ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção)

7 de novembro de 2013 ( *1 )

«Reenvio prejudicial — Livre prestação de serviços — Destacamento de trabalhadores — Diretiva 96/71/CE — Remunerações salariais mínimas — Montantes fixos e contribuição do empregador para um plano de poupança plurianual a favor dos seus trabalhadores»

No processo C‑522/12,

que tem por objeto um pedido de decisão prejudicial nos termos do artigo 267.o TFUE, apresentado pelo Bundesarbeitsgericht (Alemanha), por decisão de 18 de abril de 2012, entrado no Tribunal de Justiça em 19 de novembro de 2012, no processo

Tevfik Isbir

contra

DB Services GmbH,

O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Sétima Secção),

composto por: J. L. da Cruz Vilaça, presidente de secção, G. Arestis e J.‑C. Bonichot (relator), juízes,

advogado‑geral: M. Wathelet,

secretário: A. Calot Escobar,

vistos os autos,

vistas as observações apresentadas:

em representação de T. Isbir, por S. Hermann, Rechtsanwalt,

em representação do Governo alemão, por K. Petersen, A. Wiedmann e T. Henze, na qualidade de agentes,

em representação do Governo austríaco, por A. Posch, na qualidade de agente,

em representação do Governo polaco, por B. Majczyna e M. Szpunar, na qualidade de agentes,

em representação do Governo sueco, por C. Stege e A. Falk, na qualidade de agentes,

em representação do Governo norueguês, por P. Wennerås, na qualidade de agente,

em representação da Comissão Europeia, por F. Bulst e J. Enegren, na qualidade de agentes,

vista a decisão tomada, ouvido o advogado‑geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,

profere o presente

Acórdão

1

O pedido de decisão prejudicial tem por objeto a interpretação do artigo 3.o, n.o 1, primeiro parágrafo, alínea c), da Diretiva 96/71/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 1996, relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação de serviços (JO 1997, L 18, p. 1 e retificativos JO 2007, L 301, p. 28, e L 310, p. 22).

2

Este pedido foi apresentado no âmbito de um litígio que opõe T. Isbir, que trabalha no setor da limpeza industrial à sua entidade patronal, a DB Services GmbH (a seguir «DB Services»), empresa do grupo Deutsche Bahn AG, quanto aos elementos a ter em conta para a determinação do salário mínimo do interessado.

Quadro jurídico

Direito da União

3

O artigo 3.o da Diretiva 96/71, intitulado «Condições de trabalho e emprego», estabelece nos seus n.os 1 e 8:

«1.   Os Estados‑Membros providenciarão no sentido de que, independentemente da lei aplicável à relação de trabalho, as empresas referidas no n.o 1 do artigo 1.o garantam aos trabalhadores destacados no seu território as condições de trabalho e de emprego relativas às matérias adiante referidas que, no território do Estado‑Membro onde o trabalho for executado, sejam fixadas:

por disposições legislativas, regulamentares ou administrativas

e/ou

por convenções coletivas ou decisões arbitrais declaradas de aplicação geral na aceção do n.o 8, na medida em que digam respeito às atividades referidas no anexo:

[…]

c)

Remunerações salariais mínimas, incluindo as bonificações relativas a horas extraordinárias; a presente alínea não se aplica aos regimes complementares voluntários de reforma;

[…]

Para efeitos da presente diretiva, a noção de ‘remunerações salariais mínimas’ referida na alínea c) do n.o 1 é definida pela legislação e/ou pela prática nacional do Estado‑Membro em cujo território o trabalhador se encontra destacado.

[…]

8.   Entende‑se por ‘convenções coletivas ou decisões arbitrais declaradas de aplicação geral’, aquelas que devem ser cumpridas por todas as empresas pertencentes ao setor ou à profissão em causa e abrangidas pelo seu âmbito de aplicação territorial.

[...]»

