18.8.2006   

PT

Jornal Oficial da União Europeia

C 195/26


Parecer do Comité Económico e Social Europeu sobre a «Proposta de Directiva do Parlamento Europeu e do Conselho relativa à promoção de veículos de transporte rodoviário não poluentes»

COM(2005) 634 final — 2005/0283 (COD)

(2006/C 195/07)

O Conselho, por carta de 1 de Março de 2006, solicitou ao Comité Económico e Social Europeu que elaborasse, em conformidade com o disposto no artigo 175.o, n.o 1, do Tratado CE, um parecer sobre a proposta supramencionada.

A Secção Especializada de Transportes, Energia, Infra-estruturas e Sociedade da Informação, incumbida da preparação dos correspondentes trabalhos do Comité, emitiu parecer em 2 de Maio de 2006, sendo relator RANOCCHIARI.

O Comité Económico e Social Europeu, na 427.a reunião plenária, de 17 e 18 de Maio de 2006 (sessão de 17 de Maio), adoptou, por 137 votos a favor, 1 voto contra e 4 abstenções, o presente parecer.

1.   Conclusões e recomendações

1.1

Mais de 75 % da população da União Europeia vivem em zonas urbanas. O transporte urbano representa, portanto, uma percentagem muito importante do sector dos transportes na sua globalidade, influindo quer nos parâmetros de qualidade do ar (monóxido de carbono, hidrocarbonetos, óxidos de azoto, partículas, precursores do ozono) e, portanto, na poluição local, quer nas alterações climáticas (emissões de CO2).

1.2

Diversas acções legislativas e de investigação se seguiram durante os últimos anos tanto no âmbito europeu como no da cooperação internacional: melhorar a eficiência energética, reduzir as emissões de poluentes, além da dependência do petróleo, são os principais objectivos perseguidos.

1.3

Graças às normas que disciplinam as emissões dos veículos, conhecidas como normas «Euro», nos últimos 25 anos as emissões de poluentes devidas ao trânsito de veículos foram drasticamente reduzidas.

1.4

Além disso, graças a modelos como o CAFE (Clean Air for Europe — Ar limpo para a Europa, 2005), foi possível prever uma ulterior diminuição de 5 % dos níveis de poluição para 2020.

1.5

A directiva em exame visa a promoção de um ambiente urbano sustentável: a proposta prevê a criação de um parque de veículos pesados não poluentes, que mediante poupança de energia produzam menos emissões de poluentes.

1.6

Em especial, aos entes públicos é imposta a obrigação de velarem por que 25 % dos veículos pesados de transporte rodoviário, de massa superior a 3,5 t, adquiridos anualmente sejam veículos não poluentes. A proposta da Comissão prevê, além disso, a possibilidade de uma extensão subsequente desta obrigação às outras categorias de veículos adquiridos por organismos públicos.

1.7

Com um investimento inicial dos entes públicos, a entrada em vigor desta directiva em tempo útil favoreceria um rápido desenvolvimento e uma ampla difusão de tecnologias não poluentes.

1.8

Às muitas administrações municipais forçadas a impor restrições à livre circulação dos veículos, a directiva, se aprovada, proporcionaria uma solução alternativa capaz de obter resultados positivos de impacte ambiental, social e económico.

1.9

Cidades como Paris, Montpellier, Francoforte, Helsínquia e outras, que investiram numa frota de veículos não poluentes (autocarros ou camiões de recolha de lixo a gás natural), conseguiram resultados significativos e estão a adquirir mais veículos para aumentarem a frota disponível.

1.10

Acelerar os prazos de intervenção, diversificando os esforços e actuando em diversos planos para reduzir o impacte ambiental global (normas Euro sobre o controlo das emissões dos veículos, acções de melhoramento da eficiência energética e da segurança no tocante ao aprovisionamento e à diversificação das fontes de energia), só pode traduzir-se em benefícios sociais e avanços tecnológicos e económicos.

1.11

O CESE preconiza, portanto, que a directiva seja ainda adoptada em 2006, juntando-se às outras acções já lançadas pela Comunidade Europeia e às que estão a ser delineadas e em fase de aprovação.

2.   Motivos e contexto legislativo

2.1

Em 21 de Dezembro de 2005, a Comissão apresentou a proposta de directiva sobre a promoção de veículos de transporte rodoviário não poluentes, em apreço, (1) (base jurídica: artigo 175.o, n.o 1, do TCE; co-decisão).

2.2

Os principais objectivos da directiva são:

reduzir as emissões de poluentes produzidas pelo sector dos transportes,

incentivar o mercado dos veículos não poluentes, na ocorrência os veículos pesados de transporte de massa superior a 3,5 t.

2.3

A directiva prevê que os organismos públicos fiquem sujeitos à obrigação de reservar, nos concursos públicos anuais de aquisição de veículos pesados de transporte rodoviário (que ultrapassem as 3,5 t), uma quota mínima para os veículos conformes com a norma sobre as prestações de «veículo ecológico avançado». A quota mínima identificada é de 25 % e diz respeito à substituição de veículos automóveis pesados de transporte rodoviário para permitir a introdução gradual de critérios ambientais no procedimento de concurso público e preparar os organismos públicos e a indústria para uma possível extensão de tais requisitos a outras categorias de veículos.

