ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção)

22 de março de 2018 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Sistemas de garantia de depósitos e de indemnização dos investidores — Diretiva 94/19/CE — Artigo 1.o, n.o 1 — Depósitos — Situações transitórias provenientes de operações bancárias normais — Diretiva 97/9/CE — Artigo 2.o, n.o 2, segundo parágrafo — Fundos devidos a um investidor ou que lhe pertençam e que sejam detidos por sua conta no âmbito de operações de investimento — Instituição de crédito emissora de valores mobiliários — Fundos entregues por particulares a essa instituição pela subscrição de futuros valores mobiliários — Aplicação da Diretiva 2004/39/CE — Insolvência da referida instituição antes da emissão dos valores mobiliários em causa — Empresa pública encarregada dos sistemas de garantia dos depósitos e da indemnização dos investidores — Oponibilidade das Diretivas 94/19/CE e 97/9/CE a essa empresa»

Nos processos apensos C‑688/15 e C‑109/16,

que têm por objeto pedidos de decisão prejudicial apresentados, nos termos do artigo 267.o TFUE, pelo Lietuvos Aukščiausiasis Teismas (Supremo Tribunal da Lituânia), por Decisões de 18 de dezembro de 2015 (C‑688/15) e de 12 de fevereiro de 2016 (C‑109/16), que deram entrada no Tribunal de Justiça, respetivamente, em 21 de dezembro de 2015 e 25 de fevereiro de 2016, nos processos instaurados por

Agnieška Anisimovienė e o.

sendo interveniente:

bankas «Snoras» AB, em liquidação,

«Indėlių ir investicijų draudimas» VĮ,

bankas «Finasta» AB (C‑688/15),

e

«Indėlių ir investicijų draudimas» VĮ

sendo interveniente:

Alvydas Raišelis,

bankas «Snoras» AB, em liquidação (C‑109/16),

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quinta Secção),

composto por: J. L. da Cruz Vilaça (relator), presidente de secção, A. Tizzano, vice‑presidente do Tribunal de Justiça, E. Levits, A. Borg Barthet e M. Berger, juízes,

advogado‑geral: M. Campos Sánchez‑Bordona,

secretário: M. Aleksejev, administrador,

vistos os autos e após a audiência de 30 de março de 2017,

vistas as observações apresentadas:

em representação de A. Anisimovienė e o., por A. Mamontovas e A. Bambalas, advokātai,

em representação da «Indėlių ir investicijų draudimas» VĮ, por V. Impolevičienė, assistida por S. Urbonavičius e A. Šekštelo, advokatai,

em representação do bankas «Snoras» AB, em liquidação, por A. Pilipavičius e V. Drizga, advokatai,

em representação do Governo lituano, por R. Krasuckaitė e G. Taluntytė, na qualidade de agentes,

em representação da Comissão Europeia, por K.‑Ph. Wojcik e A. Steiblytė, na qualidade de agentes,

ouvidas as conclusões do advogado‑geral na audiência de 15 de junho de 2017,

profere o presente

Acórdão

1

Os pedidos de decisão prejudicial têm por objeto a interpretação dos artigos 1.o, ponto 1, 7.o, n.o 1, e 8.o, n.o 3, da Diretiva 94/19/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 1994, relativa aos sistemas de garantia de depósitos (JO 1994 L 135, p. 5), conforme alterada pela Diretiva 2009/14/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março de 2009 (JO 2009 L 68, p. 3) (a seguir «Diretiva 94/19»), e do artigo 1.o, pontos 1 e 4, e 2.o, n.o2, da Diretiva 97/9/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 3 de março de 1997, relativa aos sistemas de indemnização dos investidores (JO 1997 L 84, p. 22).

2

Estes pedidos foram apresentados no âmbito de processos instaurados, por um lado, por Agnieška Anisimovienė e 256 outras pessoas (a seguir, conjuntamente, «A. Anisimovienė e o.») e, por outro, pela «Indėlių ir investicijų draudimas» VĮ (a seguir « IID»), a propósito da indemnização de que A. Anisimovienė e o. pretendem beneficiar pelos fundos transferidos para o bankas «Snoras» AB (a seguir «Snoras») pela subscrição de futuras ações e obrigações que essa instituição de crédito pretendia emitir, mas cuja emissão não foi realizada, devido à insolvência desta última.

Quadro jurídico

Direito da União

Diretiva 94/19

3

O primeiro, segundo e quarto considerandos da Diretiva 94/19 enunciam:

«Considerando que, em conformidade com os objetivos do Tratado, é conveniente promover o desenvolvimento harmonioso da atividade das instituições de crédito em toda a [União] através da supressão de todas as restrições à liberdade de estabelecimento e à livre prestação de serviços, reforçando simultaneamente a estabilidade do sistema bancário e a proteção dos aforradores;

Considerando que, paralelamente à supressão das restrições à atividade das instituições de crédito, é conveniente tomar as devidas precauções relativamente à situação suscetível de se verificar em caso de indisponibilidade dos depósitos de uma instituição de crédito que tenha sucursais noutros Estados‑Membros; que é indispensável assegurar um nível mínimo harmonizado de proteção dos depósitos, independentemente da sua localização no interior da Comunidade; que esta proteção dos depósitos é tão importante quanto as regras prudenciais para a realização do mercado único bancário;

[…]

Considerando que, para as instituições de crédito, o custo da participação num sistema de garantia é muito inferior ao que resultaria do levantamento em massa dos depósitos bancários, não só de uma instituição em dificuldades, mas também de instituições com uma situação sã, na sequência de perda de confiança dos depositantes na solidez do sistema.»

4

O artigo 1.o desta diretiva contém as seguintes definições:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

1.

“Depósito”: os saldos credores resultantes de fundos existentes numa conta ou de situações transitórias decorrentes de operações bancárias normais, que devem ser restituídos pela instituição de crédito nas condições legais e contratuais aplicáveis, e as dívidas representadas por títulos emitidos pela instituição de crédito.

[…]

[…]

4.

“Instituição de crédito”: uma empresa cuja atividade consiste em receber do público depósitos ou outros fundos reembolsáveis e em conceder crédito por sua própria conta;

[…]»

5

O artigo 7.o, n.os 1 e 2, da referida diretiva prevê:

«1.   Os Estados‑Membros asseguram que a cobertura do conjunto dos depósitos de um mesmo depositante seja de, pelo menos, 50000 [euros] no caso de os depósitos ficarem indisponíveis.

1‑A.   Até 31 de dezembro de 2010, os Estados‑Membros asseguram que a cobertura do conjunto dos depósitos de um mesmo depositante seja de 100000 [euros] no caso de os depósitos ficarem indisponíveis.

[…]

2.   Os Estados‑Membros podem estabelecer que determinados depositantes ou depósitos sejam excluídos desta garantia ou que lhes seja atribuído um nível de garantia inferior. A lista dessas exclusões consta do anexo I.»

6

O anexo I da mesma diretiva menciona, no seu n.o 12, os «[t]ítulos de dívida emitidos pela instituição de crédito».

Diretiva 97/9

7

Os considerandos 2 a 4 e 8 da Diretiva 97/9 enunciam:

«(2)

Considerando que a Diretiva 93/22/CEE [do Conselho, de 10 de maio de 1993, relativa aos serviços de investimento no domínio dos valores mobiliários (JO 1993, L 141, p.27)] estabelece regras prudenciais que as empresas de investimento devem cumprir em todas as circunstâncias, incluindo regras cujo objetivo é proteger tanto quanto possível os direitos dos investidores relativamente aos fundos ou instrumentos que lhes pertençam;

(3)

Considerando, contudo, que nenhum sistema de supervisão pode garantir uma proteção completa, nomeadamente quando são cometidos atos fraudulentos;

(4)

Considerando que a proteção dos investidores e a manutenção da confiança no sistema financeiro constituem aspetos importantes para a realização e o bom funcionamento do mercado interno neste domínio e que, para esse efeito, é, pois, essencial que cada Estado‑Membro disponha de um sistema de indemnização dos investidores que assegure um nível mínimo harmonizado de proteção, pelo menos para os pequenos investidores, no caso de uma empresa de investimento deixar de honrar os compromissos assumidos para com os seus clientes investidores.»

[…]

(8)

Considerando, por conseguinte, que deve ser exigido que todos os Estados‑Membros possuam um sistema ou sistemas de indemnização dos investidores, de que sejam membros todas as empresas de investimento acima referidas; que esses sistemas devem abranger os fundos ou instrumentos detidos por empresas de investimento no âmbito das operações de investimento dos investidores e que, no caso de uma empresa de investimento deixar de honrar os compromissos assumidos para com os seus clientes investidores, não podem ser‑lhes restituídos; […]»

8

O artigo 1.o desta diretiva contém as seguintes definições:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

1.

