecer uma abordagem sectorial mais detalhada, bem como ser melhor explicitados os critérios de prioridade, os mecanismos de avaliação e ponderação das queixas, os instrumentos próprios para a detecção oficiosa das infracções, os meios de melhorar a acção dos tribunais nacionais e de outros instrumentos complementares.

1.8

Por fim, o CESE julga que a Comissão esqueceu vários aspectos de relevante interesse e pede que sejam devidamente ponderados e expressamente incluídos. É o caso, designadamente, dos índices e parâmetros para aferir da qualidade dos textos legais, das medidas concretas para a simplificação legislativa, da inexplicável falta da assunção clara da opção pelo instrumento «regulamento», em particular para a realização da harmonização completa em matérias relativas à realização do mercado interno, o imperdoável esquecimento da opção por regimes opcionais ou do papel da auto e da co-regulação e a surpreendente omissão de qualquer referência ao relevantíssimo trabalho levado a cabo no âmbito do QCR e às propostas em discussão para uma maior harmonização do direito europeu dos contratos.

1.9

Mas onde o CESE reputa que a Comunicação se revela mais débil é no que se refere à efectiva aplicação do direito comunitário e, assim, apela à Comissão para que reflicta, de modo aprofundado, sobre as origens e as causas essenciais da generalizada deficiente aplicação do acervo comunitário, todos os anos reconfirmado nos relatórios sobre a sua aplicação, tome em devida consideração os múltiplos contributos e recomendações do CESE em vários pareceres e leve a cabo um estudo sistemático das medidas indispensáveis para uma modificação radical da actual situação.

2.   Introdução: conceito e antecedentes

2.1

De acordo com a Comunicação em apreço, por «regulamentação inteligente» deverá entender-se uma regulamentação

que englobe todo o ciclo político desde a concepção de um diploma legislativo até à sua transposição, aplicação, avaliação e revisão;

que continue a ser da responsabilidade partilhada entre os Estados-Membros e as instituições europeias;

em que a opinião dos mais afectados por ela tem um papel fundamental, devendo reforçar a participação dos cidadãos e partes interessadas.

2.2

Para a Comissão, conforme repetida e insistentemente referido pelo seu representante nas reuniões de preparação do presente Parecer do CESE, trata-se de um mero documento político e não técnico, pelo que será debalde que se busca nele uma verdadeira definição de «regulamentação inteligente».

2.3

A actual iniciativa «regulamentação inteligente» assume-se, no entanto, como sucessora do exercício «legislar melhor» a que as instituições comunitárias em geral e em particular a Comissão dedicaram parte importante do seu labor nos últimos 10 anos, com êxito assinalável, como o CESE, que sempre o apoiou e incentivou, claramente reconheceu em vários pareceres (1).

3.   Observações na generalidade

3.1

O panorama actual do direito comunitário exige uma reflexão aprofundada sobre a sua concepção, elaboração, transposição e aplicação; idêntica reflexão deve merecer a revisão e simplificação.

3.2

O CESE entende pois que o tema merece uma larga discussão, envolvendo a sociedade civil, não só porque é sobre ela que se fazem sentir as consequências da legislação comunitária, mas também porque a sua participação pode contribuir decisivamente para uma desejável melhoria do quadro regulatório existente.

3.3

É neste contexto que a Comunicação, conquanto se trate apenas de um mero documento político, não se afigura estar à altura das necessidades. O que nela sobra em bons propósitos e belas intenções, falta em medidas concretas e instrumentos eficazes.

3.4

De um modo geral poderá dizer-se que, por se tratar de um documento meramente político, necessitará de ser complementado por um verdadeiro Programa, em que se precisem os objectivos, se concretizem as medidas, se identifiquem os instrumentos e se avaliem os impactos. Em que se definam opções e se estabeleça a relação custos/benefícios.

3.5

O CESE aprecia de um modo muito positivo o diagnóstico de que parte a Comunicação e os objectivos que se propõe. A não ser porque se trate de um documento meramente político, não entende a razão da mudança da denominação de «Melhor Legislar» para a de «Regulamentação inteligente».

3.6

Neste sentido, julga-se oportuno reafirmar as posições defendidas pelo CESE nesta matéria:

a)

uma mais estrita aplicação dos princípios «melhor legislar»;

b)

a transparência a todos os níveis da formação do direito;

c)

uma melhor escolha dos instrumentos jurídicos, incluindo mecanismos de auto e de co-regulação;

d)

o desenvolvimento de um sistema de acompanhamento mais sistemático no contexto da transposição das directivas ao nível nacional;

e)

é importante não esquecer o novo papel e os poderes reforçados dos parlamentos nacionais no Tratado de Lisboa;

f)

importará também prever uma utilização mais frequente pela Comissão das suas comunicações interpretativas;

g)

um maior esforço será também necessário ao nível da simplificação legislativa e da codificação.

4.   Observações na especialidade

A.   O que se saúda

4.1

Numa apreciação na especialidade são vários os aspectos positivos da Comunicação que se saúdam e apoiam.

4.2

É, desde logo, o propósito de reforçar o escrutínio da subsidiariedade e da proporcionalidade, bem como de melhorar a qualidade dos textos legais, nomeadamente pelo maior rigor dos estudos de impacto.

4.3

Mas são também as intenções de prosseguir com os programas de simplificação legislativa e de redução, em pelo menos 25 %, dos encargos administrativos desnecessários.

4.4

Como é a ideia de uma avaliação ex-post mais estratégica e integrada, que tenha em conta não só o quadro normativo existente mas igualmente as repercussões económicas, sociais e ambientais relevantes e não seja meramente casuística e isolada de cada iniciativa legislativa per se.

4.5

Valorizam-se, em especial, todas as iniciativas no sentido de levar os Estados-Membros a assumir as suas responsabilidades no «iter» legislativo, envolvendo os parlamentos nacionais, na medida das suas novas atribuições conferidas pelo TFUE, na preparação dos textos legais, e, em especial pelo que respeita ao disposto nos seus artigos 8.o a 13.o.

4.6

Saúda-se, por isso, que a Comissão se mostre disponível não só a prestar apoio aos vários órgãos e organismos dos Estados-Membros implicados na transposição e aplicação do acervo comunitário, mas também a assegurar a participação dos cidadãos e outras partes interessadas nas discussões que em cada Estado-Membro devem ter lugar no processo de preparação de diplomas comunitários, como na sua transposição e articulação com os direitos nacionais.

4.7

Aplaude-se, particularmente, a determinação da Comissão em agilizar os procedimentos relativos às infracções e o estabelecimento de prioridades, sem esquecer o papel do SOLVIT, a necessitar de um novo impulso e de maior divulgação e credibilização junto dos interessados.

4.8

Saúda-se em especial o aumento do prazo geral para as consultas públicas de 8 para 12 semanas a «fim de reforçar ainda mais a participação de todos os cidadãos e partes interessadas», medida que, no entender do CESE, não se poderá desligar do agora constante do artigo 11.o do Tratado de Lisboa, como contributo para alcançar a democracia participativa dentro da UE.

B.   O que pode ser melhorado

4.9

O CESE entende as razões que levam a Comissão a ponderar que o controlo sobre a avaliação de impacto continue a ser realizada pelo Comité interno que dela se ocupa. No entanto, também não pode ser alheio aos argumentos de quantos, na consulta pública, manifestaram interesse em que esse controle passasse a ser efectuado por uma entidade exterior independente. Em alternativa, poderia ser criada uma instituição interna com representantes de todos os Estados-Membros. De qualquer dos modos, há que reforçar o mandato do Comité de Avaliação do Impacto (CAI) através da obrigatoriedade da realização das avaliações de impacto. Acresce que o CAI não tem competências para bloquear um relatório de avaliação de impacto e, assim, para travar de facto uma proposta legislativa conexa, caso a análise revele lacunas fundamentais no trabalho de investigação realizado. Seriam temas a merecer ser debatidos com maior profundidade uma vez que, como a Comissão reconhece, se trata do «elemento-chave deste sistema».

4.10

Além disso, o Tribunal de Contas europeu concluiu num relatório recente que a Comissão Europeia não considera necessário proceder a consultas no que respeita aos projectos de avaliação do impacto, não obstante os frequentes pedidos das partes interessadas nesse sentido. A consulta sobre os projectos de avaliação de impacto contribuiria para melhorar o processo na perspectiva das partes interessadas, assegurando, assim, que o «melhor produto» fosse introduzido no processo de co-legislação envolvendo o Conselho de Ministros e o Parlamento Europeu.

4.11

O Tribunal de Contas indicou claramente neste mesmo relatório que uma das fragilidades do sistema de avaliação de impacto da UE era o facto de tanto o Parlamento Europeu como o Conselho não analisarem sistematicamente o impacto das suas próprias alterações. O CESE convida o Conselho e o Parlamento Europeu a elaborarem e a publicarem sínteses de leitura fácil das suas próprias avaliações de impacto e a respeitarem o Acordo Inter-institucional (2).

4.12

A Comunicação não esclarece quais os parâmetros que poderão ser utilizados nas avaliações de impacto que deseja efectuar (3).

4.13

No que se refere à maior transparência do sistema, a Comissão deveria dizer de que modo e com que novos meios a pretende incrementar.

4.14

No que se refere à avaliação de impacto nos direitos fundamentais, seria útil que a Comissão concretizasse de que modo e com que meios a pretende levar a cabo.

4.15

Sendo certo que a actual crise financeira e económica está na origem de um despertar para a necessidade de repensar o papel da regulação e da regulamentação dos agentes nos mercados, julga-se que, o novo exercício da «regulamentação inteligente» deverá ser encarado sectorialmente e entre os sectores a merecer uma atenção especial na Comunicação deveriam estar o sector financeiro, o sector da saúde e da segurança social.

4.16

No que se refere ao exercício dos seus poderes, em matéria de infracções, em particular «as medidas de organização interna necessárias ao exercício efectivo e imparcial da sua missão em conformidade com o Tratado» (4), sugere-se que a Comissão detalhe os critérios de prioridade, os mecanismos de avaliação e ponderação das queixas, os instrumentos próprios para a detecção oficiosa das infracções, os meios de melhorar a acção dos tribunais nacionais e de outros instrumentos complementares (SOLVIT, FIN-NET, ECC-NET, meios alternativos e extrajudiciais).

C.   O que falta

4.17

No que se refere à melhoria da qualidade dos textos legais, falta a indicação de índices e de parâmetros para a aferir.

4.18

No que respeita à simplificação legislativa faltam referências a medidas concretas que parecem evidentes, como sejam:

um esforço de codificação verdadeira e própria, que não a mera compilação de textos;

a publicação dos textos completos quando revistos e alterados, em vez da mera «colagem» e da remissão para artigos de vários diplomas legais.

4.19

Falta uma assunção clara da opção pelo instrumento do «regulamento» em vez da utilização de directivas, apesar dessa orientação constar da Estratégia 2020.

4.20

Não há qualquer ligação ao relevantíssimo trabalho levado a cabo no âmbito do QCR e às recentes propostas da Comissão em discussão para uma maior harmonização do direito europeu dos contratos (5).

4.21

Não existe uma referência à necessidade de, de uma forma sistemática, ser considerada a opção «28.o Regime», no âmbito das iniciativas «Melhor Legislar» (6).

4.22

Estranha-se igualmente que não haja uma palavra relativamente ao papel da auto e co-regulação e à necessária ponderação prévia sobre o que pode, com vantagem, ser resolvido mediante a «soft law» em vez do recurso à regulamentação.

4.23

Mas onde a Comunicação se afigura mais débil é nos aspectos relacionados com a aplicação do direito comunitário. Neste particular, o CESE gostaria de chamar a atenção para os seus pareceres sobre a matéria (7) e para as conclusões da recente conferência da Presidência belga dedicada ao tema (8).

4.24

Particularmente significativo neste aspecto é o relatório da Comissão sobre a aplicação do direito comunitário de 01/10/2010 (9), onde, apesar de uma reduzida melhoria relativamente ao ano anterior, ainda se verificam percentagens médias de atraso das transposições de 51 % e um tempo médio de 24 meses para tratamento dos processos de infracção.

4.25

Neste particular, a Comissão não refere algumas das causas essenciais da generalizada deficiente aplicação do acervo comunitário nos Estados-Membros, a que o CESE se tem referido abundantemente, o que só pode encontrar justificação no facto de se tratar de um documento de carácter meramente político. No entanto, pela sua importância num quadro de regulamentação mais inteligente importa recordar:

a)

a incorrecta ou incompleta integração das normas comunitárias nos direitos nacionais, onde muitas vezes são consideradas como indesejáveis e contrárias aos usos e costumes e aos interesses nacionais;

b)

a falta de vontade política das autoridades nacionais para cumprir e fazer cumprir normas consideradas «estranhas» ao seu corpo jurídico e à sua tradição nacional;

c)

a persistente tendência para aditar às normas comunitárias novos dispositivos regulamentares desnecessários ou de escolher apenas partes das normas comunitárias («gold-plating» e «cherry-picking») a aconselhar mesmo que, para além dos «quadros de concordância» a que se referem o Acordo Interinstitucional (10) e o Acordo-Quadro entre a Comissão e o PE, que os Estados-Membros devem elaborar, estes sejam compelidos a indicar expressamente quais os preceitos das suas leis de transposição que constituem casos de sobre-regulamentação;

d)

alguma deficiente preparação específica por parte das autoridades nacionais para entender e fazer aplicar o acervo comunitário;

e)

uma por vezes menor formação específica de alguns juízes e outros actores do sistema judicial (advogados, funcionários judiciais, etc.) em matérias de direito comunitário que algumas vezes leva à errada aplicação ou à desaplicação das normas transpostas e à aplicação de normas «paralelas» dos direitos nacionais;

f)

a necessidade de alargar as medidas de cooperação administrativa por forma a envolver as organizações da sociedade civil, em particular as associações de defesa dos consumidores;

g)

a ausência de previsão e harmonização do direito sancionatório, que tem sido deixado na disponibilidade dos Estados-Membros.

4.26

Seria igualmente ao nível da informação e da formação das autoridades públicas nacionais, em particular daquelas com mais directas responsabilidades na aplicação do direito comunitário nos Estados-Membros, que a acção da Comissão deveria prioritariamente incidir. Neste domínio, haveria que intensificar a informação e a formação dos juízes e de outros magistrados em geral, aos quais compete, em última análise, a interpretação e a aplicação do direito aos casos concretos, objecto de litígio.

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  JO C 48 de 15.2.2011, p. 107 e JO C 175 de 28.7.2009, p. 26.

(2)  JO C 321 de 31.12.2003, p. 1.

(3)  JO C 44 de 11.02.2011, p. 23.

(4)  COM(2002) 725 final.

(5)  Livro Verde sobre as opções estratégicas para avançar no sentido de um direito europeu dos contratos para os consumidores e as empresas (COM(2010) 348 final).

(6)  Cf. o Parecer de Iniciativa do CESE «28.o Regime» (JO C 21 de 21.01.2011, p. 26) bem como as referências que a este método são feitas em importantes Relatórios recentes, como o Relatório MONTI «Uma nova estratégia para o mercado único» de 9.5.2010, o Relatório Felipe González «Projecto Europa 2030» de 8.5.2010 ou o Relatório Lamassoure «Le citoyen et l’application du droit communautaire» de 8.6.2008.

(7)  JO C 24 de 31.1.2006, p. 52, e JO C 18 de 19.01.2011, p. 100.

(8)  Conferência de Alto Nível «European consumer protection enforcement day» (Bruxelas, 22.9.2010).

(9)  COM (2010) 538 final, 27.o Relatório Anual sobre a Aplicação do Direito Comunitário (2009).

(10)  JO C 321 de 31.12.2003, p. 1.


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/92


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre «Livro Verde — Política de auditoria: as lições da crise»

[COM(2010) 561 final]

2011/C 248/16

Relator: Peter MORGAN

Em 13 de Outubro de 2010, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre o

Livro Verde – Política de auditoria: as lições da crise

COM(2010) 561 final.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo que emitiu parecer em 26 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 16 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 153 votos a favor, 1 voto contra e 7 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1   Síntese

1.1.1   O Livro Verde intitula-se Política de auditoria: as lições da crise. O CESE tem para si que a dimensão da crise se deveu ao facto de nenhuma das partes envolvidas ter desempenhado correctamente as suas funções, e muito menos os conselhos de administração de muitos bancos. Dada a incapacidade destes últimos, as entidades reguladoras, os supervisores e os revisores legais de contas (RLC) deveriam ter detectado os problemas que provocaram a crise, o que não foram capazes de fazer. A UE já se debruçou sobre as questões da regulamentação e da supervisão. É claramente necessária uma revisão do papel dos RLC, e o CESE apelou justamente para uma tal revisão no seu parecer de 2009 sobre o Relatório do Grupo de Larosière  (1). O Livro Verde vai além do papel do auditor, analisando assuntos como a governação, a supervisão e a concentração. O CESE concorda que estas questões influenciaram efectivamente o desempenho dos auditores durante a crise.

1.1.2   O Livro Verde coloca 38 perguntas. Três têm a ver com questões altamente controversas: a pergunta 18, sobre a obrigação de uma nova selecção, a pergunta 28, sobre as auditorias conjuntas, e a pergunta 32, sobre a inversão da tendência para a consolidação das grandes firmas. Em todos estes casos, qualquer que seja a política adoptada pela Comissão, o CESE recomenda que seja efectuada uma avaliação de impacto cuidadosa antes que seja tomada uma decisão.

1.2   Papel do auditor

1.2.1   O papel do RLC, como actualmente definido e praticado, não é adequado para o objectivo pretendido. O comité de auditoria ou de supervisão é uma contraparte essencial do trabalho dos RLC. O reforço da independência do auditor externo e a reforma do comité de auditoria são pontos fundamentais das propostas do presente parecer.

1.2.2   O CESE propõe que a Directiva da UE relativa à revisão legal de contas, de 2006, seja revista no sentido de dar mais destaque ao papel do comité de auditoria ou de supervisão:

a maioria dos membros do comité e o respectivo presidente devem ser independentes;

a competência de alguns dos membros do comité deve ser pertinente para as características sectoriais da empresa em causa, sobretudo no sector bancário;

o comité de auditoria ou de supervisão deve não só verificar a integridade do processo de auditoria como também assumir a responsabilidade pela mesma.

1.2.3   No que diz respeito aos sistemas de supervisão no âmbito do sistema dual (conselho de supervisão e conselho executivo), o CESE defende que importa reforçar a relação entre o revisor de contas e o conselho de supervisão, bem como a co-gestão.

1.2.4   De modo geral, o CESE considera necessárias as seguintes melhorias:

especificação mais precisa do perfil do revisor de contas e das suas responsabilidades;

apresentação pelo revisor de contas de relatos mais claros e compreensíveis, sobretudo no que diz respeito aos riscos existentes;

aperfeiçoamento do trabalho de auditoria no sentido de uma auditoria de empresas (sustentabilidade do modelo empresarial, solidez financeira, identificação e análise dos riscos incorridos pelas empresas);

reforço da comunicação ao longo do exercício anual entre o revisor de contas e as instâncias de controlo da empresa já no momento da revisão de contas.

1.3   Governação e independência

O CESE não apoia a obrigatoriedade da rotação dos RLC, mas concorda que o envolvimento continuado de uma mesma firma de auditoria deve ser limitado no tempo mediante a obrigatoriedade de nova selecção da firma para o contrato de auditoria cada seis a oito anos. A prestação de serviços distintos da auditoria pelos RLC aos seus clientes deve ser estritamente controlada por autorização expressa do comité de supervisão ou auditoria, ao passo que no caso das empresas de maiores dimensões a prestação de serviços de aconselhamento em matéria fiscal e de risco ou de serviços de auditoria pelos RLC deve ser proibida, devido ao conflito de interesses que daí resultaria. A prestação de aconselhamento em matéria fiscal deve ser limitada sempre que possa haver conflito de interesses por parte do RLC.

1.4   Supervisão

Deveria ser obrigatório por lei os RLC e os supervisores reunirem-se periodicamente. Isto é especialmente necessário no caso de bancos de importância sistémica.

1.5   Concentração

A concentração da maior parte do mercado de auditoria das grandes empresas nas mãos das 4 grandes firmas representa um oligopólio. Havia cinco firmas até à falência da Arthur Anderson. Outra falência seria impensável. O CESE recomenda uma medida a curto prazo através de testamentos em vida para atenuar os efeitos da eventual falência de uma firma. A mais longo prazo, considera ser necessária uma reestruturação e, para tal, recomenda que as autoridades responsáveis pela concorrência nos Estados-Membros, a começar pela Alemanha, os Países Baixos e o Reino Unido, sejam consultadas sobre a presença ou não de um oligopólio.

1.6   Mercado europeu

A criação de um mercado europeu funcional para a revisão legal de contas é um objectivo desejável, mas as diferenças ao nível da fiscalidade, da legislação e da língua mantêm-se obstáculos de relevo. Há margem para melhorias.

1.7   Simplificação para as pequenas e médias empresas

Há PME de todas as formas e tamanhos. Se houver investimentos externos e/ou facilidades bancárias importantes e/ou clientes e fornecedores importantes preocupados com a integridade das suas cadeias de valor, é difícil pensar em muitos atalhos.

1.8   Cooperação internacional

O CESE considera a cooperação obrigatória, o que requer iniciativas com o CEF e o G20, embora os esforços imediatos devam ser desenvolvidos com os EUA através do G8.

1.9   Governo das sociedades

O CESE lamenta que o Livro Verde não inclua um capítulo sobre o governo das sociedades. Um novo Livro Verde sobre a matéria (COM(2011) 164 final) acaba de ser publicado. É fundamental que a Comissão harmonize as suas propostas sobre o governo das sociedades com as propostas relativas à política de auditoria. Os dois domínios estão intimamente relacionados no que diz respeito à veracidade das contas das sociedades.

2.   Introdução

2.1   De acordo com a legislação vigente, os conselhos de administração têm a responsabilidade de manter a contabilidade da empresa e apresentar uma descrição verídica e adequada da situação da empresa. As grandes empresas são obrigadas a utilizar as Normas Internacionais de Relato Financeiro (IFRS). Cabe aos RLC determinar se essa descrição apresentada pelo conselho de administração é ou não correcta e se a Convenção IFRS foi cumprida. O relatório dos administradores e o parecer dos RLC são ambos publicados no relatório e nas contas anuais das empresas. Os relatórios anuais elaborados antes da crise por administradores de bancos não deram qualquer aviso sobre a futura crise, e ainda assim os RLC continuaram a julgá-los fiáveis. A principal lição da crise é que esta situação tem de mudar. O CESE considera que essa mudança deve concentrar-se sobretudo no comité de auditoria ou de supervisão e na salvaguarda da independência dos RLC.

2.2   A situação actual reflecte-se nas declarações de administradores e RLC publicadas nos relatórios anuais. O Comité também examinou relatórios de RLC de França, Alemanha, Espanha e Reino Unido. Em todos os Estados-Membros, os RLC concentram-se sobretudo nos procedimentos e nos processos. A referência à conformidade com as IFRS é repetida pelos RLC em toda a UE. Está actualmente a ser expressa uma certa inquietação com a possibilidade de o facto de assinalar a conformidade com as IFRS equivaler a suprimir a avaliação de alguns aspectos da contabilidade e revisão legal de contas.

2.3   Uma análise dos pareceres de auditoria realizada na Alemanha por uma das 4 grandes firmas às contas de 2009 do Deutsche Bank, do Munich Re e da BMW, entre outros, revela, na tradução inglesa, que o texto é quase idêntico, embora as três empresas sejam muito diferentes. Esta tendência para usar um texto-tipo oculta o fundo da auditoria para o utilizador. O RLC confirma que foram seguidos os procedimentos correctos, mas não há qualquer prova da qualidade da auditoria. No entender do CESE, são necessárias reformas para assegurar que os relatórios de auditoria dêem prioridade ao conteúdo, e não à forma.

2.4   A auditoria externa baseia-se em boa parte nos sistemas de controlo interno dos seus clientes, sendo que a auditoria se centra em grande medida na integridade desses sistemas. Empresas de maiores dimensões dispõem de serviços de auditoria interna formal independentes do serviço financeiro, que apresentam relatórios directamente ao comité de auditoria. A auditoria interna é responsável pela verificação da integridade dos sistemas de controlo internos. Certas empresas subcontratam a auditoria interna a terceiros. Nestes casos, os serviços subcontratados nunca deveriam ser prestados pelos RLC designados. Compete ao comité de auditoria ou de supervisão assegurar a independência da auditoria interna e, por extensão, a integridade dos sistemas de controlo internos.

2.5   Embora a auditoria confirme a informação financeira constante das contas anuais, actualmente não é emitido parecer sobre as decisões comerciais tomadas pela empresa. Uma das lições da crise actual é que os administradores devem determinar, nos seus relatórios, o ponto da situação, incluindo uma avaliação dos «riscos», e que os RLC devem assegurar que esses relatórios são fiáveis. Por esta razão, os RLC não devem aconselhar os seus clientes sobre a avaliação e gestão dos riscos (2).

2.6   Após exame das insuficiências e dos fracassos do actual sistema de relato financeiro aos accionistas e às partes interessadas, e sobretudo visto o que sucedeu a certos bancos durante a crise, a ideia de alargar o papel do comité de auditoria ou de supervisão é universalmente aceite. Por exemplo, o Financial Reporting Council (Conselho do Relato Financeiro) do Reino Unido propôs os seguintes princípios como base para uma reforma do relato financeiro:

Relatórios narrativos de mais elevada qualidade, em particular sobre a estratégia empresarial e a gestão dos riscos;

Maior reconhecimento da importância dos comités de auditoria e, assim, maior ênfase na sua contribuição para a integridade do relato financeiro;

Maior transparência na forma como os comités de auditoria cumprem as suas responsabilidades no que toca à adequação do relatório anual, incluindo a supervisão dos auditores externos;

Mais informação sobre o processo de auditoria, tanto para os comités de auditoria como para os investidores, e mais responsabilidades para os auditores; e

Relatórios anuais mais acessíveis graças ao recurso à tecnologia.

2.7   O CESE apoia estes princípios, que implicam o seguinte:

1.

Os administradores deverão descrever mais detalhadamente as medidas que tomam para garantir a fiabilidade da informação na qual se baseiam a gestão da empresa e as decisões dos administradores; e promover mais transparência quanto às actividades da empresa e quaisquer riscos correlatos.

2.

Os revisores legais de contas terão de elaborar relatórios que incluam uma secção sobre a exaustividade e a razoabilidade do relatório do comité de auditoria e indique os aspectos do relatório anual que os RLC julguem incorrectos ou incompatíveis com a informação constante das demonstrações financeiras ou obtida durante a auditoria.

3.

O poder crescente dos comités de auditoria ou de supervisão de exigir responsabilidades da parte dos gestores e dos RLC deve ser ainda reforçado através de maior transparência, graças a relatórios mais completos desses comités que expliquem, em particular, como cumpriram a sua responsabilidade pela integridade do relatório anual e outros aspectos da sua competência, como a supervisão do processo de auditoria externa e a nomeação dos RLC.

2.8   A Directiva relativa à revisão legal de contas, de 2006, prevê as instruções seguintes no que se refere aos comités de auditoria:

Cada entidade de interesse público deve ter um comité de auditoria. Os Estados-Membros devem determinar se os comités de auditoria são compostos por membros não executivos do órgão de administração e/ou por membros dos órgãos de fiscalização da entidade examinada e/ou por membros designados pela assembleia-geral de accionistas dessa entidade. Pelo menos, um membro do comité de auditoria deve ser independente e ter competência nos domínios da contabilidade e/ou da revisão ou auditoria.

Sem prejuízo da responsabilidade dos membros dos órgãos de administração, de direcção ou de fiscalização, ou de outros membros designados pela assembleia-geral de accionistas da entidade examinada, o comité de auditoria procede nomeadamente:

1.

Ao acompanhamento do processo de informação financeira;

2.

Ao controlo da eficácia dos sistemas de controlo interno, da auditoria interna, sempre que aplicável, e da gestão de risco da empresa;

3.

Ao acompanhamento da revisão legal das contas anuais e consolidadas.

2.8.1   Para dar cumprimento aos princípios e preceitos enumerados nos pontos 2.8 e 2.9 supra, o CESE considera que estas instruções, sem prejuízo das regras de co-gestão existentes, devem ser alteradas a fim de passar a exigir que a maioria dos membros do comité e o respectivo presidente sejam independentes.

2.8.2   A mera obrigação de competência em matéria de contabilidade e/ou revisão de contas não basta. A competência de alguns membros do comité deve ser pertinente para as características sectoriais da empresa em questão, especialmente no sector bancário.

2.8.3   O CESE entende que o comité de auditoria ou de supervisão deveria não só acompanhar como também assumir responsabilidade pela integridade destes procedimentos, de acordo com os princípios e preceitos referidos nos pontos 2.6 e 2.7 supra.

2.9   Se é um facto que os administradores são responsáveis pelas contas, convém precisar melhor o seu papel e a sua responsabilidade quanto à veracidade das mesmas. Por exemplo, os administradores certificam que procederam às averiguações necessárias para poderem avalizar as contas em boa consciência. Mas é credível que os conselhos de administração dos bancos procederam às averiguações necessárias antes da crise? Terão tido a noção dos seus riscos de liquidez, da fragilidade dos seus activos associados a créditos hipotecários e dos riscos inerentes às suas carteiras de empréstimos? De futuro, os bancos e outras empresas terão de garantir que os administradores independentes designados para o conselho de administração venham munidos de um pacote de competências adequado e de um melhor entendimento do seu papel e das suas responsabilidades.

2.10   Os princípios referidos no ponto 2.6 supra tornam necessária uma reforma mais geral da gestão das empresas se se pretende que sejam aplicados com êxito. É fundamental que as conclusões dos Livros Verdes sobre a política de auditoria e sobre o governo das sociedades sejam harmonizadas, a fim de evitar quaisquer incongruências.

2.11   Em suma, embora os administradores sejam responsáveis por apresentar uma imagem verdadeira e adequada da empresa, os RLC têm de se assegurar de que a imagem apresentada é efectivamente verdadeira e adequada. A limitação da responsabilidade é um privilégio extraordinário de que gozam as sociedades anónimas. O revisor legal de contas tem como tarefa garantir que esse privilégio não é utilizado de forma abusiva. Accionistas, detentores de obrigações, gestores bancários e outros credores estão directamente expostos financeiramente e dependem directamente da veracidade das demonstrações financeiras. A subsistência de outras partes interessadas (trabalhadores, clientes, fornecedores) depende do facto de uma empresa ter capacidade para prosseguir as suas actividades. Na crise do sector bancário, os revisores legais de contas falharam, como o fizeram todos os outros responsáveis. A auditoria não pode ser protegida das reformas e da supervisão que estão a ser introduzidas noutras partes do sistema financeiro. A manutenção do status quo não constitui uma opção viável.

3.   Perguntas

3.1   Introdução

1)

Tem observações de carácter geral sobre a abordagem e os objectivos do presente Livro Verde?

Ver o capítulo 1 do presente parecer.

2)

Considera que existe uma necessidade de definir melhor o papel da auditoria na sociedade no que se refere à veracidade das demonstrações financeiras?

A veracidade das demonstrações financeiras é condição essencial para uma sociedade que depende muito do desempenho das sociedades anónimas numa economia de mercado. O interesse público exige que as empresas sobrevivam e prosperem. Há uma multiplicidade complexa de interesses interdependentes: os accionistas, detentores de obrigações, bancos e outros credores, que dependem das demonstrações para avaliar a segurança dos seus investimentos e empréstimos; os trabalhadores, que dependem das demonstrações para avaliarem da segurança dos seus postos de trabalho e dos seus salários; as partes interessadas, que dependem das demonstrações para avaliar a solidez da empresa enquanto empregador, fornecedor ou cliente; as comunidades locais e os governos nacionais e locais, que se baseiam nas contas enquanto medida da contribuição da empresa para a sociedade, assim como a sua capacidade de pagar impostos.

Para além destas considerações, os bancos e outras instituições de crédito desempenham um papel fundamental no funcionamento da economia de mercado. Durante a crise financeira, os bancos não cumpriram o seu papel de movimentar o dinheiro na economia. Em consequência, a veracidade das suas demonstrações financeiras anteriores à crise foi muito justamente posta em causa. Demonstrações financeiras verdadeiras e adequadas são a fundação da organização política, social e económica da UE. As empresas que realizam a revisão legal de contas são responsáveis por garantir o interesse público.

3)

Considera que o nível geral da «qualidade da auditoria» poderia ser melhorado?

Sim, os relatórios de auditoria não são significativos. Não reflectem o trabalho dos RLC. Com o advento das IFRS, as contas auditadas podem também ser menos significativas, em especial no caso dos bancos.

3.2   Papel do auditor

4)

Considera que as auditorias devem proporcionar garantias sobre a saúde financeira das empresas? As auditorias são adequadas para esse efeito?

Na sua forma actual, as auditorias não são adequadas para esse efeito. A saúde financeira actual de uma empresa depende da resiliência do seu modelo empresarial. Testar este modelo é sobretudo função das instituições e dos analistas, não dos RLC. Mesmo assim, há que efectuar mudanças. Nos seus relatórios, os administradores têm de ser mais transparentes sobre a verdadeira situação da empresa. Dar garantias externas sobre essa informação devia, então, ser uma função dos RLC. Para tal, os RLC necessitarão que o sector compreenda especificamente os riscos inerentes, algo que parece ter faltado à medida que a complexidade dos activos dos bancos aumentou. Neste contexto, deve também haver uma explicação das avaliações efectuadas para confirmar a capacidade de prosseguir as actividades.

5)

Para colmatar o desfasamento em relação às expectativas e esclarecer o papel da auditoria, deve a metodologia utilizada na auditoria ser mais bem explicada aos utentes?

Sim. Os RLC apresentam declarações curtas no Relatório de Contas, mas que são orientadas para o processo (ver capítulo 2) e não revelam nada sobre as suas conclusões, inquietações ou apreciações. Não se trata apenas de explicar a metodologia. Os administradores devem explicar os seus juízos e decisões e, em seguida, os RLC devem explicar o processo que os levou a concluir que as contas fornecem efectivamente uma imagem verdadeira e adequada. Para isso, importa assegurar que os RLC não continuem a usar as mesmas fórmulas ocas.

6)

Será necessário reforçar o «cepticismo profissional»? Como?

O cepticismo profissional pode ser reforçado pela formação, a experiência com serviços distintos da auditoria, a revisão inter-pares das conclusões da auditoria e a liderança dos sócios da firma de auditoria. Além disso, a maior transparência exigida aos RLC nas propostas formuladas no capítulo 2 tornarão necessário da sua parte um cepticismo profissional mais severo do que até à data. A criação de um organismo disciplinar profissional em cada Estado-Membro reforçaria o cepticismo.

É provável que o cepticismo profissional fosse ainda mais reforçado pela independência económica. A dimensão dos serviços distintos da auditoria prestados aos clientes das firmas de auditoria deve ser submetida a revisão e a uma avaliação crítica pelo comité de auditoria ou de supervisão, a fim de evitar qualquer conflito de interesses entre o exercício do cepticismo profissional e a obtenção de receitas importantes para o cliente. Também é possível que o cepticismo seja reforçado se a obrigação de uma nova selecção da firma de auditoria (pergunta 18) reduzir a probabilidade do prolongamento do contrato com a mesma firma de auditoria.

7)

Será necessário reconsiderar a percepção negativa associada aos relatórios de auditoria com reservas? Em caso afirmativo, como?

Não. Os accionistas e as partes interessadas têm razão em se preocuparem se o relatório dos administradores suscitar reservas por parte dos RLC. Contudo, uma maior transparência na comunicação da informação por parte dos administradores e/ou do comité de auditoria ou de supervisão pode tornar mais claras para os accionistas as razões pelas quais um RLC expressou reservas sobre um relatório de auditoria.

No caso dos bancos, a atribuição de uma qualificação às reservas suscitadas pode gerar uma crise de confiança com potenciais implicações sistémicas. Por isso, quaisquer preocupações dos RLC devem ser comunicadas quanto antes às entidades reguladoras e aos supervisores, para que eventuais problemas possam ser rapidamente resolvidos.

8)

Que informação adicional deve ser prestada às partes interessadas exteriores à empresa e como?

Os RLC têm responsabilidade para com os accionistas, os trabalhadores e outras partes interessadas. Não têm que prestar contas separadamente às partes interessadas. A empresa é responsável pela informação fornecida às partes interessadas. Como proposto no capítulo 2, as instâncias de controlo da empresa, os titulares de acções, os trabalhadores e outras partes interessadas devem receber mais informação por parte dos administradores e dos RLC, e com maior transparência.

O CESE propõe que o revisor de contas seja claro, pelo menos no relato não público, nas afirmações que faz quanto aos riscos identificados. As suas informações devem permitir identificar claramente os principais riscos que afectam a situação patrimonial. Entre as várias informações contam-se: análises de cenários, análises de sensibilidade, dados sobre os parâmetros que podem influenciar os riscos, o montante das perdas e as probabilidades de entrada. Relativamente aos métodos de contabilidade e de avaliação, importa apresentar com transparência os seus efeitos sobre a situação patrimonial, financeira e de rentabilidade da empresa.