Direito alemão

A AEntG 2007

4

A Lei sobre as condições de trabalho imperativas em caso de prestações de serviços transfronteiriças (Gesetz über zwingende Arbeitsbedingungen bei grenzüberschreitenden Dienstleistungen — Arbeitnehmer‑Entsendegesetz), na versão publicada em 25 de abril de 2007, que entrou em vigor em 1 de julho de 2007 (a seguir «AEntG 2007»), transpõe para direito interno alemão a Diretiva 96/71, bem como as alterações posteriores do direito da União, designadamente as que resultam da Diretiva 2006/123/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de dezembro de 2006, relativa aos serviços no mercado interno (JO L 376, p. 36).

5

O § 1 da AEntG 2007 contém disposições que determinam as modalidades de aplicação das convenções coletivas às entidades patronais estrangeiras no caso de destacamentos de trabalhadores na Alemanha.

Quinta Lei relativa à constituição de capital

6

A quinta Lei relativa à constituição de capital (Fünftes Vermögensbildungsgesetz), de 4 de março de 1994, prevê o pagamento pela entidade patronal de uma prestação pecuniária para a constituição de um capital por conta do trabalhador.

7

As modalidades de aplicação de capital previstas pela referida lei são, por exemplo, um contrato de poupança baseado em investimentos mobiliários ou outras participações de capital, as despesas de um trabalhador com a construção, a aquisição, a beneficiação, ou a ampliação de um imóvel de habitação, e as despesas relacionadas com um contrato de seguro de vida de capitalização ou de poupança. Neste âmbito, o trabalhador em causa só pode dispor das prestações no termo de um período de imobilização de vários anos, que é regulamentado diversamente consoante a forma de aplicação.

8

As prestações para a constituição de capital são subsidiadas pelo Estado, pelo menos no que se refere a algumas formas de aplicação.

As convenções coletivas

— A ETV DB Services Nord

9

A convenção coletiva sobre as remunerações dos trabalhadores e aprendizes da DB Services Nord GmbH (Entgelttarifvertrag für die Arbeitnehmer und Auszubildenden der DB Services Nord GmbH), de 16 de dezembro de 2004 (a seguir «ETV DB Services Nord»), contém tabelas salariais para os trabalhadores no domínio dos serviços nos imóveis e na circulação.

10

A ETV DB Services Nord, que devia ter sido revogada em 30 de junho de 2007, manteve‑se em vigor até 31 de março de 2008.

11

A remuneração horária prevista pela ETV DB Services Nord era de 7,56 euros para o grupo A3.

12

As partes na referida convenção estipularam que, a partir de 1 de abril de 2008, a remuneração horária para esse grupo A3 seria de 7,90 euros.

13

As partes acordaram também no momento da negociação que, no respeitante ao período de 1de julho de 2007 a 31 de março de 2008, os trabalhadores beneficiariam de dois pagamentos fixos (a seguir «prestações fixas dos meses de agosto de 2007 e de janeiro de 2008»), a saber:

600 euros a título de aumento da participação nos resultados, pagos com o salário do mês de agosto de 2007; e

150 euros a título de prestação excecional ligada à conjuntura, pagos com o salário de janeiro de 2008.

— A LohnTV Gebäudereinigung 2004

14

A convenção coletiva sobre os salários dos trabalhadores do setor da limpeza industrial (Lohntarifvertrag für die gewerblichen Beschäftigten in der Gebäudereinigung), de 4 de outubro de 2003 (a seguir «LohnTV Gebäudereinigung 2004»), foi declarada de aplicação geral a partir de 1 de abril de 2004.

15

O § 2 da LohnTV Gebäudereinigung 2004 previa uma remuneração horária de 7,87 euros.

16

Este regime deixou de vigorar em 29 de fevereiro de 2008.

— A TV Mindestlohn Gebäudereinigung

17

A convenção que regula os salários mínimos dos trabalhadores do setor da limpeza industrial no território da República Federal da Alemanha (Tarifvertrag zur Regelung der Mindestlöhne für gewerbliche Arbeitnehmer in der Gebäudereinigung im Gebiet der Bundesrepublik Deutschland), de 9 de outubro de 2007 (a seguir «TV Mindestlohn Gebäudereinigung»), previa um salário mínimo horário de 8,15 euros para os trabalhadores pertencentes à categoria correspondente ao grupo A3.