“Empresa de investimento”: uma empresa de investimento na aceção do n.o 2 do artigo 1.o da Diretiva 93/22/CEE,

autorizada nos termos do artigo 3.o da Diretiva 93/22/CEE,

ou

autorizada como instituição de crédito nos termos da [Primeira Diretiva 77/780/CEE do Conselho, de 12 de dezembro de 1977, relativa à coordenação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes ao acesso à atividade dos estabelecimentos de crédito e ao seu exercício (JO 1977, L 322, p. 30; EE 06 F2 p. 21),] e da [Segunda Diretiva 89/646/CEE do Conselho, de 15 de dezembro de 1989, relativa à coordenação das disposições legislativas, regulamentares e administrativas respeitantes ao acesso à atividade das instituições de crédito e ao seu exercício e que altera a Diretiva 77/780/CEE (JO 1989, L 386, p. 1)], e cuja autorização abrange um ou mais dos serviços de investimento enumerados na secção A do anexo da Diretiva 93/22/CEE;

2.

“Operações de investimento”, qualquer serviço de investimento na aceção do artigo 1.o da Diretiva 93/22/CEE e o serviço referido no n.o 1 da secção C do anexo da mesma diretiva.

[…]

4.

“Investidor”: qualquer pessoa que confiou fundos ou instrumentos a uma empresa de investimento no âmbito de operações de investimento;

[…]»

9

Nos termos do artigo 2.o, n.os 2 e 3, da referida diretiva:

«2.   […]

Deve ser assegurada uma cobertura em relação a créditos resultantes da incapacidade de uma empresa de investimento:

reembolsar os investidores dos fundos que lhes sejam devidos ou que lhes pertençam e que sejam detidos por sua conta no âmbito de operações de investimento, ou

[…]

de acordo com as condições legais e contratuais aplicáveis.

3.   Quaisquer créditos do tipo dos referidos no n.o 2 sobre uma instituição de crédito que, num dado Estado‑Membro, estejam sujeitos tanto à presente diretiva como à Diretiva 94/19/CE, serão imputados por esse Estado‑Membro a um sistema abrangido por uma destas diretivas, consoante o que esse Estado‑Membro considerar mais adequado. Um crédito não pode ser objeto de uma dupla indemnização ao abrigo das duas diretivas.»

Diretiva MiFID

10

Os considerandos 2, 5 e 44 da Diretiva 2004/39/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 21 de abril de 2004, relativa aos mercados de instrumentos financeiros, que altera as Diretivas 85/611/CEE e 93/6/CEE do Conselho e a Diretiva 2000/12/CE do Parlamento Europeu e do Conselho e que revoga a Diretiva 93/22 (JO 2004, L 145, p. 1), conforme alterada pela Diretiva 2006/31/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 5 de abril de 2006 (JO 2006, L 114, p. 60) (a seguir «Diretiva MiFID»), enunciam:

«(2)

[…] [É] indispensável prever o grau de harmonização necessário para proporcionar aos investidores um elevado nível de proteção […]

[…]

(5)

É necessário estabelecer um regime regulamentar completo que regule a realização de transações em instrumentos financeiros, independentemente dos métodos de negociação utilizados para a sua conclusão, por forma a garantir uma elevada qualidade de execução das transações dos investidores e apoiar a integridade e a eficiência global do sistema financeiro. […]

[…]

(44)

Para prosseguir o duplo objetivo de proteger os investidores e assegurar o funcionamento harmonioso dos mercados de valores mobiliários, é necessário garantir a transparência das transações e a aplicação das regras estabelecidas para esse efeito às empresas de investimento quando estas intervêm nos mercados. […]»

11

O artigo 1.o desta diretiva, com a epígrafe «Âmbito de aplicação», dispõe:

«1.   A presente diretiva aplica‑se às empresas de investimento e aos mercados regulamentados.

2.   As disposições a seguir indicadas aplicam‑se igualmente às instituições de crédito autorizadas nos termos da Diretiva 2000/12/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de março de 2000, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e ao seu exercício (JO 2000 L 126, p. 1)] quando prestem um ou mais serviços de investimento e/ou atividades de investimento

n.o 2 do artigo 2.o e artigos 11.o, 13.o e 14.o,

[c]apítulo II do [t]ítulo II, com exclusão do segundo parágrafo do n.o 2 do artigo 23.o;

[c]apítulo III do [t]ítulo II, com exclusão dos n.os 2 a 4 do artigo 31.o e dos n.os 2 a 6, 8 e 9 do artigo 32.o,

artigos 48.o a 53.o, 57.o, 61.o e 62.o, e

n.o 1 do artigo 71.o»

12

O artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva MiFID contém as definições seguintes:

«Para efeitos da presente diretiva, entende‑se por:

1)

“Empresa de investimento”: qualquer pessoa coletiva cuja ocupação ou atividade habitual consista na prestação de um ou mais serviços de investimento a terceiros e/ou na execução de uma ou mais atividades de investimento a título profissional.

[…]

2)

“Serviços e atividades de investimento”: qualquer dos serviços e atividades enumerados na Secção A do Anexo I e que incida sobre qualquer dos instrumentos enumerados na Secção C do Anexo I.

[…]

[…]

5)

“Execução de ordens em nome de clientes”: atuação com vista à celebração de contratos de compra ou venda de um ou mais instrumentos financeiros em nome de clientes;

6)

“Negociação por conta própria”: negociação com base no seu próprio capital, com vista à conclusão de transações em um ou mais instrumentos financeiros;

[…]

18)

“Valores mobiliários”: as categorias de valores que são negociáveis no mercado de capitais, com exceção dos meios de pagamento, como por exemplo:

a)

Ações de sociedades […]

b)

Obrigações ou outras formas de dívida titularizada;

[…]»

13

O artigo 69.o desta diretiva, com a epígrafe «Revogação da Diretiva 93/22/CEE», dispõe:

«A Diretiva 93/22/CEE é revogada com efeitos a partir de 1 de novembro de 2007. Todas as remissões para a Diretiva 93/22/CEE devem ser entendidas como remissões para a presente diretiva. As remissões para os termos definidos na Diretiva 93/22/CEE ou para os artigos desta devem ser entendidas como remissões para os termos equivalentes definidos na presente diretiva ou para os artigos desta.»

14

A secção A do anexo I da Diretiva MiFID, com a epígrafe «Serviços e atividades de investimento», contem a seguinte enumeração:

«1.

Receção e transmissão de ordens relativas a um ou mais instrumentos financeiros;

2.

Execução de ordens por conta de clientes;

3.

Negociação por conta própria;

4.

Gestão de investimento.

5.

Consultoria para investimento;

6.

Tomada firme de instrumentos financeiros e/ou colocação de instrumentos financeiros com garantia;

7.

Colocação de instrumentos financeiros sem garantia;

8.

Exploração de Sistemas de Negociação Multilateral (MTF).»

15

Entre os instrumentos financeiros enumerados na secção C desse anexo figuram, no n.o 1, os «valores mobiliários».

Diretiva 2006/48

16

O artigo 4.o, n.o 1, da Diretiva do Parlamento Europeu e do Conselho, de 14 de junho de 2006, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e ao seu exercício (JO 2006, L 177, p. 1), conforme alterada pela Diretiva 2009/110/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de setembro de 2009 (JO 2009, L 267, p.7) (a seguir «Diretiva 2006/48»), define uma instituição de crédito como «uma empresa cuja atividade consiste em receber do público depósitos ou outros fundos reembolsáveis e em conceder créditos por sua própria conta».

17

O artigo 23.o desta diretiva dispõe:

«Os Estados‑Membros devem estabelecer que as atividades referidas na lista do anexo I possam ser exercidas nos respetivos territórios, nos termos do artigo 25.o, dos n.os 1 a 3 do artigo 26.o, dos n.os 1 e 2 do artigo 28.o e dos artigos 29.o a 37.o, através do estabelecimento de uma sucursal ou por meio de prestação de serviços, por qualquer instituição de crédito autorizada e supervisionada pelas autoridades competentes de outro Estado‑Membro, desde que tais atividades estejam abrangidas pela autorização.»

18

O anexo I da referida diretiva, com a epígrafe «Lista das operações que beneficiam de reconhecimento mútuo», contém a seguinte enumeração:

«[…]

7.

Transações efetuadas por conta da própria instituição de crédito ou por conta da respetiva clientela sobre:

[…]

e)

Valores mobiliários.

8.

Participações em emissões de títulos e prestação de serviços relativos a essa participação.

[…]

14.

[…]

Quando os serviços e atividades previstos no Anexo I, Secções A e B, da Diretiva [MiFID] se refiram a instrumentos financeiros previstos no Anexo I, Secção C, dessa diretiva, ficam sujeitos a reconhecimento mútuo nos termos da presente diretiva.