9)

Existe um diálogo adequado e regular entre os auditores externos, os auditores internos e o comité de auditoria? Se não for o caso, como se poderá melhorar a comunicação?

A crise do sector bancário persuade de que não houve um diálogo adequado e regular em todos os casos, mas em muitos casos sim. Um papel reforçado para o comité de auditoria levaria a uma melhoria na comunicação.

10)

Pensa que os auditores devem desempenhar um papel na garantia da fiabilidade da informação relatada pelas empresas em termos de RSE?

Possivelmente, mas nunca antes de se chegar a acordo na UE quanto às normas de relato financeiro.

11)

Deverá haver uma comunicação mais regular pelo auditor às partes interessadas? Por outro lado, deverá o intervalo entre o fim do exercício financeiro e a data da opinião de auditoria ser reduzido?

As partes interessadas são tratadas na pergunta 8. O intervalo não é relevante.

12)

Que outras medidas poderão ser estudadas para aumentar o valor das auditorias?

A Comissão deveria avaliar o impacto da introdução das IFRS, sobretudo no que toca à sua aplicação aos bancos. Há receios de que aspectos fulcrais como a prudência e o conservadorismo contabilístico tenham sido substituídos, nas IFRS, por uma ênfase no processo e no cumprimento das normas. Há provas de que, ao limitarem a margem de manobra dos auditores para efectuarem avaliações mais prudentes, as IFRS oferecem menos garantias. As IFRS também apresentam desvantagens específicas, como a incapacidade de explicar as perdas previstas.

Testemunhos orais apresentados no âmbito do inquérito realizado pela Câmara dos Lordes do Reino Unido sobre a concentração nos mercados da auditoria revelam que as fraquezas das IFRS são particularmente graves no que toca às auditorias aos bancos (3).

Normas internacionais de auditoria (ISA)

13)

Qual é a sua opinião em relação à introdução das ISA na UE?

Positiva. Contudo, há que manter uma neutralidade estrita em relação aos sistemas jurídicos.

14)

Deverão as ISA ser juridicamente vinculativas em toda a UE? Em caso afirmativo, deverá escolher-se uma abordagem semelhante à que foi utilizada para a adopção das normas internacionais de relato financeiro (IFRS)? Em alternativa, e dada a utilização generalizada das ISA na UE, deverá a utilização das ISA ser mais incentivada através de instrumentos legislativos não-vinculativos (recomendações, códigos de conduta)?

Sim, eventualmente através de regulamentação.

15)

Devem as ISA ser objecto de adaptações suplementares de forma a corresponder às necessidades das PME e das SMP?

Não é necessário.

3.3   Governação e independência das firmas de auditoria

16)

Existe algum conflito pelo facto de o auditor ser nomeado e remunerado pela entidade auditada? Que mecanismos alternativos recomendaria neste contexto?

Há potencial para conflito, mas é controlável. Nas propostas do capítulo 2 refere-se a necessidade de mais transparência na nomeação e renomeação dos RLC. A nomeação pela empresa (comité de auditoria ou de supervisão e accionistas) permite que seja nomeado o RLC mais adequado para satisfazer as necessidades específicas da empresa, p. ex., experiência no sector e a necessária presença internacional.

17)

Será a nomeação por terceiros justificada em determinados casos?

Não em circunstâncias normais. No entanto, a questão pode surgir em relação às instituições sistemicamente importantes, tais como os bancos de grande dimensão. Se os supervisores mantiverem contactos regulares com os RLC dessas instituições e não estiverem satisfeitos com o seu desempenho ou a sua independência, o supervisor deve ter poder para exigir mudanças à instituição. Este poder aplicar-se-á apenas em última instância, uma vez que uma empresa consciente das reservas dos supervisores procurará certamente introduzir ela própria essas mudanças.

18)

Será necessário limitar no tempo o envolvimento continuado de uma mesma firma de auditoria? Em caso afirmativo, qual deve ser a duração máxima dos trabalhos de auditoria realizados por uma mesma firma?

Em resposta a esta pergunta, o CESE preconiza antes de mais uma condição: qualquer alteração proposta à situação actual deve depender de uma avaliação de impacto rigorosa.

A rotação das equipas e chefes de auditoria e os ciclos de vida normais dos presidentes, administradores executivos e administradores financeiros significam que, a nível individual, há uma sequência mais do que adequada de renovação de relações. A questão é entre empresas: a necessidade do RLC de manter os seus clientes, e a vontade do cliente de manter um auditor com quem está à vontade. Estas relações de longo prazo são uma potencial ameaça à independência e ao cepticismo profissional.

O CESE não concorda com a limitação de limitar a colaboração com uma firma de auditoria através da obrigatoriedade de rotação, mas recomenda que as grandes empresas sejam obrigadas a uma nova selecção para o seu contrato de auditoria cada seis a oito anos. O convite à apresentação de propostas deve ser enviado, no mínimo, a uma firma que não faça parte das 4 grandes. Esse concurso não levará necessariamente à substituição do RLC, pelo que o processo deve ser transparente. O comité de auditoria deve explicar as bases do seu concurso e da sua decisão. Deve também organizar uma reunião com os seus principais accionistas neste contexto.

19)

As firmas de auditoria devem ser proibidas de prestar outros serviços distintos da auditoria? Caso tal proibição seja aplicada, deve sê-lo para todas as firmas e clientes ou deverá limitar-se a determinados tipos de instituições, como as instituições financeiras de importância sistémica?

Não deve haver restrições à prestação pelas firmas de revisão legal de contas de outros serviços distintos da auditoria a empresas que não sejam suas clientes de serviços de auditoria, mas esses serviços só devem ser prestados aos clientes dos serviços de auditoria com a aprovação expressa do comité de auditoria ou de supervisão. A fim de reforçar a independência do RLC de grandes empresas, este não deve prestar aconselhamento em matéria de fiscalidade ou tomada de riscos ao cliente, nem deve ser o auditor interno. A prestação de serviços de aconselhamento fiscal deve ser anulada sempre que possa estar envolvido um conflito importante de interesses. De um modo geral, os serviços distintos da auditoria envolvem ou consultoria ou contabilidade. A primeira oferece menos oportunidades do que a segunda de gerar conflito de interesses com a revisão legal de contas. Os comités de auditoria devem ser responsáveis por aprovar todos os serviços distintos da auditoria prestados pelo RLC e por evitar os conflitos de interesses. Devem igualmente monitorizar o valor total desses serviços e publicá-lo no relatório anual.

No caso das PME, pode contemplar-se um regime mais flexível. Há PME de todos os tipos e dimensões, e em muitos casos faz sentido que a firma de RLC preste igualmente assistência em matéria fiscal e de aconselhamento quanto aos riscos.

20)

Será necessário regulamentar o nível máximo das comissões que uma firma de auditoria pode receber de um único cliente?

Só é possível responder a esta pergunta no contexto das receitas totais de cada firma de auditoria a nível nacional. O actual limite máximo de 15 % de comissões de um mesmo cliente para cada firma nacional, previsto no código deontológico do IFAC, é sensato na medida em que reconhece que as comissões pela auditoria dependem da dimensão e da complexidade da firma auditada. Os clientes fazem tudo para reduzir essas comissões ao mínimo. Os honorários para serviços distintos da auditoria devem ser comunicados separadamente.

21)

Será necessário introduzir novas regras sobre a transparência das demonstrações financeiras das firmas de auditoria?

Sim, mas estas regras devem reconhecer que as «4 grandes» incluem empresas nacionais separadas, e não são uma só entidade. As firmas de auditoria publicam as suas contas, tal como as empresas que elas auditam.

22)

Que outras medidas poderiam ser previstas em matéria de governo das firmas de auditoria para reforçar a independência dos auditores?

Em certas jurisdições os auditores apresentam anualmente uma declaração confirmando a sua independência. Num Estado-Membro, cumprem um código de governo das firmas de auditoria. Sempre que surja um conflito de interesses, têm de declinar um dos compromissos. Além disso, as firmas de auditoria têm de empregar administradores e assessores independentes.

23)

Devem ser exploradas estruturas alternativas que permitam às firmas de auditoria obter capitais junto de fontes externas?

A sociedade de responsabilidade limitada é uma estrutura atraente para as firmas de auditoria. O termo de comparação é a estrutura do tipo sociedade anónima das agências de notação de risco, que influenciou seguramente as decisões de notação desastrosas que levaram à crise financeira. O modelo é suficientemente robusto, se não tiver de enfrentar a ameaça da responsabilização ilimitada perante os tribunais dos Estados-Membros. No entanto, se houver outras formas de constituição de sociedade que contribuem para ampliar o mercado, convém encorajá-las. A limitação da responsabilidade pode ter o benefício duplo de encorajar a entrada de capital novo e de incentivar as firmas de auditoria de dimensão média a apresentar propostas agressivas para mandatos nas empresas de grande dimensão.

24)

Concorda com as sugestões relativas aos auditores de grupos? Tem outras ideias sobre a matéria?

Os auditores de grupos devem dispor da autoridade e do acesso necessários para assumirem plenamente as suas responsabilidades perante os accionistas do grupo.

3.4   Supervisão

25)

Que medidas devem ser previstas no sentido de melhorar a integração e a cooperação em matéria de supervisão das firmas de auditoria a nível da UE?

Questões como normas, passaportes e redes internacionais de firmas de auditoria têm uma dimensão internacional. Não obstante, as firmas de RLC operam através de filiais nacionais sob supervisão dos Estados-Membros. O CESE seria favorável a um colégio de supervisores nacionais, associado ao novo quadro da EU para a supervisão financeira.

26)

De que modo se poderá reforçar a consulta e a comunicação entre os auditores de grandes empresas cotadas e as entidades reguladoras?

Há já alguns requisitos legais, mas há indícios de que nos anos anteriores à crise, o diálogo entre RLC e supervisor se tinha deteriorado em alguns Estados-Membros. O CESE recomenda que seja a nova Autoridade Bancária Europeia a definir os requisitos específicos no domínio bancário. As entidades reguladoras devem também poder pedir responsabilidades ao presidente e ao administrador responsável pela comunicação, prevendo sanções caso a empresa sonegue informação essencial para a auditoria.

3.5   Concentração e estrutura do mercado

27)

Poderá a actual configuração do mercado de auditoria representar um risco sistémico?

Consideramos que há um risco verdadeiro de perturbação do mercado. A falência de uma qualquer firma de RLC não representa um risco sistémico imediato para o mercado. No entanto, do ponto de vista da independência e do mercado, o predomínio de apenas três firmas é totalmente inaceitável. A recente crise financeira e económica salientou o facto de, na gestão dos riscos, ser necessário prever todas as eventualidades.

28)

Considera que tornar obrigatória a formação de um consórcio de firmas de auditoria, com a inclusão de pelo menos uma firma de menor dimensão, sem importância sistémica, poderá funcionar como catalisador para dinamizar o mercado de auditoria e permitir que as pequenas e médias empresas participem de forma mais substancial no segmento das grandes auditorias?

A obrigação de as empresas serem auditadas por um consórcio de pelo menos duas firmas existe nos regimes jurídicos da França. A Dinamarca chegou a ter disposições semelhantes, que foram revogadas por serem consideradas desnecessárias. Em França, este dispositivo aplica-se desde 1966 às sociedades cotadas em bolsa, tendo sido alargado às sociedades sujeitas à publicação de contas consolidadas em 1984, uma altura em que as firmas de auditoria anglo-americanas estavam a aumentar rapidamente a sua parcela de mercado. Até certo ponto, esta política teve êxito. Segundo um estudo de 2006 (4) de 468 empresas francesas, com base em dados de 2003, 54 foram auditadas por duas das «4 grandes», 241 (51,5 %) por uma das «4 grandes» e por uma firma francesa, enquanto as restantes 173 empresas foram auditadas por diferentes combinações de pequenas e grandes firmas francesas.

O mercado da auditoria em França não é apenas o reflexo da intervenção legislativa. Os proprietários das empresas francesas são muito mais concentrados do que nos países anglo-saxónicos, o que afecta os requisitos de auditoria. Com base na mesma amostra de empresas, o principal investidor possui 25 % ou mais de 73 % das empresas francesas. Os principais grupos proprietários são outras empresas (24 %), membros da família (25 %) e o público em geral (21 %), ao passo que os investidores internacionais detêm apenas 8,5 %.

O estudo concluiu que o recurso às «4 grandes» aumenta quando a posse das empresas está menos concentrada num único grande proprietário e há mais investidores internacionais e públicos, ao passo que o recurso às «4 grandes» é menos provável se houver uma percentagem elevada de firmas na posse de algumas famílias. Além disso, há mais probabilidades de que seja utilizado um auditor de entre as «4 grandes» se a propriedade estiver nas mãos de instituições como bancos ou fundos de pensões. É importante assinalar que algumas destas características do tipo de propriedade também andam associadas ao recurso a duas das «4 grandes» em vez de apenas uma.

Dada esta relação entre a auditoria e as formas de propriedade, os resultados demonstram que não é absolutamente certo que o regime jurídico francês seja o único determinante da estrutura do mercado da auditoria em França. Relativamente a este ponto, note-se que a legislação francesa não exige que um «pequeno» escritório se associe obrigatoriamente a um «grande» no âmbito de uma auditoria conjunta, ao contrário do que a Comissão propõe. Como reconhece a Comissão, as respostas à consulta no âmbito do Livro Verde sobre esta matéria não foram unívocas, designadamente quanto a saber se uma auditoria conjunta permite melhores resultados, embora aumente a burocracia e os custos.

Respondendo à pergunta, uma auditoria conjunta aumentaria o envolvimento de firmas mais pequenas no mercado das grandes empresas. Se isto ajudaria a reduzir a concentração das firmas, e quanto tempo isso levaria, o CESE insta a Comissão a realizar uma avaliação de impacto aprofundada antes de tomar qualquer decisão sobre este aspecto. O CESE entende que as normas de concorrência podem ser uma forma complementar de combater o oligopólio.

29)

Do ponto de vista da melhoria da estrutura dos mercados de auditoria, concorda com a obrigatoriedade de rotação e de selecção de novos auditores após um determinado período? Qual deverá ser esse período?

O CESE não concorda com a obrigatoriedade de rotação. No que diz respeito à obrigatoriedade de selecção, ver resposta à pergunta 18.

30)

Como deve ser tratada a questão da polarização em torno das «4 grandes»?

O Comité rejeita qualquer polarização indevida em torno das «4 grandes», nomeadamente sob a forma de acordos entre bancos. Deve ser proibida a obrigatoriedade de confiar certas missões apenas às 4 grandes. A Comissão pode ponderar um sistema de certificação de que as firmas de auditoria de dimensão intermédia são tão competentes como as 4 grandes.

31)

Concorda que os planos de recurso, nomeadamente os chamados «testamentos em vida», poderão ser fundamentais para enfrentar os riscos sistémicos e os riscos de falência de uma firma de auditoria?

Deve haver planos de recurso, tanto das firmas de auditoria como dos reguladores nacionais. As firmas de auditoria são redes internacionais. A melhor estratégia seria procurar conter qualquer erro cometido ao nível dos Estados-Membros sem prejudicar a integridade do resto da rede. Os testamentos em vida podem ser a solução para qualquer estratégia de controlo. Um alerta rápido para potenciais problemas facilitaria a execução dos planos de recurso.

32)

As razões que levaram à consolidação das grandes firmas de auditoria ao longo das duas últimas décadas (ou seja, oferta global, sinergias) continuam a ser válidas? Em que circunstâncias se poderá prever uma inversão dessa tendência?

Na sequência da resposta à pergunta 18, o CESE entende que qualquer decisão nesta matéria deve ser precedida de uma avaliação de impacto aprofundada. À medida que a presença das futuras superpotências asiáticas for crescendo no mercado mundial, é provável que as suas firmas de auditoria acompanhem as suas clientes. Qualquer medida estatal para alterar a configuração do mercado da auditoria deve ter um calendário mínimo de 20 anos. Além disso, convém ter devidamente em conta o impacto potencial e as consequências imprevistas de qualquer lei.

Seria difícil prever uma inversão, mas o mais importante é reforçar as regras da concorrência no mercado da auditoria. O CESE recomenda que sejam consultadas as autoridades responsáveis pela concorrência nos Estados-Membros, a começar pela Alemanha, Países Baixos e Reino Unido. As autoridades em matéria de concorrência também deveriam examinar cuidadosamente qualquer operação proposta pelas 4 grandes firmas.

3.6   Criação de um mercado europeu

33)

Na sua opinião, qual é a melhor maneira de reforçar a mobilidade transfronteiriça dos auditores profissionais?

A harmonização da regulamentação e da legislação em vigor seria um bom ponto de partida. Também seria útil a introdução de normas ISA. A diversidade de fiscalidade, legislação e aspectos linguísticos nos 27 Estados-Membros é sem dúvida um obstáculo à plena mobilidade transfronteiriça.

34)

Concorda com a «harmonização máxima», combinada com um passaporte único europeu para os auditores e firmas de auditoria? Considera que o mesmo se deve aplicar às firmas de menor dimensão?

Sim, mas importa não subestimar as dificuldades atinentes. Seria aceitável ter um passaporte europeu para os auditores no domínio dos relatos financeiros oficiais no contexto das IFRS. A decisão sobre que auditor ou firma de RLC poderia receber um passaporte desses deve, por conseguinte, basear-se na possibilidade de a firma de auditoria poder ou ir efectuar auditorias de demonstrações financeiras no contexto das IFRS.

3.7   Simplificação: pequenas e médias empresas e pequenas e médias sociedades de auditoria

35)

Seria favorável a um nível inferior de serviços de auditoria, as chamadas «auditorias limitadas» ou «análise legal das contas», para as demonstrações financeiras das PME, em vez de uma verdadeira revisão legal de contas? Devem esses serviços ser condicionais, consoante as contas tenham ou não sido elaboradas por um contabilista (interno ou externo) adequadamente qualificado?

Há PME de todas as formas e tamanhos. Se houver investimentos externos e/ou facilidades bancárias importantes e/ou clientes e fornecedores importantes preocupados com a integridade das suas cadeias de valor, é difícil pensar em muitos atalhos. Os serviços de um contabilista certificado poderiam convir às microempresas auto-financiadas.

36)

Deverá existir um «porto seguro» aplicável às PME no que respeita a uma eventual proibição futura da prestação de serviços distintos da auditoria?

Sim, mas nada justifica essa proibição.

37)

Deverão as «auditorias limitadas» ou as «análises legais» ser acompanhadas de regras menos onerosas de controlo interno da qualidade e de fiscalização pelos supervisores? Pode sugerir exemplos de como isso poderia ser feito na prática?

Ver pergunta 35. De qualquer forma, as empresas de pequena dimensão já têm auditorias simples.

3.8   Cooperação internacional

38)

Que medidas poderiam, em seu entender, aumentar a qualidade da supervisão dos grandes operadores do sector da auditoria através da cooperação internacional?

O envolvimento com o G20 e o CEF, mas, para começar, a medida mais importante seria cooperação ao nível do G8, com especial ênfase em ligações estreitas com as entidades reguladoras dos EUA.

Bruxelas, 16 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  JO C 318, de 23.12.2009, p. 57.

(2)  A gestão dos riscos abrange a identificação, a avaliação e a priorização dos riscos (definidos pela ISSO 31000 como o efeito da incerteza nos objectivos, quer positivo quer negativo), acompanhadas de uma aplicação coordenada e económica dos recursos para minimizar, acompanhar e controlar a probabilidade e/ou o impacto de eventos nefastos ou para maximizar a concretização de oportunidades. As estratégias de gestão dos riscos incluem a transferência do risco para outrem, evitando o risco, a redução do impacto negativo do risco, e a aceitação de todas ou algumas das consequências de um risco. Fonte: Wikipedia.org.

(3)  Relatório da Câmara dos Lordes publicado em 15 de Março de 2011, «Auditors: Market Concentration and their role» [Auditores: A concentração do mercado e o seu papel], volume 1, p. 32, http://www.parliament.uk/hleconomicaffairs.

(4)  Assessing France's Joint Audit Requirement: Are Two Heads Better Than One? [Exame da obrigação de auditoria conjunta em França: Duas cabeças pensam melhor do que uma?], por Jere R. Francis, Universidade de Missouri-Columbia, Christelle Rcihard, Universidade Paris-Dauphine, e Ann Vanstraelen, Universidade de Antuérpia e Universidade de Maastricht.


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/101


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social, ao Comité das Regiões e ao Banco Central Europeu: Um enquadramento da UE para a gestão de crises no sector financeiro»

[COM(2010) 579 final]

2011/C 248/17

Relatora: Lena ROUSSENOVA

Em 20 de Outubro de 2010, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a:

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social, ao Comité das Regiões e ao Banco Central Europeu – Um enquadramento da UE para a gestão de crises no sector financeiro

COM(2010) 579 final.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo que emitiu parecer em 26 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 16 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 132 votos a favor, 13 votos contra e 20 abstenções o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1   O CESE subscreve a preocupação da Comissão de que a concessão de ajuda às instituições financeiras em dificuldades à custa das finanças públicas e da igualdade de condições no mercado interno possa já não ser aceitável no futuro, defendendo, por princípio, o amplo enquadramento da UE agora proposto. A sua aplicação acarreta custos adicionais para as autoridades nacionais e para os bancos, requer competências profissionais e recursos humanos, além de implicar uma reforma dos enquadramentos legislativos e regimes dos Estados-Membros. Tendo em conta os resultados da consulta pública, o CESE espera que a Comissão conduza uma criteriosa avaliação de impacto dos custos, recursos humanos e reformas legislativas necessários. Uma proposta realista deveria ser acompanhada por um calendário para a contratação de recursos humanos, tendo em conta que estes poderão não se encontrar imediatamente disponíveis no mercado.

1.2   O Comité recomenda uma abordagem global e encoraja a Comissão a avaliar o efeito cumulativo que o enquadramento de gestão de crises, as novas exigências regulamentares, os novos impostos sobre o sector financeiro e as taxas bancárias têm na capacidade dos bancos de concederem crédito às famílias e às empresas a taxas de juro razoáveis, sem pôr em causa o crescimento económico e a criação de emprego (1).

1.3   O CESE recomenda que a Comissão preveja medidas adequadas para assegurar a coordenação entre a autoridade escolhida para efeitos de resolução, o banco central e o Ministério das Finanças (caso nenhum destes dois últimos seja escolhido como autoridade responsável pela resolução no Estado-Membro em questão) antes de conduzir uma operação de resolução. Para proteger o sector de possíveis contágios e crises de confiança, essa coordenação seria essencial nos casos de resolução de instituições de grandes dimensões e com importância sistémica, bem como nos casos de resolução simultânea de várias instituições.

1.4   Além do proposto teste de resistência bancária, a realizar pelos supervisores no contexto das medidas preparatórias e preventivas, o CESE recomenda que a Comissão estabeleça, para todos os Estados-Membros, a obrigação de aplicarem os Programas de Avaliação do Sector Financeiro (FSAP) preconizados pelo Banco Mundial e pelo FMI, tal como sugere o Relatório De Larosière (2). A análise e o teste de resistência realizados no contexto dos FSAP permitem estabelecer uma correspondência entre os desenvolvimentos e desequilíbrios macroeconómicos de cada Estado-Membro e a respectiva situação em termos de estabilidade macrofinanceira e de riscos microprudenciais, o que os torna ferramentas analíticas úteis e perfeitamente adaptadas às tarefas dos supervisores.

1.5   O CESE saúda a proposta da Comissão relativa à transferência de activos enquanto medida preventiva, mas adverte que a concessão de ajuda financeira a outros agrupamentos bancários não deve ser imposta pelas autoridades de supervisão, mas sim continuar a ser realizada numa base voluntária, e que a igualdade de tratamento entre todos os Estados-Membros – quer na empresa-mãe quer nas suas subsidiárias – é fundamental para manter a estabilidade financeira. A ajuda financeira a agrupamentos bancários deve apenas ser prestada no quadro de um acordo financeiro celebrado com o grupo e desde que reunidas as seguintes condições:

A principal condição é que a ajuda financeira só deverá ser concedida se o prestatário cumprir e continuar a cumprir, em qualquer momento e qualquer circunstância, os requisitos prudenciais da Directiva 2006/48/CE, ou um outro requisito de capital mais exigente que vigore no país do banco transferente. O CESE recomenda que esta condição seja respeitada por todos os supervisores e mediadores, incluindo a Autoridade Bancária Europeia, em caso de desacordo entre os membros do colégio.

O CESE considera que, a título de salvaguarda para a estabilidade macrofinanceira no país do transferente, o supervisor do transferente deve ter poderes para proibir ou restringir uma transferência de activos no contexto de um acordo de ajuda financeira a um grupo, se tal constituir uma ameaça para a liquidez, a solvência e a estabilidade financeira do banco transferente e do sector financeiro no respectivo país.

1.6   A nomeação de um gestor especial é sinal de que o banco está a atravessar dificuldades, o que poderá afectar a confiança dos depositantes e desencadear uma corrida aos bancos/depósitos. Se forem nomeados gestores especiais para uma série de instituições no mesmo período de tempo, tal poderá causar perturbações graves. Nesse caso, torna-se necessária a adopção de medidas cautelares adicionais para proteger os bancos em causa, e o sector no seu conjunto, contra um possível risco de contágio e de propagação de uma crise de confiança.

1.7   O CESE recomenda à Comissão que avalie o impacto dos instrumentos de recapitalização (bail-in) no sector bancário e nos mercados financeiros, e que proceda a um estudo de viabilidade e a uma análise de custos e benefícios desses diversos instrumentos, tendo em conta as suas implicações transfronteiras, bem como a sua viabilidade comercial e transparência.

1.8   Como consequência da aplicação de uma regulamentação mais restritiva e da introdução de medidas e instrumentos adicionais de gestão de crises, o sistema bancário paralelo poderia continuar a desenvolver-se de forma significativa. A Comissão deverá assegurar que as entidades reguladoras e supervisoras sejam capazes de limitar os riscos de contágio dos bancos que são externos ao sector bancário. As entidades bancárias paralelas também devem estar sujeitas a normas regulamentares mais rigorosas e devem também poder suportar perdas.

2.   Introdução

2.1   Durante a crise financeira, os governos não permitiram o fracasso total dos bancos ou de outras instituições financeiras com importância sistémica. Para tal, foi adoptado um vasto leque de medidas: nalguns casos, os bancos precisaram de injecções de capital que implicaram custos avultados para as finanças públicas (esperando-se que venham a ser recuperados futuramente) e noutros precisaram de apoio à liquidez e/ou de garantias sobre o seu passivo. Em qualquer dos casos, estas medidas causaram uma pressão nos mercados financeiros e uma distorção considerável da igualdade de condições no mercado interno e a nível mundial.

2.2   Em resposta ao consenso já existente de que tal não se deverá repetir, a Comissão adoptou várias comunicações sobre gestão e resolução de crises no sector bancário. Na primeira, adoptada em Outubro de 2009 (3), a Comissão analisou as mudanças necessárias para permitir a gestão e resolução efectivas de uma crise ou a liquidação ordenada de um banco com actividades transfronteiras em situação de falência. Na segunda comunicação, publicada em Maio de 2010 (4), explorou formas de financiamento da resolução de crises que permitam minimizar o risco moral e proteger os fundos públicos (5). A comunicação (2010) 579 final estabelece um enquadramento global da UE para bancos em dificuldades e em processo de falência e define as orientações políticas que a Comissão pretende aplicar. Em Dezembro de 2010, foi lançada uma consulta pública sobre os detalhes técnicos do enquadramento legislativo em questão.

2.3   A Comissão tenciona avançar gradualmente no sentido da instauração de um regime de gestão de crises na UE. Como primeiro passo, pretende adoptar, antes do Verão de 2011, uma proposta legislativa relativa a um regime harmonizado da UE para a prevenção de crises e recuperação e resolução de bancos, que incluirá um conjunto comum de instrumentos de resolução e o reforço da cooperação entre autoridades nacionais quando tratam das falências transfronteiras dos bancos. Enquanto segundo passo, a Comissão irá examinar a necessidade de uma maior harmonização dos regimes de insolvência no sector bancário. Por fim, um terceiro passo deveria incluir a criação de um regime de resolução integrado, possivelmente envolvendo uma única autoridade europeia de resolução, até 2014.

3.   Observações

3.1   Âmbito e objectivos

3.1.1   A comunicação da Comissão propõe um enquadramento de gestão de crises aplicável a «todas as instituições de crédito e a algumas sociedades de investimento, independentemente de operarem além-fronteiras ou num quadro doméstico», «independentemente do seu tipo e da sua dimensão e, em especial, quando assuma(m) importância sistémica». Numa nota de pé de página, a Comissão explica que o seu objectivo político é assegurar «que sejam abrangidas as instituições de crédito cuja entrada em incumprimento possa causar instabilidade sistémica, estando a ser consideradas diferentes opções quanto à definição dessa categoria». Com efeito, muitas partes da comunicação referem-se não apenas a instituições de crédito, mas também a sociedades de investimento sem que essa categoria tenha sido claramente definida. O CESE espera que a Comissão defina claramente as categorias de sociedades de investimento e fundos de investimento com ramificações sistémicas potenciais, tendo em conta os resultados da consulta pública iniciada em Dezembro de 2010. O Comité encoraja a Comissão a avaliar igualmente se os instrumentos e poderes de resolução de bancos sugeridos na Comunicação COM(2010) 579 final serão suficientes para resolver adequadamente todos os problemas específicos relacionados com a falência de uma sociedade de investimento ou de um fundo de investimento.

3.1.2   O enquadramento previsto para a prevenção, gestão e resolução de crises assenta em sete princípios e objectivos, que deverão garantir que os bancos em dificuldades abandonem o mercado sem comprometer a estabilidade financeira. O CESE apoia a maioria destes princípios e objectivos à excepção dos enunciados em quarto e último lugar, os quais merecem algumas observações e explicações:

O CESE partilha da opinião da Comissão de que é importante reduzir o risco moral, garantindo que os accionistas e os credores suportem uma parte justa e adequada das perdas em caso de resolução do banco, mas apenas se forem alvo de um tratamento que reflicta a ordem de prioridade habitual e seja semelhante àquele que receberiam em caso de liquidação do banco. Neste processo, os credores são normalmente alvo de um tratamento diferente do que é reservado aos accionistas. A proposta de imputação das perdas tanto aos accionistas como aos credores poderá suscitar questões de natureza jurídica e carece de explicações adicionais quanto à repartição proporcional dos prejuízos e quanto aos critérios para incluir os credores entre os contribuintes: quando e em que medida? A imputação das perdas aos accionistas é certamente um princípio correcto, mas surgem alguns receios quando se espera que os credores suportem igualmente os prejuízos, sem esclarecer melhor este conceito. Quando e em que medida um credor específico deve ser chamado a suportar as perdas? Convirá estabelecer uma distinção entre credores «culpados» ou «imprevidentes» e os demais? Além disso, em que base, e em que circunstâncias, seriam as perdas cobertas por todo o sector bancário? E porque não pelo sector «financeiro»?

Em relação ao último subponto: concordamos com a necessidade de evitar desastres maiores, mas afirmar que um dos objectivos do enquadramento sugerido é «limitar as distorções da concorrência» é apenas falar por falar desse princípio, uma vez que o facto de uma instituição fragilizada ou, pior, praticamente falida precisar de uma ajuda que comporta custos para terceiros constitui, só por si, uma distorção da concorrência.

3.1.3   Como consequência da aplicação de uma regulamentação mais restritiva e da introdução de medidas e instrumentos adicionais de gestão de crises, o sistema bancário paralelo poderia continuar a desenvolver-se. O CESE recomenda que as entidades reguladoras e de supervisão procurem limitar os riscos de contágio dos bancos que são externos ao sector bancário, e providenciem para que as entidades bancárias paralelas suportem os prejuízos e estejam sujeitas a normas regulamentares adequadas.

3.2   Elementos principais do enquadramento

3.2.1   Em termos conceptuais, o enquadramento delineado pela Comissão é correcto e o CESE aprova os três tipos de medidas propostas:

i.

medidas preparatórias e preventivas;

ii.

intervenção precoce da supervisão; e

iii.

resolução.

A aplicação prática deste enquadramento não será nada simples e o CESE saúda a intenção de assegurar uma transição gradual e suave dos mecanismos nacionais actualmente vigentes para o enquadramento proposto. As numerosas iniciativas propostas por algumas autoridades nacionais, bem como as diferentes legislações nacionais em matéria de direitos de propriedade, insolvência, responsabilidades administrativas e penais dos administradores criam inúmeros obstáculos a uma transição rápida para o enquadramento delineado. O Comité espera que as «diversas opções» não sejam utilizadas indevidamente para acudir a emergências políticas, económicas e sociais, mas sejam bem aproveitadas para garantir flexibilidade na adaptação das regras nacionais à legislação europeia, e promover uma coordenação e cooperação eficazes na gestão e resolução de crises transfronteiras para todos os tipos de instituições de crédito, independentemente da sua dimensão e da sua interconectividade.

3.2.2   Autoridades responsáveis pela gestão de crises

A comunicação da Comissão indica explicitamente que os poderes para uma intervenção precoce continuarão a ser exercidos pela supervisão prudencial ao abrigo da Directiva dos Requisitos de Capital (DRC), enquanto no caso dos poderes de resolução, cada Estado-Membro deverá identificar uma autoridade de resolução para os exercer. O CESE aprova a recomendação da Comissão de que a autoridade de resolução deve ser mais administrativa do que judicial, mas está consciente dos obstáculos e dificuldades que irão acompanhar a sua aplicação prática. O Comité também espera que os fundos nacionais de resolução de bancos ex ante propostos nas Comunicações COM(2010) 254 final e COM(2010) 579 final obtenham a sua quota-parte no exercício dos poderes de resolução se forem constituídos nos termos das recomendações contidas nas comunicações citadas. Mesmo que a escolha das autoridades de resolução seja deixada ao critério dos governos nacionais, estes deverão agir de acordo com regras e princípios comuns especificados por um enquadramento da UE.

3.2.2.1   O CESE entende também que a execução bem-sucedida de uma operação de resolução irá exigir uma boa coordenação entre a autoridade de resolução escolhida, o banco central e o Ministério das Finanças, se nenhuma destas duas últimas entidades pertencer à autoridade de resolução escolhida nos Estados-Membros. Isto é fundamental nos casos de resolução de instituições de grande dimensão e importância sistémica, assim como nos casos de resolução simultânea de várias instituições financeiras.

3.2.3   Medidas preparatórias e preventivas

Todas as medidas e iniciativas propostas neste ponto são correctas em termos conceptuais, sendo, sem dúvida, necessárias para garantir a eficaz aplicação do enquadramento proposto pela Comissão. Contudo, há algumas questões que não podemos ignorar:

Qual será o seu custo e, no final, quem vai suportar esse custo?

Conseguirão as autoridades e as instituições financeiras dotar-se dos recursos profissionais necessários à correcta execução das medidas propostas?

Quanto tempo será preciso para instaurar um sistema europeu inteiramente operacional?

3.2.3.1   Mais concretamente, os supervisores têm de introduzir um controlo mais apertado, avaliar e supervisionar os planos de recuperação e resolução, adoptar medidas preventivas (ponto 3.2 do COM(2010) 579 final), intervir na resolução de uma empresa em cooperação com as autoridades responsáveis por esse processo, etc. Na prática, os supervisores tornam-se supergestores das instituições.

Além das obrigações normais de apresentação de relatórios, as instituições financeiras deverão preparar e apresentar às autoridades planos de recuperação e resolução, os quais deverão ser constantemente actualizados. Além disso, os Estados-Membros deverão instituir autoridades de resolução, ou alargar o mandato das autoridades existentes de modo a incluir a resolução de instituições financeiras.

3.2.3.1.1   Todas estas acções são sem dúvida necessárias para a criação de mercados financeiros sólidos e seguros. O problema é determinar quanto irão custar  (6) e assegurar que tanto as autoridades como as instituições financeiras se possam dotar de suficientes recursos humanos altamente qualificados e preparados para desempenhar as novas tarefas. A importância do objectivo final pode justificar os elevados custos do plano, mas a escassez de recursos humanos poderá constituir um enorme obstáculo. A Comissão está ciente desse facto e, no seu documento de consulta, convida os Estados-Membros a estimar os custos (incluindo os custos humanos) em que poderão incorrer na execução das actividades propostas relacionadas com a supervisão reforçada, o planeamento da recuperação e os planos de resolução. Uma proposta realista por parte da Comissão deveria ser acompanhada por uma avaliação de impacto dos custos e um calendário para a contratação de recursos humanos, tendo em conta que estes poderão não se encontrar imediatamente disponíveis no mercado.

3.2.3.2   Além do teste de resistência proposto, a realizar pelos supervisores, o CESE recomenda que a Comissão torne obrigatórios, para todos os Estados-Membros, os Programas de Avaliação do Sector Bancário preconizados pelo FMI/Banco Mundial (FSAP (7), tal como proposto no Relatório De Larosière (8). Actualmente, os FSAP são obrigatórios para 25 países membros do FMI, dos quais 11 são Estados-Membros da União Europeia. A análise e o teste de resistência conduzidos ao abrigo do FSAP associam os desenvolvimentos e desequilíbrios macroeconómicos dos Estados-Membros à respectiva estabilidade macrofinanceira e situação em termos de riscos microprudenciais, o que os torna ferramentas analíticas úteis e perfeitamente adaptadas às necessidades dos supervisores.