18

A aplicação da TV Mindestlohn Gebäudereinigung foi alargada a partir de 1 de março de 2008.

Litígio e questões prejudiciais

19

T. Isbir é um trabalhador do setor da limpeza industrial que trabalha na Alemanha para a DB Services desde 1 de janeiro de 2004.

20

Em aplicação da ETV DB Services Nord, recebeu uma remuneração horária de 7,56 euros até 31 de março de 2008 e de 7,90 euros a partir de 1 de abril de 2008.

21

Pediu para beneficiar, a partir de 1 de julho de 2007, das disposições mais favoráveis que fixavam os salários horários do setor da limpeza industrial, a saber, da LohnTV Gebäudereinigung 2004, até 29 de fevereiro de 2008, posteriormente da TV Mindestlohn Gebäudereinigung, a partir de 1 de março de 2008, tornadas aplicáveis a todos os trabalhadores e empregados desse setor, incluindo aos da DB Services.

22

T. Isbir entendia que devia ter recebido um salário horário de 7,87 euros, e a seguir de 8,15 euros, em vez de 7,56 euros e de 7,90 euros.

23

Embora a DB Services não tenha contestado ter passado a estar sujeita à LohnTV Gebäudereinigung 2004, e posteriormente à TV Mindestlohn Gebäudereinigung, considerou que T. Isbir já tinha ganho na realidade bem mais do que o salário mínimo horário que reclamava, uma vez que tinha beneficiado, em relação ao período em causa e ao abrigo das convenções coletivas aplicáveis ao grupo Deutsche Bahn AG, de montantes que deviam, em seu entender, ser integrados nesse salário mínimo, a saber:

por um lado, as prestações fixas dos meses de agosto de 2007 e de janeiro de 2008,

por outro lado, a contribuição para a constituição de capital.

24

É a questão da integração ou não desses elementos da remuneração no salário mínimo que é objeto do litígio que foi submetido ao Bundesarbeitsgericht.

25

O referido órgão jurisdicional reconhece que o litígio incide sobre uma situação puramente interna. Todavia, alega que, segundo a jurisprudência do Tribunal de Justiça (acórdãos de 17 de julho de 1997, Leur‑Bloem, C-28/95, Colet., p. I-4161, e de 20 de maio de 2010, Modehuis A. Zwijnenburg, C-352/08, Colet., p. I-4303), para evitar divergências de interpretação futuras, as disposições ou os conceitos provenientes do direito da União devem ser interpretadas de forma uniforme, independentemente da questão de saber se se aplicam a uma situação puramente interna ou transfronteiriça. No caso presente, resulta dos trabalhos preparatórios da AEntG 2007 que o conceito de «remuneração salarial mínima» a que se refere esta lei deve, segundo o legislador nacional, ser interpretada de maneira idêntica quer se aplique a uma situação interna ou a uma situação abrangida pelo direito da União.

26

O órgão jurisdicional de reenvio interroga‑se sobre a questão de saber em que medida os dois montantes mencionados no n.o 23 do presente acórdão cabem no quadro da interpretação que, em seu entender, o Tribunal de Justiça já deu das remunerações salariais mínimas no seu acórdão de 14 de abril de 2005, Comissão/Alemanha (C-341/02, Colet., p. I-2733), e que não compreende os elementos de remuneração que modificam a relação entre a prestação do trabalhador e a contrapartida que este recebe por ela.

27

Nestas circunstâncias, o Bundesarbeitsgericht decidiu suspender a instância e submeter ao Tribunal de Justiça as seguintes questões prejudiciais:

«1)

Deve o conceito de ‘remunerações salariais mínimas’, previsto no artigo 3.o, n.o 1, [segundo travessão], alínea c), da Diretiva [96/71], ser interpretado no sentido de que se refere à contrapartida do empregador pela prestação de trabalho do trabalhador que, segundo as disposições legislativas, regulamentares ou [de convenções coletivas declaradas de aplicação geral, na aceção do] artigo 3.o, n.o 1, proémio, da diretiva, deve ser apenas e na íntegra paga mediante o salário mínimo previsto na convenção coletiva (‘prestação normal’), podendo, por esse motivo, apenas ser imputadas na obrigação de pagamento da remuneração salarial mínima as prestações do empregador que constituem uma remuneração por esta prestação normal e que devem ser disponibilizadas ao trabalhador, o mais tardar, na data de vencimento do período de pagamento do salário?