[…]»

Direito lituano

19

Nos termos do artigo 2.o, n.os 3, 4, 11 e 12, da Indėlių ir įsipareigojimų investuotojams draudimo įstatymas (Lei da garantia de depósitos e obrigações perante os investidores), de 20 de junho de 2002 (Žin., 2002, n.o 65‑2635), na sua versão em vigor de 18 de novembro de 2011 a 1 de dezembro de 2012 (a seguir «lei da garantia dos depósitos e à indemnização dos investidores»), deve entender‑se por:

«3.   “Depositante”: pessoa singular ou coletiva, titular de um depósito num banco, numa filial de um banco ou num banco cooperativo, com a exceção das pessoas cujos depósitos não possam constituir organismos de seguro em conformidade com a presente lei. Quando uma pessoa singular ou coletiva (excluindo as sociedades de gestão que gerem fundos comuns de investimento ou fundos de pensões) detentora de um depósito atue a título fiduciário, o fiduciário será considerado depositante. Quando um grupo de pessoas for, por contrato, titular de direitos de crédito sobre os fundos, cada uma dessas pessoas será considerada depositante e os fundos são repartidos entre elas em partes iguais, exceto se os contratos dos quais decorram os créditos ou uma decisão judicial estipularem em contrário.

4.   “Depósito”: o montante total dos fundos de um depositante num banco, filial de um banco ou num banco cooperativo em conformidade com um contrato de depósito e/ou de conta bancária, bem como outros fundos sobre os quais o depositante tenha um direito de crédito, decorrente do compromisso da instituição de crédito de realizar operações com os fundos do depositante ou de prestar serviços de investimento (incluindo os juros).

[…]

11.   “Investidor”: pessoa singular ou coletiva que entregou fundos ou valores mobiliários ao segurador para beneficiar dos serviços de investimento prestados por este. […]

12.   “Obrigações perante o investidor”: obrigação do segurador que presta a um investidor serviços de investimento de restituir a este os fundos ou valores mobiliários que lhe pertencem.»

20

Resulta do artigo 3.o, n.o 1, da lei da garantia dos depósitos e à indemnização dos investidores que os depósitos dos depositantes em moeda nacional e em divisa em instituições de crédito estão abrangidos pela garantia prevista por essa lei. Em contrapartida, em conformidade com o n.o 4 desse artigo, estão excluídos os títulos de crédito emitidos por tal instituição.

Litígios nos processos principais e questões prejudiciais

Processo C‑688/15

21

Em 21 de dezembro de 2010, a assembleia geral de acionistas do Snoras aprovou uma deliberação de aumento do capital social dessa instituição de crédito e de emissão, para tal, de novas ações para subscrição pública.

22

Em 3 de fevereiro de 2011, a Vertybinių popierių komisija (Comissão de Mercado de Valores Mobiliários, Lituânia) aprovou o prospeto relativo a essas futuras ações.

23

Em 1 de março de 2011, o Snoras abriu uma conta em seu nome noutra instituição de crédito, o bankas «Finasta» AB (a seguir «Finasta»), para aí depositar os fundos, correspondentes ao preço de emissão das referidas futuras ações, que seriam transferidos pelos futuros subscritores.

24

Entre 9 de março e 16 de maio de 2011, A. Anisimovienė e o. celebraram com o Snoras contratos de subscrição das futuras ações em causa. Nos termos desses contratos, foi debitado das contas bancárias que esses particulares detinham no Snoras um montante equivalente ao preço de emissão dessas ações, para os transferir para a conta aberta no Finasta. Em certos casos, o próprio Snoras efetuou esses movimentos de conta, noutros casos, os clientes tiveram a iniciativa.

25

Em 5 de maio de 2011, o Snoras pediu ao Lietuvos Bankas (Banco da Lituânia) autorização para registar no registo comercial as alterações estatutárias decorrentes do futuro aumento de capital social.

26

Em 16 de novembro de 2011, o Banco da Lituânia decidiu suspender as atividades do Snoras até 16 de janeiro de 2012. Por decreto da mesma data, o Governo lituano nacionalizou essa instituição de crédito por motivo de interesse público. Por Decisão de 22 de novembro de 2011, o Banco da Lituânia recusou à referida instituição a autorização para inscrever no registo comercial as alterações dos seus estatutos e, por Decisão de 24 de novembro de 2011, revogou a sua licença bancária. Em 7 de dezembro de 2011, esta mesma instituição foi colocada em liquidação judicial, com efeitos a partir de 20 de dezembro de 2011.

27

Em consequência, o Snoras não realizou a emissão de ações prevista. A. Anisimovienė e o. recorreram então para o Vilniaus apygardos teismas (Tribunal Regional de Vilnius, Lituânia), para serem reconhecidos como «depositantes» dessa instituição de crédito, na aceção da lei da garantia dos depósitos e à indemnização dos investidores.

28

Por sentença de 29 de setembro de 2014, esse órgão jurisdicional julgou improcedente a ação de A. Anisimovienė e o., considerando, designadamente, que essas pessoas não devem ser consideradas depositantes, mas sim investidores e que os fundos que tinham transferido para o Snoras pela subscrição das ações que essa instituição de crédito pretendia emitir não podiam ser considerados «depósitos», na aceção dessa lei.

29

Por despacho de 12 de março de 2015, o Lietuvos apeliacinis teismas (Tribunal de Recurso da Lituânia) confirmou a decisão proferida em primeira instância. A. Anisimovienė e o. interpuseram então recurso de cassação para o Lietuvos Aukščiausiasis Teismas (Supremo Tribunal da Lituânia).

30

No âmbito desse recurso, esse órgão jurisdicional interroga‑se essencialmente quanto à possibilidade de considerar «depósitos», na aceção do artigo 1.o, ponto 1, da Diretiva 94/19, os fundos que A. Anisimovienė e o. transferiram para o Snoras pela subscrição de ações que, finalmente, não vieram a ser emitidas por essa instituição de crédito.

31

Nestas circunstâncias, o Lietuvos Aukščiausiasis Teismas (Supremo Tribunal da Lituânia) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve a Diretiva [94/19] ser interpretada no sentido de que se pode considerar que os fundos debitados com o consentimento das pessoas, ou que as próprias pessoas transferiram para ou pagaram numa conta aberta em nome de uma instituição de crédito, mas noutra instituição de crédito, são depósitos na aceção dessa diretiva?

2)

Devem as disposições conjugadas dos artigos 7.o, n.o 1, e 8.o, n.o 3, da Diretiva [94/19] ser entendidas no sentido de que deverá ser efetuado o pagamento de um seguro de depósito até ao montante especificado no artigo 7.o, n.o 1, a cada pessoa que possa provar que é titular de um crédito anterior à data da verificação ou da decisão referidas no artigo 1.o, n.o 3, alíneas i) e ii), da [mesma diretiva]?

3)

Para efeitos da Diretiva [94/19], é a definição de “operações bancárias normais” relevante para a interpretação do conceito de depósito como um saldo credor decorrente de operações bancárias? Deve essa definição ser igualmente tida em consideração na interpretação do conceito de depósito nas disposições jurídicas nacionais de transposição [dessa diretiva]?

4)

Em caso de resposta afirmativa à terceira questão, como deve o conceito de operações bancárias normais, utilizado no artigo 1.o, [ponto] 1, da Diretiva [94/19] ser entendido e interpretado:

a)

Que transações bancárias devem ser consideradas normais ou quais os critérios que devem servir de base para determinar se uma operação bancária específica é normal?

b)

Deve o conceito de operações bancárias normais ser avaliado tendo em conta o objetivo das operações bancárias realizadas, ou as partes entre as quais tais transações bancárias são efetuadas?

c)

Deve o conceito de depósito como saldo credor decorrente de operações bancárias normais, utilizado na Diretiva [94/19], ser interpretado no sentido de que apenas abrange os casos em que todas as operações que resultem na criação desse saldo sejam consideradas normais?

5)

Sempre que os fundos não se enquadrem na definição de depósito nos termos da Diretiva [94/19], mas o Estado‑Membro tenha optado por transpor essa mesma [d]iretiva e a Diretiva [97/9] para a legislação nacional de modo a que os fundos sobre os quais o depositante tenha créditos decorrentes da obrigação de uma instituição de crédito de prestar serviços de investimento sejam igualmente consideradas depósitos, pode a cobertura dos depósitos ser aplicada apenas depois de ter sido determinado que, num caso específico, a instituição de crédito atuou como uma empresa de investimento e que os fundos foram transferidos para a mesma com vista à realização de operações/atividades de investimento, na aceção da Diretiva [97/9] e [MiFID]?»

Processo C‑109/16

32

Por duas Decisões adotadas, respetivamente, em 16 de junho e 14 de julho de 2011, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários aprovou um prospeto de emissão de novas obrigações que o Snoras pretendia emitir e oferecer ao público. Nos termos do referido prospeto, essa instituição de crédito podia realizar diversas emissões de obrigações a médio prazo, sob reserva da publicação, prévia a cada uma delas, das condições definitivas aplicáveis a cada emissão.