3.2.3.3   O CESE saúda a proposta da Comissão relativa à possibilidade de transferência dos activos enquanto medida preventiva sempre que as entidades do grupo atravessem uma fase crítica em termos de liquidez. O Comité está convencido de que, para preservar o modelo de empresa subsidiária, a concessão de ajuda financeira a outros agrupamentos não deve ser imposta pelas autoridades de supervisão, mas sim continuar a ser realizada numa base voluntária Para evitar uma propagação dos problemas de liquidez, o Comité recomenda que a Comissão especifique criteriosamente as circunstâncias e as condições em que determinados activos poderão ser transferidos, e sublinha que a igualdade de tratamento em todos os Estados-Membros, quer na empresa-mãe quer nas suas subsidiárias, é essencial para evitar efeitos de contágio e manter a estabilidade financeira.

3.2.3.3.1   A ajuda financeira a agrupamentos bancários deve apenas ser prestada no quadro de um acordo financeiro celebrado com o grupo e desde que se reúnam várias condições de capital e liquidez. A condição-chave é a de que a ajuda financeira só possa ser concedida se a entidade que a presta cumprir e continuar a cumprir, em qualquer momento e qualquer circunstância, os requisitos prudenciais da Directiva 2006/48/CE ou qualquer outro requisito de capital mais exigente que vigore no país do banco transferente. O CESE recomenda que esta condição seja respeitada por todos os supervisores e mediadores, incluindo a Autoridade Bancária Europeia em caso de divergência entre membros do colégio ou na falta de um acordo. Considera igualmente que as ajudas financeiras a agrupamentos só devem ser submetidas à aprovação dos supervisores após realizadas uma avaliação de risco e uma prova de resistência. Além disso, o mercado deve ser informado acerca de toda e qualquer medida de apoio a agrupamentos.

3.2.3.3.2   A título de salvaguarda para a estabilidade macrofinanceira no país do banco transferente, o supervisor do transferente deverá ter poderes para proibir ou restringir uma transferência de activos ao abrigo de um acordo de ajuda financeira a um grupo se a transferência em causa representar uma ameaça à liquidez, solvência e estabilidade financeira do transferente e do seu país.

3.2.4   Factores que desencadeiam medidas de intervenção precoce e de resolução

3.2.4.1   Todo este capítulo parece estar correcto e ser aceitável em termos gerais. Os supervisores são encarregues da difícil e delicada tarefa de detectar não apenas as circunstâncias em que não são satisfeitas as exigências da Directiva sobre Requisitos de Capital, mas também os sinais de um possível fracasso no cumprimento de tais requisitos. Tal cria a necessidade de ferramentas sofisticadas e de competências profissionais e obriga a uma atenção redobrada sobre o mercado.

3.2.4.2   As tarefas que dizem respeito às decisões de intervenção, bem como as acções descritas no ponto 3.4, exigem um elevado grau de apreciação subjectiva que, embora bem fundamentada e justificada profissionalmente, poderá ser posta em causa, em tribunal ou por outras formas, por terceiros ou mesmo pela própria instituição. Para as autoridades de supervisão, tal implica o reconhecimento de responsabilidades, incluindo perante terceiros, a que deverão conseguir fazer face. Talvez dois factores desencadeantes claramente definidos possam ajudar os supervisores a tomar decisões quanto a uma intervenção precoce, sem terem de se basear tanto numa apreciação subjectiva e estar sujeitos a uma incerteza jurídica. Quanto aos factores que poderão desencadear a resolução de um banco, o Comité saúda as ideias avançadas pela Comissão e reconhece a necessidade de conjugar e equilibrar adequadamente os factores desencadeantes, quer quantitativos quer qualitativos. O CESE recomenda também à Comissão que preste especial atenção aos factores desencadeantes dos quais se espera que possam determinar o momento exacto em que devem intervir os instrumentos de recapitalização (bail-in).

3.2.5   Intervenção precoce

As medidas previstas pela Comissão parecem ser correctas e aceitáveis, mas a nomeação de um gestor especial deve ser objecto de uma atenção particular. Estudos jurídicos têm mostrado que o conceito de «intervenção precoce» tem significados diferentes nos diversos Estados-Membros e que os poderes das autoridades de supervisão para nomear um gestor especial podem também diferir de país para país. Nalguns Estados-Membros, o direito interno poderá permitir a nomeação de gestores especiais e implicar apenas ligeiras alterações. Em vários Estados-Membros, existe a base jurídica para nomear gestores especiais, graças a disposições que desencadeiam medidas de intervenção precoce quando um banco começa a não conseguir cumprir os requisitos de capital. Noutros Estados-Membros, o direito das sociedades nacional poderá proibir a nomeação de um gestor por uma entidade que não o conselho de administração ou a assembleia geral da empresa e apenas uma nova lei pode alterar ou modificar a legislação em vigor.

3.2.5.1   Quanto às responsabilidades, a Comissão refere que a nomeação de um gestor especial não implicaria uma garantia estatal, nem exporia os supervisores a quaisquer responsabilidades. Tal é dificilmente aceitável numa perspectiva puramente jurídica: um princípio geral é que quem quer que tome uma decisão ou empreenda uma acção é responsável pelas respectivas consequências. Qualquer excepção a este princípio que não possua um fundamento jurídico pode ser contestada em tribunal.

3.2.5.2   O CESE recomenda que a nomeação de um gestor especial seja possível, com base num factor desencadeante claramente definido, quando o supervisor, no exercício dos poderes que lhe são conferidos nos termos do artigo 136.o da Directiva sobre Requisitos de Capital, está convencido de que a gerência da instituição de crédito não deseja ou não é capaz de colocar em prática as medidas exigidas. O Comité está convencido de que, para ser juridicamente vinculativa, uma decisão de nomear um gestor especial, no contexto do tratamento de um grupo, deverá ser tomada pelo supervisor que trata das questões da consolidação, mas em concertação e estreita coordenação com os supervisores do país receptor.

3.2.5.3   A nomeação de um gestor especial é sinal de que o banco está a atravessar dificuldades, o que poderá afectar a confiança dos depositantes e desencadear uma corrida aos bancos/depósitos. O CESE receia que, se forem nomeados gestores especiais para uma série de instituições no mesmo período de tempo, tal poderá causar perturbações graves e exigir a adopção de medidas cautelares adicionais para proteger os bancos em causa e o sector no seu conjunto contra um possível efeito de contágio e o desenvolvimento de uma crise de confiança.

3.2.6   Resolução

3.2.6.1   Todas as acções previstas neste capítulo estão bem concebidas, mas a própria Comissão reconhece que uma reforma da legislação em matéria de insolvência bancária poderá ser necessária e que conviria prever uma investigação (pontos 8-9 da comunicação). De facto, todas as acções propostas poderão ser consideradas um procedimento de semifalência, paralelo mas distinto dos procedimentos normais. Em vez de uma reforma, talvez seja necessário adoptar nova legislação na maioria dos Estados-Membros.

3.2.6.2   A grande diferença entre um processo de resolução e um processo de falência é que, após a resolução, a instituição ou parte dela permanece activa, o que justifica a orientação e o envolvimento por parte das autoridades de supervisão e de resolução em todo o processo. Porém, estas autoridades não são investidas com poderes judiciais, o que complica a atribuição de poderes e responsabilidades, incluindo perante terceiros. A Comissão parece estar bem consciente desse problema: ao lidar com salvaguardas para contrapartes e acordos de mercado, é invocada uma revisão judicial que garanta «às partes afectadas direitos adequados de recurso contra a acção das autoridades e de reparação financeira».

3.2.6.3   Neste caso, as autoridades poderiam deparar-se com uma situação delicada e arriscada: uma parte «lesada» que deseje contestar uma decisão das autoridades poderia exigir a interposição de recurso judicial e o tribunal poderia decidir bloquear todo o processo. Ao abrigo da legislação em vigor, esse risco existe e é mais do que provável que se concretize, pelo que deveriam ser empreendidos todos os esforços para evitar que os procedimentos de resolução possam ser retardados ou mesmo bloqueados. Tais procedimentos deverão ser efectuados rápida e atempadamente, pois qualquer atraso ou bloqueio poderá comprometer as iniciativas das autoridades e provocar reacções negativas do mercado. Uma alteração das legislações e dos procedimentos judiciais na maioria dos Estados-Membros é sem dúvida necessária, mas visto que os enquadramentos e os procedimentos judiciais em caso de insolvência variam muito, nalguns Estados-Membros as alterações necessárias serão substanciais.

3.2.7   Conversão da dívida

O CESE saúda o esforço da Comissão de analisar os desafios que representa a resolução de instituições financeiras grandes e complexas (IFGC) e os problemas específicos relacionados com o instrumento de conversão da dívida. O Comité incentiva a Comissão a desenvolver um enquadramento, no qual esse instrumento contribua efectivamente para a resolução de todas as instituições no âmbito do regime, incluindo as IFGC, e realça a importância de se dispor de um enquadramento internacional comum. Espera, portanto, que a Comissão tenha em consideração o acordo a que chegou o Comité de Basileia de que as instituições financeiras com importância sistémica devem possuir uma capacidade de absorção de perdas superior aos limiares mínimos. O Comité realça que os instrumentos de recapitalização (bail-in) deveriam ser reconhecidos como um meio para aumentar a capacidade de absorção de perdas das instituições financeiras, incluindo as sistemicamente importantes, e acolhe favoravelmente a sua aplicação como alternativa à cobertura da dívida (bail-out) com dinheiro público. Contudo, o CESE manifesta preocupações quanto à concepção e aplicação dos instrumentos de recapitalização (bail-in) e encoraja a Comissão a proceder a uma análise muito cuidada dos mesmos.

3.2.7.1   O CESE considera que, quando da concepção e do exercício da faculdade de reduzir o valor da dívida, a habitual ordem de prioridade estabelecida pela legislação em matéria de insolvência deve ser respeitada ao máximo. Qualquer variação, em circunstâncias excepcionais, deve ser estabelecida ex ante e necessita de anúncio prévio.

3.2.7.2   A Comissão deve assegurar a credibilidade do sistema e evitar efeitos indirectos nos casos em que os principais investidores na recapitalização (bail-in) de um banco sejam outros bancos com empresas interconectadas. A eficácia dos instrumentos de recapitalização (bail-in) em períodos de crises sistémicas e os efeitos da sua activação simultânea por muitas instituições financeiras devem ser cuidadosamente analisados, sendo necessário propor medidas adicionais para evitar eventuais problemas graves.

3.2.7.3   A Comissão deverá analisar, com acuidade, o comportamento potencial procíclico e a volatilidade dos instrumentos de recapitalização (bail-in) em períodos de crise, sem descurar a questão de saber quando e até que ponto, face a estas circunstâncias, eles são dignos de confiança.

3.2.7.4   O CESE espera que a Comissão proceda a uma avaliação do impacto dos diferentes instrumentos de recapitalização (bail-in) na resiliência global do sector bancário e dos mercados financeiros.

3.3   Coordenação da gestão de crises transfronteiras

3.3.1   Resolução coordenada de grupos bancários da UE

3.3.1.1   O CESE congratula-se com o facto de a Comissão se preocupar em assegurar uma coordenação transfronteiras adequada no contexto da gestão de crises e insiste em que quaisquer disposições nesse sentido deverão garantir a igualdade de tratamento dos credores e dos accionistas nos Estados-Membros de origem e nos estados receptores, proteger contra efeitos de contágio num período de crise e manter a estabilidade financeira em todos os Estados-Membros.

3.3.1.2   De modo inteiramente correcto, no ponto 4, a Comissão afirma que, no caso de falência de um banco, é necessária uma acção coordenada e que «as medidas mencionadas no ponto 2 deverão garantir que todas as autoridades de resolução possam dispor dos mesmos instrumentos e poderes». Porém, semelhante afirmação parece perder peso face a uma outra que se encontra no início do ponto 3: «o enquadramento não deverá ser prescritivo quanto às medidas que deverão ser aplicadas a cada caso específico».

3.3.1.3   Uma acção coordenada pressupõe, por conseguinte, uma vontade comum de adoptar as mesmas medidas, uma condição que, à luz de experiências passadas, está longe de acontecer. É certo que, ao redigir o ponto 3, a Comissão se referia provavelmente apenas aos casos nacionais, enquanto no ponto 4 se refere a crises de carácter transfronteiriço, em que as competências são transferidas para uma Autoridade Europeia de Supervisão (AES). No entanto, a observação não vem a despropósito: se cada autoridade nacional for livre de escolher os seus próprios procedimentos, os que são impostos por uma AES poderão ser diferentes, ou entrar em conflito com os nacionais. Nesse caso, os procedimentos relativos aos credores de sucursais nacionais de um banco estrangeiro poderão ser diferentes dos procedimentos aplicáveis aos credores de um banco nacional. Tal poderá suscitar alguma preocupação quanto à paridade de direitos para os credores e, possivelmente, a situações de conflito de regras no mercado interno. Algumas dessas questões são abordadas em pormenor pelo documento de consulta e esperamos que os resultados da consulta ajudem a esclarecer a maior parte delas.

3.3.1.4   Estamos inteiramente conscientes de que todos os Estados-Membros resistiriam à ideia de regras prescritivas e que a posição oposta pode não ser realista; todavia, deixar demasiada liberdade de escolha às autoridades nacionais daria azo a dificuldades quando surgissem crises internacionais afectando agrupamentos bancários. Provavelmente seria necessária uma coordenação de alguns dos principais aspectos dos procedimentos (eventualmente sob a égide da AES) antes da adopção de regras nacionais.

3.3.1.5   Quanto ao enquadramento da coordenação, a Comissão considera duas reformas: uma baseada nos colégios de resolução e outra baseada nas autoridades de resolução de grupo. Estas últimas parecem ser mais racionais, flexíveis e eficazes, uma vez que o papel de liderança caberia às autoridades de resolução com o envolvimento da Autoridade Bancária Europeia na qualidade de observador. A outra, que consistiria num alargamento dos actuais colégios de supervisão suplementados pelas autoridades de resolução, poderia ter dificuldade em tomar decisões rápidas, devido a preocupações ligadas à supervisão e resolução.

3.3.1.6   Uma das principais preocupações: um regime de resolução de grupo não teria carácter vinculativo. As autoridades nacionais que discordassem desse regime terão a liberdade de adoptar «medidas independentes», mas «terão» de considerar o impacto dessas medidas a nível de outros Estados-Membros, «justificando a sua decisão» perante o colégio de resolução e «discutindo» os seus fundamentos com os outros membros do colégio. Uma vez mais, as experiências do passado justificam de algum modo uma observação negativa: sempre que estão em causa interesses nacionais, existe uma forte probabilidade de cada autoridade nacional tentar protegê-los antes de quaisquer outros. O procedimento proposto é pouco prático, moroso e impraticável nos casos em que as autoridades nacionais tenham de actuar imediatamente. Contar que as autoridades nacionais fiquem à espera e se abstenham de adoptar medidas nacionais até que, a nível do grupo, as autoridades de resolução tomem uma decisão, é irrealista, especialmente nos casos em que as filiais são demasiado grandes para o mercado local.

3.3.1.7   O CESE recomenda à Comissão que simplifique o procedimento segundo o qual os Estados-Membros que não estão de acordo com o plano proposto podem expressar os seus pontos de vista.

3.4   Financiamento da resolução

O CESE já comentou esta matéria no seu parecer sobre os Fundos de resolução de crises nos bancos  (9). O Comité gostaria de voltar a salientar que qualquer projecto de disposição regulamentar neste domínio deveria ser acompanhado por uma análise aprofundada e por uma avaliação de impacto, tendo inteiramente em conta a aplicação de direitos ou impostos bancários nalguns Estados-Membros.

3.4.1   Fundos de resolução e sistemas de garantia de depósitos (SGD)

O CESE já manifestou a sua opinião sobre os fundos de resolução de bancos e os sistemas de garantia de depósitos num parecer recente (10).

3.4.2   Concepção dos fundos de resolução

3.4.2.1   Há alguma inquietação face a uma frase final aparentemente inocente: «[…] devendo os custos que excedem a capacidade do fundo ser posteriormente recuperados junto do sector bancário.» Apelar a toda uma profissão para que cubra as perdas causadas por um dos seus membros não é uma política invulgar, mas para tal é imprescindível definir com o máximo rigor as condições e proceder previamente a uma análise aprofundada das consequências. É preciso dispor de uma base jurídica apropriada. Impor o pagamento de contribuições para um fundo através de um regulamento é um procedimento aceite, mas para que as perdas sejam suportadas directamente por terceiros é necessária uma lei.

3.4.2.2   Quanto à base de contribuição, uma abordagem harmonizada aceitável poderia basear-se no total das dívidas após a sua avaliação qualitativa ou em dívidas excluindo os depósitos garantidos. Mas, também aqui, a dificuldade reside na flexibilidade: cada Estado-Membro poderia decidir de outra forma, «desde que isto não cause distorções do mercado interno». Critérios diferentes conduziriam a sistemas contributivos diferentes e a diferentes níveis de custos para cada indústria nacional: uma distorção é o resultado inevitável da flexibilidade.

3.4.2.3   Muitos Estados-Membros já introduziram impostos e direitos cujos parâmetros (base, taxa e âmbito) variam consideravelmente. Tendo em conta essas diferenças, o Comité gostaria de salientar a importância de garantir uma coordenação adequada a curto prazo através da introdução de soluções práticas, incluindo acordos bilaterais nos casos em que tal seja adequado. Além disso, O CESE gostaria de realçar uma vez mais o significado das flexibilidades incorporadas nos sistemas nacionais de tributação a curto prazo com vista às alterações em curso no plano regulamentar e os desenvolvimentos no sentido de uma solução adequada à escala da UE a médio prazo.

3.4.3   Dimensão dos fundos

O CESE já comentou este tema num parecer recente (11). Uma vez mais, impõe-se a necessidade de efectuar uma avaliação de impacto quantitativa, bem como uma avaliação do impacto de uma subsequente fuga de fundos a partir dos recursos de crédito ao dispor do sector financeiro, em conjunto com os efeitos da Directiva Requisitos de Capital.

3.5   Próximos passos e trabalho futuro

3.5.1   Próximos passos: um enquadramento de coordenação

Não restam dúvidas de que será necessário modificar as leis nacionais em matéria de insolvência de modo a cobrir as novas regras relativas à resolução dos bancos, mas adiantar algo quanto à forma e duração desse processo seria pura especulação. A alteração de uma lei exige o envolvimento de governos e parlamentos: um procedimento habitualmente moroso, sobretudo se estão em causa questões melindrosas. Antes de adoptar uma nova regulamentação, a Comissão deve procurar evitar conflitos com princípios já estabelecidos em alguns Estados-Membros.

3.5.2   Um enquadramento para as situações de insolvência (a médio prazo)

A liquidação administrativa não constitui um procedimento desconhecido, mas na maioria dos Estados-Membros ela é normalmente levada a cabo por um liquidatário nomeado por um tribunal sob a sua supervisão. Confiar a liquidação de bancos e fazê-lo sob a autoridade de entidades bancárias com competências administrativas equivaleria a uma transferência de poderes das autoridades judiciais para as autoridades administrativas: algo que poderia entrar em conflito com as leis nacionais ou mesmo com as constituições.

3.5.3   O enquadramento da UE proposto pela Comissão para a gestão de crises no sector financeiro difere da abordagem de gestão de crises recentemente aplicada nalguns Estados-Membros ao abrigo dos programas apoiados pela UE e pelo FMI (12). Estes prevêem a recapitalização dos bancos com fundos próprios, incluindo os provenientes da UE e do FMI, que podem continuar nos próximos anos, precisamente num período em que o novo enquadramento europeu de gestão de crises e os fundos de resolução de crises em bancos devem ser aplicados no resto da UE. O CESE espera que a Comissão proponha medidas de transição adequadas, dentro de um prazo realista, que permitam a esses Estados-Membros organizar uma transição rápida, suave e completa para o proposto enquadramento de gestão de crises na UE e os fundos de resolução de crises nos bancos, compatível com a necessidade de evitar o enfraquecimento dos sectores bancários.

Bruxelas, 16 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Ver também JO C 107 de 6.4.2011, p. 16, no qual são abordados em pormenor os custos relacionados com o enquadramento de gestão de crises e a resolução de crises em bancos, bem como as suas implicações para o sector financeiro e a economia em geral.

(2)  Grupo de Alto Nível sobre Supervisão Financeira na UE presidido por Jacques De Larosière, Relatório, 25 de Fevereiro de 2009, Bruxelas, p. 64.

(3)  COM(2009) 561.

(4)  COM(2010) 254.

(5)  ver http://ec.europa.eu/internal_market/bank/crisis_management/index_en.htm.

(6)  No que diz respeito ao financiamento dos custos, ver ponto 3.4 do COM(2010) 579 final e o parecer JO C 107 de 6.4.2011, p. 16.

(7)  Ver FMI, Financial Sector Assessment Program, 2011, www.imf.org.

(8)  Grupo de Alto Nível sobre Supervisão Financeira na UE presidido por Jacques de Larosière, Relatório, 25 de Fevereiro de 2009, Bruxelas, p. 64.

(9)  JO C 107 de 6.4.11, p. 16.

(10)  Ver nota de pé de página n.o 9.

(11)  Ver nota de pé de página n.o 9.

(12)  Ver os relatórios do FMI sobre a Grécia (n.o 1168) e sobre a Irlanda (n.o 10366 e n.o 1147).


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/108


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Reforçar o regime de sanções no sector dos serviços financeiros»

[COM(2010) 716 final]

2011/C 248/18

Relator: Bernardo HERNÁNDEZ BATALLER

Em 8 de Dezembro de 2010, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Reforçar o regime de sanções no sector dos serviços financeiros

COM(2010) 716 final.

Incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo emitiu parecer em 26 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 16 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 105 votos a favor, 2 votos contra e 4 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1   O CESE acolhe muito favoravelmente o estabelecimento de um sistema supranacional de sanções que sejam realmente eficazes, dissuasoras e proporcionadas, apoiando a abordagem adoptada pela Comissão na comunicação, para garantir um conjunto mínimo de critérios comuns que os Estados-Membros deverão respeitar ao estabelecer sanções administrativas por infracção às disposições sobre os serviços financeiros.

1.2   O quadro normativo a adoptar pretende facilitar a implementação de princípios jurídicos já aplicados com êxito pela UE, como o princípio do «poluidor-pagador», utilizados neste caso para sancionar proporcionalmente o prejuízo causado e, de forma exemplar, as infracções financeiras ou a política de «clemência» própria dos procedimentos de investigação e repressão das práticas anticoncorrenciais, que se revestem aqui de especial importância devido ao papel excepcional que o pessoal das instituições financeiras pode desempenhar na denúncia de infracções.

1.3   O CESE partilha do ponto de vista da Comissão segundo o qual convém dar ao termo «sanções» um sentido lato que abarque tanto as medidas administrativas de tributação, como as medidas de restabelecimento da legalidade, a apreensão, a desqualificação de dirigentes, as sanções rescisórias (como a retirada de autorizações) e pecuniárias, as multas coercitivas e outras medidas similares.

1.4   O CESE convida a Comissão a analisar os meios possíveis para impedir as actividades financeiras fraudulentas que tenham origem ou destino em paraísos fiscais e financeiros e que impliquem movimentos de capitais que afectam o funcionamento do mercado interno.

1.5   O confisco dos benefícios ilícitos e as indemnizações punitivas devem ser previstos como medidas complementares das sanções a impor, cujas verbas, como já foi reiterado pelo CESE (1), devem reverter para um fundo de auxílio aos recursos colectivos, a fim de facilitar a interposição de acções colectivas de ressarcimento ou de reparação por parte das associações de consumidores. Para o efeito, o CESE (2) recorda à Comissão que se pronunciou em diversas ocasiões sobre a necessidade de adoptar regulamentação supranacional para harmonizar as acções colectivas.

1.6   O CESE convida a Comissão a considerar a necessidade de a UE celebrar acordos internacionais com países terceiros no intuito de consolidar o impacto extraterritorial da legislação em vigor sobre sanções financeiras, assegurando a sua eficácia e o efeito dissuasor em caso de violação das disposições em matéria de serviços financeiros.

2.   Introdução

2.1   A crise financeira suscitou dúvidas quanto à questão de saber se as disposições que regulam os mercados financeiros são sempre devidamente respeitadas e aplicadas em toda a União. Além disso, a inobservância das disposições num Estado-Membro da UE pode afectar de forma significativa a estabilidade e o funcionamento do sistema financeiro de outro Estado-Membro.

2.2   O Conselho ECOFIN convidou a Comissão e os três comités de supervisão (o Comité das Autoridades Europeias de Supervisão Bancária (CAESB), o Comité das Autoridades Europeias de Supervisão dos Seguros e Pensões Complementares de Reforma (CAESSPCR) e o Comité das Autoridades de Regulamentação dos Mercados Europeus de Valores Mobiliários (CARMEVM)) a procederem a uma análise intersectorial para comprovar a situação existente em termos de coerência, equivalência e utilização efectiva dos poderes de sanção nos Estados-Membros.

2.3   A nível internacional, o reforço dos regimes de sanções constitui um dos elementos da reforma do sector financeiro, como se depreende da cimeira dos dirigentes do G-20 realizada em Washington, em 15 de Novembro de 2008. Por outro lado, a lei Dodd-Frank para a protecção do consumidor e a reforma de Wall Street (Julho de 2010) prevê uma reforma integral do sistema financeiro norte-americano.

3.   A comunicação

3.1   A presente comunicação da Comissão baseia-se nos citados estudos e nos debates realizados com os Estados-Membros, apresenta os domínios em que poderão ser introduzidas melhorias e propõe medidas que a UE poderia adoptar para lograr uma maior convergência e eficácia dos regimes de sanções. A existência de regimes de sanções eficazes no sector financeiro é essencial para se dispor de sistemas de supervisão que garantam mercados financeiros sólidos e estáveis, assim como a protecção dos consumidores e dos investidores.

3.2   Para garantir a plena observância da legislação da UE, as sanções devem ser eficazes, proporcionadas e dissuasivas. Considera-se que as sanções são eficazes quando permitem efectivamente fazer respeitar a legislação da UE, proporcionadas quando reflectem adequadamente a gravidade da infracção cometida e não vão para além do que é necessário para alcançar os objectivos pretendidos e dissuasoras quando são suficientemente severas para desencorajar os autores de uma infracção a reincidir e qualquer potencial infractor a cometer tais infracções.

3.3   O quadro jurídico em vigor concede aos Estados-Membros considerável autonomia para adoptar e aplicar sanções nacionais. Não obstante, há que estabelecer um justo equilíbrio entre esta autonomia e a necessidade de aplicar a legislação europeia de forma eficaz e coerente.

3.4   Actualmente, as directivas e regulamentos da UE em vigor no sector financeiro abrangem quatro categorias de disposições em matéria de sanções:

coordenação da faculdade de impor sanções entre vários Estados-Membros;

obrigação de os Estados-Membros preverem a aplicação de medidas e de sanções administrativas adequadas, e de garantirem que estas sejam eficazes, proporcionadas e dissuasivas. Não está estabelecida qualquer diferenciação entre medidas de investigação, de prevenção e de repressão;

outra categoria que se refere às sanções a aplicar no caso de infracções concretas;

uma quarta categoria prevê que, em determinadas circunstâncias, as autoridades publiquem as medidas e as sanções adoptadas.

3.5   A análise dos regimes de sanções revela divergências entre os Estados-Membros que podem ser devidas a vários factores, tais como as diferenças entre os sistemas jurídicos nacionais, as exigências constitucionais, o funcionamento das administrações nacionais e as competências dos tribunais (administrativos e penais).

3.6   A Comissão constatou, designadamente, as seguintes divergências e deficiências entre os regimes de sanções nacionais:

algumas autoridades competentes não dispõem de determinados tipos importantes de poderes de sanção para certas infracções;

o montante das sanções pecuniárias administrativas (multas) varia consideravelmente de um Estado-Membro para outro e é demasiado reduzido em alguns Estados-Membros;

existem divergências quanto à natureza (administrativa ou penal) das sanções previstas na legislação nacional;

o grau de aplicação das sanções é variável em função dos Estados-Membros.

3.7   A Comissão considera que as divergências sobre aspectos essenciais dos regimes de sanções podem redundar num incumprimento das disposições da UE no âmbito dos serviços financeiros, comprometer gravemente a protecção dos consumidores e a integridade do mercado, falsear a concorrência no mercado interno, afectar negativamente a supervisão financeira e, em última análise, minar a confiança no sector financeiro.

3.8   A Comissão considera que uma convergência mais acentuada e um maior rigor dos regimes de sanções são indispensáveis para evitar riscos de disfuncionamento dos mercados financeiros. Para tal, propõe o estabelecimento de um conjunto mínimo de critérios comuns que permitam uma aproximação mínima dos regimes de sanções nacionais, que preveja o seguinte:

tipos apropriados de sanções administrativas para as infracções a disposições fundamentais;

publicação das sanções;

multas administrativas suficientemente elevadas;

sanções aplicáveis às pessoas singulares e às instituições financeiras;

critérios a ter em conta na aplicação das sanções;

introdução eventual de sanções penais para as infracções mais graves;

mecanismos adequados de apoio para uma aplicação eficaz das sanções.

4.   Observações na generalidade

4.1   Posição do CESE

4.1.1   O Comité acolhe muito favoravelmente a comunicação da Comissão que defende, no seu conjunto, a elaboração de um quadro normativo supranacional mais eficaz para proceder contra as infracções das instituições e dos operadores financeiros, no contexto da redefinição das regras internacionais sobre o mercado de capitais.

4.1.2   De facto, a comunicação é fiel ao espírito das posições políticas adoptadas nas cimeiras do G-20, especialmente na Cimeira de Washington (2008), na Cimeira de Londres (2009) e na Cimeira de Seul (2010), bem como das posições da UE concertadas ao mais alto nível institucional (criação das Autoridades de Supervisão Financeira, reforma da Directiva MIF (mercados de instrumentos financeiros), acordo sobre os fundos de cobertura de risco chamados «hedge funds», etc.).

4.2   Princípio de subsidiariedade

4.2.1   Em conformidade com o princípio de subsidiariedade, a comunicação destaca claramente a responsabilidade principal que compete às autoridades nacionais de velar, de forma coordenada e integrada, por uma aplicação coerente do quadro em vigor e do futuro regime de sanções aplicáveis no caso de infracções no sector dos serviços financeiros, circunscrevendo-se, de facto, às sanções que se inscrevem no âmbito de competências das referidas autoridades.

4.2.2   Existem, no entanto, casos de «infracções intra-europeias», cujos autores operam em diversos Estados-Membros da União Europeia e que produzem efeitos em todo o território do mercado único. Neste caso, convém:

determinar claramente quem tem competência para a abertura do procedimento sancionatório, para evitar que os autores de infracções procurem a jurisdição mais favorável («forum shopping»), escolhendo assim as autoridades nacionais que aplicam as sanções mais clementes;

delegar, inclusivamente, funções e responsabilidades noutras autoridades competentes em certas condições;

ocasionalmente e com carácter excepcional, dotar de competência, para estes casos, as autoridades europeias de supervisão, em função da matéria em causa.

4.2.3   A acção supranacional justifica-se pela necessidade de convergência dos regimes nacionais de sanções administrativas ou penais que, actualmente, apresentam sérias deficiências ou lacunas que não possibilitam a sua equiparação ou aplicam critérios totalmente diferentes. Cada Estado-Membro escolherá a via penal ou administrativa, mas respeitando os princípios de equivalência e de efectividade, nos termos estabelecidos pela jurisprudência do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE).

4.2.4   Em conformidade com o respeito pela repartição das responsabilidades entre administrações e jurisdições, o quadro normativo em estudo pretende facilitar a implementação dos princípios jurídicos já aplicados com êxito pela UE, como o princípio do «poluidor-pagador», utilizados neste caso para sancionar proporcionalmente os prejuízos causados e, de forma exemplar, as infracções financeiras ou a política de «clemência» própria dos procedimentos de investigação e repressão das práticas anticoncorrenciais, que se revestem aqui de especial importância devido ao papel excepcional que o pessoal das instituições financeiras pode desempenhar na denúncia de infracções.

4.2.5   É evidente que as sanções e as penas aplicadas aos infractores devem, em todo o caso, ser severas e ter um efeito dissuasivo para prevenir a ocorrência de delitos intoleráveis numa sociedade democrática. Todavia, esta severidade deverá ser compatível com um tratamento favorável – redução substancial ou supressão da sanção ou da pena – das pessoas que cooperem na descoberta ou na determinação das situações consideradas delituosas.

4.2.6   O CESE considera que a revelação ou a denúncia, nos termos previstos na lei Dodd Frank (Dodd Frank Act) norte-americana, pode constituir uma boa acção de saneamento do mercado interno dos serviços financeiros para melhorar o seu funcionamento, mediante o estabelecimento de um sistema de motivação económica acompanhado de medidas de estímulo para as pessoas que denunciem às autoridades de supervisão financeira a violação da legislação reguladora desses serviços financeiros.

4.2.7   Para o efeito, deveriam ser removidos determinados obstáculos legislativos que ainda existem em alguns Estados-Membros e que impedem estas acções com base na salvaguarda de supostos segredos empresariais e outras barreiras atinentes à confidencialidade, que podem prejudicar os autores das denúncias, devendo-se garantir, em todo o caso, a protecção dos trabalhadores através de programas de protecção dos seus interesses.

4.2.8   Neste sentido, a directiva relativa ao branqueamento de capitais actualmente em vigor já prevê que o pessoal de instituições financeiras que denuncie operações suspeitas beneficie de um tratamento de favor deste tipo, bem como de protecção contra eventuais represálias de ordem profissional ou de outra índole.

4.3   Pontos omissos na comunicação

4.3.1   Todavia, examinando a comunicação pode-se constatar que as infracções abordadas pela Comissão se referem, de modo geral, a acções de particulares e de pessoas singulares ou colectivas passíveis de sanções administrativas ou penais. Neste sentido, a Comissão não contempla a actuação dolosa ou omissiva dos poderes públicos, especialmente daqueles que têm competências em matéria de regulamentação e de supervisão dos mercados financeiros, cujo mau funcionamento pode criar graves prejuízos para o mercado interno e os interesses dos consumidores.

4.3.2   É o caso, por exemplo, da necessária eliminação das chamadas «barreiras invisíveis», que foram e continuam a ser obstáculos intransponíveis ao exercício das liberdades económicas fundamentais (como a utilização abusiva do poder discricionário quando se determina a idoneidade dos administradores de uma instituição de crédito (3) ou de seguros, ou a decisão sobre a incompatibilidade dos accionistas que detêm uma parte qualificada do capital de um organismo financeiro (4).

4.3.3   De igual modo, os Estados-Membros deveriam adoptar as disposições internas que não existem actualmente, para assinalar a responsabilidade dos administradores das instituições financeiras que, devido ao seu carácter sistémico, são susceptíveis de causar danos incalculáveis à estabilidade dos mercados financeiros e aos consumidores como resultado de uma gestão imprudente ou dolosa.

4.3.4   Actualmente, em certos Estados-Membros, qualquer empregado de uma instituição financeira, mesmo de importância insignificante para o mercado, pode ser severamente sancionado se cometer delitos de corrupção, de fraude ou de branqueamento de capitais, enquanto que os administradores destas mesmas instituições, responsáveis por prejuízos resultantes de infracções financeiras, podem escapar às sanções penais ou administrativas. Esta situação é, no mínimo, injustificada. Pode-se concluir que existem graves disfuncionamentos ao nível da governação empresarial.

4.4   Reciprocidade

4.4.1   Neste sentido, a comunicação adopta uma perspectiva demasiado «eurocêntrica», focalizando-se em cenários intra-europeus, sem analisar a acção dos organismos financeiros de países terceiros, que também podem influenciar o funcionamento do mercado interno, tendo em conta a abertura dos mercados de capitais e a relativa facilidade com que estas entidades operam em regime de livre estabelecimento, graças a práticas toleradas tais como as empresas conjuntas (joint ventures) ou o leapfrogging.

4.4.2   Além disso, tendo em conta a falta de um regime comum que facilitaria uma política de «reciprocidade» com os países terceiros em matéria de serviços financeiros, é necessário que os poderes públicos nacionais prevejam mecanismos de supervisão e de sanções não menos efectivos e contundentes para os organismos financeiros de países terceiros.

4.4.3   O CESE convida a Comissão a analisar os meios possíveis para prevenir as actividades financeiras fraudulentas que tenham origem ou destino em paraísos fiscais e financeiros e que impliquem movimentos de capitais que afectam o funcionamento do mercado interno.

4.4.4   Nesse sentido, o CESE encara com preocupação o facto de a Comissão não se concentrar mais nos aspectos que dizem respeito às medidas punitivas associadas ao incumprimento da legislação financeira quando este se verifique no território de países terceiros ou seja da responsabilidade directa ou indirecta de pessoas físicas ou jurídicas estabelecidas nos Estados em questão.

