ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção)

11 de julho de 2019 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Ambiente — Diretiva 2009/28/CE — Artigo 3.o, n.o 3, alínea a) — Promoção da utilização da energia proveniente de fontes renováveis — Produção de energia elétrica por instalações solares fotovoltaicas — Alteração de um regime de apoio — Princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança legítima»

Nos processos apensos C‑180/18, C‑286/18 e C‑287/18,

que têm por objeto três pedidos de decisão prejudicial apresentados, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Itália), por Decisões de 25 de janeiro de 2018, que deram entrada no Tribunal de Justiça em 9 de março de 2018, nos processos

Agrenergy Srl (C‑180/18 e C‑286/18),

Fusignano Due Srl (C‑287/18)

contra

Ministero dello Sviluppo Economico,

sendo interveniente:

Gestore dei servizi energetici (GSE) SpA,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Décima Secção),

composto por: C. Lycourgos, presidente de secção, M. Ilešič e I. Jarukaitis (relator), juízes,

advogado‑geral: H. Saugmandsgaard Øe,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos e após a audiência de 14 de março de 2019,

vistas as observações apresentadas:

em representação da Agrenergy Srl e da Fusignano Due Srl, por V. Cerulli Irelli e A. Lorizio, avvocati,

em representação da Gestore dei servizi energetici (GSE) SpA, por A. Segato e A. Pugliese, avvocati,

em representação do Governo italiano, por G. Palmieri, na qualidade de agente, assistida por G. Aiello, avvocato dello Stato,

em representação do Governo checo, por M. Smolek e J. Vláčil, na qualidade de agentes,

em representação do Governo helénico, por M. Tassopoulou, A. Magrippi e E. Tsaousi, na qualidade de agentes,

em representação do Governo espanhol, por A. Rubio González, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por G. Gattinara, T. Maxian Rusche e K. Talabér‑Ritz, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

Os pedidos de decisão prejudicial têm por objeto a interpretação do artigo 3.o, n.o 3, alínea a), da Diretiva 2009/28/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009, relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis que altera e subsequentemente revoga as Diretivas 2001/77/CE e 2003/30/CE (JO 2009, L 140, p. 16).

2

Estes pedidos foram apresentados no âmbito de litígios que opõem a Agrenergy Srl (processos C‑180/18 e C‑286/18) e a Fusignano Due Srl (processo C‑287/18) ao Ministero dello Sviluppo Economico (Ministério do Desenvolvimento Económico, Itália) a respeito da legalidade de um decreto ministerial e do direito destas empresas de beneficiar das tarifas de incentivo previstas por um decreto ministerial anterior.

Quadro jurídico

Direito da União

3

Nos termos do considerando 25 da Diretiva 2009/28:

«Os Estados‑Membros têm potenciais diferentes de energia renovável e utilizam diferentes regimes de apoio a nível nacional para as fontes de energia renováveis. A maioria dos Estados‑Membros aplica regimes de apoio que só concedem incentivos a energias provenientes de fontes renováveis produzidas no seu território. Para que os regimes de apoio nacionais funcionem adequadamente, é importante que os Estados‑Membros possam controlar o efeito e os custos desses mesmos regimes em função dos seus diferentes potenciais. Uma forma importante de alcançar o objetivo da presente diretiva é garantir o correto funcionamento dos regimes de apoio nacionais, à semelhança do disposto na Diretiva 2001/77/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de setembro de 2001, relativa à promoção da eletricidade produzida a partir de fontes de energia renováveis no mercado interno da eletricidade (JO 2001, L 283, p. 33)], a fim de manter a confiança dos investidores e permitir aos Estados‑Membros conceberem medidas nacionais eficazes para o cumprimento dos objetivos. […]»

4

O artigo 1.o da Diretiva 2009/28, com a epígrafe «Objeto e âmbito de aplicação», dispõe:

«A presente diretiva estabelece um quadro comum para a promoção de energia proveniente das fontes renováveis. Fixa objetivos nacionais obrigatórios para a quota global de energia proveniente de fontes renováveis no consumo final bruto de energia e para a quota de energia proveniente de fontes renováveis consumida pelos transportes. […]»

5

O artigo 3.o da referida diretiva, sob a epígrafe «Objetivos globais nacionais obrigatórios e medidas para a utilização de energia proveniente de fontes renováveis», prevê:

«1.   Cada Estado‑Membro deve assegurar que a sua quota de energia proveniente de fontes renováveis, calculada nos termos dos artigos 5.o a 11.o, no consumo final bruto de energia em 2020 seja, pelo menos, igual ao objetivo nacional para a quota de energia proveniente de fontes renováveis estabelecida para esse ano na terceira coluna do quadro da parte A do anexo I. Estes objetivos globais nacionais obrigatórios devem ser coerentes com uma quota de pelo menos 20 % de energia proveniente de fontes renováveis no consumo final bruto de energia da [União] até 2020. Para alcançar mais facilmente o objetivo estabelecido no presente artigo, os Estados‑Membros devem promover e incentivar a eficiência energética e as poupanças de energia.

2.   Os Estados‑Membros devem introduzir medidas efetivamente concebidas para assegurar que a sua quota de energia proveniente de fontes renováveis seja igual ou superior à fixada na trajetória indicativa fixada na parte B do anexo I.

3.   Para alcançar os objetivos fixados nos n.os 1 e 2, os Estados‑Membros podem, nomeadamente, aplicar as seguintes medidas:

a)

Regimes de apoio;

[…]»

Direito italiano

6

O artigo 23.o do decreto legislativo n.o 28 — Attuazione della direttiva 2009/28/CE sulla promozione dell’uso dell’energia da fonti rinnovabili, recante modifica e successiva abrogazione delle direttive 2001/77/CE e 2003/30/CE (Decreto Legislativo n.o 28 que transpõe a Diretiva 2009/28/CE, relativa à promoção da utilização da energia proveniente de fontes renováveis que altera e subsequentemente revoga as Diretivas 2001/77/CE e 2003/30/CE), de 3 de março de 2011 (suplemento ordinário do GURI n.o 71, de 28 de março de 2011, a seguir «Decreto Legislativo n.o 28/2011»), prevê, como resulta dos autos remetidos ao Tribunal de Justiça, que se aplicam princípios da gradação da intervenção para salvaguarda dos investimentos efetuados, da proporcionalidade em relação aos objetivos, bem como da flexibilidade da estrutura dos regimes de apoio, com o objetivo de ter em consideração os mecanismos do mercado e a evolução das tecnologias das fontes renováveis e da eficiência energética.

7

O artigo 25.o deste decreto legislativo dispõe:

«1.   A produção de energia elétrica proveniente de instalações que utilizem fontes renováveis e que tenham entrado em funcionamento até 31 de dezembro de 2012 é incentivada pelos mecanismos existentes à data de entrada em vigor do presente decreto […]

[…]

10.   […] [O] incentivo à produção de energia elétrica proveniente de instalações solares fotovoltaicas que entraram em funcionamento depois de [31 de maio de 2011] é regulamentado pelo decreto do [ministro do Desenvolvimento Económico] que deve ser adotado em cooperação com o Ministro dell’ambiente e della tutela del [território e del] mare [ministro do Ambiente e da Proteção do Território e do Mar, Itália], após consulta da Conferenza unificata [Conferência Unificada, Itália] referida no artigo 8.o do Decreto Legislativo n.o 281 [Decreto Legislativo n.o 281], de 28 de agosto de 1997, até 30 de abril de 2011, com base nos seguintes princípios:

a)

determinação de um limite anual de potência elétrica cumulativa das instalações fotovoltaicas que podem beneficiar das tarifas de incentivo;

b)

determinação de tarifas de incentivo tendo em conta a redução do custo das tecnologias e das instalações, bem como das medidas de incentivo aplicadas nos Estados‑Membros da União Europeia;

c)

previsão das tarifas de incentivo e das quotas diferenciadas, tendo em conta a natureza das instalações;

d)

aplicação das disposições do artigo 7.o do decreto legislativo n.o 387 [Decreto Legislativo n.o 387] de 29 de dezembro de 2003, no limite da sua compatibilidade com o presente número.»