33

O referido prospeto indicava, em primeiro lugar, que essas futuras obrigações seriam distribuídas pelo próprio Snoras e que os particulares interessados podiam subscrevê‑las diretamente junto de sucursais, agências e outros serviços desta instituição de crédito. Em segundo lugar, o preço de emissão das obrigações devia ser creditado no dia da celebração do contrato de subscrição das mesmas. Para esse efeito, o subscritor devia dispor de fundos correspondentes numa conta aberta no Snoras e autorizar este último a debitá‑los. Em terceiro lugar, a data de produção de efeitos indicada nas condições definitivas da emissão em causa seria considerada a data de emissão das obrigações em causa. Em quarto lugar, uma vez realizada a emissão, essas obrigações deviam ser inscritas nas contas de títulos abertas no Snoras em nome dos obrigacionistas.

34

Em 2 de novembro de 2011, o Snoras publicou as condições definitivas da décima primeira emissão de obrigações a médio prazo.

35

Em 10 de novembro de 2011, A. Raišelis celebrou com o Snoras, por um lado, um contrato de prestação de serviços de investimento e, por outro, um contrato de subscrição de 40 obrigações correspondentes a essa décima primeira emissão. No mesmo dia, transferiu os fundos correspondentes ao preço de emissão dessas futuras obrigações para a sua conta bancária pessoal aberta no Snoras. No dia seguinte, A. Raišelis assinou com essa instituição de crédito um novo contrato de subscrição, idêntico ao primeiro, apenas tendo sido alterada a data indicada para a assinatura e o pagamento das referidas obrigações para 11 de novembro de 2011. Na mesma data, o Snoras debitou um montante equivalente ao referido preço de emissão da conta de A. Raišelis e creditou uma conta aberta, em nome dessa instituição de crédito, nessa mesma instituição, e destinada ao pagamento das obrigações em causa.

36

Todavia, o Snoras tornou‑se insolvente antes de ter podido realizar a emissão das obrigações em questão.

37

Por conseguinte, A. Raišelis propôs uma ação no Vilniaus miesto 2‑asis apylinkės teismas (Tribunal de Distrito n.o 2 de Vilnius, Lituânia) contra a IID, a empresa pública encarregada, na Lituânia, dos sistemas de garantia dos depósitos e de indemnização dos investidores. Nesse âmbito, A. Raišelis alega que tem o direito de beneficiar da indemnização prevista pela lei da garantia dos depósitos e à indemnização dos investidores.

38

Por sentença de 7 de setembro de 2012, o referido órgão jurisdicional julgou improcedente a ação de A. Raišelis. Considerou, designadamente, que só teria tido direito à indemnização se o Snoras tivesse utilizado os fundos controvertidos sem o seu consentimento, o que não era o caso. Além disso, segundo esse mesmo órgão jurisdicional, obrigações como as que o Snoras pretendia emitir não podem dar origem à referida indemnização.

39

A sentença da primeira instância foi anulada pelo Vilniaus apygardos teismas (Tribunal Regional de Vilnius) em 17 de outubro de 2013, que reconheceu a A. Raišelis o direito à indemnização pedida. No entender do tribunal de recurso, A. Raišelis devia ser considerado um «investidor», na aceção da lei relativa dos depósitos e à indemnização dos investidores, e os fundos que detinha na conta aberta em nome de Snoras deviam ser qualificados de «depósitos» que beneficiam da garantia prevista por essa lei. A IID interpôs então recurso de cassação no Lietuvos Aukščiausiasis Teismas (Supremo Tribunal da Lituânia).

40

Esse órgão jurisdicional considera que a questão suscitada pelo referido recurso depende, desde logo, de saber qual, da Diretiva 94/19 ou da Diretiva 97/9, é suscetível de cobrir os fundos transferidos por A. Raišelis ao Snoras pela operação de subscrição controvertida.

41

Na hipótese de o Tribunal de Justiça declarar que tais fundos estão, em princípio, abrangidos pelo âmbito de aplicação da Diretiva 97/9, o órgão jurisdicional de reenvio tem dúvidas a respeito da correta tradução, em lituano, do artigo 2.o, n.o 2, dessa diretiva e da transposição dessa disposição para a lei da garantia dos depósitos e à indemnização dos investidores.

42

Por último, na hipótese de o Tribunal de Justiça declarar que os fundos como os transmitidos por A. Raišelis para o Snoras a propósito da subscrição das futuras obrigações controvertidas estão, em princípio, abrangidos pelo âmbito de aplicação da Diretiva 94/19, o órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se quanto a saber se esses fundos preenchem os requisitos necessários para serem qualificados de «depósitos», na aceção do artigo 1.o, n.o 1, dessa diretiva.

43

Nestas circunstâncias, o Lietuvos Aukščiausiasis Teismas (Supremo Tribunal da Lituânia) decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Nos casos em que uma instituição de crédito opera como empresa de investimento para a qual tenham sido transferidos fundos para aquisição de títulos de dívida emitidos por ela própria, mas a emissão não se efetive e os mesmos não sejam transferidos para a titularidade da pessoa que avançou os fundos, e em que, por outro lado, estes tenham já sido retirados da conta bancária dessa pessoa e transferidos para uma conta aberta em nome da instituição de crédito e não sejam reembolsáveis e, ainda, em que a intenção do legislador nacional em tal caso não seja clara quanto ao sistema específico de proteção a aplicar, são o artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva [94/19] e o artigo 1.o, n.o 4, da Diretiva [97/9] suscetíveis de aplicação direta para efeitos de determinar o sistema de cobertura aplicável, e o fim a que se destinem os fundos é o critério decisivo para o efeito? São essas disposições das diretivas suficientemente claras, precisas e incondicionais e criam direitos subjetivos suscetíveis de ser invocados pelos particulares nos tribunais nacionais como fundamento dos seus pedidos de indemnização contra o organismo de garantia instituído pelo Estado[‑Membro] responsável pelo pagamento da referida indemnização?

2)

Deve o artigo 2.o, n.o 2, da Diretiva [97/9], que define os tipos de créditos que são abrangidos pelos sistemas de indemnização dos investidores, ser entendido e interpretado no sentido de abarcar também o direito ao reembolso de fundos devidos aos investidores por uma empresa de investimento e que não são detidos em nome destes?

3)

Caso a resposta à segunda questão seja afirmativa, é o artigo 2.o, n.o 2, da Diretiva [97/9], que define os tipos de créditos que são abrangidos pelos sistemas de indemnização dos investidores, suficientemente claro, preciso e incondicional, e cria direitos subjetivos suscetíveis de serem invocados pelos particulares nos tribunais nacionais como fundamento dos seus pedidos de indemnização contra o organismo de garantia instituído pelo Estado[‑Membro] responsável pelo pagamento da referida indemnização?

4)

Deve o artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva [94/19] ser entendido e interpretado no sentido de a definição do conceito de “depósito” no âmbito da referida diretiva incluir os fundos transferidos de uma conta pessoal, com o consentimento do respetivo titular, para uma conta aberta em nome de uma instituição de crédito detida por essa mesma instituição de crédito e destinada ao pagamento da futura operação de emissão de títulos de dívida dessa instituição?

5)

Devem as disposições conjugadas dos artigos 7.o, n.o 1, e 8.o, n.o 3, da Diretiva [94/19], ser entendidas no sentido de que dispõem que é devido o pagamento a título de garantia de depósito de um valor até ao montante máximo especificado no artigo 7.o, n.o 1, a todas as pessoas que possam comprovar a titularidade de créditos anteriores à data em que tenha tido lugar a determinação ou decisão mencionada no artigo 1.o, [ponto] 3, alíneas i) e ii), da [referida diretiva]?»

Tramitação do processo no Tribunal de Justiça

44

Por Despachos do presidente do Tribunal de Justiça, de 15 de fevereiro de 2016, Anisimovienė e o. (C‑688/15, não publicado, EU:C:2016:92), e de 13 de abril de 2016, Indėlių ir investicijų draudimas (C‑109/16, não publicado, EU:C:2016:267), foram indeferidos os pedidos do órgão jurisdicional de reenvio para a sujeição dos presentes reenvios prejudiciais ao procedimento de tramitação acelerada, nos termos do artigo 105.o do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça.

45

Por Decisões de 20 de janeiro e de 29 de fevereiro de 2016, o presidente do Tribunal de Justiça atribuiu ao processo C‑688/15 e ao processo C‑109/16 tratamento prioritário, nos termos do artigo 53.o, n.o 3, do referido regulamento.

46

Por Despacho de 29 de fevereiro de 2016, o presidente do Tribunal de Justiça ordenou a apensação desses dois processos, tendo em conta a conexão entre eles, para efeitos de fase oral e de acórdão.