4.5   Em relação a certos aspectos de carácter técnico, convém assinalar o seguinte:

4.5.1

O CESE partilha do ponto de vista da Comissão segundo o qual convém dar ao termo «sanções» um sentido lato que abarque tanto as medidas administrativas de tributação, como as medidas de restabelecimento da legalidade, a apreensão, a desqualificação de dirigentes, as sanções rescisórias (como a retirada de autorizações) e pecuniárias, as multas coercitivas e outras medidas similares.

4.5.2

Todos os procedimentos sancionatórios devem basear-se, pelo menos, nos princípios da legalidade, da incriminação, do estabelecimento da culpa, da não retroactividade, da reformatio in peius, da presunção de inocência, da proporcionalidade, da aplicação do princípio non bis in idem, da prescrição, da caducidade do procedimento, da suspensão cautelar e da possibilidade de interpor recurso como forma de ter acesso efectivo à justiça.

4.5.3

Também seria recomendável prever um maior impacto da publicidade e a comunicação das sanções impostas aos infractores para que, além da publicação lógica destas informações nos jornais oficiais internos, as sanções possam, sempre em função da sua gravidade, ser igualmente publicadas no Jornal Oficial da União Europeia ou em meios de comunicação escrita ou de divulgação massiva, como os portais Internet. Os custos da difusão destas informações deveriam ser imputados aos infractores.

4.6   Elementos do instrumento

4.6.1   O CESE considera que uma clarificação do tipo de instrumento legislativo que a Comissão se propõe adoptar oportunamente pode contribuir para facilitar a realização do objectivo de alcançar um regime de sanções baseado nos princípios da eficácia, da proporcionalidade e do poder de dissuasão.

4.6.2   Embora o ideal seja a adopção de um regulamento, não deveria existir qualquer margem discricionária no que diz respeito à sua aplicação e, na fase actual de evolução do Direito da União Europeia, um regulamento pode não ser o instrumento adequado.

4.6.3   O CESE considera que é mais apropriado optar por uma directiva-quadro, embora a Comissão entenda que convém proceder a uma harmonização mínima. Neste caso, as suas disposições deveriam ser suficientemente claras e acompanhadas de instruções precisas e incondicionais para garantir um efeito directo, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça. Esta directiva deveria incluir disposições muito detalhadas para garantir a consecução dos objectivos de interesse geral pretendidos.

4.6.4   Em todo o caso, na hipótese da imposição de sanções económicas, deveria ser sempre tido em conta o princípio de que o autor das infracções não poderá retirar qualquer benefício dos seus actos delituosos e deverão ser estabelecidos métodos comuns para calcular o reembolso dos benefícios obtidos de forma ilícita como medida adicional à sanção pecuniária imposta.

4.6.5   O confisco dos benefícios ilícitos e as indemnizações punitivas devem ser previstos como medidas complementares das sanções a impor, cujas verbas, como já foi reiterado pelo CESE (5), devem reverter para um fundo de auxílio aos recursos colectivos, segundo as prioridades de cada Estado-Membro, a fim de facilitar a interposição deste tipo de acções colectivas de reparação por parte das associações de consumidores e outras organizações com interesse legítimo. Para o efeito, o CESE (6) recorda à Comissão a necessidade de adoptar regulamentação supranacional para harmonizar as acções colectivas, e assim obter um elevado nível de protecção dos seus interesses económicos.

4.6.6   Quando da imposição das sanções, as outras circunstâncias que também deveriam ser consideradas são a situação pessoal dos infractores, a gravidade da infracção, a solidez financeira dos autores da infracção, a sua colaboração com as autoridades, a duração da infracção, o impacto da infracção sobre os direitos e legítimos interesses dos consumidores e utilizadores, bem como sobre outros operadores económicos.

4.7   O Tratado de Lisboa e os consumidores

4.7.1   Finalmente, a comunicação tem devidamente em conta a posição dos consumidores dos serviços financeiros e faz referência, nomeadamente, à criação, em todos os organismos, de procedimentos de acção colectiva de ressarcimento. O CESE já manifestou o seu apoio a estas acções em vários pareceres. A comunicação limita-se, todavia, a uma abordagem passiva da situação dos consumidores baseada na protecção contra as práticas abusivas ou delituosas e na sua repressão.

4.7.2   No contexto da aplicação do Tratado de Lisboa, que consagra o princípio da democracia participativa como um dos pilares fundamentais da vida democrática da União, há que contar com a participação dos consumidores e das suas associações mais representativas.

4.7.3   O futuro regime de sanções que se pretende adoptar deveria estabelecer disposições para garantir o reforço das associações de consumidores neste âmbito. Entre outros mecanismos, deveria ser prevista a criação de canais permanentes de comunicação entre o Parlamento Europeu, a Comissão Europeia, o CESE e as referidas organizações. Também convém garantir o seu financiamento público para assegurar um financiamento mais eficaz ex ante que alerte para situações potencialmente perigosas para a estabilidade dos mercados financeiros e facilite a elaboração de regras adaptadas à rápida evolução dos produtos e práticas dos mercados e tenha em conta o impacto nos clientes das sanções aplicadas aos organismos financeiros.

4.7.4   Combinadas com a abordagem de protecção e de repressão face aos danos causados pelas infracções às regras do sector, estas medidas permitiriam a adopção de uma abordagem preventiva das mesmas que poderia ser muito mais eficaz.

4.7.5   O CESE considera importante a criação de uma Agência Europeia de Protecção dos Consumidores de Serviços Financeiros e reitera (7) a necessidade de analisar a possibilidade de estabelecer, no ordenamento jurídico europeu, uma entidade análoga à que foi instituída nos Estados Unidos pela lei Dodd-Frank (Bureau of Consumer Financial Protection – Agência de Protecção Financeira dos Consumidores).

4.7.6   Por conseguinte, o CESE propõe à Comissão que aproveite o período de preparação da futura proposta para elaborar ou rever estudos sobre boas práticas europeias em matéria de defesa dos consumidores de serviços financeiros, as quais permitirão estabelecer instrumentos jurídicos destinados a assegurar um nível elevado de protecção a todos os utilizadores de serviços financeiros. Este nível elevado de protecção dos consumidores de serviços financeiros representa um mandato previsto na Carta dos Direitos Fundamentais dirigido a todas as instituições da União Europeia.

Bruxelas, 16 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  JO C 162 de 25.6.2008, p. 1-19 e JO C 175 de 28.7.2009, p. 20-25.

(2)  JO C 324 de 30.12.2006, p. 1.

(3)  Artigo 11.o da Directiva 2006/48/CE do PE e do Conselho de 14.6.2006, JO L 177 de 30.6.2006, p. 1.

(4)  Artigo 12.o da Directiva 2007/44/CE do PE e do Conselho, de 5.9.2007, JO L 247 de 21.9.2007, p. 1.

(5)  Ver nota de pé de página n.o 1.

(6)  Ver a nota de pé de página n.o 2.

(7)  JO C 107 de 6.4.2011, p. 21.


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/113


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre o «Livro Verde — Reduzir os trâmites administrativos para os cidadãos: Promover a livre circulação dos documentos públicos e o reconhecimento dos efeitos dos actos de registo civil»

[COM(2010) 747 final]

2011/C 248/19

Relator: Bernardo HERNÁNDEZ BATALLER

Em 14 de Dezembro de 2010, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 304. ° do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre o

«Livro Verde — Reduzir os trâmites administrativos para os cidadãos: Promover a livre circulação dos documentos públicos e o reconhecimento dos efeitos dos actos de registo civil»

COM(2010) 747 final.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos, a Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo que emitiu parecer em 26 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu aprovou por 127 votos a favor, 2 votos contra e 3 abstenções o presente parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1   O CESE acolhe favoravelmente o Livro Verde da Comissão e reconhece a necessidade de facilitar a circulação dos documentos públicos entre os Estados-Membros. Com efeito, se forem removidos os obstáculos existentes, os cidadãos europeus terão a sua vida simplificada e poderão exercer mais cabalmente os seus direitos.

1.2   O CESE apoia as iniciativas da Comissão para favorecer a livre circulação de documentos públicos como complemento da cidadania europeia, reforçando os seus direitos económicos e sociais.

1.3   O CESE considera que, no caso de actos de registo civil, a Comissão deveria:

criar um regime supranacional opcional do certificado europeu de estado civil,

encetar os trabalhos necessários para estabelecer regras uniformes em matéria de conflito de leis e

estabelecer, enquanto estão a ser criadas as premissas anteriores, o reconhecimento mútuo mediante a identificação dos requisitos mínimos a que devem obedecer os actos de estado civil e o consenso sobre a sua presunção de validade generalizada dentro da UE, uma vez constatada a legalidade da sua emissão pela respectiva autoridade competente.

1.4   O CESE apela, neste contexto, às demais instituições e órgãos competentes da UE que concretizem sem demora as propostas da Comissão na matéria, para se poder, dentro do possível, adoptar normas supranacionais durante o actual período legislativo.

1.5   Afigura-se, por conseguinte, plausível defender a implantação generalizada de documentos administrativos com formulários normalizados e multilingues que poderiam inspirar-se nos modelos utilizados pela CIEC (Comissão Internacional do Estado Civil) que, para além de outras vantagens, evitariam a tradução do documento no Estado de destino.

2.   Introdução

2.1   As formalidades administrativas a cumprir pelos documentos públicos para poderem ser utilizados fora do Estado onde foram emitidos podem implicar para o interessado grandes perdas de tempo e elevados custos económicos decorrentes, em síntese, da prova da sua autenticidade ou da apresentação de uma tradução certificada.

2.1.1   Uma das causas dessas dificuldades é a obrigação de os cidadãos apresentarem às autoridades de outro Estado-Membro documentos públicos para fornecer as provas exigidas para poderem exercer um direito ou cumprir uma obrigação. Esses documentos podem ser de natureza muito diversa: documentos administrativos, actos notariais, como os títulos de propriedade, certidões de registo civil, como as certidões de nascimento ou de casamento, contratos diversos e decisões judiciais.

2.1.2   Neste sentido, o método tradicional de autenticação dos documentos públicos que se destinam a ser utilizados no estrangeiro é designado por «legalização» e deve ser, na sua modalidade comum, legalizado pelas autoridades competentes do Estado emissor e seguidamente pela embaixada ou consulado do Estado onde irá ser utilizado. Uma versão simplificada desta formalidade é a «apostila» em que o Estado que emite o documento emite também um certificado de autenticação.

2.1.3   No âmbito do Programa de Estocolmo (1), o Conselho Europeu convida a Comissão a prosseguir os seus esforços no sentido de garantir o pleno exercício do direito de livre circulação, prevendo para tal propostas legislativas relativas

à livre circulação dos documentos, mediante a supressão da legalização dos documentos entre os Estados-Membros e

ao reconhecimento dos efeitos de determinados documentos de registo civil, para que o estatuto jurídico atribuído num Estado-Membro possa ser reconhecido com os mesmos efeitos jurídicos noutro Estado-Membro.

3.   O Livro Verde da Comissão

3.1   A Comissão lança uma consulta sobre questões relacionadas com a livre circulação dos documentos públicos e o reconhecimento dos efeitos dos actos de registo civil.

3.2   Os documentos públicos

3.2.1   A Comissão pretende lançar uma reflexão sobre todos os documentos públicos que necessitam de formalidades administrativas para poderem ser utilizados fora do Estado onde foram emitidos. Essas formalidades abrangem a prova da autenticidade ou a apresentação de uma tradução certificada. A função comum a todos estes documentos é provar factos registados perante uma autoridade pública.

3.2.2   Actualmente, as formalidades administrativas como a legalização e a apostila dos documentos públicos nos Estados-Membros caracterizam-se por um enquadramento jurídico disperso por diversas fontes:

direitos nacionais muito diferentes entre si;

diversas convenções internacionais, multilaterais ou bilaterais, ratificadas por um número variado e limitado de países, que não oferecem as soluções adaptadas à livre circulação dos cidadãos europeus;

um direito da União Europeia fragmentado e que apenas aborda aspectos limitados das questões suscitadas.

3.3   Soluções possíveis para facilitar a livre circulação de documentos públicos entre Estados-Membros

3.3.1

Supressão das formalidades administrativas:

Propõe-se que seja suprimida a legalização e a apostila para todos os documentos públicos, de modo a garantir a sua livre circulação.

3.3.2

Cooperação entre as autoridades nacionais competentes:

3.3.2.1

Em caso de dúvidas importantes sobre a autenticidade de um documento ou quando esse documento não exista noutro Estado-Membro, as autoridades competentes nacionais poderão proceder a um intercâmbio das informações necessárias para se encontrar a solução mais adequada.

3.3.2.2

O portal e-Justiça pode informar os cidadãos sobre a existência de actos de registo civil e sobre as suas implicações jurídicas. Também poderia ser dada aos cidadãos a possibilidade de solicitarem e receberem on-line certidões do registo civil através de um sistema seguro.

3.3.3

Reduzir a necessidade de tradução dos documentos públicos:

A criação de formulários normalizados opcionais, pelo menos para os documentos públicos mais comuns, poderia ser introduzida em vários sectores administrativos, satisfazendo os pedidos de tradução e evitando custos.

3.3.4

O certificado europeu de registo civil:

Esse certificado europeu poderia coexistir com as certidões de registo civil dos Estados-Membros, já que não seria obrigatório mas opcional. O formato e as menções do certificado poderiam ser uniformizados mediante a criação de um suporte único, o certificado europeu.

3.4   Reconhecimento mútuo dos efeitos dos actos de registo civil

3.4.1

Os actos de registo civil são o registo escrito efectuado por uma autoridade a fim de constatar ocorrências na vida de cada cidadão como, por exemplo, o nascimento ou a filiação.

3.4.2

Haveria que garantir a continuidade e a imutabilidade da situação de registo civil de todos os cidadãos europeus que exercem o seu direito de livre circulação e que a situação jurídica atestada por um acto de registo civil possa produzir os efeitos civis associados a essa situação.

3.4.3

Levanta-se a questão de saber se é necessária uma acção da União para proporcionar uma maior segurança jurídica aos cidadãos europeus em matéria de registo civil e suprimir os obstáculos com que estes se deparam quando pedem o reconhecimento, num Estado-Membro, de uma situação jurídica criada noutro Estado-Membro.

3.4.4

A intervenção da União no direito derivado (2), até à data, tem sido muito específica, não existindo ainda regras sobre o reconhecimento num Estado-Membro de situações ligadas ao estado civil ocorridas noutro Estado-Membro. Além disso, a União Europeia não tem competência para intervir no direito material da família dos Estados-Membros, já que o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia não fornece qualquer base jurídica para uma solução desse tipo.

3.4.5

Para resolver esses problemas, a União Europeia tem três alternativas em termos da política a adoptar:

3.4.5.1

Ajudar as autoridades nacionais a encontrar soluções concretas:

já que a principal função da União Europeia consistiria em ajudar as autoridades nacionais a cooperarem mais eficazmente.

3.4.5.2

Reconhecimento de pleno direito:

que seria efectuado sem a harmonização das regras existentes e permitiria a subsistência dos sistemas jurídicos dos Estados-Membros, o que implica que cada Estado-Membro – com base na confiança recíproca – aceite e reconheça os efeitos de uma situação jurídica criada noutro Estado-Membro.

3.4.5.3

Reconhecimento com base na harmonização das regras aplicáveis aos conflitos de leis:

Tratar-se-ia de criar um conjunto de normas comuns estabelecidas a nível da União Europeia, cuja função seria determinar qual o direito aplicável a uma determinada situação transnacional quando estivesse em causa um evento de registo civil.

4.   Observações na generalidade

4.1   O Livro Verde elaborado pela Comissão tem a sua justificação legislativa na necessidade de aperfeiçoar e aprofundar o funcionamento do Espaço de Liberdade, Segurança e Justiça, e de galvanizar a sua interligação com o exercício dos direitos reconhecidos aos indivíduos pelo estatuto de cidadania da União e nas liberdade económicas fundamentais.

4.2   Neste sentido, o CESE acolhe com agrado esta iniciativa da Comissão que, em consonância com os princípios e valores constitucionais e com os objectivos da União Europeia, consagrados no TUE e no TFUE, após a entrada em vigor do Tratado de Lisboa, dão prioridade à perspectiva jurídica que fortalece o papel dos cidadãos no processo de integração europeu.

4.3   Compete, por conseguinte, às instituições e aos órgãos da União facilitar aos cidadãos dos seus Estados-Membros, e a todos os indivíduos em geral, o exercício dos direitos e das liberdades de que são destinatários até a um máximo de amplitude e de potencialidade possível, dentro dos limites estabelecidos pelos Tratados e pelo acervo jurídico vigente.

4.3.1   Isso redundará num tratamento mais igualitário, de conformidade com o princípio consagrado no artigo 9. ° do TUE e contribuirá para remover os obstáculos ao exercício desses direitos e dessas liberdades que não são justificados por razões de ordem pública e que protegem amiúde meros interesses corporativos (o que implica a eventual interferência de burocratas, notários, funcionários do registo civil, etc.) ou dissimulam receios infundados relacionados com a soberania dos Estados-Membros da UE.

4.4   Não obstante o exposto, as futuras medidas para a remoção dos obstáculos resultantes das formalidades administrativas ou linguísticas requerem uma apreciação ponderada do seu alcance material. Isso porque, para além dos desejados efeitos que delas podem resultar para o indivíduo em termos de eliminação de obstáculos e entraves administrativos e de custos económicos, bem como de redução dos prazos para a utilização dos documentos públicos fora do Estado que os emitiu, tais medidas podem provocar sérios conflitos jurídicos em virtude dos seus eventuais efeitos em domínios tão sensíveis como o estado civil.

4.5   Nesta linha de raciocínio, convém analisar separadamente a viabilidade das referidas medidas, abordando, por um lado, os aspectos relacionados com questões meramente processuais e linguísticas e, por outro lado, as questões mais substantivas relativas à situação jurídica dos interessados.

4.6   O pleno exercício dos direitos de livre circulação e residência, bem como os de liberdade de estabelecimento, de livre prestação de serviços e de livre circulação de trabalhadores no mercado interno, etc. requerem a adopção de mecanismos e actos legislativos supranacionais que suprimam ou limitem a casos muito específicos as formalidades administrativas necessárias para a autenticação dos documentos públicos.

4.6.1   As interferências das autoridades dos Estados-Membros diferentes daquele que emitiu o original de um documento público, dissimulam amiúde interesses incompatíveis com o direito da UE e redundam num tratamento discriminatório e em sobrecargas para os particulares injustificadas.

4.6.2   É óbvio que se pode assegurar a ordem pública e salvaguardar os interesses financeiros dos Estados-Membros com meios menos onerosos para o cidadão que não lesem, de qualquer modo, os seus direitos reconhecidos pela legislação da União. Em caso de dúvidas fundadas sobre a autenticidade de um documento ou quando esse documento não exista noutro Estado-Membro, as autoridades competentes nacionais poderiam trocar informações e encontrar uma solução.

4.6.2.1   O CESE sublinha, todavia, que considera uma obrigação das administrações públicas facilitar aos cidadãos, por todos os meios possíveis, a regularização transnacional de todos os documentos públicos que atestem estados ou situações e tenham de preencher certas condições ou exigências para permitirem o exercício dos direitos e liberdades reconhecidos pela UE.

4.6.3   Esse facto é comprovado por várias experiências em curso na UE, tais como:

a cooperação administrativa entre os funcionários do registo civil, que já existe nos Estados-Membros que fazem parte da convenção n. ° 3 da CIEC (3) e cujos resultados satisfatórios são um bom argumento para o Comité convidar todos os Estados-Membros da UE a aderirem a essa Convenção, como uma fase preliminar à previsível adopção das regras supranacionais neste âmbito;

o intercâmbio de informações sobre qualificações profissionais mediante o Sistema (electrónico) de Informação sobre o Mercado Interno (IMI);

a progressiva automatização e supressão do «exequatur» face à utilização generalizada de procedimentos electrónicos, e-Justiça, etc.

4.6.3.1   Parece lógico, à luz destas experiências, que a Comissão Europeia estabeleça uma ligação entre a sua proposta legislativa do Livro Verde sobre a livre circulação de documentos públicos e outras iniciativas, como a «Europa Digital» e a «e-2020». O CESE considera que seria uma boa ocasião para incentivar à criação de uma rede de registos civis que facilitasse a aplicação do princípio da apresentação única de um documento, simplificando todas as formalidades administrativas.

4.6.3.2   O CESE é de opinião que se pode explorar também a possibilidade de criar a curto prazo uma base electrónica dos modelos dos documentos públicos emitidos mais regularmente pelos Estados-Membros, gerida pela Comissão Europeia, para facilitar o reconhecimento mútuo e a validação automática em todo o território da UE, com versões nas respectivas línguas oficiais.

4.6.4   Analogamente, as experiências realizadas noutros domínios de acção da UE demonstram que é possível utilizar documentos elaborados com formatos, técnicas e materiais idênticos ou semelhantes, como o Passaporte Europeu (4) e os documentos de protecção diplomática a que se refere a alínea c) do n. °2 do artigo 20. ° do TFUE, o modelo de carta de condução de veículos a motor e de ciclomotores nas suas diferentes categorias, etc.

4.6.5   Afigura-se, por conseguinte, plausível defender a implantação generalizada de documentos administrativos com formulários normalizados e multilingues que poderiam inspirar-se nos modelos utilizados pela CIEC, os quais, para além de outras vantagens, evitariam a tradução do documento no Estado de destino.

4.7   Uma cooperação administrativa mais estreita e a emissão de documentos com validade em todos os Estados-Membros da UE são objectivos certamente viáveis num ambiente de confiança mútua, ou pelo menos de reconhecimento mútuo, e de toda a conveniência para facilitar o exercício dos referidos direitos de cidadania e dos direitos económicos fundamentais da UE. A adopção de normas europeias, plenamente aplicáveis em todos os Estados-Membros, constitui uma tarefa institucional que se enquadra no âmbito de competências da UE e se revela necessária para o aprofundamento do processo de integração.

4.8   No entanto, a questão dos documentos comprovativos do estado civil apresenta certos aspectos mais complexos que requerem a exploração de várias alternativas de política legislativa.

4.8.1   Trata-se de encontrar uma solução comum, porventura através da adopção de um certificado europeu de estado civil, para resolver a situação problemática actual em que os certificados de estado civil emitidos pelas autoridades competentes não tratam em pé de igualdade as várias situações pessoais nem reconhecem plenamente ou fazem valer os seus efeitos nos respectivos Estados.

4.8.2   As várias tradições jurídicas, culturais e religiosas dos Estados-Membros não conferem a mesma dimensão ao estatuto jurídico do indivíduo. Daí resultam disparidades em domínios tão diversos como o certificado de capacidade para contrair matrimónio exigido em certos Estados, o reconhecimento das uniões entre pessoas do mesmo sexo, a determinação da sequência dos apelidos ou a atribuição de género após mudança de sexo.

4.9   Tendo em conta que são actualmente os Estados-Membros que detêm as competências neste âmbito, que o Tratado de Lisboa não oferece bases específicas para a adopção de medidas supranacionais de harmonização legislativa sobre a matéria e que tão pouco se prevê, ao arrepio do disposto no artigo 77. °, n. ° 3 do TFUE sobre a emissão de vistos de longa duração e de autorizações de residência, uma cláusula para casos em que não esteja prevista a atribuição de competências, impõe-se o respeito escrupuloso do princípio da subsidiariedade.

4.10   Dever-se-ia, por conseguinte, contemplar a aplicação hipotética do princípio de reconhecimento mútuo mediante um certo tipo de disposição legislativa supranacional fundada na previsão genérica do artigo 81. °, n. °1 do TFUE, de acordo com o processo legislativo especial previsto no artigo 81. °, n. ° 3 do TFUE, com a necessária participação dos parlamentos nacionais dos Estados-Membros.

4.10.1   Não seria, pois, conveniente proceder a um exame detalhado ou a uma avaliação selectiva das opções jurídicas a aplicar pela União em função da situação de estado civil a reconhecer, uma vez que seria provavelmente mais fácil aplicar este processo à filiação, à adopção ou à sequência dos apelidos de uma pessoa do que ao reconhecimento de um casamento.

4.10.2   Sejam qual for, em suma, a opção legislativa da União Europeia, e o período necessário para a sua adopção, convém dar prioridade às pessoas que requerem o reconhecimento de uma situação jurídica ou dos efeitos derivados de um certificado de estado civil, mediante a elaboração de critérios ou de directrizes europeias com carácter vinculativo que ajudem as autoridades competentes dos Estados-Membros a encontrar soluções coerentes, ágeis e não discriminatórias em razão de nacionalidade.

4.11   Dada a necessidade impreterível de facilitar a circulação dos documentos públicos, os Estados-Membros e as instituições da UE deverão apoiar as iniciativas da Comissão que lhe são favoráveis e a estabelecer um regime supranacional opcional do certificado europeu de estado civil, encetando os trabalhos necessários para a harmonização das regras de conflitos de lei e conseguir, entretanto, o reconhecimento mútuo mediante a identificação dos requisitos mínimos a que devem obedecer os actos de estado civil, bem como o consenso sobre a sua presunção de validade no território da UE, uma vez constatada a legalidade da sua emissão pela respectiva autoridade competente.

4.12   A fim de garantir a máxima eficácia possível das futuras medidas a adoptar pela UE sobre a livre circulação de documentos públicos, o CESE convida a Comissão a ponderar a viabilidade de incluir nas suas futuras propostas legislativas o alargamento do seu âmbito de aplicação aos cidadãos do Espaço Económico Europeu e dos países terceiros com quem a UE tenha celebrado acordos de associação actualmente em vigor (segundo um regime de reciprocidade com os cidadãos dos Estados-Membros) e aos nacionais de países terceiros residentes de longa duração que estejam legalmente estabelecidos ou domiciliados num dos Estados-Membros da União Europeia.

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  COM(2004) 401 final.

(2)  Regulamento (CE) n. ° 2201/2003, artigo 21. °, n. ° 2.

(3)  Segundo a Convenção n. ° 3, quando o funcionário do registo civil lavra uma certidão de casamento deve advertir o funcionário do registo civil do local de nascimento dos futuros cônjuges através de um formulário normalizado.

(4)  JO C 241 de 19.9.1981 e JO C 179 de 26.7.1982.


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/118


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera as Directivas 89/666/CEE, 2005/56/CE e 2009/101/CE no que respeita à interconexão dos registos centrais, registos comerciais e registos das sociedades»

[COM(2011) 79 final — 2011/0038 (COD)]

2011/C 248/20

Relator: Miklós PÁSZTOR

Em 8 de Outubro e em 16 de Março de 2011, respectivamente, o Parlamento Europeu e o Conselho decidiram, nos termos do artigo 50.o, n.o 2, alínea g), do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho que altera as Directivas 89/666/CEE, 2005/56/CE e 2009/101/CE no que respeita à interconexão dos registos centrais, registos comerciais e registos das sociedades

COM(2011) 79 final – 2011/0038 (COD).

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada do Mercado Único, Produção e Consumo que emitiu parecer em 26 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 se Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho) o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 144 votos a favor, 2 votos contra e 4 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1   O CESE congratula-se com a publicação da directiva que considera como um progresso importante no desenvolvimento do mercado único. Efectivamente, ela permite a realização dos objectivos mais amplos das sociedades comerciais, dos trabalhadores, dos consumidores e dos cidadãos europeus, tal como sublinhado pela Estratégia Europa 2020 e pela iniciativa relativa às PME (Snall Business Act). No entanto, a proposta, na sua forma actual, que prevê uniformizar as indicações e os actos mais importantes e substituir a cooperação voluntária por uma obrigação legal aplicável em todo o território da União, satisfaz apenas algumas das exigências fundamentais que foram expressas.

1.2   Simultaneamente, a proposta contém muitas incertezas quanto à aplicação, deixando à Comissão a tarefa de resolver várias questões no quadro de uma regulamentação futura. O CESE manifesta o desejo de ser associado igualmente às etapas legislativas e de se manter um parceiro da Comissão na preparação dessa regulamentação futura.

1.3   O CESE teria preferido que a proposta consolidasse as três directivas modificadas e formulasse de forma verdadeiramente autónoma os requisitos da União na matéria (1). Com a modificação e os actos delegados que serão adoptados posteriormente, a aplicação perderá alguma clareza. Por esse motivo, o CESE mantém neste contexto as posições expressas em relação ao Livro Verde e gostaria que elas fossem tidas em conta nas futuras disposições legislativas.

1.4   O Comité considera como uma grave lacuna o facto de a regulamentação não abordar a questão da transferência da sede social, que, como indica o Livro Verde, se torna cada vez mais determinante num mercado mais integrado. O CESE considera que se perdeu uma oportunidade por o legislador não ter procurado definir como modelo o princípio, ainda por cima já referido, da transparência dos valores mobiliários.

1.5   O CESE apoia as modificações apresentadas na proposta em relação às Directivas 89/666/CEE e 2005/56/CE.

1.6   No que se refere à modificação da Directiva 2009/101/CE, o Comité considera importante que:

os dados sejam publicados o mais rapidamente possível, a saber, no prazo mais curto tendo em conta as limitações técnicas e jurídicas;

o pedido de informações de base seja gratuito no quadro do sistema europeu unificado, uma recomendação já apresentada pelo CESE;

a questão das despesas de construção e exploração do sistema seja clarificada, o que não acontece neste momento. Neste contexto, o Comité lamenta a ausência de estudos de impacto na proposta. Insiste, porém, na necessidade de a União prever fundos que cubram essas despesas;

a exploração do sistema permita aceder o mais directamente possível às informações e reduzir ao mínimo a publicação de informações em suporte papel.

1.7   O CESE aceita a data limite de 1 de Janeiro de 2014 para a entrada em vigor na União e nos Estados-Membros dos actos jurídicos necessários. Considera, porém, indispensável que a UE fixe uma data limite interna para a aplicação das medidas adoptadas nos actos delegados.

2.   Conteúdo da proposta de directiva

2.1   A directiva visa aumentar a transparência do enquadramento legislativo e fiscal das empresas que aproveitam cada vez mais as oportunidades proporcionadas pelo mercado único e reforçar dessa forma a confiança em relação a este último, favorecendo a exploração das vantagens competitivas das relações entre parceiros comerciais.

2.2   Com base na directiva, os Estados-Membros devem adoptar as medidas necessárias para que os sócios e terceiros tenham facilmente acesso, em todo o território da União, aos actos e indicações sobre as empresas e as relações que mantêm entre si. Efectivamente, até agora não existia qualquer obrigação nem possibilidade eficaz para tal. O problema da transparência coloca-se de forma especialmente séria e urgente no caso das fusões e cisões de empresas situadas de dois lados diferentes de uma fronteira ou de sucursais locais de uma sociedade regulada pelo direito de outro Estado-Membro.

2.3   A Comissão propõe como solução modificar as directivas anteriores:

Directiva 89/666/CEE do Conselho relativa à publicidade das sucursais criadas num outro Estado-Membro (décima primeira directiva);

Directiva 2005/56/CE relativa às fusões transfronteiriças das sociedades de responsabilidade limitada;

Directiva 2009/101/CE tendente a coordenar as garantias que podem ser concedidas aos sócios e terceiros (nova directiva relativa à publicidade das sociedades que substitui a primeira directiva).

Estas directivas satisfaziam apenas em parte as exigências crescentes de informação.

2.4   As modificações introduzidas pela nova directiva ampliam, tornam mais precisas e desenvolvem as exigências e procedimentos existentes e conferem à Comissão o poder de aplicar outras precisões e alargamentos quando da aplicação da directiva. Esta acção visa essencialmente que todas as empresas, sucursais ou agrupamentos de agentes económicos possam ser identificados clara e rapidamente e que todas as alterações sejam registadas e imediatamente acessíveis. O melhor instrumento para tal parece ser o armazenamento e publicação electrónicos dos actos e indicações, devendo os Estados-Membros garantir a informatização e a acessibilidade dos dados através da plataforma europeia única prevista.

2.5   A grande maioria das modificações propostas pela Comissão destina-se à Directiva 2009/101/CE:

a publicação dos dados tem de ser efectuada num prazo máximo de 15 dias;

deve ser atribuído a cada sociedade um identificador único que permita a sua identificação inequívoca no Espaço Económico Europeu;

as formalidades definidas pelos Estados-Membros devem ser compatíveis com a acessibilidade através de uma plataforma electrónica europeia única;

os Estados-Membros devem garantir a fiabilidade dos actos e indicações;

as despesas de publicação não devem exceder os encargos administrativos necessários;

para executar estas disposições, a Comissão Europeia, com base nos poderes delegados, pode decidir as modalidades técnicas para a gestão, a segurança, o modo de criação do identificar único, as línguas utilizadas, a metodologia e as normas técnicas de publicação e as possibilidades de penalização em caso de incumprimento das disposições.

2.6   No tocante às directivas de 1989 e 2005, a modificação refere-se à identificação única das sucursais ou sociedades de responsabilidade limitada resultantes de uma fusão transfronteiriça e à exigência de compatibilidade electrónica das demais actividades de registo.

2.7   A directiva, destinada aos Estados-Membros, fixa em seguida o dia 1 de Janeiro de 2014 como prazo máximo de execução pelos mesmos. A directiva em si entra em vigor 20 dias a contar da sua publicação.

3.   Contexto jurídico do parecer

3.1   A transparência dos registos comerciais é não só um objectivo importante em si, mas constitui também um dos requisitos para a promoção da harmonização do direito das sociedades. A interoperabilidade dos registos nacionais é uma questão, no fundo, informática e económica, mas a proposta deve ser publicada sob uma forma jurídica, e por isso não se pode ignorar os requisitos legais. Para além da necessidade de encontrar a forma apropriada de um ponto de vista jurídico, há que examinar em pormenor o contexto jurídico da harmonização.

3.1.1   Neste contexto, há que se questionar, em primeiro lugar, sobre a forma de conciliar os interesses dos países tipicamente exportadores e importadores de capitais. O quadro infra apresenta em linhas gerais os seus principais pontos de vista. Com base nestes, a tomada em consideração dos interesses subjacentes dos países limita intrinsecamente, a longo prazo, o êxito da harmonização de fundo, ainda que, no quadro dos debates, esta questão não pareça importante em comparação com uma questão técnica como a da interoperabilidade dos registos comerciais.

 

Estado-Membro exportador de capitais

Estado-Membro importador de capitais

1.

Legitimidade das empresas (personalidade jurídica)

Princípio da ficção (universalidade)

Princípio da realidade (especificidade)

2.

Capacidade de identificação da pessoa jurídica

Local de registo

Sede administrativa efectiva

3.

Jurisdição

Princípio da individualidade

Princípio da territorialidade

4.

Princípio de direito económico

Segurança jurídica

Prevenção do abuso do direito

5.

Princípio do direito da União (política do mercado interno)

Proibição de limitar as liberdades fundamentais

Proibição de tratamento discriminatório

3.2   Os obstáculos ao registo nacional das empresas são muito mais reduzidos em certos países, designadamente os que seguem o princípio da ficção (onde o reconhecimento das empresas ao nível nacional é em princípio automático se elas cumprirem determinadas condições formais), do que noutros países (onde a defesa das comunidades locais que gravitam em torno da empresa é também importante), na medida em que a responsabilidade da empresa que solicita o registo é mais importante do que a do Estado. Ou seja, em matéria de registo de empresas, a regulamentação do direito privado tem mais importância do que a do direito público.

3.3   Em alguns países, é completamente impossível modificar o estatuto das empresas, ao passo que noutros, no caso de alteração da sede administrativa efectiva, é possível modificar a identidade reconhecível pelo direito das sociedades e, por conseguinte, pelo registo. Isto causou já vários problemas no mercado interno (ver, por exemplo, o caso Überseering), sem excluir a dupla identidade nem a possibilidade do pesadelo da dupla não identidade (por exemplo, no caso de uma associação germano-irlandesa).

3.4   Certos países encaram o mundo na sua globalidade e consideram as actividades das empresas no seu conjunto, sejam elas exercidas no seu território ou no estrangeiro (princípio da individualidade). Noutros países, a jurisdição é determinada com base no território, que é um conceito importante, e, por conseguinte, existe uma diferença fundamental entre o interior do país e o estrangeiro. A harmonização é, pois, genuinamente importante. No primeiro caso (princípio da individualidade), a interoperabilidade dos registos comerciais deriva essencialmente do direito privado, referindo-se o direito das sociedades aos próprios interesses das empresas. No segundo caso, são necessárias medidas públicas. É, pois, possível imaginar que, no primeiro caso, no tocante aos países exportadores de capitais, o programa BRITE, por exemplo, parece ser uma melhor solução do que a harmonização positiva.

3.5   Uma das características dos países exportadores de capitais é resistirem a modificar, no registo, a identificação obtida ao abrigo do direito das sociedades, pois, para eles, a segurança jurídica tem a primazia sobre tudo o resto. Outros países, pelo contrário, estimam que a defesa dos interesses das comunidades locais que gravitam em torno das empresas é primordial e não hesitam, se necessário, a pôr em causa o estatuto jurídico de uma empresa. Por esse motivo, o artigo 11.o da primeira directiva (12.o na nova), que especifica detalhadamente os motivos para a dissolução de uma empresa, pode ser aplicado de forma muito diversa segundo os países, em função da percepção que têm da constituição de uma empresa (ver, por exemplo, os casos Ubbink ou Marleasing).