2)

Deve o conceito de ‘remunerações salariais mínimas’ previsto no artigo 3.o, n.o 1, [segundo travessão], alínea c), da Diretiva [96/71], ser interpretado no sentido de que se opõe a disposições ou práticas nacionais segundo as quais as prestações de um empregador não devem ser consideradas elementos que fazem parte do salário mínimo e, por conseguinte, não devem ser imputadas no cumprimento do direito ao salário mínimo, se o empregador fornecer essas prestações por força de uma obrigação decorrente de uma convenção coletiva,

que, segundo a vontade das partes na convenção coletiva e do legislador nacional, se destinam à constituição de [capital] em benefício do trabalhador,

e que, para esse efeito,

as prestações mensais do empregador em benefício do trabalhador são aplicadas a longo prazo, por exemplo, como contribuição para a poupança, para a construção ou a aquisição de uma casa de habitação ou para um seguro de vida de capitalização, e

são incentivadas sob a forma de subsídios do Estado ou de benefícios fiscais, e

o trabalhador só pode dispor desses valores após vários anos, e

o montante das contribuições, como montante fixo mensal, depende exclusivamente das horas de trabalho acordadas, mas não da remuneração [‘prestações para a constituição de capital’]?»

Quanto à competência do Tribunal de Justiça

28

Importa recordar que o Tribunal já se declarou competente para conhecer de reenvios prejudiciais relativos a disposições do direito da União em situações em que, embora os factos no processo principal se situassem fora do âmbito de aplicação do direito da União, as disposições desse direito tinham sido tornadas aplicáveis pelo direito nacional (v., neste sentido, acórdão Leur‑Bloem, já referido, n.os 26 e 27). Do mesmo modo, o Tribunal declarou que, quando uma legislação nacional adota, para resolver situações puramente internas, as soluções do direito da União, nomeadamente com o objetivo de evitar discriminações contra cidadãos nacionais ou eventuais distorções da concorrência, existe um interesse manifesto da União Europeia em que, para evitar divergências de interpretação futuras, as disposições ou os conceitos provenientes do direito da União sejam interpretados de maneira uniforme, quaisquer que sejam as condições em que se devam aplicar (v., neste sentido, acórdão Modehuis A. Zwijnenburg, já referido, n.o 33).

29

O órgão jurisdicional de reenvio alega, a este propósito, que o legislador nacional considerou, como em seu entender resulta dos trabalhos preparatórios da AEntG 2007, que transpôs a Diretiva 96/71 para o direito interno alemão, que sejam interpretadas de maneira uniforme «as situações internas e as situações cujo âmbito é abrangido pelo direito da União, designadamente quando se trata do destacamento transfronteiriço de trabalhadores».

30

Ora, em tal situação, e no âmbito da repartição das funções jurisdicionais entre os órgãos jurisdicionais nacionais e o Tribunal de Justiça, prevista pelo artigo 267.o TFUE, compete exclusivamente ao órgão jurisdicional nacional apreciar o alcance exato dessa remissão para o direito da União, limitando‑se a competência do Tribunal unicamente à análise das disposições deste direito. Com efeito, a tomada em consideração dos limites que o legislador nacional estabeleceu à aplicação do direito da União a situações puramente internas é regulada pelo direito interno e, por conseguinte, é da competência exclusiva dos órgãos jurisdicionais do Estado‑Membro (v. acórdão Leur‑Bloem, já referido, n.o 33)

31

De quanto precede resulta que o Tribunal de Justiça é competente para responder às questões colocadas pelo órgão jurisdicional de reenvio.