Quanto às questões prejudiciais

Quanto à primeira a quarta questões no processo C‑688/15 e à segunda, quarta e quinta questões no processo C‑109/16

47

Com a primeira a quarta questões no processo C‑688/15 e a segunda, quarta e quinta questões no processo C‑109/16, que importa examinar em conjunto e em primeiro lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância se, por um lado, as disposições da Diretiva 97/9 e, por outro, as da Diretiva 94/19 devem ser interpretadas no sentido de que os créditos relativos a fundos, debitados de contas da titularidade de particulares numa instituição de crédito e transferidos para contas abertas em nome dessa instituição, para subscrição de futuros valores mobiliários que aquela deveria emitir, em circunstâncias em que a emissão desses valores acabou por não se realizar devido à insolvência da referida instituição, estão abrangidos, por um lado, pelos sistemas de indemnização dos investidores previstos na Diretiva 97/9 e/ou, por outro, pelos sistemas de garantia dos depósitos previstos na Diretiva 94/19.

48

Para responder às questões submetidas, há que interpretar, num primeiro momento, as disposições da Diretiva 97/9 e, depois, num segundo momento, as da Diretiva 94/19.

Quanto à Diretiva 97/9 — os sistemas de indemnização dos investidores

49

Como resulta dos considerandos 4 e 8 da Diretiva 97/9, os sistemas de indemnização dos investidores previstos por essa diretiva têm por objeto cobrir os fundos e os instrumentos que uma empresa de investimento detém em relação com as operações de investimento dos seus clientes e que, no caso de tal empresa não estar em condições de honrar os seus compromissos assumidos para com estes, não lhes podem ser restituídos. Ao prever tais sistemas, a Diretiva 97/9 visa, simultaneamente, proteger os investidores e assegurar a confiança do público no sistema financeiro.

50

Nesse âmbito, o artigo 2.o, n.o 2, segundo parágrafo, da Diretiva 97/9 dispõe que deve ser assegurada uma cobertura pelos sistemas de indemnização dos investidores em relação aos créditos resultantes da incapacidade de uma empresa de investimento reembolsar tais investidores, em conformidade com as condições legais e contratuais aplicáveis, dos fundos que lhes sejam devidos ou que lhes pertençam e que sejam detidos por sua conta no âmbito de operações de investimento.

51

Para estabelecer se os créditos como os que estão em causa no processo principal estão abrangidos pelas hipóteses aí previstas, é necessário decidir, em primeiro lugar, sobre os conceitos de «empresa de investimento» e de «operações de investimento», previstos no artigo 2.o, n.o 2, segundo parágrafo, primeiro travessão, da Diretiva 97/9 e, em segundo lugar, sobre uma eventual condição de inscrição dos fundos em causa numa conta aberta em nome do investidor que invoca tal.

– Quanto aos conceitos de «empresa de investimento» e de «operações de investimento», na aceção da Diretiva 97/9

52

Por força do artigo 2.o, n.o 2, segundo parágrafo, primeiro travessão, da Diretiva 97/9, os créditos que devem estar abrangidos pelos sistemas de indemnização dos investidores prendem‑se com fundos devidos a um «investidor» ou que lhe pertençam e sejam detidos por sua conta por uma «empresa de investimento» no âmbito de uma ou mais «operações de investimento».

53

A este respeito, embora o artigo 1.o, ponto 4, da Diretiva 97/9 defina, para efeitos dessa diretiva, um «investidor» como qualquer pessoa que confiou fundos ou instrumentos a uma «empresa de investimento» no âmbito de «operações de investimento», no que respeita a estes dois últimos conceitos, os pontos 1 e 2 desse artigo remetem, respetivamente, para a definição dada pela Diretiva 93/22 e para os «serviços de investimento» como definidos por essa diretiva e enumerados no anexo da mesma.

54

A Diretiva 93/22, que aprovava as regras aplicáveis às empresas de investimento na União, foi todavia substituída, a partir de 1 de novembro de 2007, pela Diretiva MiFID. Nos termos do artigo 69.o desta, todas as remissões para a Diretiva 93/22 devem ser entendias como remissões para o termo equivalente definido na Diretiva MiFID. Por conseguinte, no presente processo, há que basear‑se, para efeitos da interpretação da Diretiva 97/9, nas definições de «empresa de investimento» e de «serviços e atividades de investimento», que figuram no artigo 4.o, n.o 1, pontos 1 e 2, da Diretiva MiFID.

55

Neste quadro, resulta do artigo 4.o, n.o1, ponto 1, dessa diretiva que uma «empresa de investimento» é uma pessoa coletiva cuja ocupação ou atividade habitual consista na «prestação de um ou mais serviços de investimento a terceiros e/ou na execução de uma ou mais atividades de investimento a título profissional». Seguindo a mesma lógica, o artigo 1.o, n.o 2, da referida diretiva dispõe que algumas das suas disposições se aplicam às instituições de crédito autorizadas «quando prestem um ou mais serviços de investimento e/ou atividades de investimento».

56

Em face destes elementos, para determinar se os créditos como os de A. Anisimovienė e o. e os de A. Raišelis contra o Snoras podem estar cobertos pelos sistemas de indemnização dos investidores previstos pela Diretiva 97/9, há que determinar se os fundos a que esses créditos se referem foram transferidos para essa instituição de crédito no âmbito de um ou mais serviços ou atividades de investimento, na aceção da Diretiva MiFID, prestados ou exercidos pela referida instituição.

57

A este respeito, nos termos do artigo 4.o, n.o 1, ponto 2, da Diretiva MiFID, devem ser considerados «serviços e atividades de investimento» todos os serviços e atividades enumerados na secção A do seu anexo I e que incidam sobre qualquer dos instrumentos enumerados na secção C desse anexo.

58

É pacífico que ações e obrigações como as que o Snoras pretendia emitir constituem instrumentos financeiros previstos na referida secção C. Com efeito, figura, no seu n.o 1, a categoria dos «valores mobiliários», a saber, nos termos do artigo 4.o, n.o1, ponto 18, da Diretiva MiFID, os valores negociáveis no mercado de capitais, incluindo as ações de sociedades e as obrigações.

59

No que diz respeito ao requisito da secção A do anexo I da Diretiva MiFID, o Governo lituano alega que uma instituição de crédito, quando distribui ao público, incluindo os seus clientes, instrumentos financeiros de que é emissora, não presta um dos serviços nem exerce uma das atividades enumeradas naquela secção. Com efeito, ao oferecer esses instrumentos ao público, esse estabelecimento não atua como um intermediário financeiro, mas sim como qualquer outra sociedade emissora de títulos.

60

É certo, como alega o referido Governo, que a oferta ao público, por uma instituição de crédito, de instrumentos financeiros de que não é emissor não é, em si, um «serviço ou uma atividade de investimento», na aceção da Diretiva MiFID, uma vez que não figura no anexo I, secção A, dessa diretiva.

61

Todavia, o facto de uma instituição de crédito celebrar, com os seus clientes, contratos de subscrição que têm por objeto instrumentos financeiros de que é emissor implica, em contrapartida, a prestação desses serviços de investimento. Como alegam A. Raišelis e a Comissão Europeia, a celebração, por uma instituição de crédito, de tais contratos de subscrição com os seus clientes constitui, designadamente, uma «execução de ordens em nome de clientes», prevista no anexo I, secção A, ponto 2, da Diretiva MiFID.

62

A este respeito, o conceito de execução de ordens «em nome de clientes» deve ser considerado sinónimo do de execução de ordens «por conta de clientes», cuja definição figura no artigo 4.o, n.o 1, ponto 5, dessa diretiva. Com efeito, estes dois conceitos referem‑se manifestamente, na Diretiva MiFID, a um e mesmo serviço e, de resto, a grande maioria das versões linguísticas dessa diretiva utilizam uma mesma expressão quer no anexo quer no artigo 4.o da referida diretiva.

63

Assim sendo, em conformidade com essa definição, o conceito de «execução de ordens em nome de clientes» designa a celebração de contratos de compra ou venda de um ou mais instrumentos financeiros em nome de clientes.

64

Ora, é pacífico que um contrato de subscrição que tem por objeto instrumentos financeiros constitui de facto um acordo desse tipo. Quanto ao facto de, no âmbito do serviço de «execução de ordens», esse acordo ser celebrado «em nome de clientes», importa salientar que, é certo que esses termos podem, em abstrato, dar a entender que uma instituição de crédito não pode ser considerada prestadora desse serviço a um cliente quando o seu papel na celebração do referido acordo não se resume ao de um intermediário e é igualmente parte no mesmo acordo, enquanto emitente dos instrumentos financeiros que esse cliente pretende adquirir.

65

Esses mesmos termos devem, contudo, ser colocados no contexto em que se inserem. Em especial, há que distinguir o serviço de execução de ordens «em nome» (ou «por conta») de clientes da atividade de negociação «por conta própria», referida no anexo I, secção A, n.3, da Diretiva MiFID. Em conformidade com o artigo 4.o, n.o 1, ponto 6, desta diretiva, essa atividade consiste na negociação com base no seu próprio capital, com vista à conclusão de transações em um ou mais instrumentos financeiros.