3.6   Os países que, em princípio, não fazem distinção entre as actividades internas e externas aproveitam, em geral, melhor as oportunidades oferecidas pelo mercado interno, e as empresas que neles estão registadas podem, assim, facilmente considerar que as medidas adoptadas pelo Estado de acolhimento lhes são prejudiciais na medida em que limitam as liberdades da União. Por outro lado, na prática dos países que reconhecem o princípio da realidade, ou seja da territorialidade, a tónica pode ser colocada principalmente no problema do tratamento discriminatório das empresas estrangeiras. Manifestamente, são sobretudo os países exportadores de capitais que têm interesse na uniformização dos registos comerciais, sendo que a regulamentação na matéria representa um desafio mais importante para os países importadores de capitais.

4.   Observações na generalidade

4.1   O CESE congratula-se com a publicação da directiva que considera como um progresso importante no desenvolvimento do mercado único. Efectivamente, a realização dos objectivos mais amplos das sociedades comerciais, dos trabalhadores, dos consumidores e dos cidadãos europeus torna-se possível, tal como sublinhado anteriormente pelo Comité em relação ao Livro Verde: «Os objectivos da interconexão dos registos de empresas têm de estar correlacionados com dois documentos estratégicos, nomeadamente a Estratégia Europa 2020 e o“Small Business Act (SBA)”. A interconexão dos registos de empresas deve permitir aumentar a transparência e facilitar a cooperação entre empresas, bem como reduzir as barreiras às actividades transfronteiras e diminuir os encargos administrativos, em particular para as PME, que constituem aspectos essenciais para consolidar o mercado único e promover um progresso económico e social equilibrado e sustentável, como salientado pela Comissão na sua Comunicação “Think Small First – Um Small Business Act para a Europa”, COM(2008) 394 final.» (2).

4.2   O Comité nota igualmente que a proposta, na sua forma actual, satisfaz apenas algumas das exigências fundamentais que foram expressas, prevendo uniformizar as indicações e os actos mais importantes e substituir a cooperação voluntária por uma obrigação legal aplicável em todo o território da União. Da mesma forma, embora considere aceitável a orientação da regulamentação relativa aos encargos administrativos e à protecção de dados, estima, porém, que vários pontos devem ser esclarecidos.

4.3   Cabe, porém, constatar que a proposta contém ainda várias incertezas quanto à sua aplicação. Em geral, deixa a uma regulamentação futura a questão de definir as modalidades, quando teria sido oportuno receber essas informações neste momento. Assim, a proposta em apreço poderia, por exemplo, conter mais informações sobre certas normas e certos conteúdos, dado que o Livro Verde referia em parte estas questões e aguardava uma resposta. Devia ter sido possível pronunciar-se sobre o seu carácter prático. Por esse motivo, o CESE mantém neste contexto as posições expressas em relação ao Livro Verde e gostaria que elas fossem tidas em conta nas futuras disposições legislativas.

4.4   O CESE sente que, desta forma, a União Europeia perdeu uma oportunidade de avançar mais firmemente no sentido de uma maior harmonização do direito das sociedades, tal como descrito no ponto 3. O Comité está consciente de que diferenças jurídicas e institucionais consideráveis dificultam progressos nesta questão mais ampla e que a harmonização do direito das sociedades constitui o trabalho de uma década. No entanto, o registo é parte dela e ao não abordar a questão em pormenor, perdeu-se uma ocasião de procurar formulações comuns e de lançar um debate. Além disso, o programa BRITE ilustra bem o facto de os actores envolvidos poderem resolver, a contento de todos, as questões de pormenor através da auto-regulação.

4.5   O Comité considera como uma grave lacuna o facto de a regulamentação não abordar a questão da transferência da sede social, que, como indica o Livro Verde, se torna cada vez mais determinante num mercado mais integrada. O CESE considera que se perdeu uma oportunidade por o legislador não ter procurado definir como modelo o princípio, ainda por cima já referido, da transparência dos valores mobiliários.

4.6   No quadro deste processo, teria talvez sido importante que a proposta consolidasse as três directivas modificadas e formulasse de forma verdadeiramente autónoma os requisitos da União na matéria (3). Com a modificação e os actos delegados que serão adoptados posteriormente, a aplicação perderá alguma clareza sobretudo devido ao facto de a proposta em apreço não definir previamente os desafios do registo em termos de gestão e cooperação entre os registos comerciais dos Estados-Membros.

4.7   O Comité tem para si que surgirão novas dificuldades na realização dos objectivos pretendidos, na medida em que, devido à letra da proposta e não, esperamos, devido ao objectivo inicialmente determinado, as instâncias de cooperação em matéria de registo que se mantiveram activas até ao momento ao nível europeu, fossem elas oficiais, voluntárias ou originárias do mercado, não terão lugar no quadro da nova cooperação. O CESE concorda que o portal jurídico único da União Europeia, o portal europeu e-Justiça, deve constituir o ponto central de acesso à informação jurídica, mais considera importante que se guarde margem de manobra suficiente para iniciativas com objectivos diferentes e, eventualmente, mais amplos. O Comité sublinha igualmente que a «cooperação neste domínio entre as instituições nacionais e europeias e os parceiros sociais e a sociedade civil reveste importância fundamental» (4). O CESE manifesta o desejo de ser associado igualmente às etapas legislativas e de se manter um parceiro da Comissão na preparação de uma regulamentação futura.

5.   Observações na especialidade

5.1   O CESE apoia as modificações apresentadas na proposta em relação às Directivas 89/666/CEE e 2005/56/CE.

5.2   No que se refere à modificação da Directiva 2009/101/CE, o Comité considera importante que os dados sejam publicados o mais rapidamente possível, a saber, no prazo mais curto tendo em conta as limitações técnicas e jurídicas. O CESE tem para si que é possível, a curto prazo, reduzir radicalmente o prazo proposto. Chama, no entanto, a atenção para o facto de até esse prazo poder, em certos casos, se revelar longo e, daí a necessidade eventual de a declaração das modificações se efectuar de forma mais rápida, ou seja, através da plataforma europeia única, mediante uma «publicação» (5) imediatamente após uma notificação local e que poderá ser certificada posteriormente. Os sistemas informáticos actuais possibilitam-no.

5.3   No tocante aos custos associados a esse serviço de informação, há que definir claramente se a totalidade dos custos são cobertos pelo montante pago pelo notificador ou se o requerente da informação também deve pagar. Neste ponto, os sistemas em vigor nos Estados-Membros divergem. Segundo a prática em vigor actualmente, o serviço só é pago nos casos em que as informações solicitadas devem provir do registo das sociedades de outros países. O Comité reitera o seu desejo, já expresso, de que o requerimento de informações de base seja gratuito no quadro do sistema europeu unificado (6).

5.3.1   O Comité assinala que se devem considerar como informações de base especificamente para as empresas de parceiros comerciais, os sócios, os credores e os trabalhadores, as informações relativas à sede social, os proprietários e os principais dirigentes da empresa, a sua situação económica e jurídica e a sua capacidade de resistência, bem como dados contabilísticos e de balanço precisos.

5.3.2   Nesse contexto, o Comité sublinha que a questão das despesas de construção e de exploração do sistema não foi esclarecida. Lamenta a ausência, na proposta, de estudos de impacto que permitam avaliá-las. Insiste, porém, na necessidade de a União prever fundos que cubram essas despesas.

5.4   O CESE acolhe favoravelmente o facto de os dados serem acessíveis por via electrónica. Espera, porém, que a exploração do sistema permita aceder mais directamente às informações. Reconhece, no entanto, que é importante encontrar um equilíbrio entre o requisito de publicidade e um funcionamento rápido e seguro. O Comité está convicto de que é possível chegar a um compromisso satisfatório e que, no fim, a publicidade sairá reforçada. Outro desejo fundamental do Comité em relação ao sistema unificado é permitir reduzir ao mínimo a publicação de informações em suporte papel e, assim, as despesas de publicação.

5.4.1   O CESE chama a atenção para o facto de poderem surgir contradições entre as obrigações europeias em matéria de notificação de informações, por um lado, e as normas jurídicas da competência nacional (por exemplo, a questão da fé conferida aos actos), por outro. Esta situação não pode ser mantida a longo prazo.

5.5   O Comité estima que existem igualmente soluções técnicas simples para os problemas de língua, desde que um trabalho preliminar considerável tenha sido efectuado. Os programas informáticos de tradução actuais permitem publicar facilmente, em qualquer língua, textos normalizados, desde que estes estejam disponíveis e tenham sido aprovados, após as consultas apropriadas. Este tipo de normalização é desejável sobretudo para as informações de base e os documentos de contabilidade.

5.6   Em relação à protecção de dados, o CESE considera oportuno aplicar ao registo comercial as disposições da Directiva 95/46/CE relativa à protecção dos dados pessoais.

5.7   O CESE aceita a data limite de 1 de Janeiro de 2014 para a entrada em vigor nos Estados-Membros dos actos jurídicos necessários. Considera, porém, indispensável que a UE fixe uma data limite interna para a aplicação das medidas adoptadas nos actos delegados. Assim, o bom funcionamento da estrutura que permite um acesso rápido e uniforme às informações sobre as sociedades será assegurado em todo o território da União.

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  A primeira e a décima primeira directivas podem, na verdade, ser facilmente combinadas na medida em que o seu objecto é análogo (a publicidade das sociedades), ao passo que, no tocante à Directiva relativa às fusões transfronteiriças, esta limita-se a um aspecto específico, a clareza dos registos comerciais em caso de operações transfronteiriças.

(2)  JO C 48 de 15.2.2011, p. 120, ponto 1.2.

(3)  A primeira e a décima primeira directivas podem, na verdade, ser facilmente combinadas na medida em que o seu objecto é análogo (a publicidade das sociedades), ao passo que, no tocante à Directiva relativa às fusões transfronteiriças, esta limita-se a um aspecto específico, a clareza dos registos comerciais em caso de operações transfronteiriças.

(4)  JO C 48 de 15.2.2011, p. 120, ponto 6.7.

(5)  Tratar-se-ia de mensagens ou de informações publicadas na rede electrónica europeia e directamente acessíveis aos interessados.

(6)  JO C 48 de 15.2.2011, p. 120, ponto 1.5.


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/123


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Uma abordagem global da protecção de dados pessoais na União Europeia»

[COM(2010) 609 final]

2011/C 248/21

Relator: Peter MORGAN

Em 4 de Novembro de 2010, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões –«Uma abordagem global da protecção de dados pessoais na União Europeia»

COM(2010) 609 final.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania, que emitiu parecer em 27 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 16 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 155 votos a favor, 9 votos contra e 12 abstenções, o seguinte parecer:

1.   Conclusões e recomendações

1.1   A legislação da União Europeia em matéria de protecção de dados baseia-se na Directiva 95/46/CE, que tinha os seguintes dois objectivos:

(1)

Os Estados-Membros assegurarão […] a protecção das liberdades e dos direitos fundamentais das pessoas singulares, nomeadamente do direito à vida privada, no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais.

(2)

Os Estados-Membros não podem restringir ou proibir a livre circulação de dados pessoais entre Estados-Membros por razões relativas à protecção assegurada por força do n.o 1.

É essencial um equilíbrio entre estes dois objectivos, para que não entrem em conflito. Qualquer nova legislação deverá criar um enquadramento jurídico que contribua para a consecução ambos.

1.2   O CESE congratula-se com a comunicação em apreço, que apresenta a abordagem da Comissão relativamente à actualização da Directiva 95/46/CE referente à protecção dos dados. O desenvolvimento vertiginoso de novas tecnologias está a causar um aumento exponencial do volume de dados processados em linha, o que requer um reforço paralelo da protecção dos dados pessoais, para evitar intrusões em larga escala na privacidade de cada um. A recolha, cruzamento e gestão dos dados provenientes de várias fontes devem ser cuidadosamente circunscritos. O sector público dispõe de vários ficheiros sobre aspectos da relação entre os cidadãos e o Estado. Os dados recolhidos devem limitar-se ao mínimo necessário para cada objectivo e deverá ser proibido reuni-los todos numa única base de dados do tipo «big brother».

1.3   Ao mesmo tempo, o CESE recomenda prudência. A legislação que regula a actividade empresarial deve manter-se estável e previsível. O CESE apoia, por conseguinte, uma revisão apropriada da directiva relativa à protecção dos dados.

1.4   A comunicação reconhece que uma das principais preocupações recorrentes das partes interessadas, e em particular das empresas multinacionais, é a insuficiente harmonização das legislações dos Estados-Membros em matéria de protecção de dados, apesar da existência de um quadro jurídico comum da UE. O CESE propõe que a nova legislação assegure uma protecção mais consistente dos dados pessoais dos trabalhadores em toda a UE, com um enquadramento europeu que reforce a clareza e a segurança jurídicas. Neste sentido, o CESE acolhe com particular satisfação a intenção de tornar obrigatória a nomeação de um responsável pela protecção de dados independente e de harmonizar as normas relativas às suas funções e competências.

1.5   Dado o possível conflito entre a privacidade das pessoas e a exploração comercial dos seus dados e tendo em conta a importância do que está em jogo, importa que as pessoas estejam mais bem informadas sobre os fins para os quais os seus dados são recolhidos e sobre o poder de que dispõem para controlar essa informação depois de reunida. Assim, o CESE considera que uma aplicação eficaz e a possibilidade efectiva de recurso são indispensáveis para que este projecto seja verdadeiramente «global». Além disso, haverá que incluir a dimensão transfronteiriça.

1.6   No que respeita aos cidadãos da UE, a legislação aplicável na União Europeia deverá ser a do Estado-Membro do responsável pelo tratamento dos dados, independentemente do local onde estes estão armazenados. No que diz respeito a pessoas vulneráveis, em especial os trabalhadores e os consumidores, deve ser aplicável a legislação em matéria de protecção dos dados pessoais em vigor no seu local de residência habitual.

1.7   A referência às crianças é demasiado superficial. É necessária uma atenção particular às questões da privacidade relacionadas com crianças. O «direito a ser esquecido» permitirá apagar o registo de disparates infantis ou de pequenos delitos cometidos na adolescência, mas pode não ser realizável na prática.

1.8   É preciso esclarecer a actual definição de dados sensíveis face à contínua expansão das categorias de dados electrónicos sobre as pessoas. A utilização generalizada e indiscriminada de câmaras de vigilância é um motivo de preocupação para o CESE. É essencial aplicar a legislação que limita a utilização indevida destas imagens. Os dados obtidos através do sistema GPRS relativos à localização de pessoas constituem outra questão controversa. A recolha de dados biométricos é cada vez mais frequente. A definição de dados sensíveis deverá incluir estas novas tecnologias e metodologias e ter em conta novos desenvolvimentos tecnológicos. Poderá ser necessário estabelecer princípios em função dos contextos. O CESE é a favor de uma utilização adequada destas novas tecnologias.

1.9   Embora reconhecendo que a cooperação policial entre Estados é uma questão delicada, o CESE considera essencial que os direitos fundamentais, incluindo a protecção dos dados pessoais, sejam sempre objecto do máximo cuidado.

1.10   Apoia o propósito geral da Comissão de garantir uma aplicação mais coerente das normas da UE em matéria de protecção de dados em todos os Estados-Membros. Preocupa-o, no entanto, o facto de possivelmente nem todos os 12 novos Estados-Membros terem ainda concluído a plena e efectiva transposição da Directiva 95/46/CE.

1.11   Na opinião do CESE, as autoridades nacionais de protecção de dados carecem em geral de eficácia e estão sobrecarregadas de trabalho, sendo necessário reforçar a sua independência. Qualquer nova directiva deverá prever que as autoridades nacionais disponham do estatuto, da autoridade e dos recursos necessários para levar a cabo a sua tarefa.

1.12   Com base nos contributos que deu até à data para a protecção das pessoas no que se refere ao tratamento dos seus dados pessoais, o CESE considera que o Grupo de Trabalho do Artigo 29.o tem uma valiosa função a cumprir.

1.13   No contexto da Agenda Digital da UE, o CESE solicita à Comissão que pondere a criação de uma autoridade da União Europeia para examinar as ramificações mais vastas da Internet na sociedade num período de 10 a 20 anos. As actuais disposições para a segurança dos dados pessoais e para a cibersegurança estão a tornar-se cada vez mais desadequadas. A sociedade está a tentar recuperar o atraso. No âmbito da protecção dos dados, o CESE recomenda a nomeação de uma autoridade europeia para a protecção de dados com competências para actuar em toda a UE. A actual Autoridade Europeia só actua no âmbito das instituições da UE. É necessária uma autoridade responsável pela coordenação entre Estados-Membros e pelas normas de funcionamento, se bem que essa nomeação abrangeria só uma parte das competências da autoridade mais ampla que o Comité preconiza.

2.   Introdução

2.1   O CESE continua a apoiar os princípios em que se baseia a Directiva de 1995. Apresentam-se a seguir alguns excertos avulsos simplificados do texto da directiva, que expõem com clareza os princípios em causa:

Artigo 6.o

Os Estados-Membros devem estabelecer que os dados pessoais serão:

a)

objecto de um tratamento leal e lícito;

b)

recolhidos para finalidades determinadas, explícitas e legítimas;

c)

adequados, pertinentes e não excessivos relativamente às finalidades para que são recolhidos e para que são tratados posteriormente;

d)

exactos e, se necessário, actualizados;

e)

conservados de forma a permitir a identificação das pessoas em causa apenas durante o período necessário para a prossecução das finalidades para que foram recolhidos.

Artigo 7.o

Os Estados-Membros estabelecerão que o tratamento de dados pessoais só poderá ser efectuado se:

a)

a pessoa em causa tiver dado de forma inequívoca o seu consentimento; ou

b)

o tratamento for necessário para a execução de um contrato no qual a pessoa em causa é parte; ou

c)

o tratamento for necessário para cumprir uma obrigação legal à qual o responsável pelo tratamento esteja sujeito; ou

d)

o tratamento for necessário para a protecção de interesses vitais da pessoa em causa; ou

e)

o tratamento for necessário para a execução de uma missão de interesse público; ou

f)

o tratamento for necessário para prosseguir interesses legítimos do responsável pelo tratamento.

Artigo 8.o

Os Estados-Membros proibirão o tratamento de dados pessoais que revelem a origem racial ou étnica, as opiniões políticas, as convicções religiosas ou filosóficas, a filiação sindical, bem como o tratamento de dados relativos à saúde e à vida sexual.

2.2   As circunstâncias mudaram significativamente na última década, com novas disposições introduzidas no artigo 16.o do Tratado de Lisboa e no artigo 8.o da Carta dos Direitos Fundamentais.

2.3   A comunicação em apreço visa definir a abordagem da Comissão para modernizar o sistema jurídico da UE em matéria de protecção de dados em todos os sectores de actividade da União, tendo particularmente em conta os desafios resultantes da globalização e das novas tecnologias, de modo a continuar a garantir um elevado nível de protecção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento dos dados pessoais em todos os domínios de actividade da União.

2.4   Hoje em dia, o intercâmbio de informações a nível mundial é mais fácil e mais rápido. Por exemplo, os dados pessoais de alguém – correio electrónico, fotografias e agendas electrónicas – podem ser criados no Reino Unido utilizando software localizado na Alemanha, processados na Índia, armazenados na Polónia e consultados em Espanha por um cidadão italiano. Este rápido aumento dos fluxos de informação no mundo inteiro constitui um enorme desafio ao direito dos cidadãos à privacidade dos dados pessoais. As questões relativas à protecção dos dados, incluindo a sua dimensão transfronteiriça, estão presentes no quotidiano das pessoas – no trabalho, nas relações com autoridades públicas, quando adquirem bens ou serviços, quando viajam ou quando navegam na Internet.

2.5   Em 2011, a Comissão apresentará propostas legislativas de revisão do quadro jurídico da protecção de dados, no intuito de reforçar a posição da UE em matéria de protecção dos dados pessoais no contexto de todas as políticas da União – incluindo a aplicação da lei e a prevenção da criminalidade, atendendo às especificidades destes domínios. Paralelamente serão empreendidas medidas não legislativas, como a promoção da auto-regulação e o estudo da viabilidade de rótulos europeus de protecção da privacidade.

2.6   A Comissão continuará também a garantir o acompanhamento adequado da correcta aplicação do Direito da UE neste domínio, prosseguindo uma política de repressão das infracções sempre que as normas de protecção de dados da UE não forem correctamente implementadas e aplicadas.

2.7   A abordagem global da protecção de dados tem os seguintes objectivos principais:

reforçar os direitos das pessoas;

aprofundar a vertente relativa ao mercado interno;

rever as normas de protecção de dados no domínio da cooperação policial e judiciária em matéria penal;

ter em conta a dimensão mundial da protecção de dados;

reforçar o quadro institucional para uma melhor aplicação das normas de protecção de dados.

Os pontos 3 a 7 infra resumem estes objectivos e expõem a perspectiva do CESE sobre as propostas. Os títulos em negrito seguem a estrutura da comunicação. O texto em itálico é uma sinopse das propostas.

3.   Reforçar os direitos das pessoas

3.1   Garantir a protecção adequada das pessoas em todas as circunstâncias

A Carta dos Direitos Fundamentais inclui o direito à protecção dos dados pessoais. A definição de «dados pessoais» engloba todas as informações relativas a uma pessoa identificada ou identificável. Será ponderada a melhor forma de garantir a aplicação coerente das normas de protecção de dados, tendo em consideração o impacto das novas tecnologias nos direitos e liberdades das pessoas, e de alcançar o objectivo de garantir a livre circulação de pessoas no mercado interno.

3.1.1   A livre circulação de dados pessoais no mercado interno é necessária para o bom funcionamento deste mercado, mas constitui uma ameaça potencial à privacidade dos dados que as empresas detêm sobre os seus trabalhadores. São necessárias salvaguardas específicas, como a obrigação dos responsáveis pelo tratamento de dados de prestarem contas quanto à troca internacional de dados e a utilização da encriptação para os dados mais sensíveis.

3.1.2   O Comité sublinha que o sector do emprego está excluído, em maior ou menor medida, não só da actual comunicação, mas também do debate geral sobre a protecção de dados na Europa. O trabalho já realizado a nível europeu deve ser utilizado como ponto de partida, especialmente as propostas apresentadas pelo Grupo de Trabalho do Artigo 29.o.

3.2   Aumentar a transparência para as pessoas em causa

A transparência é uma condição fundamental para que as pessoas possam exercer o controlo sobre os seus próprios dados e para garantir a protecção efectiva dos dados pessoais. Será ponderada a introdução de um princípio geral de tratamento transparente, de obrigações específicas dos responsáveis pelo tratamento dos dados, sobretudo no que diz respeito aos menores, de avisos de privacidade normalizados e de uma notificação obrigatória em caso de violação de dados pessoais.

3.2.1   São preferíveis avisos normalizados, uma vez que evitam conflitos de interesses. A utilização destes avisos deverá ser voluntária.

3.2.2   A transparência não resolve necessariamente o problema das cláusulas contratuais unilaterais. É importante elaborar regras mais rigorosas para criar uma protecção mais eficaz contra cláusulas injustas.

3.2.3   A referência às crianças é demasiado superficial. É necessária uma atenção particular às questões da privacidade relacionadas com crianças. O «direito a ser esquecido» permitirá apagar o registo de disparates infantis ou de pequenos delitos cometidos na adolescência, mas pode não ser realizável na prática. (ver ponto 3.3.2)

3.2.4   A nova legislação deve esclarecer o papel do responsável pelo processamento dos dados e do responsável pelo registo, para que não haja confusão quanto à identidade e às obrigações e direitos de cada um.

3.2.5   O CESE apoia a proposta de notificação obrigatória das violações de dados pessoais, mas crê que talvez não possa ser aplicável a todas as situações, em todos os sectores e em todas as circunstâncias.

3.3   Aumentar o controlo sobre os próprios dados

Há duas condições prévias importantes: a limitação da actuação do responsável pelo tratamento dos dados às finalidades a atingir (princípio da minimização dos dados) e a manutenção de um controlo efectivo das pessoas sobre os dados que lhes dizem respeito. Serão analisadas formas de reforçar o princípio da minimização dos dados, melhorar as condições para o exercício dos direitos de acesso, rectificação, supressão ou bloqueamento de dados, clarificar o chamado «direito a ser esquecido» e garantir o direito explícito à portabilidade dos dados.

3.3.1   De modo geral, o CESE apoia todas as medidas destinadas a melhorar a vida privada. As pessoas devem ter o direito de aceder livremente a todos os dados recolhidos a seu respeito. Um exemplo disso poderia ser o livre acesso aos dados respeitantes às responsabilidades de crédito. A retirada do consentimento sem necessidade de justificação e o direito efectivo a ser esquecido são fundamentais, mas a privacidade estaria mais protegida se, logo à partida, não fossem recolhidos tantos dados. Nesta perspectiva, o CESE insta a Comissão a dar efectivo seguimento à proposta de reforçar o princípio da minimização dos dados.

3.3.2   Embora o direito a ser esquecido seja um conceito aliciante, será difícil realizá-lo, dada a natureza viral dos dados na Internet e as tecnologias que apagam dados mas não os esquecem.

3.4   Aumentar a sensibilização do público

Devem incentivar-se acções de sensibilização, incluindo o fornecimento de informações claras em sítios Web, explicitando com precisão quais os direitos das pessoas a que os dados se referem e as responsabilidades dos responsáveis pelo tratamento. A falta de sensibilização dos jovens constitui uma preocupação especial.

3.4.1   Será difícil conseguir as necessárias alterações de comportamento, especialmente dado que o rápido desenvolvimento das redes sociais não foi acompanhado por uma maior sensibilização dos utilizadores para as implicações do grande volume de dados pessoais que elas favorecem. Embora, em princípio, fosse positivo que houvesse avisos de sensibilização obrigatórios em todos os serviços de Internet, estes poderiam ser problemáticos para as empresas. Deveria ser ponderada a introdução de protocolos de sensibilização por categoria de serviço – comércio electrónico, fornecedores de serviços Internet, motores de busca, redes sociais, etc.

3.4.2   O CESE acolhe favoravelmente a intenção da Comissão de oferecer apoio financeiro da UE a actividades de sensibilização e gostaria que esse apoio fosse alargado de modo a abranger o co-financiamento de actividades de sensibilização levadas a cabo pelos parceiros sociais e pelas organizações da sociedade civil a nível europeu e nacional.

3.5   Garantir o consentimento informado e livre

A Comissão irá analisar meios de clarificar e reforçar as normas que regem o consentimento.

3.5.1   Os tipos de consentimento necessários devem continuar a depender da natureza dos dados a serem processados e não do tipo de tecnologia utilizada. Todavia, o CESE manifesta preocupação pelo facto de, na maioria dos casos, quando o consentimento é dado por Internet, não ser fornecida qualquer confirmação desse acordo, nem existirem mecanismos eficazes para registar a retirada do consentimento. Por outro lado, a aceitação pode consistir em clicar num botão para aceitar páginas e páginas de condições, entre as quais o consentimento pode ser um elemento secundário. Para ser válido, específico e dado com conhecimento de causa, faria sentido que o consentimento relativo ao controlo dos dados constituísse um documento simples e separado.

3.5.2   O processamento de informação de carácter pessoal é essencial para as organizações e empresas que desenvolvem a sua actividade na Internet. A opção por defeito é claramente vantajosa para o operador, mas pode trazer desvantagens ao cliente se não for correctamente aplicada. A sua utilização deveria ser circunscrita, de modo a obrigar todos os operadores a oferecer, por defeito, a protecção da vida privada aos seus clientes, se estes assim o desejarem.

3.5.3   Para se poder dar o consentimento livremente, o contrato deve também ser justo. É necessário estabelecer princípios para evitar práticas comerciais abusivas.

3.6   Proteger dados sensíveis

Será ponderada a ampliação da definição de «dados sensíveis» de modo a incluir, por exemplo, os dados genéticos, assim como uma maior harmonização das condições necessárias para o tratamento de dados sensíveis.

3.6.1   É preciso esclarecer a actual definição de dados sensíveis face à contínua expansão das categorias de dados electrónicos sobre as pessoas. A utilização generalizada e indiscriminada de câmaras de vigilância é um motivo de preocupação para o CESE. É essencial aplicar a legislação que limita a utilização indevida destas imagens. Os dados obtidos através do sistema GPRS relativos à localização de pessoas constituem outra questão controversa. A recolha de dados biométricos é cada vez mais frequente. A definição de dados sensíveis deve incluir estas novas tecnologias e metodologias e ter em conta novos desenvolvimentos tecnológicos. Poderá ser necessário estabelecer princípios em função dos contextos. O CESE é a favor de uma utilização adequada destas novas tecnologias.

3.6.2   Importa também prever-se uma maior protecção para os dados sensíveis, devendo a encriptação ser obrigatória para determinados dados sensíveis. Devem aplicar-se as melhores tecnologias disponíveis. Os responsáveis pelo tratamento de dados devem responder pelas falhas de segurança.

3.7   Tornar as soluções e as sanções mais eficazes

Será ponderada a possibilidade de ampliar os poderes para instaurar acções nos tribunais nacionais e a eventual inclusão de sanções penais aplicáveis aos casos de violações graves.

3.7.1   Dado o possível conflito entre a privacidade das pessoas e a exploração comercial dos seus dados e tendo em conta a importância do que está em jogo, importa que as pessoas estejam mais bem informadas sobre os fins para os quais os seus dados são recolhidos e sobre o poder de que dispõem para controlar essa informação depois de reunida. Assim, o CESE considera que uma aplicação eficaz e a possibilidade efectiva de recurso são indispensáveis para que este projecto seja verdadeiramente «global». Além disso, haverá que incluir a dimensão transfronteiriça.

3.7.2   Deve ponderar-se o recurso colectivo como solução em casos de violações graves das normas de protecção. Deve estudar-se também a possibilidade de as associações empresariais, as organizações profissionais e os sindicatos representarem as pessoas e intentarem acção judicial.

4.   Aprofundar a vertente relativa ao mercado interno

4.1   Aumentar a segurança jurídica e assegurar a igualdade de condições para os responsáveis pelo tratamento dos dados

A protecção de dados na UE tem uma forte vertente relativa ao mercado interno. Serão analisados os meios de conseguir maior harmonização das normas de protecção de dados a nível da UE.

4.1.1   O CESE receia que a margem de decisão conferida aos Estados-Membros, pela Directiva 95/46/CE tenha criado um problema de aplicação. Um regulamento poderia ter proporcionado maior segurança neste contexto. A harmonização deveria fazer-se com base num corpus de normas suficientes para satisfazer os requisitos da directiva.

4.1.2   Não existe, em todo o texto da comunicação, qualquer referência aos trabalhadores nem ao acesso aos seus dados pessoais que estão em poder das empresas. Nas empresas multinacionais, que podem centralizar os seus registos dentro, ou mesmo fora, da UE, é necessário que a nova legislação estabeleça direitos de acesso claramente definidos para os trabalhadores.

4.2   Reduzir a carga administrativa dos responsáveis pelo tratamento

Serão estudadas as diversas possibilidades de simplificação e harmonização do actual sistema de notificação, incluindo a eventual criação de um formulário de registo uniforme para toda a UE. As notificações poderiam ser publicadas na Internet.

4.2.1   O CESE apoia vigorosamente estas iniciativas.

4.3   Clarificar as normas sobre a lei aplicável e a responsabilidade dos Estados-Membros

Nem sempre é claro para os responsáveis pelo tratamento e para as autoridades de supervisão qual é o país responsável e qual a lei aplicável, se estiverem envolvidos vários Estados-Membros. A globalização e os avanços tecnológicos estão a agravar este problema. Será analisada a forma de rever e clarificar as disposições em vigor sobre a lei aplicável, no intuito de aumentar a segurança jurídica e clarificar a responsabilidade dos Estados-Membros.

4.3.1   No que respeita aos cidadãos da UE, a legislação aplicável na União Europeia deverá ser a do Estado-Membro do responsável pelo tratamento dos dados, independentemente do local onde estes estão armazenados. No que diz respeito aos intervenientes vulneráveis no intercâmbio de dados, em especial os trabalhadores e os consumidores da UE, devem ser aplicáveis as disposições e os procedimentos previstos na legislação em matéria de protecção dos dados pessoais em vigor no local de residência habitual desses trabalhadores ou consumidores.

4.4   Aumentar a responsabilidade dos responsáveis pelo tratamento de dados

A Comissão irá ponderar os modos de garantir que os responsáveis pelo tratamento de dados apliquem medidas e mecanismos adequados para assegurar o cumprimento das normas de protecção de dados. Será estudada a possibilidade de tornar obrigatória a nomeação de um responsável pela protecção de dados e de harmonizar as normas relativas às suas funções e competências, a fim de criar a obrigação de proceder a uma avaliação de impacto. A Comissão promoverá igualmente a utilização de tecnologias de protecção da privacidade (PET/ Privacy Enhancing Technologies), bem como a aplicação do princípio da «privacidade desde a concepção».

4.4.1   As PET e o princípio da privacidade desde a concepção podem eliminar a margem de discricionariedade dos responsáveis pelo tratamento de dados, que de outro modo, se podem ver perante um conflito de interesses com as prioridades comerciais das respectivas organizações. O CESE insta a Comissão a proceder a um estudo mais aprofundado destes instrumentos, e ao seu desenvolvimento pois são susceptíveis de melhorar a protecção dos dados e, ao mesmo tempo, eliminar os conflitos de interesses. O ideal seria que estes instrumentos fossem obrigatórios.

4.4.2   Para evitar possíveis dúvidas, os responsáveis pelo tratamento devem responder por todos os aspectos do tratamento dos dados sob a sua responsabilidade. Nessa conformidade, sempre que haja subcontratações e/ou operações em outros países, o contrato deve especificar claramente todas as obrigações em matéria de protecção de dados pessoais.

4.4.3   O CESE considera que cada Estado-Membro deverá criar uma entidade profissional responsável pelas qualificações e pela certificação dos responsáveis pela protecção de dados.

4.4.4   A aplicação das disposições previstas neste ponto deveria ser coerente com o objectivo de reduzir a carga administrativa dos responsáveis pelo tratamento de dados a que se faz referência no ponto 4.2.

4.5   Incentivar as iniciativas auto-reguladoras e explorar os regimes de certificação da UE

A Comissão irá analisar formas de continuar a incentivar as iniciativas de auto-regulação, como os códigos de conduta e ponderar a possibilidade de criação de regimes de certificação da UE.

4.5.1   Ver ponto 3.7.1 supra: a aplicação das disposições e a possibilidade de recurso são grandes preocupações do CESE. Estas propostas são atractivas na medida em que podem contribuir para reduzir o enorme peso da regulação que incide sobre as empresas. Deveria promover-se, em cada Estado-Membro, a elaboração de um compêndio ou guia de boas práticas.

5.   Rever as normas de protecção de dados no domínio da cooperação policial e judiciária em matéria penal

O instrumento da UE para a protecção de dados pessoais tratados no quadro da cooperação policial e judiciária em matéria penal é a Decisão-Quadro 2008/977/JAI. Esta Decisão-Quadro apresenta muitas lacunas que podem afectar as possibilidades de exercício dos direitos de protecção de dados das pessoas em questões como, por exemplo, ter conhecimento de quais os dados pessoais tratados e objecto de troca, por quem e para que fins, e das formas de exercício dos respectivos direitos, nomeadamente o direito de aceder aos seus dados pessoais.

Será ponderada a extensão da aplicação das normas gerais de protecção de dados ao domínio da cooperação policial e judiciária em matéria penal, a introdução de novas disposições em domínios como o tratamento de dados genéticos, o lançamento de uma consulta sobre a revisão dos sistemas de supervisão neste domínio e a avaliação da necessidade de harmonizar, a longo prazo, as diversas normas sectoriais no novo quadro normativo geral da protecção de dados.

5.1   Embora reconhecendo que a cooperação policial entre Estados é uma questão delicada, o CESE considera essencial que os direitos fundamentais, incluindo a protecção dos dados pessoais, sejam sempre objecto do máximo cuidado. Teme que as preocupações em matéria de segurança, mesmo que mal fundamentadas, sejam muitas vezes causa de atropelos aos direitos fundamentais. Os cidadãos devem dispor de melhor informação sobre os métodos utilizados pelas autoridades para recolherem dados pessoais a partir de facturas de telefone, contas bancárias, controlos aeroportuários, etc., e os fins para os quais os utilizam.

6.   A dimensão mundial da protecção de dados

6.1   Clarificar e simplificar as normas aplicáveis às transferências internacionais de dados

A Comissão tenciona analisar as formas de:

melhorar e racionalizar os procedimentos em vigor para as transferências internacionais de dados, a fim de garantir uma abordagem mais uniforme e coerente da UE face a países terceiros e a organizações internacionais,

definir melhor os critérios e requisitos para proceder à avaliação do nível de protecção de dados em países terceiros ou organizações internacionais,

definir os elementos fundamentais da protecção de dados na UE que poderiam ser utilizados nos acordos internacionais.

6.1.1   O CESE apoia estas iniciativas louváveis e espera que a Comissão consiga obter o amplo acordo internacional sem o qual estas propostas poderão perder eficácia.