8

O artigo 1.o, n.o 2, do decreto ministeriale — Incentivazione della produzione di energia elettrica da impianti solari fotovoltaici (Decreto Ministerial relativo ao incentivo da produção de energia elétrica proveniente de instalações solares fotovoltaicas), de 5 de maio de 2011 (GURI n.o 109, de 12 de maio de 2011, a seguir «Quarto Programa Energia»), aplicava‑se às instalações fotovoltaicas que entraram em funcionamento depois de 31 de maio de 2011 e até 31 de dezembro de 2016, para um objetivo indicativo de potência instalada a nível nacional de cerca de 23000 megawatts (MW), correspondente a um custo indicativo cumulado anual dos incentivos que se pode estimar entre 6 e 7 mil milhões de euros.

9

O artigo 2.o do Quarto Programa Energia previa:

«Critérios gerais do regime de apoio:

1.   O regime de apoio é aplicado de acordo com objetivos indicativos de evolução no tempo da potência das instalações — objetivos que devem ser compatíveis com as previsões anuais em matéria de despesas.

2.   Sem prejuízo das disposições transitórias de elegibilidade para os incentivos previstas para 2011 e 2012, a ultrapassagem dos custos anuais indicativos definidos para cada ano ou fração de ano não limita o acesso às tarifas de incentivo, mas implica uma redução suplementar destas últimas para o período seguinte, tendo em conta o custo indicativo cumulado anual referido no artigo 1.o, n.o 2.

3.   Quando o menor dos valores do custo indicativo cumulado anual a que se refere o artigo 1.o, n.o 2, for atingido, as modalidades de incentivo estabelecidas no presente decreto podem ser revistas por decreto do ministro do Desenvolvimento Económico em cooperação com o ministro do Ambiente e da Proteção do Território e do Mar, após consulta da [Conferência Unificada], num sentido que favoreça, em qualquer caso, o posterior desenvolvimento do setor.»

10

O artigo 6.o deste programa energia dispõe:

«Condições gerais de acesso às tarifas de incentivo:

1.   As instalações beneficiam de tarifas de incentivo segundo as modalidades e no respeito das condições fixadas pelo presente decreto.

2.   As grandes instalações que entraram em funcionamento até 31 de agosto de 2011 beneficiam diretamente das tarifas de incentivo, sem prejuízo da obrigação de notificar a Gestore dei servizi energetici (GSE) SpA da entrada em funcionamento no prazo de 15 dias a contar desta.

3.   Para 2011 e 2012, as grandes instalações que não constem das referidas no n.o 2 beneficiam de tarifas de incentivo se estiverem preenchidas ambas as seguintes condições adicionais:

a)

a instalação foi inscrita no registo previsto no artigo 8.o em posição útil para estar abrangida pelos limites específicos de custos definidos para cada um dos períodos de referência previstos no artigo 4.o, n.o 2. Neste contexto, o limite máximo dos custos para 2011 inclui os custos ligados às medidas de incentivo para grandes instalações que entraram em funcionamento até 31 de agosto de 2011. Ainda que todos os custos relacionados com as medidas de incentivo para grandes instalações que entraram em funcionamento até 31 de agosto de 2011 e para aquelas inscritas no registo referido no artigo 8.o impliquem, para 2011, uma ultrapassagem do limite de custos previsto para o mesmo período, o excedente dá origem a uma redução de igual importância do limite de custos relativo ao segundo semestre de 2012;

[…]»

11

O preâmbulo do decreto ministeriale — Attuazione dell’art. 25 del decreto legislativo del 3 marzo 2011, n.o 28, recante incentivazione della produzione di energia elettrica da impianti solari fotovoltaici (Decreto Ministerial relativo à aplicação do artigo 25.o do Decreto Legislativo n.o 28, de 3 de março de 2011, que estabelece medidas de incentivo à produção de energia elétrica proveniente de instalações solares fotovoltaicas), de 5 de julho de 2012 (suplemento ordinário do GURI n.o 159, de 10 de julho de 2012, a seguir «Quinto Programa Energia»), tem a seguinte redação:

«Considerando que, no que respeita à energia solar fotovoltaica, a redução rápida do custo das instalações implicou um crescimento acelerado do volume das instalações, que acarretou, entre outras consequências, o aumento dos encargos relacionados com o apoio, para além da apropriação de outros terrenos agrícolas;

considerando que vários outros países europeus adotaram medidas destinadas a reduzir os incentivos à energia fotovoltaica, tendo em conta o nível elevado dos encargos relacionados com o apoio e a redução do custo das instalações, e que é necessário, também para preservar a concorrência e proteger os utilizadores finais, atender a normas europeias em matéria de incentivos;

visto que, na perspetiva do desenvolvimento posterior do setor, subsistem margens importantes de redução dos incentivos relativamente aos que foram pagos durante os últimos anos, tendo em conta o nível dos incentivos nos outros países europeus e a rentabilidade habitual dos investimentos;

visto que o desenvolvimento futuro da energia solar fotovoltaica deve ser orientado para aplicações que permitam reduzir a apropriação de território, estimular a inovação tecnológica e a eficiência energética e gerar efeitos positivos suplementares no que diz respeito à proteção do ambiente e às repercussões económicas […]»

12

O artigo 1.o do Quinto Programa Energia prevê:

«1.   Em conformidade com o artigo 25.o, n.o 10, do Decreto Legislativo [n.o 28/2011] e tendo em conta o disposto no artigo 2.o, n.o 3, do Decreto Ministerial de 5 de maio de 2011, o presente decreto fixa as modalidades dos incentivos à produção de energia elétrica de fonte fotovoltaica que devem ser aplicadas uma vez atingido o custo indicativo cumulado anual de 6 mil milhões de euros para os incentivos. […]

5.   O presente decreto deixa, em todo o caso, de ser aplicável, no termo de um prazo de trinta dias a contar da data em que for atingido um custo indicativo cumulado anual de 6,7 mil milhões de euros. A data em que é atingido o referido valor anual de 6,7 mil milhões de euros é comunicada pela Autoridade para a energia elétrica e o gás, com base nos elementos fornecidos pela GSE, segundo as modalidades previstas no n.o 2.»

Litígios nos processos principais e questão prejudicial

13

A Agrenergy e a Fusignano Due são empresas que operam no domínio da construção, gestão e manutenção de instalações de produção de energia proveniente de fontes renováveis. As instalações em causa nos processos principais foram concluídas durante o ano de 2011 e entraram em funcionamento em 29 de fevereiro de 2012. Os processos C‑180/18 e C‑286/18 dizem respeito a instalações fotovoltaicas no solo implantadas pela Agrenergy em terrenos agrícolas, respetivamente, da comuna de Fusignano (Itália) e da comuna de Massa Lombarda (Itália). O processo C‑287/18 diz respeito a uma instalação implantada pela Fusignano Due no território da comuna de Fusignano.

14

Segundo o sistema instituído pelo Decreto Legislativo n.o 28/2011, a GSE aplica ao proprietário de uma instalação fotovoltaica ligada à rede elétrica nacional e que tenha uma potência nominal de pelo menos 1 kilowatt (kW) uma tarifa vantajosa para a energia produzida. A possibilidade de beneficiar destas tarifas depende da classificação dos operadores económicos em causa no registo informático em que estão inscritos, e pode diminuir em função da ultrapassagem dos limites dos custos de incentivos concedidos durante um período anterior.

15

As recorrentes nos processos principais impugnaram, no Tribunale amministrativo regionale per il Lazio (Tribunal Administrativo Regional do Lácio, Itália), o Quinto Programa Energia, que reduziu consideravelmente os incentivos à produção de energia elétrica proveniente de instalações solares fotovoltaicas. Solicitaram usufruir da tarifa de incentivo mais vantajosa prevista no Quarto Programa Energia, alegando que as instalações em causa preenchiam as condições para beneficiar dos incentivos previstos por este último programa energia.

16

O Tribunale amministrativo regionale per il Lazio (Tribunal Administrativo Regional do Lácio) negou provimento aos recursos interpostos, com o fundamento de que a não abertura do registo relativo ao segundo semestre de 2012 era legal, à luz das disposições do artigo 6.o do Quarto Programa Energia, na medida em que a totalidade dos custos associados ao sistema de incentivo às grandes instalações que entraram em funcionamento até 31 de agosto de 2011 e o número dos inscritos nesse registo tinham levado a que se excedesse o limite de custos previsto para o mesmo período. Com efeito, segundo esse órgão jurisdicional, como tinha sido anunciado pela GSE, o custo das medidas de incentivo a essas instalações e às que tinham sido inscritas no anterior registo tinha tido por efeito esgotar a dotação para o segundo semestre de 2012, o que tinha justificado a não abertura do referido registo.