66

Daqui resulta que a Diretiva MiFID assenta numa dicotomia entre, por um lado, a celebração de acordos de compra e venda de instrumentos financeiros pelas instituições de crédito e as empresas de investimento em seu próprio benefício, com base no seu próprio capital, e, por outro, a celebração de tais acordos por essas instituições e essas empresas em benefício da sua clientela, com base nos capitais desta. Nessa perspetiva, um acordo de tal natureza deve ser considerado celebrado por uma instituição de crédito «em nome» (ou «por conta») de clientes, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, ponto 5, e do anexo I, secção A, ponto 2, dessa diretiva, quando um cliente é beneficiário do mesmo e investe o seu capital, mesmo quando essa instituição é igualmente parte nesse acordo na qualidade de emitente dos instrumentos em causa.

67

Essa interpretação é corroborada pelos objetivos prosseguidos pela Diretiva MiFID. A este respeito, cumpre recordar que essa diretiva visa designadamente, como resulta dos seus considerandos 2, 5 e 44, oferecer um nível elevado de proteção dos investidores, apoiar a integridade e a eficiência global do sistema financeiro e garantir a transparência das transações financeiras.

68

Ora, à luz desses objetivos, é irrelevante a questão de saber se os instrumentos financeiros que uma instituição de crédito distribui ao público são emitidos por sociedades terceiras ou pela própria instituição.

69

Resulta de todas estas considerações que o facto de uma instituição de crédito celebrar contratos de subscrição com os seus clientes relativos a futuros valores mobiliários de que essa instituição seria emitente constitui um serviço de investimento, na aceção do artigo 4.o, n.o 1, ponto 2, da Diretiva MiFID. Por conseguinte, os créditos relativos a fundos transferidos por esses clientes para a referida instituição no que respeita a esses contratos podem estar cobertos pelos sistemas de indemnização dos investidores, em conformidade com o artigo 2.o, n.o 2, segundo parágrafo, primeiro travessão, da Diretiva 97/9.

70

Essa conclusão não é posta em causa pelo argumento do Governo lituano e da IID segundo o qual créditos como os que A. Anisimovienė e o. e A. Raišelis invocam não são indemnizáveis com base na Diretiva 97/9, na medida em que esses créditos provêm da realização de um risco de investimento, a saber, a insolvência do emitente dos instrumentos financeiros que esses particulares pretendem adquirir e contra o qual essa diretiva não prevê nenhuma proteção.

71

A este respeito, é verdade que, como o advogado‑geral salientou no n.o 134 das suas conclusões, a Diretiva 97/9 não tem por objeto proteger os investidores do risco inerente a todo o investimento. Em especial, essa diretiva não os pretende acautelar contra a insolvência das sociedades emitentes de instrumentos financeiros de que são proprietários. A este respeito, o risco de insolvência do emitente não pode ser coberto pela referida diretiva pelo simples motivo de, numa determinada operação de investimento, o referido emitente ser uma instituição de crédito ou uma empresa de investimento.

72

Todavia, basta sublinhar que, no caso em apreço, A. Anisimovienė e o. e A. Raišelis nunca adquiriram a propriedade dos instrumentos financeiros em contrapartida dos quais tinham transferido os fundos controvertidos para o Snoras, uma vez que a emissão dos referidos instrumentos não se realizou antes da insolvência dessa instituição de crédito.

73

Nessas circunstâncias, não está em causa a perda de valor de instrumentos financeiros detidos por um investidor ou a incapacidade de o emitente desses instrumentos reembolsar esse investidor pelo montante dos referidos instrumentos. Em contrapartida, está em causa a incapacidade de uma instituição de crédito, agindo na qualidade de empresa de investimento, entregar esses instrumentos aos clientes que pretendam adquirir a propriedade dos mesmos e, assim, honrar os seus compromissos a esse respeito. Ora, essa situação constitui uma realização do risco coberto pela Diretiva 97/9.

74

De resto, essa interpretação está em conformidade com os objetivos prosseguidos pela Diretiva 97/9, em especial o de acautelar os investidores contra o risco de fraude, de negligência profissional ou de erro de gestão que torne a empresa de investimento incapaz de restituir aos seus clientes os fundos e os títulos que lhes pertencem. Com efeito, à luz desses objetivos, e como a Comissão alega, é essencial que sejam protegidos os fundos que tal empresa ou que uma instituição de crédito detém de um investidor que pretende adquirir instrumentos financeiros, previamente à emissão desses instrumentos, independentemente de os referidos instrumentos serem emitidos por uma sociedade terceira ou por esse estabelecimento.

– Quanto à inexistência de um requisito de inclusão dos fundos em causa numa conta aberta em nome do investidor

75

Na versão em língua francesa da Diretiva 97/9, o artigo 2.o, n.o 2, segundo parágrafo, primeiro travessão, da mesma dispõe, como foi recordado no n.o 50 do presente acórdão, que deve ser assegurada uma cobertura pelos sistemas de indemnização dos investidores para os créditos que resultem da incapacidade de uma empresa de investimento reembolsar os investidores dos «fundos que lhes sejam devidos ou que lhes pertençam e que sejam detidos por sua conta» no âmbito de operações de investimento, nos termos das condições legais e contratuais aplicáveis.

76

Todavia, a redação dessa disposição é sensivelmente mais restritiva na versão em língua lituana da Diretiva 97/9. Nessa versão, a referida disposição indica que estão cobertos os créditos que resultam da incapacidade de uma empresa de investimento reembolsar os investidores dos «fundos que lhes pertençam e que sejam detidos em seu nome» no âmbito de operações de investimento, nos termos das referidas condições («[k]ompensacija turi būti mokama pagal tuos reikalavimus, kurie kilo dėl investicinės įmonės nepajėgumo grąžinti pinigus, priklausančius investuotojams ir laikomus jų vardu ryšium su investicine veikla»).

77

Ora, esses termos podiam dar a entender que apenas os créditos relativos a fundos detidos por uma empresa de investimento ou uma instituição de crédito agindo como tal, em contas abertas e em nome dos investidores devem estar cobertos pelos sistemas de indemnização dos investidores previstos pela Diretiva 97/9.

78

Como tal, segundo jurisprudência constante, em caso de divergência entre as diferentes versões linguísticas de um texto do direito da União, a disposição em causa deve ser interpretada em função da sistemática geral e da finalidade da regulamentação de que constitui um elemento (v., designadamente, Acórdãos de 30 de maio de 2013, Genil 48 e Comercial Hostelera de Grandes Vinos, C‑604/11, EU:C:2013:344, n.o 38, e de 17 de maio de 2017, ERGO Poist’ovňa, C‑48/16, EU:C:2017:377, n.o 37 e jurisprudência aí referida).

79

A este respeito, importa recordar que a Diretiva 97/9 visa, designadamente, acautelar os investidores contra uma situação em que uma empresa de investimento não está em condições de honrar os seus compromissos assumidos para com eles. Em conformidade com esse objetivo, o artigo 1.o, ponto 4, dessa diretiva define de forma lata o conceito de «investidor» como qualquer pessoa que confiou fundos ou instrumentos a uma empresa de investimento no âmbito de operações de investimento. De igual modo, o considerando 8 da referida diretiva visa, de forma geral, «os fundos ou instrumentos detidos por empresas de investimento no âmbito das operações de investimento dos seus clientes».

80

Tendo em conta estes elementos, os sistemas de indemnização dos investidores previstos pela Diretiva 97/9 não se podem limitar a abranger os créditos relativos a fundos detidos pelas empresas de investimento ou as instituições de crédito que atuam como tal nas contas abertas em nome dos investidores.

81

Em consequência, a circunstância de créditos como os de A. Anisimovienė e o. e A. Raišelis não dizerem respeito a fundos inscritos em contas abertas em seu nome, mas sim a contas de que a instituição de crédito em causa é titular, não exclui que devam estar abrangidos pelos sistemas de indemnização dos investidores, desde que os outros requisitos previstos no artigo 2.o, n.o 2, segundo parágrafo, primeiro travessão, da Diretiva 97/9 estejam preenchidos.

82

Tendo em conta o exposto, há que concluir que créditos como os que estão em causa nos processos principais estão abrangidos pelos sistemas de indemnização dos investidores previstos pela Diretiva 97/9.

Quanto à Diretiva 94/19 — os sistemas de garantia de depósitos

83

Em conformidade com o segundo considerando da Diretiva 94/19, os sistemas de garantia dos depósitos previstos por essa diretiva têm por objeto acautelar os particulares contra a indisponibilidade dos depósitos de uma instituição de crédito. Ao prever tais sistemas de garantia de depósitos, a Diretiva 94/19 visa, como indicam o primeiro e quarto considerandos, simultaneamente proteger os depositantes e assegurar a estabilidade do sistema bancário, evitando os fenómenos de retirada maciça dos depósitos não apenas de uma instituição de crédito em dificuldade, mas igualmente de instituições sãs na sequência de uma perda de confiança do público na solidariedade desse sistema.