6.2   Promover princípios universais

A União Europeia deverá continuar a ser a força motriz do desenvolvimento e da promoção de normas jurídicas e técnicas internacionais em matéria de protecção de dados. Para este efeito, a Comissão trabalhará activamente no domínio das normas internacionais, em cooperação com países terceiros e organizações internacionais, como a OCDE.

6.2.1   O CESE manifesta o seu apoio também neste ponto. Dada a natureza global da Internet, é vital que as normas e orientações sejam compatíveis entre continentes. Os dados pessoais têm de ser protegidos além-fronteiras. O Comité assinala que já existem orientações da OCDE, para além da Convenção 108 do Conselho da Europa, que está actualmente a ser revista. A Comissão deverá assegurar a compatibilidade da nova directiva com essa convenção.

7.   Um quadro institucional mais forte para uma melhor aplicação das normas de protecção de dados

A Comissão irá analisar:

as formas de reforçar, clarificar e harmonizar o estatuto e os poderes das autoridades nacionais de protecção de dados;

as formas de melhorar a cooperação e a coordenação entre autoridades de protecção de dados;

a forma de garantir uma aplicação coerente das normas de protecção de dados da UE no mercado interno. As medidas poderão visar, nomeadamente:

reforçar o papel das autoridades nacionais de protecção de dados;

coordenar melhor o seu trabalho através do Grupo de Trabalho do Artigo 29.o;

criar um mecanismo que garanta a coerência sob a autoridade da Comissão Europeia.

7.1   Dada a sua preocupação com a aplicação das disposições e a possibilidade de recursos, o CESE considera estas propostas fundamentais. Subscreve os conceitos de «reforçar, clarificar e harmonizar» e de «cooperação e coordenação» e apoia o propósito geral da Comissão de garantir uma aplicação mais coerente das normas da UE em matéria de protecção de dados em todos os Estados-Membros. Preocupa-o, no entanto, o facto de, possivelmente, nem todos os 12 novos Estados-Membros terem ainda concluído a plena e efectiva transposição da Directiva 95/46/CE.

7.2   Na opinião do CESE, as autoridades nacionais de protecção de dados carecem em geral de eficácia e estão sobrecarregadas de trabalho, sendo necessário reforçar a sua independência. Qualquer nova directiva deverá prever que as autoridades nacionais disponham do estatuto, da autoridade e dos recursos necessários para levar a cabo a sua tarefa. As suas tarefas e as directivas relativas à respectiva dotação em recursos deverão ser definidas a nível da UE. e deverá ser ponderada a criação de uma autoridade europeia para a protecção de dados com competências para actuar em toda a União.

7.3   Com base nos contributos que deu até à data para a protecção das pessoas no que se refere ao tratamento dos seus dados pessoais, o CESE considera que o Grupo de Trabalho do Artigo 29.o tem uma valiosa função a cumprir.

Bruxelas, 16 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


ANEXO

Ao parecer do Comité Económico e Social Europeu

As propostas de alteração foram rejeitadas pela Assembleia em plenária, tendo recolhido, contudo, pelo menos um quarto dos sufrágios expressos.

Ponto 1.6

«No que respeita aos cidadãos e aos trabalhadores da UE, a legislação aplicável na União Europeia deverá ser a do Estado-Membro do responsável pelo tratamento dos dados, independentemente do local onde estes estão armazenados.»

Ponto 4.3.1

«No que respeita aos cidadãos e aos trabalhadores da UE, a legislação aplicável na União Europeia deverá ser a do Estado-Membro do responsável pelo tratamento dos dados, independentemente do local onde estes estão armazenados.»

Resultado da votação

Votos a favor

:

86 (para alterar estes pontos)

Votos contra

:

72

Abstenções

:

19


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/130


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre a Plataforma Europeia contra a Pobreza e a Exclusão Social: um quadro europeu para a coesão social e territorial»

[COM(2010) 758 final]

2011/C 248/22

Relatora: Maureen O'NEILL

Em 16 de Dezembro de 2010, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre:

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões «Plataforma Europeia contra a Pobreza e a Exclusão Social: Um quadro europeu para a coesão social e territorial»

COM(2010) 758 final.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania que emitiu parecer em 27 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária, realizada em 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 147 votos a favor, 1 contra e 2 abstenções, o seguinte parecer:

O parecer do CESE sobre A Plataforma Europeia contra a Pobreza e a Exclusão Social enquadra-se na Estratégia Europa 2020 para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo. O parecer realça a nova abordagem global, que está estreitamente ligada às outras iniciativas emblemáticas e aos cinco objectivos principais definidos para a UE. Salienta igualmente a necessidade de haver coerência entre as políticas ao nível nacional e ao nível da UE, bem como o envolvimento e o papel fundamental dos intervenientes não governamentais (1).

1.   Recomendações

O CESE formula as seguintes recomendações:

Representando a pobreza uma violação dos direitos humanos, a responsabilidade pela sua erradicação terá de ser partilhada entre os governos, os parceiros sociais e a sociedade civil;

Deve haver uma coerência política entre as medidas económicas, financeiras, de apoio ao emprego e sociais da Estratégia Europa 2020 e todas elas devem contribuir para a coesão social;

As medidas de austeridade não devem agravar o risco de pobreza, sendo necessário avaliar eficazmente e debater o impacto social;

A execução da estratégia de inclusão activa deve configurar uma abordagem integrada destinada a assegurar um apoio adequado ao rendimento, um mercado de trabalho inclusivo e acesso a trabalho e serviços de qualidade;

Deve ser colocada uma maior tónica na redução das desigualdades e no cumprimento dos direitos fundamentais, incluindo através de uma repartição mais justa do rendimento e da aplicação das cláusulas sociais horizontais inscritas no Tratado de Lisboa;

Deve ser dada uma ênfase acrescida ao investimento no capital humano através da aprendizagem ao longo da vida nos planos do ensino e da formação, incluindo o aperfeiçoamento da formação especializada orientada para as necessidades do mercado de trabalho, e não só;

A participação na Plataforma de intervenientes da sociedade civil, incluindo pessoas com experiência no domínio do combate à pobreza, ONG e parceiros sociais, deve ser reforçada por meio de um diálogo estruturado aos níveis europeu e nacional e apoiada através de financiamento adequado da UE. O CESE deve ter um papel activo e colaborar tanto nesse diálogo como na Convenção Anual;

É necessário aumentar o financiamento atribuído pela UE à redução da pobreza, em particular os Fundos Estruturais, colocando a tónica na simplificação dos procedimentos, no aumento da transparência e na monitorização do cumprimento dos objectivos estabelecidos;

É necessário reforçar a necessidade da aplicação do método aberto de coordenação, que inclui o desenvolvimento de estratégias nacionais de protecção social e de inclusão social e de planos de acção a nível nacional e local. Há que clarificar a sua ligação à iniciativa emblemática contra a pobreza.

2.   Antecedentes

«Considera-se que as pessoas vivem em situação de pobreza quando os respectivos rendimentos e recursos são de tal forma inadequados que as excluem de ter um nível de vida considerado aceitável na sociedade em que vivem. Em virtude da sua pobreza, podem ainda sofrer de várias desvantagens como desemprego, baixos rendimentos, fracas condições de habitação, cuidados de saúde insuficientes e obstáculos à aprendizagem ao longo da vida, à cultura, ao desporto e a actividades recreativas. São muitas vezes excluídas e marginalizadas da participação em actividades (económicas, sociais e culturais) que são habituais para outras pessoas, podendo o seu acesso aos direitos fundamentais ser restringido» (2).

2.1   Mais de 80 milhões de pessoas vivem na UE abaixo do limiar da pobreza (3), das quais mais de 50 % são mulheres e 20 milhões são crianças. Embora seja importante dispor de dados estatísticos sobre a pobreza material, é também importante reconhecer a existência de uma pobreza intelectual, como, por exemplo, a iliteracia. Os mais atingidos pela actual crise económica foram pessoas mais vulneráveis e desfavorecidas das nossas sociedades.

2.2   A Comissão Europeia inscreveu o objectivo de redução da pobreza no centro do seu programa económico, laboral e social – a Estratégia Europa 2020 (4). Os chefes de Estado e de Governo chegaram a um acordo político sobre o objectivo comum de tirar, no mínimo, 20 milhões de pessoas de situações de pobreza e de exclusão social na próxima década. A iniciativa emblemática da Plataforma contra a Pobreza é parte integrante da estratégia, juntamente com a Orientação 10, que servirá de base à contribuição dos Estados-Membros na luta contra a pobreza e a exclusão social no quadro dos programas nacionais de reformas.

2.3   O Ano Europeu de Combate à Pobreza e à Exclusão Social pôs em evidência a complexidade e a pluridimensionalidade da luta contra a pobreza, bem como a urgência de tomar as medidas de combate à pobreza no contexto da crise económica e das medidas de austeridade.

2.4   Os jovens, os migrantes e os trabalhadores pouco qualificados deparam-se com um desemprego cada vez maior. Os «trabalhadores pobres», ou seja, pessoas com trabalho, mas sem rendimento suficiente para fazer face às suas necessidades diárias, bem como os idosos e as famílias que vivem com um rendimento reduzido, enfrentam situações de privação material crescente que afectam 8 % dos europeus, podendo esta percentagem chegar aos 30 % da população de alguns Estados-Membros (5).

2.5   O Conselho Europeu decidiu basear a meta global de redução da pobreza no âmbito da Estratégia Europa 2020 em três indicadores: a taxa de risco de pobreza, o índice de privação material e a percentagem de pessoas em agregados familiares sem emprego. As metas de redução da pobreza devem articular-se com as prioridades locais e regionais.

3.   A Plataforma contra a Pobreza e a Exclusão Social

3.1   A Plataforma proposta é uma das sete iniciativas emblemáticas que integram a Estratégia Europa 2020, que consagra três prioridades, tendentes à consecução de elevados níveis de emprego, produtividade e coesão social:

Crescimento inteligente;

Crescimento sustentável;

Crescimento inclusivo.

3.2   A Plataforma visa forjar um compromisso comum entre os Estados-Membros, as instituições europeias e os principais intervenientes no sentido de combaterem a pobreza e a exclusão social, mediante o estabelecimento de um «quadro de acção dinâmico» para que a coesão social e territorial permita assegurar uma distribuição mais equitativa do emprego, do crescimento e da inclusão social por toda a UE.

3.3   Para esse fim, a Comissão identificou as seguintes áreas de acção:

Acções em todo o espectro de intervenção política;

Utilização mais intensa e eficaz dos Fundos da UE em apoio da coesão social;

Promoção de acções de inovação social baseada em dados concretos;

Trabalho em parceria e aproveitamento das potencialidades da economia social;

Coordenação política reforçada entre os Estados-Membros.

4.   Observações na generalidade

4.1   A pobreza constitui uma realidade inaceitável na Europa do século XXI e uma violação dos direitos humanos. O CESE saúda o compromisso de reduzir a pobreza e o objectivo de tirar dessa situação, pelo menos, 20 milhões de pessoas (6), a par da criação da Plataforma e das medidas de redução da pobreza, muitas das quais vêm ao encontro de anteriores pareceres do CESE, mas reclama acções mais concretas para actuar sobre as causas, e não apenas sobre os efeitos da pobreza, e para aplicar os direitos humanos.

4.2   Há uma falta de coerência entre as políticas económicas, financeiras e sociais da UE e as realidades vigentes a nível dos Estados-Membros. O CESE salienta a importância de se adoptar uma abordagem coerente e integrada e considera que as políticas da UE em matéria de governação económica, crescimento e emprego no contexto da crise não deverão agravar o risco de pobreza. O CESE considera que se deve proceder a uma avaliação eficaz do impacto social destas medidas e debater convenientemente os resultados da mesma.

4.3   Durante a elaboração do parecer, o CESE teve em conta os outros efeitos da pobreza: a pobreza faz aumentar a emigração por motivos económicos e sociais e prejudica, a nível dos vários Estados-Membros, a amortização do investimento em recursos humanos. As pessoas pobres, que têm pouca capacidade para defender os seus interesses, poderão ver-se numa situação ainda mais desfavorável se as reformas económicas, fiscais, sociais, da saúde e da educação destinadas a reduzir a despesa do Estado não levarem em conta a protecção das pessoas pobres. O aumento do número de pessoas que passou a viver abaixo do limiar de pobreza deverá tornar ainda mais urgente a necessidade de redistribuir os fundos públicos.

5.   Observações na especialidade

5.1   Protecção social

5.1.1   O CESE reconhece a importância das medidas tendentes a incrementar o emprego e a criar postos de trabalho, mas destaca quão crucial é não reduzir os apoios sociais ou exercer pressão no sentido da baixa dos salários – o que afecta os mais pobres de forma desproporcionada -, mas sim reforçar a protecção social.

5.1.2   Os sistemas de protecção social reduzem o risco de pobreza em um terço (7), para além de serem cruciais para garantir os direitos humanos. Actuam como estabilizadores económicos automáticos que mitigam a pobreza e promovem a coesão económica e social e o crescimento, e determinantes para assegurar o apoio da opinião pública ao projecto europeu (8).

5.1.3   O CESE comunga da preocupação da Comissão de garantir a sustentabilidade dos regimes de protecção social e de pensões dos Estados-Membros para assegurar a disponibilidade de um rendimento adequado ao longo da vida, incluindo na velhice (9).

5.2   Estratégias de inclusão activa

5.2.1   Urge privilegiar de forma contínua e coordenada uma estratégia integrada de inclusão activa que contemple os três pilares (mercado de trabalho inclusivo, acesso a serviços de qualidade e apoio adequado ao rendimento) (10) para enfrentar os entraves colocados às vítimas da pobreza.

5.2.2   O CESE concorda que a ênfase seja mais colocada na prevenção e na erradicação através de um crescimento sustentável para combater à pobreza. A conjugação da criação de emprego de qualidade e de sistemas de protecção social modernos e eficazes com uma abordagem das desigualdades de rendimento, distribuição de riqueza e acesso aos serviços é essencial. O relatório anual da Comissão sobre os progressos alcançados (2011) salienta o facto de que «o crescimento só pode ser sustentável se as suas vantagens beneficiarem todas as componentes da sociedade» e que «o crescimento e a coesão social caminham a par» (11).

5.2.3   Pese embora a importância decisiva de que a introdução de políticas a nível comunitário se reveste, o papel dos Estados-Membros e em particular dos órgãos de poder regional e local, deve ser reforçado, para que haja lugar a um processo de mudança efectivo. O CESE gostaria de colaborar com o Comité das Regiões nessa matéria.

5.2.4   O CESE destaca o papel determinante que deve caber tanto aos parceiros sociais como às organizações do sector da economia social, incluindo as cooperativas, no desenvolvimento de um mercado de trabalho inclusivo e na promoção de uma repartição mais justa do rendimento, como contribuição fundamental para a aplicação da Estratégia Europa 2020.

5.2.5   O CESE apela a que se dê mais ênfase à criação de emprego sustentável de qualidade e à adopção de medidas para combater o fenómeno da pobreza no trabalho – incluindo a garantia de um nível mínimo de remuneração -, as boas condições de trabalho e à neutralização dos principais factores de risco de pobreza na transição de situações de dependência de prestações sociais para o mundo do trabalho.

5.2.6   Urge empreender acções específicas, no quadro de uma estratégia da UE de inclusão activa (12), com vista à criação de um mercado de trabalho inclusivo para eliminar as barreiras ao acesso de determinados grupos concretos, nomeadamente jovens e idosos, minorias étnicas (incluindo os Romes), migrantes, mulheres, famílias monoparentais e pessoas com deficiência (13).

5.2.7   O CESE realça a importância do trabalho legal para todos e manifesta se preocupado com o impacto que o trabalho clandestino e a fuga e evasão fiscais têm no financiamento sustentável dos sistemas de protecção social, bem como no emprego e nos direitos sociais. É necessário assegurar uma acção integrada a nível europeu, incluindo um conjunto de sanções e controlos eficazes, bem como criar incentivos ao trabalho legal.

5.2.8   O CESE reclama a elaboração de um programa detalhado para a execução das estratégias de inclusão activa a nível local, e exprime o seu acordo por o Parlamento Europeu ter instado a Comissão a estudar o impacto de uma proposta legislativa que introduza um rendimento mínimo adequado de, no mínimo, 60 % do rendimento mediano nacional.

5.2.9   O CESE reclama que se proceda à compilação de dados comparáveis e indicadores aperfeiçoados capazes de reflectirem os benefícios sociais e económicos da erradicação da pobreza, bem como os custos da inacção.

5.3   Envolvimento dos intervenientes

5.3.1   O CESE considera essencial envolver os intervenientes relevantes num diálogo estruturado regular, aos níveis europeu e nacional, com o objectivo de encontrar soluções eficazes e monitorizar a implementação do programa da Plataforma.

5.3.2   O CESE acolhe favoravelmente a proposta da Comissão de trabalhar com as instituições da UE, pessoas em situação de pobreza, ONG, organizações do sector da economia social, parceiros sociais e outros agentes da sociedade civil no âmbito de uma Convenção Anual para apresentação dos progressos alcançados, como parte do atrás referido diálogo estruturado aos níveis europeu e nacional. Este exercício deve incluir a avaliação do impacto social da análise anual do crescimento e dos progressos alcançados.

5.3.3   O CESE gostaria de ver reforçado o papel do Parlamento Europeu na execução do programa da Plataforma nos Estados-Membros. Esta posição enquadra-se nas propostas emanadas da Ágora dos Cidadãos, do Parlamento Europeu.

5.3.4   O CESE apoia vigorosamente a elaboração, no quadro da iniciativa emblemática da Plataforma, de orientações voluntárias sobre o envolvimento das partes interessadas a nível da UE e dos programas nacionais de reformas.

5.3.5   O CESE deve participar activamente na prossecução dos objectivos da Plataforma e ter um papel essencial na concertação dos interesses dos parceiros sociais e das organizações da sociedade civil. Tal papel pode incluir:

Organizar uma audição anual para reflexão sobre os progressos alcançados no sentido de concretizar o objectivo de redução da pobreza;

Contribuir para a avaliação intercalar, planeada para 2014, no contexto da Estratégia Europa 2020;

Contribuir para a Convenção Anual;

Participar no diálogo regular com outros intervenientes, incluindo o Comité das Regiões, os CES nacionais, e elaborar pareceres sobre as principais prioridades.

5.4   Combater as desigualdades

5.4.1   O CESE saúda a ênfase colocada na acção da Plataforma em matéria de combate à discriminação, igualdade e integração, tendo em vista assegurar a inclusão das pessoas com deficiência ou com problemas psíquicos, dos jovens, dos idosos, dos migrantes e das minorias étnicas, incluindo os Romes, e promover a igualdade entre os géneros (14). O CESE salienta a necessidade de se introduzir uma referência transversal aos direitos humanos fundamentais e incluir propostas concretas para a efectiva implementação das cláusulas sociais horizontais estabelecidas nos artigos 5.o, 8.o, 9.o e 10.o do TFUE.

5.4.2   O CESE apoia a prioridade atribuída ao combate aos problemas dos sem-abrigo e da privação de habitação, da penúria energética e da exclusão financeira. O CESE realça a importância de promover o acesso a preços comportáveis a serviços de qualidade, incluindo o acesso às TI. A acção nessas áreas deve ser desenvolvida também através de estratégias nacionais de protecção e inclusão sociais, no contexto de um MAC social reforçado.

5.4.3   O CESE vinca a necessidade do investimento no capital humano e frisa a relevância da educação e da formação para efeitos de qualificação profissional, desenvolvimento pessoal e inclusão social. Esta abordagem deve abarcar os primeiros anos de vida, a escolarização, a educação permanente e a formação profissional e contínua, como parte de uma política de promoção da universalização da aprendizagem ao longo da vida.

5.4.4   Os relatórios da OCDE e da Comissão realçam o agravamento das desigualdades na distribuição do rendimento e da riqueza, bem como no acesso aos serviços, incluindo os de prestação de cuidados de saúde, tanto no interior dos Estados-Membros como entre os diferentes Estados-Membros. Além disso, a pobreza é uma das grandes determinantes sociais da doença e a política da UE deveria ter uma obrigação moral de salvar vidas. Os elementos de facto disponíveis indicam, de forma iniludível, que as sociedades mais igualitárias apresentam, quase invariavelmente, um melhor desempenho na área da saúde. A Plataforma deve dar prioridade ao desenvolvimento de estratégias integradas e de medidas concretas destinadas a reduzir os actuais fossos no sentido de criar uma sociedade mais justa (15).

5.4.5   O CESE apoia a proposta da Comissão que visa a elaboração de uma recomendação sobre pobreza infantil de âmbito alargado que contribua para «prevenir e combater» este fenómeno por meio de um apoio adequado ao rendimento das famílias, do investimento na prestação de cuidados e na educação, em particular durante os primeiros anos de vida, e da capacitação das crianças à luz dos direitos fundamentais, com especial realce para a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança. Esta orientação deve ser articulada com uma abordagem coerente em matéria de política da família. Devem ser estabelecidos mecanismos de acompanhamento contínuo, intercâmbio, investigação e revisão interpares destinados a contribuírem para a consecução do objectivo de redução da pobreza no âmbito da Estratégia Europa 2020 (16).

5.5   Tirar partido dos Fundos da UE para cumprir os objectivos de inclusão social e de coesão social

5.5.1   O CESE saúda calorosamente as propostas que visam uma utilização mais eficaz dos Fundos Estruturais para reduzir a pobreza e promover a coesão social, mas salienta a necessidade de se aumentar o montante disponível para o efeito, em particular para as comunidades desfavorecidas. É fundamental investir na criação de empregos de qualidade e em abordagens eficazes em matéria de apoio a grupos excluídos, incluindo por meio do sector da economia social. O financiamento deverá ser planeado de forma a também permitir um melhor acesso a serviços de qualidade, incluindo habitação.

5.5.2   O CESE saúda as propostas de simplificação do acesso aos Fundos Estruturais por parte de organizações de âmbito local, particularmente pela via da concessão de subvenções globais, da assistência técnica e da criação de capacidades. Reputa, porém, necessário:

Reduzir a burocracia tornando os procedimentos de acesso ao financiamento mais flexíveis;

Definir normas mínimas europeias para aumentar a transparência e a eficácia dos procedimentos, incluindo informação simplificada (17).

A Comissão deve facultar orientação, promover a aprendizagem mútua, monitorizar o cumprimento dos objectivos fixados e, sobretudo, tirar ensinamentos da utilização dos Fundos Estruturais durante a crise.

5.5.3   O CESE propõe que os programas da UE, como o Progress, sejam utilizados para financiar o desenvolvimento das plataformas nacionais, de modo a permitir o envolvimento eficaz dos intervenientes na Plataforma Europeia e contribuir para uma melhor concretização das suas prioridades.

5.6   Inovação social e reformas

5.6.1   O CESE saúda o reconhecimento do papel do sector social da economia e das ONG na aplicação das estratégias de combate à pobreza, fomento da criação de emprego, e desenvolvimento de serviços que respondam de forma criativa às necessidades da comunidade. Salienta igualmente que o desenvolvimento de soluções eficazes é da responsabilidade partilhada entre todos os intervenientes, incluindo as PME e os empresários.

5.6.2   O voluntariado é muito importante em matéria de desenvolvimento de comunidades, aquisição de competências, educação informal e não formal, e responsabilização e capacitação das pessoas. O CESE considera importante promover os benefícios do voluntariado, contanto que este não mine o emprego remunerado ou os serviços públicos.

5.6.3   O CESE saúda o apoio acrescido à inovação social baseada em dados concretos, mas frisa a importância da preservação e do desenvolvimento das boas práticas já estabelecidas, e apela a um financiamento sustentado.

5.7   Coordenação política reforçada

5.7.1   Os planos nacionais de reformas e a adopção de metas nacionais são elementos-chave no lançamento da Estratégia Europa 2020 e na concretização de políticas de redução da pobreza. É, porém, vital que esse processo recorra a um método aberto de coordenação reforçado nas áreas sociais, baseado em estratégias nacionais integradas, que lhe assegure uma base mais sólida para a consecução dos objectivos sociais fixados, sendo necessário clarificar a sua ligação com a Plataforma Europeia contra a Pobreza.

5.7.2   No seu parecer sobre o MAC e a Cláusula Social, o CESE saudou a cláusula social horizontal, a avaliação de impacto social e um MAC social reforçado, como instrumentos para assegurar a prossecução de uma abordagem integrada e a integração dos objectivos sociais. O CESE apela a que se confira mais visibilidade e transparência a esse processo, mediante o envolvimento das instituições da UE e das restantes partes interessadas, e salienta a importância do desenvolvimento de estratégias de protecção social e inclusão social aos níveis europeu, nacional, regional e local.

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Esta frase foi aditada no seguimento de uma recomendação do Comité de Pilotagem para a Estratégia Europa 2020.

(2)  (Relatório conjunto da Comissão Europeia e do Conselho Europeu sobre a coesão social, Março de 2004).

(3)  O limiar de pobreza corresponde a 60 % da mediana da distribuição dos rendimentos monetários equivalentes nacional, após deduzidas as transferências sociais específicas de cada Estado-Membro.

(4)  Actualização de 2010 do relatório conjunto do Comité de Protecção Social (CPS) e da Comissão Europeia sobre o impacto social da crise económica e as respostas políticas a essa mesma crise (Novembro de 2010). COM(2010) 2020 – Europa 2020 – Estratégia para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo.

(5)  Considera-se que as pessoas sofrem de privação material se são afectadas pelo menos por quatro de nove carências. As pessoas não podem pagar a renda ou as contas dos serviços de utilidade pública; manter as suas casas devidamente aquecidas; fazer face a despesas inesperadas; comer peixe, carne ou proteínas equivalentes de dois em dois dias; pagar uma semana de férias fora de casa uma vez por ano; ter um carro; ter uma máquina de lavar roupa; ter uma televisão a cores, ou um telefone.

(6)  Ver a Declaração do CESE ao Conselho Europeu, de 17 de Junho de 2010.

(7)  Relatório de avaliação da dimensão social da Estratégia Europa 2020 (Fevereiro de 2011) do CPS.

(8)  JO C 136/26 de 3.5.2011.

(9)  JO C 84/38 de 17.3.2011.

(10)  Recomendação da Comissão sobre a inclusão activa das pessoas excluídas do mercado de trabalho (2008.867/CE).

(11)  Ver ponto 2.5 do Relatório sobre os progressos alcançados na aplicação da Estratégia Europa 2020, Anexo I - Análise anual do crescimento (COM (2011) 11).

(12)  ETUC/Business Europe e outros: Acordo-quadro para mercados de trabalho inclusivos (Março de 2010).

(13)  JO C 21/66 de 21.1.2011.

(14)  Ver a mensagem do CESE ao Conselho Europeu de Junho de 2010, em que se realça a importância da adopção de uma política de resposta às desigualdades e luta contra a discriminação.

(15)  OECD (2008): Growing unequal: income distribution and poverty in OECD countries. DG Investigação da Comissão Europeia, 2010 Why socio-economic inequalities increase: facts and policy papers in Europe EUR 24 471 [Por que motivo cresce a desigualdade socioeconómica: factos e documentos de orientação na Europa].

(16)  JO C 44/34 de 11.2.2011.

(17)  JO C 132/8 de 3.5.2011.


25.8.2011   

PT

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C 248/135


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Comunicação sobre a migração»

[COM(2011) 248 final]

2011/C 248/23

Relator-Geral: Luis Miguel PARIZA CASTAÑOS

Em 4 de Maio de 2011, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Comunicação sobre a migração

COM(2011) 248 final.

Em 14 de Junho de 2011, a Mesa do Comité Económico e Social Europeu incumbiu a Secção Especializada de Emprego, Assuntos Sociais e Cidadania da preparação dos correspondentes trabalhos.

Dada a urgência dos trabalhos, na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu designou Luis Miguel PARIZA CASTAÑOS para relator-geral e aprovou por 109 votos a favor, 2 votos contra e 6 abstenções, o presente parecer.

1.   Introdução

1.1   Na sua reunião de Junho, o Conselho Europeu prevê debater alguns aspectos da política comum de imigração. O Presidente Van Rompuy propôs centrar os trabalhos no seguinte:

a livre circulação das pessoas no interior da UE,

as regras relativas ao asilo,

o desenvolvimento de uma parceria com os países da margem Sul do Mediterrâneo e o controlo das fronteiras externas.

1.2   Em 4 de Maio, a Comissão Europeia publicou a Comunicação sobre a migração (1), como contributo para a reunião do Conselho.

2.   Observações na generalidade

2.1   Através de vários pareceres (ver anexo), o CESE colaborou com as outras instituições para que a UE tivesse uma política e uma legislação comum em matéria de asilo e imigração. Mas, apesar dos progressos realizados, a situação não é satisfatória. O processo de adopção, pelo Conselho e pelo Parlamento, de uma legislação comum sobre a admissão de imigrantes e o acolhimento das pessoas que necessitam de protecção internacional, é muito laborioso.

2.2   A política comum de imigração deve ter uma perspectiva global que tenha em conta diversos factores como a situação demográfica e os mercados de trabalho, o respeito dos direitos humanos, a igualdade de tratamento e a não discriminação, a legislação sobre a admissão de novos imigrantes, o acolhimento e a protecção dos requerentes de asilo, a luta contra as redes criminosas do tráfico ilegal de seres humanos, a colaboração com os países terceiros, a solidariedade europeia, a política social e a integração.

2.3   Durante os últimos meses, houve acontecimentos, foram proferidas declarações e adoptadas decisões políticas que o Comité observa com grande preocupação. A xenofobia e o nacionalismo redutor, estas velhas doenças bem conhecidas dos europeus, estão a ganhar terreno no nosso território e as minorias e os imigrantes são vítimas de inibições de direitos, de insultos e de políticas agressivas e discriminatórias.

2.4   No passado, a xenofobia e o populismo eram promovidos por sectores políticos extremistas mas minoritários. Mas actualmente, essas políticas fazem parte da ordem do dia e dos programas de vários governos europeus, que utilizam as políticas contra os imigrantes e contra as minorias como arma eleitoral. O CESE espera que o Conselho Europeu de Junho evite que a agenda europeia seja contaminada pela xenofobia e pelo populismo.

2.5   Nas últimas semanas, fomos testemunhas de situações inaceitáveis, enquanto que o aumento moderado do afluxo de imigrantes na região do Mediterrâneo provocou uma grave crise política na Europa. Noutros tempos, porém, perante a chegada de muitas mais pessoas que fugiam da guerra e da miséria, a Europa adoptou uma posição solidária, garantindo a protecção dos direitos humanos e reforçando os valores da integração europeia.

2.6   A criação do Espaço Schengen é para o Comité e para a maior parte dos cidadãos europeus um dos avanços mais notáveis da integração europeia. Porém, alguns Estados-Membros estão a introduzir controlos nas fronteiras internas da UE que são não conformes com o Tratado.

2.7   O CESE está alarmado com o facto de uma pequena crise migratória de pessoas que necessitam de protecção estar a pôr à prova a solidez dos valores de alguns governos e da própria UE.

2.8   O Comité pretende lançar um apelo à moderação dos discursos políticos e ao restabelecimento do equilíbrio e do respeito dos princípios da democracia e das sociedades livres e abertas. Os governos europeus devem recordar que a integração dos imigrantes é um processo bidireccional que também supõe compromissos por parte das sociedades de acolhimento europeias e que deve ser de cariz integrador. Ora uma sociedade que aceita que os seus dirigentes políticos utilizem o populismo e a xenofobia contra os imigrantes e as minorias nas campanhas eleitorais e nas decisões políticas não adopta uma perspectiva de integração.

2.9   A Europa precisa de uma visão a médio e a longo prazo. A Presidência belga da UE solicitou ao CESE que elaborasse um parecer exploratório (2) sobre o papel da imigração no contexto demográfico da Europa. As conclusões deste parecer são claras: durante os próximos anos, está previsto um aumento da mobilidade dos trabalhadores dentro da UE e também se prevê que aumente a imigração de trabalhadores e respectivas famílias provenientes de países terceiros. Este cenário aponta para novos desafios em termos de gestão de mais diversidade nas empresas e nas cidades. O Comité solicita à Comissão que apresente sem tardar a nova Agenda Europeia para a Integração, tendo em conta os trabalhos do Fórum Europeu para a Integração.

2.10   Os recentes acontecimentos ocorridos no Sul do Mediterrâneo, bem como os debates e os conflitos no interior da UE, constituem uma oportunidade para reforçar os valores e os princípios da UE e as normas comuns existentes e para garantir «mais Europa» nas políticas europeias em matéria de fronteiras, livre circulação, asilo e imigração.

3.   Observações na especialidade

3.1   Livre circulação das pessoas – Fronteiras internas

3.1.1   O CESE considera que a livre circulação das pessoas constitui um princípio e um direito fundamental no processo de integração europeia, bem como um dos pilares fundamentais do espaço de liberdade, segurança e justiça. O CESE concorda com a Comissão sobre a necessidade de desenvolver um sistema mais claro e mais sólido para a governação de Schengen mediante um sistema europeu independente e objectivo de avaliação da aplicação do Código das Fronteiras pelos Estados-Membros. Este sistema deveria ser orientado e coordenado pela Comissão e contar com o contributo de peritos externos.

3.1.2   Os Estados-Membros devem respeitar as obrigações que lhes são impostas pelo Código das Fronteiras quando reintroduzem controlos temporários nas fronteiras internas nos casos excepcionais em que as considerações de ordem pública exigem uma acção imediata, em particular o dever de informar previamente a Comissão, bem como o respeito das garantias processuais (exposição de motivos) previstos no Código e dos princípios de proporcionalidade, solidariedade e confiança mútua.

3.1.3   O Comité aceita que se crie um mecanismo a nível europeu que permita a reintrodução coordenada de controlos nas fronteiras internas em «situações verdadeiramente críticas» ou quando as fronteiras externas estejam submetidas a fortes pressões migratórias inesperadas. A negociação deste mecanismo no Conselho não deveria dar a possibilidade aos governos de renegociar e/ou de modificar pela negativa as garantias processuais comuns previstas pelo Código Schengen.

3.1.4   O CESE apoia a proposta do Parlamento Europeu para que a Comissão elabore um novo mecanismo de infracção (mecanismo de detecção precoce das possíveis violações dos direitos e das liberdades fundamentais na UE), cuja principal função seria suspender as medidas adoptadas pelos Estados-Membros no quadro do Direito da União e que violem os direitos fundamentais e as liberdades das pessoas, enquanto que se determina a legalidade destas medidas através de um procedimento acelerado no Tribunal de Justiça sediado no Luxemburgo (3).

3.2   Fronteiras externas

3.2.1   A União Europeia necessita de uma política de fronteiras externas credível, efectiva, legítima e sujeita a fortes controlos democráticos e a avaliações independentes. O Comité exorta o Conselho e o Parlamento Europeu a estabelecerem um acordo sobre a proposta da Comissão de Fevereiro de 2010 no sentido de reforçar o regulamento da Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras Externas dos Estados-Membros da União Europeia (FRONTEX).

3.2.2   O CESE considera que os Estados-Membros devem reforçar as competências operacionais e a autonomia do sistema FRONTEX em termos de actividades e de recursos (equipamento técnico). Todavia, a realização de operações conjuntas coordenadas pela Agência e as suas repercussões nos direitos fundamentais e garantias administrativas previstos no Código das Fronteiras devem ser objecto de um controlo democrático por parte do Parlamento e da Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia (FRA). Isto deveria ser acompanhado de uma avaliação permanente, especialmente das actividades e dos acordos da FRONTEX com países terceiros, da eficácia das operações conjuntas e da qualidade das suas análises de risco.

3.2.3   O CESE considera essencial que a FRONTEX cumpra as suas obrigações em termos de acesso à protecção internacional e respeite, por exemplo, o princípio da não expulsão, o controlo independente do respeito dos direitos fundamentais e a elaboração de um código de conduta ético nos casos de regressos forçados.

3.2.4   O Comité também é favorável à criação de um serviço europeu de guarda de fronteiras, que seria composto por um contingente europeu que, no futuro, constituiria uma administração europeia centralizada. A sua principal função seria a aplicação das regras comuns previstas no Código das Fronteiras.

3.3   Imigração laboral

3.3.1   A UE deve encorajar a elaboração de uma política comum sobre imigração legal e favorecer a mobilidade e o tratamento equitativo dos cidadãos de países terceiros que chegam à Europa em busca de emprego. Em vários Estados-Membros e, em particular, em certos sectores e categorias profissionais, as empresas precisam de contratar novos trabalhadores migrantes com base nas competências e nas qualificações. A União deve dotar-se de um quadro jurídico comum a nível europeu em matéria de imigração laboral que seja coerente, global, horizontal e orientado pelo respeito dos direitos dos trabalhadores, a igualdade de tratamento e as necessidades das empresas.

3.3.2   O Comité já elaborou pareceres sobre directivas relativas aos trabalhadores sazonais, aos trabalhadores destacados, aos trabalhadores altamente qualificados e aos investigadores. Com a colaboração dos países de origem e para evitar a fuga de cérebros, a UE deve acolher novos talentos, que são necessários para o funcionamento de uma economia dinâmica, inovadora e competitiva.