17

Além disso, o regime de apoio às instalações produtoras da energia renovável não constituía uma obrigação, sendo apenas uma das formas possíveis de os Estados‑Membros atingirem os objetivos de produção de energia renovável fixados pela Diretiva 2009/28. O Quinto Programa Energia teria operado a revisão do sistema de incentivos, no âmbito de uma aplicação coerente e racional dos princípios da gradação, da flexibilidade, da eficácia e da eficiência estabelecidos nesta diretiva.

18

As recorrentes nos processos principais interpuseram recurso das decisões do Tribunale amministrativo regionale per il Lazio (Tribunal Administrativo Regional do Lácio) no Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional, Itália). Em apoio dos seus recursos, alegam, em substância, que não puderam beneficiar das tarifas mais vantajosas previstas no Quarto Programa Energia, devido à não abertura, pela GSE, do registo relativo ao segundo semestre de 2012 e alegam que o Quinto Programa Energia é contrário à legislação italiana e à Diretiva 2009/28 e viola o princípio da proteção da confiança legítima.

19

O órgão jurisdicional de reenvio salienta que o regime transitório referido no artigo 1.o do Quinto Programa Energia se aplica às instalações «inscritas em posição útil nos registos» relativos ao regime previsto pelo Quarto Programa Energia, e não àquelas que, se esses registos tivessem sido abertos, teriam preenchido as condições para, simplesmente, aí estarem incluídas. Por consequência, as instalações das recorrentes nos processos principais não podem beneficiar da tarifa prevista por este último programa energia, uma vez que foram classificadas, no registo correspondente, numa posição não suficiente.

20

Por outro lado, considera que o facto de ter atingido o limite máximo de despesas fixado antecipadamente pela regulamentação nacional em causa justificou a não abertura do registo para o segundo semestre de 2012, estando já esgotada a dotação financeira prevista. A GSE publicitou devidamente essas circunstâncias, de modo que as recorrentes nos processos principais não poderiam invocar uma confiança legítima na possibilidade de obter a tarifa de incentivo prevista pelo Quarto Programa Energia.

21

O órgão jurisdicional de reenvio considera que a regulamentação italiana é compatível com a Diretiva 2009/28, uma vez que esta última não impõe aos Estados‑Membros a obrigação de preverem um regime imutável de apoio à produção de energia proveniente de fontes renováveis. Com efeito, segundo o referido órgão jurisdicional, esta diretiva visa promover a produção de energia proveniente de fontes renováveis e define objetivos relativos à quota de produção energética proveniente dessas fontes no total nacional. A elaboração de regimes de apoio a esta produção é uma das medidas que podem ser tomadas pelos Estados‑Membros a este respeito e, por conseguinte, esses regimes têm caráter opcional e facultativo. Além disso, o considerando 25 da Diretiva 2009/28 salienta a flexibilidade estrutural dos regimes de apoio, que devem adaptar‑se às circunstâncias e às restrições orçamentais dos Estados‑Membros. Esta abordagem é respeitada pela regulamentação nacional em causa nos processos principais, que prevê regimes de apoio aplicáveis em função das necessidades do momento.

22

Além disso, resulta do preâmbulo do Quinto Programa Energia que a redução das medidas de incentivo se deve ao facto de a República Italiana se ter antecipado aos objetivos de produção de energia proveniente de fontes renováveis, de as instalações terem um custo inferior ao anterior, de os custos suportados pelas finanças públicas serem cada vez mais elevados, de os outros Estados‑Membros estarem a reduzir também os seus sistemas de incentivos, de ser oportuno limitar o desgaste dos solos e de ser prioritário investir na eficiência energética, no calor e nos transportes, sendo estas medidas consideradas em média economicamente mais eficazes.

23

Nestas condições, o Consiglio di Stato (Conselho de Estado, em formação jurisdicional) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça, em cada um dos processos apensos, a seguinte questão prejudicial:

«Deve o artigo 3.o, n.o 3, alínea a), da Diretiva [2009/28] ser interpretado — designadamente à luz do princípio geral de proteção da confiança legítima e de todo o sistema de regulação previsto n[ess]a diretiva em matéria de incentivos à produção de energia a partir de fontes renováveis — no sentido de que exclui a compatibilidade com o direito da União [Europeia] da legislação nacional que permite ao Governo italiano estabelecer, por meio de decretos de execução sucessivos, a redução ou mesmo a supressão das tarifas de incentivo à produção de energia anteriormente estabelecidas?»