Quanto às questões prejudiciais

32

Com as suas duas questões, que devem ser examinadas conjuntamente, o órgão jurisdicional de reenvio pergunta, em substância, se o artigo 3.o, n.o 1, segundo travessão, alínea c), da Diretiva 96/71 deve ser interpretado no sentido de que se opõe à integração no salário mínimo de elementos de remuneração como os que estão em causa no processo principal que consistem, por um lado, em duas prestações fixas decididas no quadro da negociação de uma convenção coletiva e, por outro, numa contribuição para a constituição de um capital.

33

Neste contexto, importa recordar que, como resulta do considerando 6 da Diretiva 96/71, o legislador da União adotou esta com o intuito de prever, no interesse dos empregadores e do seu pessoal, as condições de trabalho e de emprego aplicáveis à relação de trabalho quando uma empresa estabelecida num dado Estado‑Membro destaca temporariamente trabalhadores para o território de outro Estado‑Membro, no âmbito de uma prestação de serviços. Decorre do considerando 13 da mesma diretiva que as legislações dos Estados‑Membros devem ser coordenadas de modo a prever um núcleo de regras imperativas de proteção mínima que as entidades patronais que destaquem trabalhadores devem observar no Estado de acolhimento. Todavia, a referida diretiva não harmonizou o conteúdo material dessas regras imperativas de proteção mínima. Esse conteúdo pode pois ser livremente definido pelos Estados‑Membros, no respeito do Tratado CE e dos princípios gerais do direito da União (acórdão de 18 de dezembro de 2007, Laval un Partneri, C-341/05, Colet., p. I-11767, n.os 58 a 60).

34

A fim de garantir o respeito por um núcleo de regras imperativas de proteção mínima, o artigo 3.o, n.o 1, primeiro parágrafo, da Diretiva 96/71 prevê que os Estados‑Membros providenciarão no sentido de que, independentemente da lei aplicável à relação de trabalho, no âmbito de uma prestação de serviços transnacional, as empresas garantam aos trabalhadores destacados no seu território as condições de trabalho e de emprego relativas às matérias indicadas nesta disposição, designadamente as remunerações salariais mínimas, incluindo as bonificações relativas a horas extraordinárias (acórdão Laval un Partneri, já referido, n.o 73).

35

A Diretiva 96/71 não se destina a harmonizar os sistemas de determinação das condições de trabalho e de emprego nos Estados‑Membros, os quais continuam a ter liberdade para escolher, a nível nacional, um sistema não expressamente previsto na referida diretiva, desde que não coloque entraves à prestação de serviços entre os Estados‑Membros (acórdão Laval un Partneri, já referido, n.o 68).

36

Além disso, importa recordar que o artigo 3.o, n.o 1, segundo travessão, da Diretiva 96/71 remete expressamente, para efeitos de aplicação desta, para a legislação ou a prática nacional do Estado‑Membro em cujo território o trabalhador se encontra destacado para a determinação das remunerações salariais mínimas referidas no primeiro parágrafo do mesmo n.o 1.

37

Neste contexto, deve concluir‑se que a Diretiva 96/71 não fornece nenhum elemento de definição material do salário mínimo. A determinação de quais os elementos constitutivos deste, para a aplicação desta diretiva, deve portanto ser feita pelo direito do Estado‑Membro em causa, na condição apenas de que essa determinação, como resulta da legislação ou das convenções coletivas nacionais pertinentes ou da interpretação que delas fazem os órgãos jurisdicionais nacionais, não tenha por efeito criar entraves à livre prestação de serviços entre os Estados‑Membros.

38

A este propósito, o Tribunal de Justiça já considerou que os acréscimos e complementos, que a legislação ou a prática nacional do Estado‑Membro em cujo território o trabalhador se encontra destacado não define como elementos que fazem parte do salário mínimo, e que alteram a relação entre a prestação do trabalhador, por um lado, e a contrapartida que este recebe, por outro, não podem ser considerados tais elementos por força do disposto na Diretiva 96/71 (acórdão Comissão/Alemanha, já referido, n.o 39).