3.3.3   O CESE considera urgente que o Conselho e o Parlamento Europeu cheguem a um acordo sobre a directiva relativa a um conjunto comum de direitos e à autorização única (4). Devem ser corrigidas as desigualdades de direitos que existem actualmente entre diferentes categorias de trabalhadores provenientes de países terceiros a nível da UE. O quadro jurídico comum em vigor caracteriza-se por uma abordagem sectorial que encoraja um tratamento diferenciado e discriminatório entre diferentes categorias de trabalhadores migrantes no que respeita às condições de entrada e de residência e aos direitos.

3.3.4   O CESE saúda a proposta da Comissão Europeia de apresentar um código comum em matéria de imigração em 2013. Este código deverá consolidar a legislação actual mediante um quadro uniforme e transparente de direitos, garantias e deveres dos imigrantes, e deverá inspirar-se nos princípios da igualdade e do tratamento equitativo. A UE deveria promover mais activamente a transposição, por parte dos Estados-Membros, das convenções e dos tratados internacionais e europeus no quadro de organizações como a ONU, o Conselho da Europa e a OIT.

3.4   Diálogo e parcerias de mobilidade com países terceiros

3.4.1   O CESE apoia as orientações gerais apresentadas pela Comissão na sua Comunicação sobre «Um diálogo sobre migração, mobilidade e segurança com os países do Sul do Mediterrâneo» (5). A UE deve continuar a desenvolver uma abordagem global sobre a migração, orientada pelo objectivo prioritário de facilitar os canais legais de migração e mobilidade.

3.4.2   O CESE congratula-se com a iniciativa de criar parcerias de mobilidade entre a UE e a Tunísia, Egipto e Líbia. Seria necessário, no entanto, realizar um estudo independente sobre a eficácia e o impacto das parcerias de mobilidade que estão actualmente em funcionamento. O CESE apoia a iniciativa da Comissão de assegurar que as parcerias de mobilidade sejam dotadas de um mecanismo de avaliação eficiente. Por outro lado, as parcerias de mobilidade, que são declarações políticas conjuntas juridicamente não vinculativas para os Estados participantes, deveriam transformar-se em acordos internacionais.

4.   Protecção internacional

4.1   O CESE espera que o Conselho e o Parlamento aprovem, em 2012, a legislação comum necessária para criar um regime comum de asilo.

4.2   Além disso, o Comité considera que é necessário melhorar a solidariedade entre os Estados-Membros em matéria de acolhimento das pessoas que entram na UE e que necessitam de protecção internacional. O Comité também propõe que a UE possa oferecer programas de reinstalação, de acordo com as propostas da Comissão.

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  COM(2011) 248 final.

(2)  JO C 48 de 15.2.2011, p. 6/13.

(3)  Resolução do Parlamento Europeu, de 15 de Dezembro de 2010 sobre a situação dos direitos fundamentais na União Europeia (2009) – Aplicação efectiva após a entrada em vigor do Tratado de Lisboa (2009/2161(INI)) - P7_TA(2010)0483, ponto 39.

(4)  COM(2007) 638 final.

(5)  COM(2011) 292 final.


25.8.2011   

PT

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C 248/138


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao controlo dos perigos associados a acidentes graves que envolvem substâncias perigosas»

[COM(2010) 781 final — 2010/0377 (COD)]

2011/C 248/24

Relator: David SEARS

Em 24 de Janeiro de 2011, o Conselho decidiu, nos termos do artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu, sobre

Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa ao controlo dos perigos associados a acidentes graves que envolvem substâncias perigosas

COM(2010) 781 final — 2010/0377 (COD).

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Agricultura, Desenvolvimento Rural e Ambiente, que emitiu parecer em 20 de Maio de 2011, sendo relator David SEARS.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu aprovou, por 146 votos a favor, sem votos contra, e 6 abstenções o seguinte parecer:

1.   Síntese e recomendações

1.1

O CESE tem apoiado sistematicamente as propostas legislativas da Comissão para redução da frequência e do impacto potencial dos perigos associados a acidentes graves. Tendo em conta que o âmbito destas directivas está fortemente dependente de outra legislação da UE, em particular no que se refere à classificação e rotulagem de substâncias perigosas, o CESE concorda que se tornou necessária uma nova directiva em virtude de alterações resultantes da recente adopção de um sistema mundial harmonizado de classificação e rotulagem (GHS), que foi desenvolvido e proposto pela Organização das Nações Unidas (ONU). As dificuldades inerentes a esse processo, com poucos benefícios esperados além de um comércio mundial mais fácil, estão identificadas e foram já amplamente debatidas num parecer anterior (1).

1.2

O CESE também manifesta pleno acordo com o ponto de vista da Comissão e da maioria das partes interessadas de que não são necessárias outras alterações significativas. De facto, essas alterações devem ser reduzidas ao mínimo, a fim de se evitar desvios a nível dos principais objectivos desta legislação estabelecida há muito, eficaz e bem fundamentada.

1.3

O CESE considera, portanto, que devem ser envidados todos os esforços para uma avaliação crítica, se necessário produto a produto, que determine se as alterações na classificação afectam a probabilidade de ocorrência de acidentes graves. Caso não afectem, e/ou representem um aumento significativo do número de PME e estabelecimentos mais pequenos e de menor risco abrangidos, devem ser tomadas precauções para não diminuir o impacto da proposta. Este aspecto é particularmente relevante no sector dos detergentes, onde as novas classificações estão manifestamente desajustadas da experiência com produtos para o lar numa utilização quotidiana. Nestes casos, os limites de tonelagem também devem ser objecto de uma cuidadosa consideração, em particular quando haja uma probabilidade reduzida de fogo ou explosão e quando os produtos tenham sido embalados em pequenas quantidades para venda a retalho.

1.4

Nos casos em que as matérias-primas, produtos intermédios e produtos acabados sejam abrangidos por vários actos legislativos, sujeitos a revisão em datas diferentes, é necessário ter um grande cuidado com os períodos de transição que se sobrepõem, a fim de assegurar a minimização dos custos totais para os operadores e os Estados-Membros, bem como para reduzir ao mínimo a confusão para todos os intervenientes.

1.5

Tendo em conta a opinião generalizada das autoridades competentes de que os estabelecimentos mais importantes já são efectivamente abrangidos por esta legislação, devem ser envidados todos os esforços para aumentar a eficiência e a eficácia dos controlos e dos subsequentes relatórios sobre aqueles e, se for o caso, locais adjacentes. Na medida do possível, estes esforços não se devem resumir a um aumento da quantidade de informação que os Estados-Membros têm de recolher e transmitir à Comissão. O CESE observa que o sistema, tal como se encontra estruturado, mal cumpre a sua finalidade e saúda os esforços da Comissão no sentido de acordar as alterações com os Estados-Membros, de cujos contributos abertos e atempados está dependente. As alterações propostas à lista de produtos e estabelecimentos afectados devem continuar sujeitas ao escrutínio das outras instituições da UE e dos organismos consultivos da UE antes de serem adoptadas.

1.6

O CESE apoia vivamente a disponibilização de informação pertinente, compreensível e num prazo razoável ao público. Continuarão a ser necessários materiais impressos, embora se registe uma utilização cada vez mais frequente de outros meios electrónicos, nomeadamente as redes sociais, em especial a nível local. Todas as organizações da sociedade civil nas imediações de estabelecimentos abrangidos pela Directiva Seveso (ou quaisquer outros estabelecimentos de fabrico ou armazenagem) têm um papel a desempenhar tanto na tentativa de prevenção como na resposta a acidentes de todos os tipos, incluindo situações de emergência por acidente grave, como definido na Directiva Seveso.

1.7

As novas propostas em matéria de «justiça ambiental» apenas são pertinentes se for possível demonstrar a «injustiça ambiental» dos perigos associados a acidentes graves. Tendo em conta a frequência relativamente reduzida dos acidentes comunicados ao abrigo da presente directiva, em particular no que se refere a estabelecimentos do grupo inferior, essa demonstração afigura-se difícil. Todas as informações prestadas devem ser disponibilizadas a todos os elementos da sociedade civil organizada. O CESE considera, portanto, que este requisito deve ser substituído por uma abordagem mais moderna e que reúna maior consenso no que diz respeito à gestão da informação sobre segurança, devidamente fundamentada e tendo em conta a análise de impacto necessária.

1.8

O CESE assinala que a UE se encontra atrasada em relação aos EUA no que se refere ao reconhecimento e à valorização das boas práticas, em particular no que respeita à segurança dos processos e das pessoas, e considera que avanços neste domínio teriam mais vantagens do que as medidas ora propostas.

1.9

Por conseguinte, o CESE apoia a proposta da Comissão, mas sugere a reapreciação de uma série de aspectos, a fim de assegurar o cumprimento integral dos objectivos de longo prazo firmemente estabelecidos desta legislação no sentido de reduzir a frequência e o impacto dos perigos associados a acidentes graves.

2.   Introdução

2.1

A necessidade de classificar, rotular e embalar (CRE) «substâncias» (inicialmente, pelo menos, uma lista finita de elementos e respectivos compostos) definidas como «perigosas», em várias escalas de impacto na saúde humana, na segurança e no ambiente, foi identificada há mais de 40 anos na Directiva 67/548/CEE relativa às substâncias perigosas. Cerca de 20 anos mais tarde, esta necessidade foi alargada às «preparações» (uma lista mais vasta, potencialmente infinita, de misturas produzidas intencionalmente com duas ou mais substâncias, em proporções variáveis, mas definidas) na Directiva 88/379/CEE relativa aos preparados perigosos.

2.2

Estas duas directivas, e as muitas directivas de alteração e adaptações ao progresso técnico, constituem a base para um sistema harmonizado de protecção dos trabalhadores, dos consumidores, dos fabricantes, das empresas de comercialização, dos distribuidores e do ambiente. Além disso, também garantem um mercado único em toda a UE para os produtos abrangidos, nomeadamente matérias-primas, produtos intermédios e fluxos de resíduos, e produtos acabados destinados a serem colocados no mercado. Além disso, as directivas interagem com praticamente toda a restante legislação da UE em matéria de protecção da saúde humana, da segurança e do ambiente, e concorrem para ela. Por conseguinte, quaisquer alterações a este sistema subjacente deverão ser complexas e dispendiosas para todos os intervenientes.

2.3

Nos últimos anos, ocorreram duas alterações desse tipo. Em 2006, o Conselho aprovou o Regulamento (CE) n.o 1907/2006 relativo ao registo, avaliação, autorização e restrição dos produtos químicos (REACH), em conjunto com a Directiva 2006/121/CE, que altera a Directiva 67/548/CEE e aproxima estes dois importantes actos legislativos. Em 2008, o Conselho e o Parlamento Europeu aprovaram o Regulamento (CE) n.o 1272/2008 com vista à aplicação de um novo sistema mundial harmonizado de classificação e rotulagem de produtos químicos (GHS), desenvolvido pela Organização das Nações Unidas ao longo de muitos anos de trabalho. Em muitos casos, isto levaria a alterações a nível das designações, pictogramas e advertências normalizadas atribuídas a vários perigos e a «substâncias» e «misturas». Os riscos a que os trabalhadores, os distribuidores, os consumidores e o público estariam efectivamente sujeitos em virtude de um determinado produto ou processo permaneceriam, obviamente, inalterados.

2.4

Na altura, concluiu-se que seriam poucos os benefícios de substituir um sistema bem estabelecido, totalmente funcional e eficaz, sendo o potencial de redução de custos para o comércio internacional mais do que compensado pelo aumento dos custos de natureza regulamentar e de conformidade na UE. Igualmente consideráveis seriam os problemas técnicos inerentes à introdução de novas classificações e terminais, o que se traduziria num aumento dos custos de reformulação ou de alterações à gama de produtos à disposição dos consumidores. Além disso, não era despiciendo o potencial de confusão durante e após o período de transição de cada acto legislativo afectado.

2.5

Estes problemas estão agora bem patentes, e em certa medida resolvidos, na proposta da Comissão COM(2010) 781 final, também designada por «Seveso III», relativa a uma directiva que substitua a legislação existente em matéria de controlo de «perigos associados a acidentes graves», que envolvem especificamente «substâncias perigosas», ambos na acepção da presente legislação.

2.6

Esta legislação foi introduzida em 1982 com a Directiva 82/501/CEE, na sequência de um grave acidente em Seveso (que levou à vasta exposição a dioxinas) ocorrido em 1976. A legislação foi alterada na sequência de acidentes em Bhopal (uma grave fuga de isocianato de metilo) e Basileia (uma série de incêndios e libertação de substâncias tóxicas). Foi substituída em 1996 pela Directiva 96/82/CE do Conselho. Na sequência de graves acidentes em Toulouse (com nitrato de amónio), Baia Mare (um derrame de cianeto) e Enschede (uma explosão numa fábrica de pirotecnia), esta directiva viria a ser alterada pela Directiva 2003/105/CE, que estabelece uma série de obrigações processuais e de comunicação bem definidas para os fabricantes e os Estados-Membros.

2.7

Crê-se que esta legislação teve um efeito profundo e positivo na segurança e no controlo das fábricas onde são utilizadas, fabricadas ou armazenadas substâncias perigosas. A legislação abrange cerca de 10 000 estabelecimentos de fabrico, dos quais cerca de 4 500 são considerados estabelecimentos do «grupo superior», ou seja, sujeitos a normas mais exigentes de comunicação e controlo do que os outros 5 500 estabelecimentos do «grupo inferior». São realizadas inspecções regulares. Existem sistemas de comunicação a nível nacional e a nível de toda a UE. O sistema goza de amplo apoio e é valorizado por todos os intervenientes. Continuam a ocorrer acidentes, mas espera-se que sejam menos frequentes e tenham menos impacto na saúde humana e no ambiente do que seria o caso na ausência desta legislação.

2.8

Segundo as estatísticas da Comissão em linha, foram comunicados 745 acidentes deste tipo ao longo dos 30 anos que a directiva esteve em vigor. Foram comunicados mais 42 acidentes que ainda não foram adicionados à base de dados pública eMARS (2). Embora as estatísticas não estejam completas nem sejam de acesso fácil, 80 % destes acidentes terão ocorrido em estabelecimentos do grupo superior, ao passo que os restantes dizem respeito a estabelecimentos do grupo inferior. Trinta e cinco dos referidos acidentes foram comunicados voluntariamente por países da OCDE que não integram a UE. O número de acidentes por ano comunicado atingiu o seu pico no período de 1996 a 2003 e tem decrescido acentuadamente desde então. Não é claro se esta evolução resulta de uma efectiva melhoria a nível da segurança das fábricas ou apenas de um grande atraso na análise e comunicação de acidentes pelos Estados-Membros e de atrasos subsequentes na tradução.

2.9

Os estabelecimentos militares e os perigos associados às radiações ionizantes, a exploração offshore de minerais e hidrocarbonetos, o seu transporte e os locais de eliminação de resíduos, em conjunto com substâncias específicas constantes da lista na parte 3 do anexo 1 da directiva, estão excluídos destes controlos.

2.10

Infelizmente, o âmbito desta legislação está fortemente condicionado pela legislação CRE atrás referida em relação a quaisquer substâncias perigosas envolvidas. As classificações e as tonelagens das substâncias utilizadas, fabricadas ou armazenadas num local determinam a eventual obrigatoriedade e os controlos previstos na Directiva Seveso a que esse local está sujeito. Os controlos foram concebidos apenas para evitar ou minorar os efeitos de «acidentes graves», os quais se definem por causarem um ou vários dos seguintes danos: um ou mais óbitos, danos pessoais e hospitalização de seis ou mais pessoas, danos materiais dentro ou fora da fábrica, evacuação significativa de pessoal ou de vizinhos da fábrica ou danos a longo prazo causados ao ambiente exterior. Os «acidentes graves»de facto, indicados no ponto 2.6 supra, que levaram a mudanças na legislação assumiram proporções gravíssimas e, por conseguinte, não são exemplos dos acidentes que normalmente são comunicados.

2.11

A introdução da legislação GHS agora implica alterações, em especial aos anexos da directiva onde classes de perigo específicas e «substâncias» classificadas, e respectivas «misturas», são indicadas para inclusão ou exclusão com base nas respectivas classificações de perigo revistas.

2.12

Uma vez que se trata de alterações a definições e não aos riscos em si, e tendo em conta que a Comissão não pretende alterar nem alargar significativamente o âmbito da legislação actual, os verdadeiros benefícios para a segurança dos processos, dos trabalhadores ou dos consumidores e para o ambiente deverão ser mínimos. Por conseguinte, torna-se óbvia a necessidade de controlar os custos e outros impactos para os operadores e os Estados-Membros, bem como a necessidade de evitar qualquer desvio do actual enfoque nos perigos associados aos acidentes graves.

3.   Síntese da proposta da Comissão

3.1

A proposta da Comissão de uma nova directiva baseia-se no artigo 191.o do TFUE. Os Estados-Membros são os destinatários da directiva, que entra em vigor 20 dias a contar da data da sua publicação no Jornal Oficial. A Directiva 96/82/CEE é revogada, com efeitos a partir de 1 de Junho de 2015. Foram consultadas as partes interessadas. Registou-se um amplo consenso sobre o facto de não ser necessário efectuar grandes alterações, com excepção da harmonização do anexo I com o Regulamento (CE) n.o 1272/2008.

3.2

A Comissão visa, no entanto, clarificar e actualizar alguns dos procedimentos e definições, assim como introduzir novas medidas, designadamente relacionadas com a frequência das inspecções, o conteúdo da política de prevenção de acidentes graves (PPAG) do operador, os requisitos do sistema de gestão da segurança (SGS), a disponibilização de informação ao público, os direitos de acesso à justiça ambiental, a apresentação de relatórios pelos Estados-Membros à Comissão e o processo de alteração dos anexos através de actos delegados.

3.3

A Comissão reconhece que as principais dificuldades residem na harmonização das actuais categorias «muito tóxico» e «tóxico» com as novas categorias «toxicidade aguda 1, 2 e 3», agora separadas por vias de exposição (via oral, cutânea e inalatória). Haverá categorias novas e mais específicas para perigos das substâncias comburentes, explosivas ou inflamáveis, incluindo «aerossóis inflamáveis». Uma série de outros produtos, entre os quais o nitrato de amónio e o fuelóleo pesado, de uso generalizado apesar de serem ocasionalmente utilizados como precursores explosivos, merecem atenção especial.

3.4

A proposta é acompanhada por um documento de trabalho e uma avaliação de impacto dos serviços da Comissão, duas avaliações de impacto externas elaboradas pela COWI A/S (um grupo internacional de consultoria da Dinamarca) sobre opções possíveis para a proposta global e para a adaptação do anexo I, e por um relatório de um grupo de trabalho técnico do CCI sobre critérios de classificação para a identificação dos estabelecimentos abrangidos pela Directiva Seveso. Foi fornecida informação adicional sobre as propostas para a reformulação da base de dados eMARS após um pedido nesse sentido.

3.5

Apesar do acréscimo de poderes e responsabilidades da Comissão, é referido que isso não terá incidência no orçamento comunitário. A avaliação de impacto não quantifica integralmente os custos e os benefícios para os Estados-Membros ou os operadores, embora dê a entender que deverão ser bastante inferiores àqueles que se verificaram quando a legislação foi introduzida. Além disso, refere que os custos são, em geral, insignificantes em comparação com os custos associados a um incidente real. O incêndio no terminal de Buncefield, no Reino Unido, em 2005, é apontado como exemplo. Não foi avaliado o custo ou a eficácia real de algumas novas propostas de comunicação com o público ou para fornecer dados à Comissão. A aplicação e os resultados esperados da legislação actual foram analisados em documentos relacionados, mas esses documentos não acompanham a avaliação de impacto.

4.   Observações na generalidade

4.1

O CESE, através dos seus pareceres, tem manifestado posições favoráveis a todas as directivas atrás referidas e tem apoiado enfaticamente a série de propostas que visam minorar a frequência e o potencial dos perigos associados a acidentes graves sob as designações genéricas de Directiva Seveso I, II e, agora, III. Por conseguinte, apoia a nova proposta, a base jurídica seleccionada e o instrumento escolhido. No entanto, manifesta reservas em relação à proporcionalidade e ao efeito provável da proposta, onde algumas disposições vão claramente além do que é estritamente necessário para alcançar os objectivos pretendidos.

4.2

O CESE também apoiou vivamente o objectivo de um «sistema mundial harmonizado» (GHS) de «classificação, rotulagem e embalagem de produtos químicos», desenvolvido pela Organização das Nações Unidas, para facilitar o comércio mundial e ajudar as economias menos desenvolvidas nos seus esforços para proteger a saúde e a segurança dos trabalhadores e consumidores.

4.3

No entanto, o CESE apontou uma série de reservas ao sistema atrás referido num parecer anterior publicado no JO C 204 de 9 de Agosto de 2008, p.47. Muitas dessas reservas aplicar-se-iam, independentemente das suas boas intenções, a qualquer processo de harmonização transnacional – ou, neste caso, mundial – em que um sistema que funciona bem é substituído por outro em nome de um desígnio superior, ou seja, facilitar o comércio mundial. A burocracia e os custos podem disparar. Pode verificar-se uma degradação de procedimentos e definições consolidados. É possível que se assista a uma diluição dos objectivos essenciais. As práticas de fabrico e comercialização poderão carecer de revisão, implicando custos consideráveis e total ausência de benefícios para os trabalhadores ou consumidores. É provável alguma confusão a todos os níveis durante e após o inevitável período de transição de cada acto legislativo afectado. Os benefícios, se forem avaliados, serão provavelmente poucos ou inexistentes e os custos suplementares são difíceis de justificar.

4.4

Muitos dos aspectos atrás referidos foram identificados na elaboração da presente proposta, especialmente tendo em conta o amplo consenso sobre o facto de não ser necessário efectuar grandes revisões do enfoque, do âmbito e da aplicação geral da legislação existente, com excepção da revisão do anexo I para efeitos de harmonização com as novas definições de CRE de «substâncias perigosas» e das quais esta legislação está dependente.

4.5

Infelizmente, subsistem uma série de problemas. Alguns desses problemas foram suscitados durante a consulta, mas não se encontram resolvidos na redacção actual. Outras preocupações de natureza genérica perderam-se por completo.

4.6

O CESE lamenta, em particular, que a adopção de um GHS negociado a nível mundial e, basicamente, monolingue tenha contribuído para a perda de significado de palavras-chave há muito estabelecidas, tais como «substância», que agora pode incluir «preparações» e «misturas», e que estas duas palavras revistam o mesmo significado, o que não acontecia na directiva relativa a preparações; e que ainda não tenha sido efectuado qualquer esforço para confirmar que os três termos – em português e noutras línguas europeias –«químico» (substantivo), «substância química» e substância” são sinónimos na legislação da UE, apesar das diferentes utilizações e significados que lhes são atribuídos. Poderá, em alguns casos, ser necessário explicar que não existem substâncias «não químicas». As referências a «M-factors» (factores M) ou «R & S Phrases» (expressões de risco e segurança), mais uma vez, só fazem sentido numa língua e a sua tradução para outras línguas pode ser problemática.

4.7

Estamos, portanto, perante uma oportunidade perdida para criar um glossário de termos-chave em todas as línguas da UE, tal como foi sugerido noutra ocasião, o qual é essencial tendo em conta a expansão da legislação a novas áreas que afectam o mesmo grupo de produtos – por exemplo, limitar a disponibilidade de precursores explosivos que podem ser utilizados por terroristas –, bem como para resolver o problema da sobreposição e interacção de legislação horizontal e vertical, como o REACH, a legislação sobre emissões industriais, a qualidade da água e REEE, com legislação específica para produtos como solventes, detergentes, cosméticos, aerossóis, adubos e pesticidas.

4.8

Verifica-se uma situação semelhante com o processo proposto para alterar os anexos, que servem essencialmente para aumentar ou diminuir o número de produtos e, por conseguinte, de locais sujeitos à legislação em apreço, por iniciativa exclusiva da Comissão através de «actos delegados». Estes actos carecem de orientações claras, que sejam aceitáveis para todas as partes afectadas. Essas orientações ainda estão por desenvolver. A base científica destas decisões deve ser descrita na íntegra, e os procedimentos previamente acordados devem ser escrupulosamente seguidos. Em caso de impugnação pelo Parlamento Europeu ou pelo Conselho, deveria ser obrigatória uma análise completa pelas outras instituições e organismos consultivos da UE. Também deveria ser criado um dispositivo para os Estados-Membros ou outras partes afectadas apresentarem objecções.

4.9

Este aspecto também é pertinente para o âmbito de aplicação da directiva. A Directiva Seveso II aplica-se a cerca de 10 000 estabelecimentos designados em toda a UE. Destes, cerca de metade também estão abrangidos pela recém-aprovada directiva relativa às emissões industriais, que substitui a directiva IPPC e abrangerá mais de 50 000 locais no total. Entre os «estabelecimentos Seveso» contam-se locais de fabrico de substâncias químicas, refinação de petróleo, produtos de consumo e locais de fabrico a jusante, assim como algumas instalações de tratamento de resíduos. Parece haver acordo entre as autoridades competentes dos Estados-Membros em que as definições existentes cobrem razoavelmente bem os locais onde é possível a ocorrência de acidentes graves. Certamente que já estão identificados todos os principais locais. Quaisquer aumentos no nível de classificações dos produtos a fim de cumprir os requisitos do GHS, sem quaisquer alterações aos próprios perigos subjacentes, apenas resultarão na adição de locais mais pequenos, sem que nunca daí resulte uma diminuição dos riscos em si, ou no aumento, pouco justificado, do número de locais classificados como de alto risco. Existem preocupações específicas no caso das matérias-primas para detergentes, pois as alterações na definição podem implicar a adição de um grande número de locais do grupo inferior. Tendo em conta que, segundo as estatísticas da Comissão, os 5 500 estabelecimentos do grupo inferior não representam mais de 5 a 10 acidentes comunicados por ano, este não parece ser um domínio prioritário para receber a atenção dos reguladores. De facto, num estabelecimento Seveso do grupo inferior, a ocorrência de um acidente que cumpra as condições para ser comunicado a cada 500 ou 1 000 anos (ou mesmo para um estabelecimento Seveso do grupo superior, um acidente a cada 100 ou 200 anos) denota que as pessoas estão sujeitas a mais perigos na sua casa ou a caminho do trabalho, embora estes perigos raramente tenham um grande impacto em terceiros ou sejam considerados graves pelos reguladores ou pelo público. Velar por que as PME responsáveis conheçam e cumpram a legislação e por que os locais sejam regularmente inspeccionados pelas autoridades competentes são actividades que compensam cada vez menos. Em tempo de orçamentos reduzidos e restrições de pessoal, esse tipo de medidas poderia aumentar a probabilidade de ocorrência de acidentes graves noutros locais.

4.10

Por conseguinte, o CESE recomenda vivamente que se mantenha o enfoque original das directivas de evitar ou minorar os efeitos dos perigos associados a «acidentes graves» (tal como se encontram definidos). Qualquer decisão que contribua para diminuir este efeito, nomeadamente através da mera introdução do novo GHS para CRE ou de alterações aos sistemas de comunicação a nível nacional e a nível de toda a UE, deve merecer forte oposição. É necessário ponderar cuidadosamente os novos limites de classificação, mas também os limites de tonelagem dos produtos armazenados. Sempre que incluam produtos já embalados em pequenas quantidades para serem vendidos a retalho e a probabilidade de incêndio ou explosão seja reduzida, o risco de um acidente grave diminui muito.

4.11

O CESE observa ainda que a proposta exclui especificamente – e justificadamente – acidentes como a recente explosão numa plataforma petrolífera offshore no Golfo do México, para os quais poderá ser necessária legislação nova, e, fazendo referência a um acidente ocorrido mais próximo de nós, a fuga de «lama vermelha» na Hungria que, em teoria, está coberta pela directiva relativa à gestão dos resíduos de indústrias extractivas de 2006. A correcta aplicação e inspecção a nível nacional são fundamentais, independentemente da legislação que esteja em vigor a nível da UE.

5.   Observações na especialidade

5.1

O CESE observa que existem requisitos de comunicação aplicáveis aos fabricantes e Estados-Membros com prazos diferentes em muitas das directivas supramencionadas. Aumentar a frequência e a profundidade dos relatórios nesta rubrica, sem provas inequívocas de efeitos positivos, apenas aumenta os encargos para todas as partes visadas. A acumulação de dados a nível central, em Bruxelas ou em qualquer outro local, agrava os problemas de manutenção da qualidade dos dados e, se for o caso, da confidencialidade dos dados.

5.2

Este aspecto é também relevante para um novo requisito que obriga os «estabelecimentos» a fornecerem informação detalhada sobre os seus «vizinhos», para evitar «efeitos de dominó» em locais adjacentes, que podem ou não estar abrangidos por esta legislação. É pouco claro como este requisito deve ser tratado no âmbito do direito da concorrência da UE. No entanto, é muito pertinente para o desenvolvimento de planos de resposta a emergências locais e, nessa medida, tem o pleno apoio do CESE.

5.3

O requisito que obriga os operadores a elaborar relatórios que evidenciem a presença de uma «cultura de segurança» deve-se a acidentes ocorridos nos EUA com o vaivém espacial e, mais recentemente, aos grandes acidentes no Texas e no Golfo do México, onde os relatórios elaborados a posteriori denunciaram a falta de uma «cultura de segurança». No entanto, trata-se de observações subjectivas que são difíceis de avaliar ou quantificar. A realização periódica de avaliações prévias de alguma utilidade poria problemas às autoridades competentes na maioria dos Estados-Membros, tendo em conta o seu actual quadro de pessoal. Esta proposta foi, pois, rejeitada numa reunião de peritos de segurança em Ispra, em 2010, e não se compreende porque ressurgiu na presente proposta.

5.4

Globalmente, o CESE preferiria que os requisitos de comunicação se mantivessem a um nível realista, significativo, comparável e aplicável em todos os Estados-Membros, com uma aposta clara na troca de boas práticas entre Estados-Membros. O CESE lamenta, em particular, que as secções de «ensinamentos extraídos» dos 745 relatórios em linha disponíveis na base de dados eMARS estejam normalmente em branco e que no resto das «caixas de selecção» seja fornecida pouca informação útil, apesar de ser apresentada ao público em geral e aos peritos de segurança como uma fonte essencial de dados pertinentes. Alguns dados, por exemplo, sobre a repartição de acidentes pelos estabelecimentos dos grupos superior e inferior aparentam não ter sido recolhidos de uma forma sistemática, o que dificulta a avaliação da eficácia das diferentes componentes da legislação e das acções necessárias a nível nacional. O CESE congratula-se, portanto, com as acções da Comissão no sentido de alcançar um acordo relativo a novas normas de comunicação com os Estados-Membros e está confiante de que serão afectados recursos suficientes para garantir que o sistema está em condições de cumprir a sua finalidade original.

5.5

O CESE questiona igualmente o motivo por que existem diferenças entre os requisitos de comunicação aplicáveis aos dois grupos de operadores, definidos pelas tonelagens e classificações de perigo das substâncias produzidas, utilizadas ou armazenadas num local, nomeadamente em relação à necessidade de uma política de prevenção de acidentes graves (PPAG), do subsequente sistema de gestão da segurança (SGS) e de relatórios de segurança. Tendo em conta que o primeiro (PPAG) serve de pouco sem o segundo (SGS), o CESE considera que este requisito deve ser aplicado por igual a todos os estabelecimentos enumerados na directiva. No entanto, os requisitos específicos aplicáveis aos estabelecimentos do grupo inferior devem ser objecto de uma adaptação mais cuidadosa, reflectindo o risco muito mais reduzido de ocorrência de um acidente grave.

5.6

O CESE constata que as propostas de disponibilização de informação ao público sofreram um alargamento considerável, embora nem sempre sejam claros os motivos desse alargamento. As «escolas e hospitais» são identificados especificamente num parágrafo, mas não é claro se foram definidos para fins educativos, como locais que empregam ou acolhem um elevado número de pessoas e precisam de formação e de planos de evacuação específicos, ou como recursos fundamentais em caso de emergência. Importa esclarecer este aspecto, para os visados poderem tomar as medidas adequadas.

5.7

Em todos os casos desse tipo, o requisito deve consistir na prestação de informação pertinente, compreensível e em tempo útil para uma finalidade específica. A entrega electrónica servirá alguns sectores da comunidade, mas não outros. A informação impressa continuará a ser necessária durante muitos anos. As novas formas de comunicação, como a utilização de mensagens de correio electrónico dirigidas, das redes sociais ou mesmo do Twitter®, podem ser exploradas a nível local no âmbito de planos de resposta a emergências específicas.

5.8

Por último, a Comissão inclui um novo artigo destinado a garantir a «justiça ambiental», um conceito que surgiu na década de 1980 nos Estados Unidos, com base nos movimentos em prol dos direitos civis da década de 1960, quando existia uma forte correlação entre a cor da pele, a pobreza e a falta de direitos civis, e, por inerência, uma óbvia falta de «justiça». Esses mesmos princípios foram incluídos na Convenção de Aarhus de 1998. Em 2006, foi adoptado um regulamento que estabelece as obrigações das instituições da UE. O parecer do CESE respectivo, publicado no JO C 117 de 30 de Abril de 2004, p. 52, apoiava a proposta, mas continha reservas em relação à definição restritiva de «organizações activas no domínio da protecção ambiental» onde «outras organizações não lucrativas, como sindicatos, organizações da economia social e associações socioprofissionais, de consumidores, etc., contribuem igualmente para a protecção ambiental a nível local, regional, nacional e europeu». Este aspecto continua a ser válido, com todos os elementos da sociedade civil organizada a participarem activamente na avaliação crítica das questões pertinentes para a presente legislação e a garantirem a adequada protecção da saúde e da segurança dos trabalhadores e do público que os rodeia em caso de ocorrência de um acidente grave. Segundo os relatórios da Comissão em linha relativos à aplicação do regulamento de 2006, os poucos pedidos de informação registados têm estado relacionados com campanhas pan-europeias em curso e não com aspectos de locais específicos. Por conseguinte, não é claro por que motivo este requisito específico foi adicionado nesta altura, em vez de, por exemplo, propostas de intercâmbio, reconhecimento e distinção de boas práticas. Este é um domínio em que a UE se encontra bastante atrasada em relação aos EUA e onde se poderiam obter ganhos efectivos de segurança dos processos e das pessoas, em conformidade com os objectivos declarados desta proposta.

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  JO C 204 de 9.8.2008.

(2)  http://emars.jrc.ec.europa.eu/


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/144


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões relativa às oportunidades e desafios do cinema europeu na era digital»

[COM(2010) 487 final]

2011/C 248/25

Relator: Mircea Eugen BURADA

Em 24 de Setembro de 2010, a Comissão Europeia decidiu, nos termos do artigo 114.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre:

Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões relativa às oportunidades e desafios do cinema europeu na era digital

COM(2010) 487 final.

Foi incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação que emitiu parecer em 24 de Maio de 2011.

Na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho), o Comité Económico e Social Europeu adoptou, por 142 votos a favor, 1 voto contra e 9 abstenções, o seguinte parecer:

Lema

«A Europa deve ser um actor global e não um subcontratado da globalização». (1)

PREÂMBULO

« O cinema europeu contribui de forma importante para dar corpo às identidades europeias que se encontram no âmago da Agenda Europeia para a Cultura».

Esta primeira frase da Comunicação da Comissão é uma excelente declaração de intenções, que revela, logo à partida, a verdadeira dimensão do tema e nos adverte para a importância extrema de que este se reveste na perspectiva da criação da União Europeia, tal como foi idealizada e lançada pelos seus fundadores. A cultura em todas as suas vertentes – e, para o que aqui nos interessa, o cinema – é o principal vector de comunicação, de solidariedade, de democracia e, sobretudo, de coesão europeia. O cinema, verdadeiro Holy Grail (Santo Graal) da existência, deve ser protegido e considerado de grande interesse político e estratégico. O cinema digital é uma oportunidade a não perder de conferir ao cinema europeu o papel principal de veículo transcendental de ideias, constituindo uma ocasião única, e imprescindível, para a União Europeia se dotar dos instrumentos necessários para promover a coesão europeia, dando corpo às identidades europeias. Ora, esta ambição só pode ser concretizada através da arte em geral e do cinema, em especial. Em termos económicos, isso implica que haja um ORÇAMENTO, ou seja, um enorme esforço financeiro sem o qual a União Europeia, uma Torre de Babel de 27 andares, corre o risco de fragmentar-se devido a sensibilidades próprias das identidades de cada Estado-Membro.

1.   Conclusões e recomendações

1.1   O tema ora em análise é complexo, sensível, grave e, sobretudo, político:

COMPLEXO dada a multiplicidade cultural das identidades europeias,

SENSÍVEL na medida em que cada Estado-Membro, orgulhoso da riqueza e da variedade do seu património cinematográfico, será nesta nova etapa muito cauteloso ou até mesmo céptico;

GRAVE devido à inexistência de uma verdadeira estratégia à escala europeia e à falta de resultados, o que, a longo prazo, traz o risco de comprometer os esforços de consolidação da União Europeia através da construção e harmonização das identidades europeias;

POLÍTICO porque o cinema, artefacto cultural por excelência, que no início era um passatempo, foi gradualmente ganhando novas valências: apoio moral, instrumento de comunicação, testemunho histórico, subliminar, veículo de propaganda, etc.