Quanto à questão prejudicial

24

Com a sua questão, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 3.o, n.o 3, alínea a), da Diretiva 2009/28, lido à luz dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança legítima, deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional, como a que está em causa nos processos principais, que permite a um Estado‑Membro prever a redução, ou mesmo a supressão, das tarifas de incentivo anteriormente fixadas para a energia produzida pelas instalações solares fotovoltaicas.

25

Importa recordar que, conforme resulta do seu artigo 1.o, a Diretiva 2009/28 tem por objeto estabelecer um quadro comum para a promoção de energia proveniente das fontes renováveis, fixando, nomeadamente, objetivos nacionais obrigatórios para a quota global de energia proveniente dessas fontes no consumo final bruto de energia.

26

O artigo 3.o, n.o 3, alínea a), da Diretiva 2009/28 prevê que os Estados‑Membros podem aplicar regimes de apoio para alcançar os objetivos previstos no artigo 3.o, n.os 1 e 2, desta diretiva, segundo os quais, por um lado, cada Estado‑Membro deve assegurar que a quota de energia proveniente de fontes renováveis no consumo final bruto de energia em 2020 seja, pelo menos, igual ao objetivo nacional, tal como previsto no anexo I, parte A, da referida diretiva, e, por outro, que os Estados‑Membros devem introduzir medidas efetivamente concebidas para assegurar que a sua quota de energia proveniente de fontes renováveis seja igual ou superior à fixada na trajetória indicativa fixada na parte B do anexo I da mesma diretiva.

27

O Tribunal de Justiça declarou que, como resulta da própria letra do artigo 3.o, n.o 3, alínea a), da Diretiva 2009/28 e, em particular, do termo «podem», os Estados‑Membros não estão de modo algum obrigados a adotar regimes de apoio para promover a utilização de energia proveniente de fontes renováveis. Têm, assim, uma margem de apreciação quanto às medidas que considerem apropriadas para alcançar os objetivos globais nacionais obrigatórios fixados no artigo 3.o, n.os 1 e 2, desta diretiva, lido em conjugação com o anexo I da mesma (v., neste sentido, Acórdão de 20 de setembro de 2017, Elecdey Carcelen e o., C‑215/16, C‑216/16, C‑220/16 e C‑221/16, EU:C:2017:705, n.os 31 e 32). Essa margem de apreciação implica que os Estados‑Membros sejam livres de adotar, modificar ou suprimir regimes de apoio, desde que, nomeadamente, esses objetivos sejam atingidos.

28

Além disso, importa salientar que, como decorre de jurisprudência constante, quando os Estados‑Membros adotam medidas através das quais põem em prática o direito da União, devem respeitar os princípios gerais deste direito, entre os quais figura, nomeadamente, o princípio da segurança jurídica (Acórdão de 1 de julho de 2014, Ålands Vindkraft, C‑573/12, EU:C:2014:2037, n.o 125 e jurisprudência referida).

29

Também segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, o princípio da segurança jurídica, que tem como corolário o princípio da proteção da confiança legítima, exige, por um lado, que as regras jurídicas sejam claras e precisas e, por outro, que a sua aplicação seja previsível para os sujeitos de direito, em particular quando possam ter consequências desfavoráveis para os indivíduos e as empresas (v., neste sentido, Acórdão de 11 de junho de 2015, Berlington Hungary e o., C‑98/14, EU:C:2015:386, n.o 77).

30

O referido princípio exige, em particular, que a legislação permita aos interessados conhecer com exatidão a extensão das obrigações que ela lhes impõe e que estes últimos possam conhecer sem ambiguidade os seus direitos e obrigações e agir em conformidade (v., designadamente, Acórdão de 1 de julho de 2014, Ålands Vindkraft, C‑573/12, EU:C:2014:2037, n.o 128 e jurisprudência referida).