39

A este respeito, o Tribunal de Justiça considerou que é de facto normal que, se o empregador exigir ao trabalhador a prestação de trabalho adicional ou horas de trabalho em condições específicas, esse trabalhador seja compensado por essa prestação suplementar, sem que tal compensação seja considerada para efeitos de cálculo do salário mínimo (acórdão Comissão/Alemanha, já referido, n.o 40).

40

Assim, só os elementos da remuneração que não alterem o nexo entre a prestação do trabalhador, por um lado, e a contrapartida que este recebe, por outro, podem ser tidos em conta na determinação do salário mínimo, na aceção da Diretiva 96/71.

41

Em circunstâncias como as do processo principal, importa, em primeiro lugar, constatar que as prestações fixas dos meses de agosto de 2007 e de janeiro de 2008 se afiguram constituir, como salienta o órgão jurisdicional de reenvio, a contrapartida da atividade normal dos trabalhadores em causa, como prevista por uma convenção coletiva de aplicação geral, a ETV DB Services Nord.

42

É certo que as referidas prestações foram feitas fora do período em relação ao qual era suposto remunerarem a prestação dos trabalhadores em questão. Todavia, essa circunstância, em si mesma, não tem incidência na qualificação dessas remunerações, desde que as partes na ETV DB Services Nord tenham pretendido, deste modo, proceder a um aumento dos salários como contrapartida do trabalho, tendo em conta a prática nacional que consistia, no momento da negociação dessa convenção, e no termo da validade da convenção anterior, em antecipar, através dessas prestações fixas, a aplicação da nova tabela salarial. Compete, todavia, ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se essa qualificação corresponde realmente à intenção das partes nessa convenção coletiva.

43

Em segundo lugar, afigura‑se que a contribuição para a constituição de um capital, tendo em conta o seu objetivo e as suas características tal como indicadas pelo órgão jurisdicional de reenvio, modifica o nexo entre a prestação do trabalhador e a contrapartida que o mesmo recebe como remuneração.

44

Com efeito, mesmo que não seja destacável da prestação de trabalho, tal contribuição distingue‑se claramente do salário propriamente dito. Uma vez que visa, graças à constituição de um capital de que o trabalhador beneficiará a mais ou menos longo prazo, realizar um objetivo de política social suportado, designadamente, por uma contribuição financeira dos poderes públicos, não se pode considerar, para efeitos de aplicação da Diretiva 96/71, que se inscreve na relação habitual entre a prestação de trabalho e a contrapartida financeira que esta exige por parte da entidade patronal. Incumbe, porém, ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se assim acontece realmente no litígio que lhe foi submetido.

45

Atentas as considerações que precedem, há que responder às questões colocadas que o artigo 3.o, n.o 1, segundo travessão, alínea c), da Diretiva 96/71 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe à integração no salário mínimo de elementos de remuneração que não modificam o nexo entre a prestação do trabalhador, por um lado, e a contrapartida que o mesmo recebe como remuneração dessa prestação, por outro. Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se assim acontece realmente no caso dos elementos de remuneração em causa no processo principal.

Quanto às despesas

46

Revestindo o processo, quanto às partes na causa principal, a natureza de incidente suscitado perante o órgão jurisdicional de reenvio, compete a este decidir quanto às despesas. As despesas efetuadas pelas outras partes para a apresentação de observações ao Tribunal de Justiça não são reembolsáveis.

 

Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Sétima Secção) declara:

 

O artigo 3.o, n.o 1, segundo travessão, alínea c), da Diretiva 96/71/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 16 de dezembro de 1996, relativa ao destacamento de trabalhadores no âmbito de uma prestação de serviços, deve ser interpretado no sentido de que não se opõe à integração no salário mínimo de elementos de remuneração que não modificam o nexo entre a prestação do trabalhador, por um lado, e a contrapartida que o mesmo recebe como remuneração dessa prestação, por outro. Incumbe ao órgão jurisdicional de reenvio verificar se assim acontece realmente no caso dos elementos de remuneração em causa no processo principal.

 

Assinaturas


( *1 ) Língua do processo: alemão.