84

Nesse âmbito, o artigo 1.o, ponto 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 94/19 dispõe que, para efeitos dessa diretiva, constituem um «depósito» os saldos credores resultantes de fundos existentes numa conta ou de situações transitórias decorrentes de operações bancárias normais, que devem ser restituídos pela instituição de crédito nas condições legais e contratuais aplicáveis, e as dívidas representadas por títulos emitidos pela instituição de crédito.

85

No caso em apreço, importa recordar que, por um lado, os fundos que A. Anisimovienė e o. e A. Raišelis invocam já não estavam creditados nas contas de que eram titulares no Snoras no dia da indisponibilidade dos depósitos deste. Por outro lado, os futuros valores mobiliários que tinham subscrito e de que esta instituição de crédito devia ser emitente não chegaram a ser emitidos antes da insolvência da referida instituição. De resto, relativamente a esses valores mobiliários, embora as obrigações em causa no processo C‑109/16 sejam «títulos de dívida», previstos no artigo 1.o, ponto 1, da Diretiva 94/19, as ações em questão no processo C‑688/15 constituem, em contrapartida, títulos de capital relativamente aos quais essa diretiva não prevê nenhuma garantia (Acórdão de 21 de dezembro de 2016, Vervloet e o., C‑76/15, EU:C:2016:975, n.os 66 e 67).

86

Nestas circunstâncias, há que determinar unicamente se os créditos como os desses particulares sobre o Snoras se podem reconduzir à segunda hipótese de «depósitos» prevista no artigo 1.o, ponto 1, da Diretiva 94/19, a saber, a de «saldos credores resultantes de […] situações transitórias decorrentes de operações bancárias normais, que devem ser restituídos pela instituição de crédito nas condições legais e contratuais aplicáveis.»

87

Resulta dos termos dessa disposição, lidos à luz dos objetivos prosseguidos pela Diretiva 94/19, como recordados no n.o 83 do presente acórdão, que se reconduzem a tal hipótese os créditos contra uma instituição de crédito, tendo por objeto os fundos de depositantes envolvidos em uma ou várias «operações bancárias normais» e que se encontrem numa situação transitória decorrente dessas operações.

88

No que diz respeito, em primeiro lugar, à questão de saber se créditos como os de A. Anisimovienė e o. e A. Raišelis contra o Snoras têm por objeto fundos envolvidos em «operações bancárias normais», cumpre salientar que a Diretiva 94/19 não define o que se deve entender por esses termos nem faz nenhuma remissão para os direitos nacionais no que respeita ao seu significado.

89

Segundo jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, a determinação do significado e do alcance dos termos para os quais o direito da União não forneça nenhuma definição deve fazer‑se de acordo com o seu sentido habitual na linguagem comum, tendo em atenção o contexto em que são utilizados e os objetivos prosseguidos pela regulamentação de que fazem parte (Acórdão de 20 de dezembro de 2017, Erzeugerorganisation Tiefkühlgemüse, C‑516/16, EU:C:2017:1011, n.o 50 e jurisprudência aí referida).

90

Na sua aceção comum, os termos «operações bancárias normais» remetem para operações habitualmente efetuadas pelas instituições de crédito no âmbito das suas atividades.

91

A este respeito, cumpre recordar que, em conformidade com a definição que lhes é dada, em termos idênticos, pelo artigo 1.o, ponto 4, da Diretiva 94/19 e pelo artigo 4.o, n.o 1, alínea a), da Diretiva 2006/48, relativa ao acesso à atividade das instituições de crédito e ao seu exercício, atividade característica de tais instituições consiste em receber do público depósitos ou outros fundos reembolsáveis e em conceder créditos por sua própria conta.

92

Contudo, é pacífico que essas instituições efetuam habitualmente, de forma conexa com essa atividade, um vasto leque de operações, de que o legislador da União elaborou uma lista no anexo I desta última diretiva. Tendo em conta que a Diretiva 94/19 e a Diretiva 2006/48 se aplicam ambas às instituições de crédito e que prosseguem objetivos comuns, designadamente, a proteção da poupança e dos depositantes, a enumeração das atividades que figuram no referido anexo é pertinente para interpretar o conceito de «operações bancárias normais», na aceção do artigo 1.o, ponto 1, da Diretiva 94/19.

93

Ora, figuram, no ponto 7 do anexo I da Diretiva 2006/48 as transações efetuadas por conta da própria instituição ou por conta da respetiva clientela sobre, designadamente, os valores mobiliários, bem como, no ponto 8 desse anexo, as participações em emissões de títulos e as prestações de serviços relativos a essa participação. Por outro lado, e em coerência com a explicação constante do n.o 55 do presente acórdão, o referido anexo menciona igualmente os «serviços e atividades de investimento», tal como definidos pela Diretiva MiFID.

94

Decorre destes elementos que a subscrição de futuros valores mobiliários por conta dos seus clientes se insere nas operações habitualmente efetuadas pelas instituições de crédito no âmbito das suas atividades. Por conseguinte, e tendo em conta os objetivos prosseguidos pela Diretiva 94/19, como recordados no n.o 83 do presente acórdão, tal operação deve ser qualificada de «operação bancária normal», na aceção do artigo 1.o, ponto 1, da Diretiva 94/19, uma vez que é efetuada pela instituição de crédito sobre ou, como nos processos principais, a partir dos fundos dos seus depositantes. Além disso, e por analogia com os fundamentos que figuram nos n.os 61 a 66 do presente acórdão, há que considerar que a circunstância de a instituição de crédito ser o emitente dos futuros valores mobiliários em causa não põe essa qualificação em questão.

95

Em segundo lugar, quanto à questão de saber se as operações de subscrição de futuros valores mobiliários em causa nos processos principais levaram a uma «situação transitória», na aceção do artigo 1.o, ponto 1, da Diretiva 94/19, há que considerar que, quando, no âmbito de tais operações, são debitados fundos de depositantes de uma instituição de crédito, previamente à emissão desses valores mobiliários, da conta bancária daqueles e creditados em contas abertas em nome dessa instituição, onde se encontram depositados enquanto não se tornam a contrapartida da compra dos referidos valores mobiliários uma vez emitidos, esses fundos encontram‑se efetivamente numa «situação transitória».

96

Tendo em conta todas as considerações anteriores, créditos como os que estão em causa no processo principal estão abrangidos pelos sistemas de garantia dos depósitos previstos pela Diretiva 94/19, uma vez que se referem a «saldos credores resultantes […] de situações transitórias decorrentes de operações bancárias normais», na aceção do artigo 1.o, ponto 1, dessa diretiva.

97

Esta interpretação não é posta em causa, no processo C‑688/15, pela circunstância de a conta bancária na qual estão inscritos os fundos que A. Anisimovienė e o. invocam não estar aberta em nome do Snoras mas sim de outra instituição de crédito. Com efeito, no âmbito da hipótese de «saldos credores resultantes […] de situações transitórias decorrentes de operações bancárias normais», referida no artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 94/19, a localização da conta na qual a instituição de crédito inscreve os fundos durante as operações bancárias normais não é determinante.

98

Esta mesma interpretação também não é posta em causa, no processo C‑109/16, pela circunstância de a República da Lituânia ter usado a faculdade prevista no artigo 7.o, n.o 2, da Diretiva 94/19, lido em conjugação com o anexo I, ponto 12, dessa diretiva, excluindo da garantia dos depósitos os títulos de dívida emitidos pelas instituições de crédito. Com efeito, essa exclusão é desprovida de pertinência nesse processo, a respeito do qual há que recordar que as obrigações em questão não tinham sido emitidas e adquiridas por A. Raišelis na data da insolvência do Snoras.

Conclusão

99

Em face de todas as considerações anteriores, há que responder à primeira a quarta questões no processo C‑688/15 e à segunda, quarta e quinta questões no processo C‑109/16, que, por um lado, as disposições da Diretiva 97/9 e, por outro, as da Diretiva 94/19 devem ser interpretadas no sentido de que os créditos relativos a fundos, debitados de contas da titularidade de particulares numa instituição de crédito e transferidos para contas abertas em nome dessa instituição, para subscrição de futuros valores mobiliários que aquela deveria emitir, em circunstâncias em que a emissão desses valores acabou por não se realizar devido à insolvência da referida instituição, estão abrangidos tanto pelos sistemas de indemnização dos investidores previstos pela Diretiva 97/9 como pelos sistemas de garantia dos depósitos previstos pela Diretiva 94/19.

Quanto à primeira parte da primeira questão no processo C‑109/16

100

Com a primeira parte da sua primeira questão no processo C‑109/16, que importa examinar em segundo lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 2.o, n.o 3, da Diretiva 97/9 deve ser interpretado no sentido de que, numa situação em que os créditos estão abrangidos tanto pelos sistemas de garantia de depósitos previstos pela Diretiva 94/19 como pelos sistemas de indemnização dos investidores previstos na Diretiva 97/9, e na qual o legislador nacional não imputou tais créditos a um sistema pertencente a uma ou a outra dessas duas diretivas, o juiz deve ou pode por si só decidir, com base nessa disposição, qual o sistema de que os titulares desses créditos podem beneficiar.