1.2   O Comité recomenda a todos os decisores envolvidos neste projecto único no mundo que ajam com prudência e evitem a armadilha de comparações baseadas numa depreciação cultural do tipo «a cinematografia americana é dominante» ou «os espectadores preferem produções americanas», etc. A concorrência deve ser como uma injecção de adrenalina para o cinema digital europeu. Os espectadores apreciam que se comunique com eles, gostam de ser encantados e convencidos, de desfrutar de um espectáculo, de ser convidados a entrar numa sala com as suas próprias ideias e de sair com as ideias que lhes são transmitidas na tela. Eis a chave do sucesso. Daí que se recomende empreender todos os esforços (confiança em si, determinação, ambição europeia) para encontrar os meios e o financiamento necessários, com o objectivo preciso de assegurar o êxito desta máquina político-cultural, que constitui indubitavelmente uma das pedras angulares da integração europeia.

1.3   A verdadeira revolução digital do cinema europeu, com os programas, as normas e a regulamentação que a acompanham, vai agitar a «vida pacata» de muitos daqueles que operam neste sector, impondo-lhes um novo quadro de trabalho e um novo ritmo de vida e, sobretudo, exigindo um orçamento acrescido. Trata-se de um novo desafio que põe em risco a sobrevivência de inúmeras pequenas e médias empresas, como explicado claramente na comunicação da Comissão. O Comité recomenda e apoia qualquer intervenção útil à União Europeia e considera indispensável envidar esforços para manter em funcionamento as pequenas salas de cinema tanto nas zonas rurais como nas grandes cidades, tão importantes para a coesão social e para o nicho de filmes artísticos e experimentais.

1.4   Sendo um passo gigantesco, e inovador, imprescindível ao futuro da União – uma componente importante da cultura europeia -, o cinema digital constitui uma ponte sólida entre os povos e as culturas da União, permitindo-lhes encontrarem-se, conhecerem-se melhor, descobrirem-se e, quem sabe, nos casos em que isso for necessário, aperceberem-se de que podem viver em conjunto, entreolhando-se com inteligência e, porque não, com admiração, criando assim um arco-íris anunciador de uma vida mais social, mais competitiva e menos dispendiosa.

1.5   O Comité apoia a criação, ao nível da União Europeia, de um enquadramento jurídico específico, claro e estável. Os Estados-Membros devem envidar esforços específicos para fazer regressar às salas os milhões de espectadores que deixaram de frequentar o cinema. Há que ter noção de um aspecto importantíssimo: actualmente, ver um filme numa sala de cinema tornou-se um luxo, pois com o advento do cinema doméstico (obrigatoriamente com ecrã de plasma) é possível ver em casa, comodamente, filmes em DVD.

1.6   Este assunto deve ser abordado tendo bem presente que as TIC – as novas tecnologias, a informação em tempo real e a comunicação directa sem fronteiras linguísticas – são uma grande vantagem, permitindo a difusão, sem barreiras e a custos cada vez mais baixos, dos diversos valores culturais e criativos da Europa. Ao mesmo tempo, elas facilitam enormemente a acessibilidade aos mesmos por parte das pessoas com deficiência visual ou auditiva.

1.7   Contudo, nada de estável e sólido poderá ser feito sem que a União Europeia disponibilize os meios financeiros indispensáveis à aplicação e ao apoio deste projecto multicultural, único no mundo. A má gestão deste programa resultará, seguramente, num acréscimo de custos difícil de suportar pelas pequenas salas de cinema, por determinadas categorias de profissionais do sector e, sobretudo, pelos espectadores, que são o nosso alvo principal. Tendo em conta que não pode haver uma única abordagem de apoio público aplicada indiferenciadamente a todos os países e regiões da Europa, o CESE ressalta a necessidade de haver financiamento suficiente para a digitalização das pequenas salas de cinema, em particular nas zonas rurais e nas grandes cidades. Para esse fim, como prioridade, há que utilizar os Fundos Estruturais, assegurar o co-financiamento nacional e facilitar o acesso dos exploradores de salas de cinema ao fundo de garantia para a produção no sector audiovisual, no âmbito do programa MEDIA. Todavia, a abordagem de apoio público não pode ser aplicada indiscriminadamente a todos os países e regiões, devendo cada país e cada região ter a liberdade de escolher o sistema que melhor funcionar nos mercados existentes.

1.8   Com a passagem para a tecnologia digital, que irá certamente ocorrer nos próximos anos, recomenda-se a digitalização dos arquivos dos filmes, sejam eles documentários, imagens de arquivo ou filmes clássicos, para que as gerações futuras não sejam privadas desta mina de ouro do cinema europeu e possam aceder facilmente a essas produções.

1.9   A comunicação em apreço foca mais a digitalização das salas de cinema do que o cinema europeu em geral e a política audiovisual num mundo digitalizado. A digitalização é um fenómeno muito mais complexo do que a mera substituição de equipamento. Para que o cinema europeu passe a ser uma importante componente estratégica da Agenda Digital para a Europa é necessária uma abordagem mais integrada, que tenha em consideração tanto os aspectos tecnológicos e industriais como as questões e os objectivos culturais – a criação. O acesso ao cinema digital, seja ele para entretenimento ou para informação, deve fazer parte da Agenda Digital para a Europa.

2.   Introdução

2.1   O cinema digital consiste na distribuição e projecção de filmes nas salas de cinema com recurso à tecnologia digital. A tecnologia digital abrange: registo digital, pós-produção digital, realização do master digital (Digital Cinema Distribution Master, DCDM), projecção digital de filmes (DCI), que pode ser efectuada em formatos 2K e 4K. O sistema digital de cinema deve assegurar a mais alta fidelidade de imagens e som.

2.2   A distribuição digital de filmes permite aos distribuidores efectuar economias consideráveis. A exibição de 80 minutos de um filme clássico custa entre 1 500 e 2 500 dólares. Este montante multiplicado por milhões de cópias resulta numa soma fabulosa. Em suporte digital, com um máximo de 250 MB/s, um filme normal pode ser gravado num disco rígido de apenas 300 GB a um custo muito baixo, para além de que o suporte digital é fácil de utilizar, guardar e transportar, podendo também ser reutilizado (fonte: Wikipédia, a enciclopédia livre).

2.3   A distribuição digital (cinema digital) não existirá sem a produção de filmes, que tem ficado para trás no que toca à actualização técnica do equipamento de filmagem em digital. Há que realizar um importante esforço financeiro para recuperar o atraso e avançar rapidamente face à concorrência.

Encontramo-nos hoje numa situação assaz curiosa: pretendemos criar uma rede de cinemas digitais, enquanto que a maioria dos produtores continua a utilizar o suporte em celulóide para a distribuição dos filmes.

O mesmo se passa com os filmes em 3D. A maioria das vezes, os distribuidores/exploradores de salas de cinema vendem, por mais uns tantos euros, aos cidadãos europeus entradas para filmes que são exibidos sem a qualidade exigida pelas normas digitais. A projecção de um filme que não tenha sido filmado em digital não pode ser verdadeiramente digital. Por exemplo: o filme AVATAR, que foi filmado em 3D, levou milhões de espectadores às salas de cinema.

3.   Princípios

3.1   A comunicação em análise tem em consideração vários conceitos-chave que facilitam um espaço cultural comum europeu, partindo da perspectiva de que o processo de digitalização deve efectuar-se nos moldes atrás referidos e beneficiar de um apoio financeiro adequado.

3.1.1   Um dos maiores interesses da AGENDA EUROPEIA PARA A CULTURA é promover o cinema europeu, motor da modelação das identidades europeias e da aproximação das culturas da União.

3.1.2   A AGENDA DIGITAL PARA A EUROPA é uma das sete iniciativas emblemáticas da Estratégia Europa 2020 para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo num mercado digital único.

3.1.3   O mercado único é a placa giratória que, apesar de todas as dificuldades, assegura a livre circulação no seio da União dos conteúdos culturais, das relações sociais e dos serviços comerciais, permitindo aos cidadãos europeus usufruir plenamente das vantagens da era digital através da criação de um mercado digital único.

3.1.4   A Convenção da UNESCO sobre a Protecção e a Promoção da Diversidade das Expressões Culturais, ratificada pela União Europeia em 2006, é extremamente útil para identificar as medidas que devem ser tomadas, devendo este ser um desiderato da União Europeia em matéria de digitalização das salas de cinema.

3.1.5   O Livro Verde Realizar o potencial das indústrias culturais e criativas. Além da sua contribuição directa para o PIB, as indústrias criativas e culturais também são importantes forças motrizes da inovação económica e social em muitos outros sectores.

3.1.6   O programa MEDIA 2007 é um vasto programa com uma componente de formação destinada aos profissionais da indústria audiovisual europeia. O seu objectivo é apoiar quem trabalha neste sector a adaptar-se à dimensão europeia e internacional do mercado audiovisual, promovendo a realização de acções de formação contínua e a utilização das novas tecnologias.

3.1.7   Não há financiamento suficiente para a digitalização das pequenas salas de cinema, em particular nas zonas rurais, sendo necessário utilizar os Fundos Estruturais, assegurar o co-financiamento nacional e facilitar o acesso dos exploradores de salas de cinema ao fundo de garantia para a produção no sector audiovisual, no âmbito do programa MEDIA.

4.   Análise da situação

4.1   A revolução digital levanta questões políticas ao nível regional, nacional e europeu:

a competitividade e a circulação das obras europeias;

o pluralismo e a diversidade linguística e cultural.

Importa que estes problemas sejam analisados e resolvidos de forma uniforme e equitativa por todos os intervenientes ao nível da UE.

4.2   Assinale-se que ao nível do apoio concedido pelas autoridades estatais dos Estados-Membros, o apoio financeiro tem sido até à data reservado à criação e produção cinematográficas, o que, na opinião do CESE, é muito louvável e imprescindível para a promoção da cultura cinematográfica dos respectivos estados, na condição de se passar à produção digital.

4.3   A Comissão aponta ainda para a importância de providenciar financiamento adicional para as matrizes digitais (master) e para os ecrãs digitais, para que os filmes possam ser distribuídos e vistos por um grande número de espectadores, na condição de ser financiada a reciclagem profissional das pessoas que perderam o emprego devido à introdução da nova tecnologia.

4.4   O texto levanta a questão do envolvimento maciço dos distribuidores e dos exploradores das salas de cinema, condição essencial para garantir a circulação das obras europeias e assegurar a diversidade do cinema europeu. O facto de os distribuidores serem também produtores do filme é irrelevante, na medida em que o preço do bilhete não é proibitivo. Tira-se proveito dos seus interesses de negócio para favorecer o cinema digital nacional/europeu.

4.5   Logo na Primavera de 2008, a Comissão Europeia e os Estados-Membros desenvolveram acções de apoio, tendo criado um grupo de peritos sobre cinema digital. Os debates apontaram para a necessidade de encontrar uma alternativa ao modelo existente Virtual Print Fee (Taxa de Cópia Virtual – VPF) e para o facto de que a digitalização depende da ajuda pública a nível nacional e do apoio financeiro da União Europeia.

4.6   Os «investidores intermediários» financiam, a montante, todo o equipamento digital para as salas de cinema digital. O distribuidor tem de reembolsar, desde a primeira projecção, o financiamento – a taxa VPF -, o que, de facto, equivale a comprar o equipamento digital.

4.7   Embora a comunicação inclua alguns exemplos de financiamentos que nos levam a supor que a revolução digital está em marcha, não sabemos concretamente se já desenvolveu uma velocidade de cruzeiro nem temos uma ideia precisa da eficiência e estabilidade dos equipamentos e, principalmente, da dimensão desta rede federativa de cinemas digitais, um dos pilares da construção europeia para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo.

4.8   À consulta pública sobre as oportunidades e desafios do cinema europeu na era digital, lançada pela Comissão Europeia em 16 de Outubro de 2009, responderam mais de 300 exploradores de salas de cinema, distribuidores, produtores, agentes de vendas e agentes de filmes, assim como agências profissionais e empresas de serviços digitais.

4.9   No entender do Comité, para vencer esta aposta, é preciso adaptar, a longo prazo, esta monitorização à variedade dos conteúdos culturais europeus.

4.10   Ao longo dos anos, o cinema foi-se deparando com vários desafios: o cinema mudo, o sistema Technicolor, o sistema Dolby Sound, etc. Mas actualmente o grande desafio é a revolução digital.

4.11   O Comité salienta que a digitalização traz também sérios desafios, técnicos e financeiros, no que diz respeito ao arquivo, à preservação a longo prazo e ao acesso aos filmes, aspectos estes que não são tratados na comunicação Não existe um plano a longo prazo para o arquivo digital, nem nenhuma forma comprovada de arquivo de conteúdos digitais para visualização posterior. Um produto arquivado digitalmente tem uma longevidade inferior à de um filme, os custos são mais elevados e o conteúdo digital aumenta exponencialmente. Paralelamente, surgem questões relacionadas com o acesso, a originalidade e a autenticidade.

4.12   O Comité considera que para dar resposta a estes desafios é essencial que haja uma cooperação em larga escala entre todas as partes interessadas, a fim de criar sistemas apropriados de armazenagem e arquivo, definir normas comuns e decidir um financiamento estável e fiável. As recomendações relativas a um quadro coerente de armazenagem e arquivo digitais incluem a garantia de acesso por um período de cem anos, medidas para evitar falhas e dificuldades financeiras por longos períodos, a capacidade de produzir cópias para satisfazer necessidades futuras de distribuição, uma qualidade de imagem/som igual ou superior ao original, bem como a protecção contra a dependência de plataformas tecnológicas instáveis.

4.13   A mesma comunicação insiste nas oportunidades oferecidas pela distribuição digital: sobrevivência dos arquivos cinematográficos e, também, distribuição em grande escala de filmes clássicos que, devido a uma técnica obsoleta, correm o risco de caírem em esquecimento.

4.14   O digital representa também uma oportunidade de reduzir os custos de produção e pós-produção. Uma matriz principal (Digital Source Master – DSM) pode ser explorada em vários domínios: cinematográfico, vídeo a pedido (VOD), DVD e televisão digital.

4.15   A distribuição digital oferece também uma outra oportunidade importante: vai além das fronteiras físicas, culturais e, principalmente, linguísticas através da simples apresentação de um filme no original, traduzido na língua do país em que vai ser exibido. Além disso, há cada vez mais DVD com legendagem em várias línguas.

4.16   Este processo digital permite igualmente ao realizador de um filme controlar até ao último momento a qualidade da cópia do master digital: imagem, efeitos especiais, luminosidade, banda sonora, efeitos sonoros, etc.

4.17   O Comité felicita a Comissão Europeia pelos seus esforços no sentido de encorajar os Estados-Membros que apoiam a sua própria produção de filmes a tirarem partido desta oportunidade oferecida pela distribuição digital, e a responderem ao desafio de garantir, através da sua participação na revolução digital, um futuro certo para o cinema digital, que permite aos cidadãos da União Europeia usufruírem da diversidade cultural.

4.18   O CESE salienta o potencial de desenvolvimento e a especificidade do emprego neste sector. Investir hoje nos recursos humanos é essencial para assegurar a difusão bem-sucedida do cinema digital na Europa, que é garante da qualidade e da especificidade da indústria cinematográfica europeia. É também importante reduzir ao máximo (por exemplo, através de formação adequada e de substituições) os custos sociais associados à transição para o digital, como a duplicação de pessoal para projecções e/ou laboratórios de filmes.

4.19   A Decisão relativa ao MEDIA 2007 prevê no artigo 3.o, n.o 1, alínea c), uma formação profissional que tenha em conta as tecnologias digitais para a produção, pós-produção, distribuição, comercialização e arquivo de obras audiovisuais europeias. O programa MEDIA 2007 deve ser revisto e alargado de forma a dar prioridade e satisfazer outros requisitos para além dos já exigidos.

4.20   O MEDIA 2007 apoia igualmente o outro aspecto do cinema digital, nomeadamente a distribuição e a difusão (artigo 5.o).

4.21   Os auxílios estatais, concedidos nos termos do artigo 107.o, n.o 3, alínea d), do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), constituem uma outra fonte de financiamento.

4.22   Normalização: em 2002, seis grandes empresas americanas estabeleceram uma série de especificações técnicas para o cinema digital: Digital Cinema Initiative (DCI).

4.23   Em 2005, a empresa Motion Picture and Television Engineers (SMPTE) publicou estas especificações DCI que passaram a ser a norma que serve de base ao cinema digital e foram adoptadas como normas internacionais pela Organização Internacional de Normalização (ISO), sediada em Genebra. Em 2011, a Comissão propôs a adopção de uma recomendação, aguardada com muito interesse, sobre a promoção de normas europeias específicas para o cinema digital europeu.

4.24   Na Europa, em comparação com os Estados Unidos, a percentagem de produções cinematográficas filmadas em digital, ou cuja pós-produção é assegurada em digital, é preocupantemente reduzida, colocando-nos numa posição muito atrás deste grande concorrente. Um exemplo eloquente: de todos os filmes digitais exibidos em França (30 filmes em 2007,50 em 2008), 35 eram produções norte-americanas, 10 produções europeias e 5 produções independentes.

4.25   Esforços para desenvolver as salas de cinema digital, sem se assegurar o apoio à produção digital europeia, levam ao estrangulamento das obras cinematográficas europeias e à capitulação perante produtores digitais de países terceiros.

4.26   Se este vasto programa europeu vier a fracassar, o cinema digital nada mais seria do que o colapso da ideia de uma coesão europeia baseada na modelação do conteúdo multicultural da União Europeia.

4.27   Moral da história: o cinema digital tem de recuperar o enorme atraso que tem.

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Encontro do presidente Staffan NILSSON com o comissário Michel BARNIER, em 6 de Janeiro de 2011.


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/149


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões: Reforma das regras da UE em matéria de auxílios estatais aplicáveis aos serviços de interesse económico geral»

[COM(2011) 146 final]

2011/C 248/26

Relator-Geral: Raymond HENCKS

Em 23 de Março de 2011, o Conselho decidiu, em conformidade com o artigo 304.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Comunicação da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões – Reforma das regras da UE em matéria de auxílios estatais aplicáveis aos serviços de interesse económico geral

COM(2011) 146 final.

Em 3 de Maio de 2011, a Mesa do Comité Económico e Social Europeu decidiu incumbir da preparação dos correspondentes trabalhos a Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação.

Dada a urgência dos trabalhos (artigo 59.o do Regimento), o Comité Económico e Social Europeu, na 472a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho) decidiu designar relator-geral Raymond HENCKS e adoptou, por 135 votos a favor, 6 votos contra e 16 abstenções, o seguinte parecer.

1.   Recomendações

1.1

O CESE congratula-se por a Comissão ter, em diálogo com as partes interessadas, reflectido sobre a oportunidade de reexaminar e clarificar as regras de financiamento dos serviços de interesse económico geral.

1.2

Subscreve plenamente a adopção de uma nova abordagem mais diversificada e mais proporcionada em relação aos vários tipos de serviços públicos e aprova a isenção de notificação para os serviços públicos de pequena escala e certos serviços sociais.

1.3

O CESE solicita, neste contexto, à Comissão que, para cada uma das modalidades de financiamento das compensações por obrigações de serviço público, clarifique se elas satisfazem os critérios Altmark e não estão, por conseguinte, sujeitas às regras aplicáveis aos «auxílios estatais».

1.4

Para acabar de vez com a sujeição a uma análise exclusivamente caso a caso, legislativa ou contenciosa, o Comité não pode deixar de aprovar a intenção da Comissão de clarificar a distinção entre serviços de interesse económico geral (SIEG) e serviços de interesse não económico geral (SINEG), continuando evidentemente persuadido de que, dada a dificuldade em definir a noção de SINEG/SIEG, a atenção não deverá incidir no carácter económico ou não, mas antes na missão específica dos serviços em questão e nas obrigações de serviço público.

1.5

Neste contexto, o Comité entende, pois, que as regras de aplicação das compensações pelas obrigações de serviço público relacionadas com os auxílios estatais podem ser mais democráticas para as dezenas de milhares de autoridades públicas que as deverão aplicar se dependerem da aplicação do processo legislativo ordinário, nos termos do artigo 14.o do TFUE, desde que compatíveis com as disposições do Tratado.

1.6

Se é certo que o incentivo aos Estados-Membros para que dêem maior peso às considerações de eficiência é bastante louvável, esta não deve, porém, centrar-se exclusivamente nos critérios económicos, mas deve ter em conta também os aspectos sociais, territoriais e ambientais e ainda critérios, tais como a qualidade, os resultados e a sustentabilidade.

1.7

O CESE teme que a introdução da noção de eficiência, em contrapartida, equivalha a alinhar os critérios de apreciação da decisão e do enquadramento pelo quarto critério do acórdão Altmark. Ademais, corre-se o risco de tal se aplicar a todas as compensações, inclusivamente às pagas por serviços públicos isentos de notificação.

1.8

Quanto à intenção da Comissão de clarificar os limites impostos aos Estados-Membros na qualificação de uma actividade de SIEG, o CESE recorda que, desde há bastante anos, tem vindo a solicitar que sejam clarificadas as condições de aplicação do artigo 106.o, n.o 2, que é alvo de interpretações díspares.

2.   Introdução

2.1

Existe nos diferentes Estados-Membros toda uma série de ajudas financeiras públicas de vários tipos, desde os auxílios estatais ao emprego, à formação, ao investimento, à investigação, à protecção do ambiente, às pequenas e médias empresas, aos auxílios de emergência e à reestruturação de empresas em dificuldade, às famílias, às pessoas em situação difícil, etc., até aos serviços de interesse geral (SIG).

2.2

No âmbito das regras da concorrência e do mercado interno, o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia define auxílio estatal como qualquer tipo de vantagem conferida numa base selectiva a uma ou mais empresas pelas autoridades nacionais.

2.3

Assim, para ser considerado auxílio estatal, o auxílio deverá satisfazer todos os seguintes critérios:

implicar transferência de recursos públicos pelas autoridades nacionais, regionais ou locais, quer directamente, quer por intermédio de um organismo público ou privado, seja qual for a sua forma (subvenções, bonificações, garantias de empréstimos, injecções de capital, provisões, etc.);

não fazer parte das medidas gerais, mas ser selectivo e discriminatório em relação a outras empresas ou organismos;

conferir ao beneficiário (empresa privada ou organismo público com ou sem fins lucrativos) uma vantagem económica que não teria obtido no quadro das suas actividades económicas normais;

ter um efeito potencial sobre a concorrência e as trocas comerciais entre Estados-Membros.

2.4

Em princípio, os auxílios estatais infra-referidos são proibidos pelo tratado (artigos 107.o e 108.o do TFUE); alguns são, não obstante, autorizados quando justificados por objectivos de interesse comum (serviços de interesse geral, coesão social e regional, emprego, investigação e desenvolvimento, desenvolvimento sustentável, promoção da diversidade cultural, etc.) ou para corrigir deficiências dos mercados, desde que não falseiem a concorrência de maneira que contrarie os interesses da UE.

2.5

A possibilidade dada aos Estados-Membros de atribuírem auxílios estatais foi enquadrada por um conjunto de actos legislativos e uma jurisprudência rica e evolutiva do Tribunal de Justiça Europeu, que criaram regras vinculativas para os Estados-Membros que pretendem instaurar esses dispositivos.

2.6

Assim, os Estados-Membros devem, em regra, salvo excepções (auxílio de minimis, auxílios abaixo de um determinado limiar, auxílios a sectores específicos), seguir um procedimento de notificação à Comissão dos auxílios que pretendem conceder. Só após autorização oficial da Comissão é que o auxílio pode ser posto em execução.

2.7

A Comissão, a única entidade habilitada a avaliar a compatibilidade dos auxílios estatais com o tratado (com possibilidade de recurso para o Tribunal de Justiça Europeu), detém, por conseguinte, importantes poderes de investigação, decisão e sanção nesta matéria.

2.8

Os SNEIG não são abrangidos pela legislação sobre os auxílios estatais.

2.9

Relativamente aos SIEG, a questão com que as autoridades públicas se confrontam é de saber se uma compensação por obrigações de serviço público constitui um auxílio estatal compatível com o tratado no âmbito das regras de concorrência e do mercado interno.

2.10

Em conformidade com o acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça (processo Altmark Trans GmbH C280/00), a compensação por um SIEG não constitui auxílio estatal desde que estejam reunidas todas as condições seguintes:

1.

as obrigações de serviço público estão claramente definidas;

2.

os parâmetros de cálculo da compensação são previamente estabelecidos;

3.

a compensação pelo serviço público não excede os custos e um lucro razoável;

4.

a escolha da empresa é efectuada no âmbito de um processo de concurso público que permita seleccionar o candidato capaz de fornecer esses serviços ao menor custo para a colectividade ou a compensação é determinada com base numa análise dos custos de uma empresa média do sector «bem gerida» e correctamente equipada.

2.11

Na sequência deste acórdão, vulgarmente designado «Acórdão Altmark», a Comissão verificou que poucas compensações satisfaziam estas quatro condições e que todas as outras compensações constituíam, portanto, «auxílios estatais». Adoptou, então, o pacote Monti-Kroes, que especifica:

1.

através de uma decisão, o que constitui auxílio estatal, sem, todavia, ter de ser objecto de notificação (Decisão 2005/842/CE relativa à aplicação do disposto no artigo 86.o, n.o 2, do Tratado CE / artigo 106.o, n.o 2, do TFUE aos auxílios estatais sob a forma de compensação de serviço público concedidos a certas empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse económico geral);

2.

através de um enquadramento – as modalidades de apreciação dos casos notificados (Enquadramento 2005/C 297/04 relativo aos auxílios estatais sob forma de compensação de serviço público);

3.

uma nova abordagem ao quarto critério Altmark, que consiste em calcular a compensação com base nos custos suplementares provocados pelo cumprimento da missão especial e não por comparação com uma empresa média bem gerida e correctamente equipada.

2.12

Este enquadramento, que visa estabelecer as regras e os princípios que determinam as condições em que as compensações de serviço público são compatíveis com o «mercado comum», com base no artigo 106.o, n.o 2, do TFUE, expira em Novembro de 2011.

2.13

Como, além disso, tanto o enquadramento como a decisão prevêem uma avaliação das regras por eles fixadas, a Comissão deu início à revisão do pacote Monti-Kroes, convidando os Estados-Membros em 2008/2009 a apresentarem um relatório sobre a aplicação do actual pacote e lançando, em 2010, uma consulta pública sobre o assunto.

2.14

Com base nestas duas acções, a Comissão elaborou orientações que constam da comunicação em apreço, cujo objectivo é, até Julho próximo, lançar, em colaboração com as instituições europeias e as outras partes interessadas, um debate de orientação antes da elaboração de novos projectos de textos legislativos.

3.   Conteúdo da comunicação

3.1

No âmbito do objectivo de elaborar instrumentos mais claros, mais simples, mais proporcionados, a comunicação prevê:

clarificar

a distinção entre actividades económicas e não económicas,

os limites impostos aos Estados-Membros na definição de uma actividade de SIEG,

a sua prestação a menor custo através dos meios mais eficientes e mais rentáveis,

a interacção com as regras sectoriais aplicáveis aos SIEG;

adoptar uma abordagem mais diversificada e mais proporcionada em relação aos vários tipos de serviços públicos;

simplificar a aplicação das regras a determinados tipos de serviços públicos de pequena escala prestados a nível local e com impacto limitado no comércio entre os Estados-Membros, bem como a certos tipos de serviços sociais de interesse geral;

dar maior peso às considerações de eficiência e de concorrência no caso de serviços comerciais de grande escala, que têm claramente uma dimensão europeia.

4.   Observações na generalidade

4.1

O CESE apoia o pedido dos Estados-Membros e de outras partes directamente implicadas expresso tanto no relatório sobre a aplicação do actual pacote Monti-Kroes como durante a consulta pública na matéria de que as regras respeitantes aos auxílios estatais aplicáveis aos SIEG sejam revistas, a fim de eliminar as inseguranças jurídicas e lograr um reequilíbrio mais harmonioso entre os interesses económicos, sociais e ambientais.

4.2

O CESE subscreve plenamente a adopção de uma abordagem mais diversificada e mais proporcionada em relação aos vários tipos de serviços públicos e destinada a clarificar as regras de financiamento. Aprova também a isenção de notificação para os serviços públicos de pequena escala e certos serviços sociais, que, no entanto, ainda estão por definir. É particularmente importante que se mantenham as isenções existentes em certas áreas (por exemplo, no atinente ao emprego dos grupos vulneráveis como as pessoas com deficiência).

4.3

Questiona-se, neste contexto, sobre as razões que levaram a Comissão a limitar ao perímetro local as isenções de notificação dos serviços de pequena escala, quando, de facto, a condição de não afectar as trocas comerciais entre os Estados-Membros deveria bastar, tanto a nível local como regional ou mesmo nacional.

4.4

De acordo com a comunicação, a revisão do pacote insere-se no âmbito dos objectivos mais vastos da Comissão no domínio dos serviços públicos, nomeadamente da sua comunicação intitulada «Um acto para o mercado único», bem como da Estratégia Europa 2020.

4.5

O CESE recorda, neste contexto, que no parecer sobre aquela comunicação (INT/548 de 15.3.2011) se afirma que o objectivo da comunicação e de outras medidas sobre os serviços públicos deveria ser ajudar os Estados-Membros a desenvolverem e a melhorarem os seus serviços públicos em conformidade com o protocolo sobre os SIG.

4.6

Nesta óptica, o CESE solicita à Comissão que, para cada uma das modalidades de financiamento das compensações por obrigações de serviço público, clarifique se elas satisfazem os critérios Altmark e não constituem, portanto, «auxílios estatais». Actualmente, há uma certa falta de conhecimento sobre os procedimentos de notificação e as várias isenções. Isso tem por consequência uma redução do mercado, uma vez que as organizações que dependem de compensações para prestar um serviço eficaz estão impossibilitadas de concorrer, o que tem um impacto directo nas vidas dos cidadãos da UE que se vêem privados de serviços de qualidade e acessíveis.

4.7

No entender do CESE, o facto de se ter inscrito no protocolo sobre os SIG a distinção entre serviços económicos e não económicos, sem, porém, ser superada a dificuldade em distinguir estas duas categorias, é prova evidente da necessidade de clarificação dos conceitos e dos regimes em causa, incluindo do papel das organizações sem fins lucrativos e da noção de «lucro razoável», para que deixem de estar dependentes de uma análise caso a caso, legislativa ou contenciosa. Face à dualidade que implica a existência de objectivos sociais e de objectivos de concorrência, é necessário clarificar o conceito de «lucro razoável». Será, portanto, mais útil que o nível europeu forneça orientações regulamentares e uma interpretação das considerações pertinentes neste âmbito.

4.8

O Comité não pode deixar de aprovar a intenção da Comissão de clarificar a distinção entre SIEG e SINEG. Como já teve ocasião de referir no seu parecer sobre «O futuro dos serviços sociais de interesse geral» (CESE 976/2006), a distinção entre carácter económico e não económico é imprecisa e incerta.

4.9

O CESE continua persuadido de que, tendo em conta, por um lado, a dificuldade em definir exaustivamente a noção de SINEG/SIEG e, por outro, o risco que uma abordagem restritiva comporta, a atenção não deverá incidir no carácter económico ou não, mas antes concentrar-se na missão específica dos serviços em questão e nas exigências (obrigações de serviço público) que lhes são impostas por uma autoridade pública para o cumprimento das suas funções e que deverão ser claramente estabelecidas.

4.10

Se é certo que o Tratado de Lisboa, por via do protocolo relativo aos serviços de interesse geral, introduziu instruções para a utilização das regras respeitantes aos SIG, económicos e não económicos, foi também o mesmo tratado que introduziu, através do artigo 14.o, uma nova base jurídica para os serviços de interesse económico geral ao confiar ao Conselho e ao Parlamento Europeu a responsabilidade pelo estabelecimento, por meio de regulamentos adoptados de acordo com o processo legislativo ordinário, dos princípios e das condições, designadamente económicas e financeiras, que lhes permitam cumprir as suas missões.

4.11

Neste contexto, o Comité entende, pois, que as regras de aplicação das compensações pelas obrigações de serviço público relacionadas com os auxílios estatais podem ser mais democráticas para as dezenas de milhares de autoridades públicas que as deverão aplicar se dependerem da aplicação do processo legislativo ordinário, nos termos do artigo 14.o do TFUE, desde que compatíveis com as disposições do Tratado.

4.12

O CESE congratula-se com a intenção da Comissão de incentivar os Estados-Membros a darem maior peso às considerações de eficiência. Esta não se deve centrar exclusivamente nos critérios económicos, mas deve ter em conta os aspectos sociais, territoriais e ambientais, em função das missões específicas de cada SIEG definidas pelas autoridades públicas. A Comissão não deve restringir os critérios de «eficiência» a considerações de curto prazo, mas deve ter em conta também a qualidade, os resultados e a sustentabilidade dos serviços, em especial no que toca à prestação de serviços sociais e de cuidados de saúde. Além disso, devem também ser tidas em conta as especificidades das empresas de economia social (cooperativas, mutualidade, associações e fundações).

4.13

Assim, uma boa parte dos serviços de interesse geral, como os serviços sociais ou de saúde, caracteriza-se por uma relação assimétrica entre prestador e beneficiário, que é diferente de uma relação comercial do tipo fornecedor-consumidor. Os serviços de interesse geral constituem, muitas vezes, soluções por medida, tendo em conta as especificidades da situação e as necessidades dos utentes; não podem funcionar senão com base no princípio da solidariedade e dependem fortemente dos financiamentos públicos. O CESE convida a Comissão a lançar uma consulta para examinar que serviços públicos dentro dos SSIG poderão beneficiar de uma isenção por categoria, dado não afectarem significativamente a concorrência nem oferecerem oportunidades transfronteiras.

4.14

Com este critério de eficiência, alinhar-se-iam, no fim de contas, os critérios de apreciação da decisão e do enquadramento pelo quarto critério do acórdão Altmark. Tal poderia, aliás, aplicar-se a todas as compensações, inclusivamente às pagas por serviços públicos de pequena escala prestados a nível local e com impacto limitado no comércio entre os Estados-Membros, bem como por certos serviços sociais de interesse geral, que a Comissão pretende, contudo, isentar de notificação e considerar compatíveis com o mercado interno. Significa isto que estes serviços continuam sujeitos a um controlo a posteriori e, daí, uma nova insegurança jurídica.

4.15

Tal insegurança existe ainda no respeitante à competência que a Comissão se atribui para avaliar a eficiência, quando, de facto, essa competência lhe é negada pelo Tribunal de Justiça no processo M6/TF1 (T-568/08 e T573/08).

4.16

Quanto à intenção da Comissão de clarificar os limites impostos aos Estados-Membros na qualificação de uma actividade de SIEG, o CESE solicita, há anos, que sejam clarificadas as condições de aplicação do artigo 106.o, n.o2, que é alvo de interpretações díspares, na medida em que, por um lado, ele é apresentado como derrogação ou excepção às regras gerais do tratado (ver Comunicação de 20.11.2007), mas, por outro, ficou consagrado no Livro Branco de 2004 que «o cumprimento efectivo de uma missão de interesse geral prevalece, em caso de tensão, sobre a aplicação das regras do Tratado».

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/153


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos pneumáticos dos veículos a motor e seus reboques bem como à respectiva instalação nesses veículos (codificação)

[COM(2011) 120 final — 2011/0053 (COD)]

2011/C 248/27

Em 1 de Abril de 2011 e em 24 de Março de 2011, respectivamente, o Conselho e o Parlamento Europeu decidiram, nos termos do artigo 114. ° do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa aos pneumáticos dos veículos a motor e seus reboques bem como à respectiva instalação nesses veículos (codificação)

COM(2011) 120 final — 2011/0053 (COD).

Considerando que o conteúdo da proposta é inteiramente satisfatório e não suscita quaisquer observações, o Comité, na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho), decidiu, por 157 votos a favor, 1 voto contra e 8 abstenções, emitir parecer favorável ao texto proposto.

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


25.8.2011   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 248/154


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados no ambiente» (codificação)

[COM(2011) 189 final — 2011/0080 (COD)]

2011/C 248/28

Em 10 de Maio de 2011, o Parlamento Europeu e em 3 de Maio de 2011, o Conselho, decidiram, nos termos do artigo 192. °, 1. o parágrafo, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, consultar o Comité Económico e Social Europeu sobre a

Proposta de directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados no ambiente (codificação)

COM(2011) 189 final — 2011/0080 COD.

Considerando que o conteúdo da proposta é inteiramente satisfatório, o qual, de resto, havia sido já objecto do parecer CESE 23/81 fin adoptado em 29 de Abril de 1981 (1), o Comité, na 472.a reunião plenária de 15 e 16 de Junho de 2011 (sessão de 15 de Junho), decidiu, por 154 votos a favor, 2 votos contra e 10 abstenções, emitir parecer favorável ao texto proposto, remetendo para a posição defendida no documento mencionado.

Bruxelas, 15 de Junho de 2011

O Presidente do Comité Económico e Social Europeu

Staffan NILSSON


(1)  Parecer do CESE sobre Proposta de directiva do Conselho relativa à avaliação dos efeitos de determinados projectos públicos e privados no ambiente, JO C 185 de 7 de Julho de 1981, p. 8.