31

Quanto ao princípio da proteção da confiança legítima, resulta de jurisprudência constante do Tribunal de Justiça que a possibilidade de invocar este último é reconhecida a qualquer operador económico em relação ao qual a autoridade nacional tenha feito surgir esperanças fundadas. Todavia, quando um operador económico prudente e avisado esteja em condições de prever a adoção de uma medida suscetível de afetar os seus interesses, não poderá invocar o benefício de tal princípio, quando essa medida for adotada. Além disso, os operadores económicos não têm fundamento para depositar a sua confiança legítima na manutenção de uma situação existente que pode ser alterada no quadro do poder de apreciação das autoridades nacionais (Acórdão de 10 de setembro de 2009, Plantanol, C‑201/08, EU:C:2009:539, n.o 53 e jurisprudência referida).

32

Por outro lado, no tocante a um regime previsto por uma regulamentação nacional, é atendendo às modalidades de informação normalmente utilizadas pelo Estado‑Membro que a adotou e às circunstâncias do caso concreto que o órgão jurisdicional de reenvio deve apreciar, de forma global e in concreto, se a confiança legítima dos operadores económicos visados por essa regulamentação foi devidamente respeitada (Acórdão de 10 de setembro de 2009, Plantanol, C‑201/08, EU:C:2009:539, n.o 57).

33

Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio examinar se uma legislação nacional como a que está em causa nos processos principais é conforme com os referidos princípios, uma vez que o Tribunal de Justiça, ao conhecer de um reenvio prejudicial a título do artigo 267.o TFUE, só é competente para fornecer a esse órgão jurisdicional todos os elementos de interpretação do direito da União que possam permitir‑lhe apreciar essa conformidade (Acórdão de 1 de julho de 2014, Ålands Vindkraft, C‑573/12, EU:C:2014:2037, n.o 126 e jurisprudência referida).

34

O órgão jurisdicional de reenvio pode, para este efeito, ter em conta todos os elementos pertinentes que decorrem da letra, da finalidade e da economia das legislações em causa (Acórdão de 11 de junho de 2015, Berlington Hungary e o., C‑98/14, EU:C:2015:386, n.o 81 e jurisprudência referida).

35

Com vista a fornecer uma resposta útil ao órgão jurisdicional de reenvio, há que salientar, em particular, os seguintes elementos que resultam dos autos remetidos ao Tribunal de Justiça.

36

Em primeiro lugar, o Decreto Legislativo n.o 28/2011, que transpôs a Diretiva 2009/28 para o direito italiano, já previa, no seu artigo 25.o, n.o 10, que um decreto ministerial devia regular o incentivo à produção de energia elétrica proveniente de instalações solares fotovoltaicas e que esse decreto se basearia nos princípios da determinação de um limite anual de potência elétrica cumulativa das instalações fotovoltaicas suscetíveis de beneficiar das tarifas de incentivo, e da determinação dessas tarifas, que têm em conta a diminuição do custo das tecnologias e das instalações, bem como as medidas de incentivo aplicadas nos outros Estados‑Membros e a natureza do local de implantação das instalações.

37

Em segundo lugar, o Quarto Programa Energia, adotado em aplicação desta disposição, previa, por um lado, no seu artigo 6.o, n.o 2, que as grandes instalações que entraram em funcionamento até 31 de agosto de 2011 beneficiavam diretamente das tarifas de incentivo. Todavia, é pacífico que as instalações em causa nos processos principais não satisfaziam esta condição, uma vez que tinham entrado em funcionamento após essa data.

38

Por outro lado, o artigo 6.o, n.o 3, alínea a), do Quarto Programa Energia estabelecia, para as instalações que não faziam parte das que tinham entrado em funcionamento até essa data, uma condição de elegibilidade para as medidas de incentivo, a saber, a inscrição em posição útil num dos registos abertos pela GSE. Estes registos eram, em princípio, abertos semestralmente e as instalações aí inscritas segundo uma classificação, nos termos da qual acediam às medidas de incentivo. A GSE refere que publicava no seu sítio Internet, por um lado, um «contador fotovoltaico» a indicar o número de instalações que beneficiavam de medidas de incentivo e o custo anual suportado para o seu incentivo e, por outro, avisos que assinalavam a falta de abertura dos registos, quando os limites máximos de custos eram atingidos.