101

A este respeito, resulta do artigo 2.o, n.o 3, da Diretiva 97/9 que, se, num dado Estado‑Membro, um crédito estiver abrangido simultaneamente pelos sistemas de indemnização dos investidores previstos nessa diretiva e pelos sistemas de garantia dos depósitos previstos pela Diretiva 94/19, cabe a esse Estado‑Membro imputar esse crédito a um sistema decorrente de uma ou de outra dessas diretivas, «consoante o que […] considerar mais adequado». Por outro lado, a mesma disposição estabelece que um crédito não pode ser objeto de uma dupla indemnização ao abrigo das duas diretivas.

102

Assim, quanto às categorias de créditos que preenchem cumulativamente os requisitos previstos pelas Diretivas 94/19 e 97/9, essa disposição não prevê critérios objetivos para efeitos da sua imputação a um sistema previsto numa ou noutra diretiva, mas remete para cada Estado‑Membro a tarefa de o decidir.

103

Daqui decorre que, admitindo que o tribunal competente verifica, por um lado, que os créditos pelos quais é pedida uma indemnização preenchem tanto os requisitos previstos pela Diretiva 94/19 como os previstos pela Diretiva 97/9 e, por outro, que o direito nacional não contém nenhuma regra de imputação de tais créditos a um sistema que decorre de uma ou outra diretiva, não se pode basear no artigo 2.o, n.o 3, da Segunda Diretiva para decidir ele próprio o sistema nos termos do qual os titulares desses créditos devem ser indemnizados.

104

Numa hipótese como a do número anterior, sendo certo que, por um lado, os titulares dos referidos créditos podem juridicamente invocar a proteção que tanto a Diretiva 94/19 como a Diretiva 97/9 lhes garantem, mas que, por outro, em conformidade com o referido artigo 2.o, n.o 3, dessa Segunda Diretiva, não podem beneficiar de uma dupla indemnização, há que considerar que cabe aos referidos titulares escolher ser indemnizados por um ou outro dos sistemas previstos no direito nacional para implementar essas diretivas.

105

Tendo em conta todas as considerações que precedem, há que responder à primeira parte da primeira questão no processo C‑109/16 que o artigo 2.o, n.o 3, da Diretiva 97/9 deve ser interpretado no sentido de que, numa situação em que os créditos estão abrangidos tanto pelos sistemas de garantia de depósitos previstos na Diretiva 94/19 como pelos sistemas de indemnização dos investidores previstos na Diretiva 97/9, e na qual o legislador nacional não imputou tais créditos a um sistema previsto numa ou noutra dessas diretivas, o juiz não pode por si só decidir, com base nessa disposição, qual o sistema de que os titulares desses créditos podem beneficiar. Em contrapartida, nessa situação, cabe a estes últimos escolher ser indemnizados por um ou outro dos sistemas previstos no direito nacional para implementar essas duas diretivas.

Quanto à segunda parte da primeira questão e à terceira no processo C‑109/16

106

Com a segunda parte da sua primeira questão e a sua terceira questão no processo C‑109/16, que importa examinar em conjunto e em último lugar, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância se, por um lado, o artigo 1.o, ponto 1, da Diretiva 94/19 e, por outro, o artigo 1.o, ponto 4, e o artigo 2.o, n.o 2, segundo parágrafo, da Diretiva 97/9 devem ser interpretados no sentido em que podem ser invocados por particulares perante o tribunal nacional em apoio de pedidos de indemnização contra uma empresa pública encarregada, num Estado‑Membro, dos sistemas de garantia dos depósitos e de indemnização dos investidores.

107

A este respeito, em primeiro lugar, no Acórdão de 25 de junho de 2015, Indėlių ir investicijų draudimas e Nemaniūnas (C‑671/13, EU:C:2015:418, n.o 58), o Tribunal de Justiça declarou que as disposições da Diretiva 97/9 relativas à determinação dos fundos e instrumentos cobertos pelos sistemas de indemnização que prevê, incluindo o artigo 1.o, ponto 4, e o artigo 2.o, n.o 2, segundo parágrafo, dessa diretiva, são suficientemente claras, precisas e incondicionais para poderem ser invocadas diretamente pelos particulares no tribunal nacional.

108

A mesma interpretação se impõe no que respeita ao artigo 1.o, ponto 1, da Diretiva 94/19. Com efeito, essa disposição define as diferentes hipóteses de «depósitos» abrangidos pela referida diretiva com toda a clareza, precisão e incondicionalidade exigidas para poder ser aplicada diretamente num litígio no tribunal nacional, em especial tendo em conta a interpretação fornecida pelo Tribunal de Justiça nos presentes processos.

109

Em segundo lugar, cumpre recordar que os sujeitos de direito podem invocar disposições incondicionais e suficientemente precisas de uma diretiva não apenas contra um Estado‑Membro e todos os órgãos da sua Administração, mas igualmente contra organismos ou entidades, que se distinguem dos particulares e devem ser equiparados ao Estado, quer porque são pessoas coletivas de direito público que fazem parte do Estado em sentido amplo, quer porque estão sujeitos à autoridade ou ao controlo de uma autoridade pública, quer ainda porque foram encarregados, por essa autoridade, de exercer uma missão de interesse público e foram dotados, para esse efeito, de poderes exorbitantes (Acórdão de 10 de outubro de 2017, Farrell, C‑413/15, EU:C:2017:7455, n.os 33 e 34).

110

No caso em apreço, resulta das decisões de reenvio nos dois processos principais que a IID é, no direito lituano, uma «empresa estatal», isto é, uma pessoa coletiva de direito público, de modo que pode ser equiparada ao Estado para efeitos da aplicabilidade direta das Diretivas 94/19 e 97/9.

111

Em face de todas as considerações anteriores, há que responder à segunda parte da primeira questão e à terceira questão no processo C‑109/16 que, por um lado, o artigo 1.o, ponto 1, da Diretiva 94/19 e, por outro, o artigo 1.o, ponto 4, e o artigo 2.o, n.o 2, segundo parágrafo, da Diretiva 97/9 devem ser interpretados no sentido de que podem ser invocados por particulares perante o tribunal nacional em apoio dos pedidos de indemnização contra uma empresa pública encarregada, num Estado‑Membro, dos sistemas de garantia dos depósitos e de indemnização dos investidores.

Quanto à quinta questão no processo C‑688/15

112

Com a sua quinta questão no processo C‑688/15, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se a Diretiva 94/19 deve ser interpretada no sentido de que os Estados‑Membros são livres de estender a garantia dos depósitos a créditos que, em princípio, não estão abrangidos por essa diretiva nem pela Diretiva 97/9.

113

Tendo em conta as respostas dadas às questões anteriores, não há que responder à quinta questão no processo C‑688/15.

Quanto às despesas

114

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quinta Secção) declara:

 

1)

Por um lado, as disposições da Diretiva 97/9/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 3 de março de 1997, relativa aos sistemas de indemnização dos investidores e, por outro, as da Diretiva 94/19/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 30 de maio de 1994, relativa aos sistemas de garantia de depósitos, conforme alterada pela Diretiva 2009/14/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março de 2009, devem ser interpretadas no sentido de que os créditos relativos a fundos, debitados de contas da titularidade de particulares numa instituição de crédito e transferidos para contas abertas em nome dessa instituição, para subscrição de futuros valores mobiliários que aquela deveria emitir, em circunstâncias em que a emissão desses valores acabou por não se realizar devido à insolvência da referida instituição, estão abrangidos tanto pelos sistemas de indemnização dos investidores previstos pela Diretiva 97/9 como pelos sistemas de garantia dos depósitos previstos pela Diretiva 94/19, conforme alterada pela Diretiva 2009/14.

 

2)

O artigo 2.o, n.o 3, da Diretiva 97/9 deve ser interpretado no sentido de que, numa situação em que os créditos estão abrangidos tanto pelos sistemas de garantia de depósitos previstos na Diretiva 94/19, como pelos sistemas de indemnização dos investidores previstos na Diretiva 97/9, e na qual o legislador nacional não imputou tais créditos a um sistema previsto numa ou noutra dessas diretivas, o juiz não pode por si só decidir, com base nesta disposição, qual o sistema de que os titulares desses créditos podem beneficiar. Em contrapartida, nessa situação, cabe a estes últimos escolher ser indemnizados por um ou outro dos sistemas previstos no direito nacional para implementar essas duas diretivas.

 

3)

Por um lado, o artigo 1.o, ponto 1, da Diretiva 94/19, conforme alterada pela Diretiva 2009/14, e, por outro, o artigo 1.o, ponto 4, e o artigo 2.o, n.o 2, segundo parágrafo, da Diretiva 97/9 devem ser interpretados no sentido de que podem ser invocados por particulares perante o tribunal nacional em apoio de pedidos de indemnização contra uma empresa pública encarregada, num Estado‑Membro, dos sistemas de garantia dos depósitos e de indemnização dos investidores.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: lituano.