39

A este respeito, o Quarto Programa Energia limitou os custos indicativos cumulados de incentivos a 6 mil milhões de euros, correspondendo este montante a um objetivo indicativo de potência a nível nacional de cerca de 23000 MW e que obstavam, quando fosse atingido, à abertura de novos registos. Este programa energia previa igualmente que, quando o referido montante fosse alcançado, o regime de incentivos podia ser alterado. No caso em apreço, o montante de 6 mil milhões de euros foi atingido no mês de março de 2012 e, consequentemente, o registo das «grandes instalações» não foi aberto relativamente ao segundo semestre de 2012. O Quinto Programa Energia foi adotado nos termos do artigo 25.o do Decreto Legislativo n.o 28/2011.

40

O Governo italiano alega que estas circunstâncias deviam ser conhecidas pelas recorrentes nos processos principais. Estas últimas reconhecem, nas suas observações escritas, ter tomado conhecimento de uma comunicação da GSE relativa ao esgotamento do montante dos incentivos previstos pelo Quarto Programa Energia e à não abertura de um novo registo.

41

Daqui decorre que, sob reserva de verificações pelo órgão jurisdicional de reenvio, a possibilidade de usufruir das tarifas de incentivo previstas pelo Quarto Programa Energia dependia, por um lado, da inscrição em posição útil de uma instalação solar fotovoltaica num registo aberto pela GSE e, por outro, da não ultrapassagem do referido limite dos custos de incentivo indicativos durante o período anterior. Tal incentivo não era, portanto, oferecido a todos os operadores de instalações solares fotovoltaicas e também não estava garantido durante um período específico, mas dependia das condições e das circunstâncias acima referidas.

42

Todas estas condições parecem resultar claramente da regulamentação nacional em causa nos processos principais, pelo que a sua aplicação deveria, em princípio, ter sido previsível para os operadores económicos em questão, o que cabe igualmente ao órgão jurisdicional de reenvio verificar.

43

Com efeito, resulta dos autos remetidos ao Tribunal de Justiça que as disposições regulamentares em causa nos processos principais foram devidamente publicadas, eram suficientemente precisas e as recorrentes nos processos principais tinham tido conhecimento do seu conteúdo.

44

Além disso, estas disposições eram suscetíveis de indicar de imediato a operadores económicos prudentes e avisados que o regime de incentivo aplicável às instalações solares fotovoltaicas podia ser adaptado ou mesmo suprimido pelas autoridades nacionais, para ter em conta a evolução de certas circunstâncias e que, por conseguinte, nenhuma certeza na manutenção de tal regime no decurso de um determinado período podia basear‑se nas disposições da referida regulamentação.

45

Com a adoção do Quinto Programa Energia, o legislador italiano parece ter previsto precisamente, tendo em conta a evolução de certas circunstâncias, a adaptação desse regime de incentivos nas condições fixadas por esse Quinto Programa Energia.

46

Perante os elementos precedentes e sem prejuízo das apreciações que são da competência exclusiva do órgão jurisdicional de reenvio, a regulamentação em causa nos processos principais não se afigura suscetível de violar os princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança legítima, nem incompatível com a Diretiva 2009/28.

47

Atendendo às considerações precedentes, há que responder à questão submetida que, sob reserva das verificações que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio efetuar tendo em conta todos os elementos relevantes, o artigo 3.o, n.o 3, alínea a), da Diretiva 2009/28, lido à luz dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança legítima, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação nacional, como a que está em causa nos processos principais, que permite a um Estado‑Membro prever a redução, ou mesmo a supressão, das tarifas de incentivo anteriormente fixadas para a energia produzida pelas instalações solares fotovoltaicas.

Quanto às despesas

48

Revestindo o processo, quanto às partes nas causas principais, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Décima Secção) declara:

 

Sob reserva das verificações que cabe ao órgão jurisdicional de reenvio efetuar tendo em conta todos os elementos relevantes, o artigo 3.o, n.o 3, alínea a), da Diretiva 2009/28/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de abril de 2009, relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis que altera e subsequentemente revoga as Diretivas 2001/77/CE e 2003/30/CE, lido à luz dos princípios da segurança jurídica e da proteção da confiança legítima, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação nacional, como a que está em causa nos processos principais, que permite a um Estado‑Membro prever a redução, ou mesmo a supressão, das tarifas de incentivo anteriormente fixadas para a energia produzida pelas instalações solares fotovoltaicas.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: italiano.