2.4

A longo prazo, a directiva levará a um melhoramento das prestações ambientais de toda a frota graças ao progresso das economias de escala, a uma redução dos custos e a uma maior difusão das tecnologias para veículos ecológicos avançados.

3.   Definições e explicações

3.1

Os veículos pesados de transporte rodoviário objecto da directiva são os que têm peso superior a 3,5 t, como autocarros e veículos utilitários (por exemplo, camiões de recolha do lixo).

3.2

Por «veículo não poluente» entende-se «veículo ecológico avançado» segundo a definição da norma de rendimento europeia VEA (2), que estabelece limites severos para as emissões de CO2 e para as emissões nocivas de monóxido de carbono, óxidos de azoto, hidrocarbonetos, partículas e precursores do ozono:

CO

(g/kWh)

HC

(g/kWh)

NOx

(g/kWh)

PM

(g/kWh)

FUMO

(m-1)

1,5

0,25

2,0

0,02

0,15

3.3

Os Estados-Membros sempre foram incentivados a instituir facilidades fiscais para os veículos que cumprem valores-limite de emissões mais severos do que a norma Euro 4 actualmente em vigor (3), para favorecer a entrada no mercado de veículos de transporte rodoviário menos poluentes e mais eficientes.

3.4

Os organismos públicos a que se destina a directiva são o Estado, as autarquias locais ou regionais, os organismos de direito público, as empresas públicas e os operadores ligados por contratos a organismos públicos para a prestação de serviços de transporte.

3.5

A obrigação de reservar uma quota mínima das aquisições anuais por concurso público para veículos não poluentes refere-se a operações de aquisição e de locação financeira de veículos pesados de transporte rodoviário.

3.6

Promover a utilização de veículos VEA é, além disso, na linha da recente proposta de directiva da Comissão relativa à tributação aplicável aos veículos automóveis ligeiros de passageiros (4): esta seria parcialmente baseada nas emissões de CO2, para incentivar a aquisição de veículos menos poluentes e mais eficientes do ponto de vista energético, como os alimentados a biocombustíveis, gás natural, gás de petróleo liquefeito (GPL), motores eléctricos ou híbridos.

3.7

O aumento do consumo de biocombustíveis é identificado como um dos objectivos do Plano de acção Biomassa (5), recentemente adoptato pela Comissão e incentivado na comunicação subsequente sobre os biocombustíveis (6).

3.8

A proposta em apreço insere-se, pois, num vasto contexto de acções empreendidas para enfrentar o constante aumento das emissões de gases com efeito de estufa que influem negativamente nos objectivos comunitários ligados às alterações climáticas, ao incremento dos fenómenos de poluição local devidos às emissões do escape dos veículos que actuam negativamente sobre a saúde dos cidadãos, à eficiência energética dos combustíveis que ainda determina uma forte dependência europeia do petróleo.

3.9

No Livro Verde sobre o aprovisionamento energético (7), os temas ligados ao crescimento do sector dos transportes, aos elevdos consumos de energia, bem como às emissões de CO2 e à dependência do petróleo são analisados para identificar intervenções que possam influenciar a procura de tecnologias e combustíveis alternativos e favorecer uma geração de veículos não poluentes, como se refere no Livro Branco (8) sobre a política europeia dos transportes até 2010.

3.10

A comunicação sobre os combustíveis alternativos para o transporte rodoviário (9) e a subsequente directiva relativa à promoção da utilização de biocombustíveis (10) vêem na diversificação das fontes de energia um sistema eficaz para reduzir a dependência do petróleo, as emissões de CO2 e dos poluentes locais.

3.11

Na comunicação sobre a revisão da estratégia da União Europeia em favor do desenvolvimento sustentável (11) são tratados os aspectos ligados às alterações climáticas: nesta estratégia é explicitamente proposto o desenvolvimento de um mercado de veículos menos poluentes, no quadro de um programa de gestão do tráfego nas zonas urbanas em que seja prevista a promoção de «eco-inovações», e é expressamente recomendada a adopção de autocarros ecológicos.

3.12

O Livro Verde (12) sobre a eficiência energética propõe acções concretas, entre elas o recurso a concursos públicos para desenvolver um mercado de veículos menos poluentes e com maior eficiência energética relativamente aos convencionais.

3.13

A produção e a utilização de veículos mais respeitadores dos limites no que diz respeito aos poluentes atmosféricos representam um factor fundamental na tentativa de atingir os objectivos estabelecidos pela legislação europeia sobre a matéria (13).

3.14

No contexto da Estratégia temática sobre a poluição atmosférica (14), com a qual a Comissão se propõe uniformizar as directivas vigentes sobre a matéria, sublinha-se novamente a necessidade de recomendar aos entes públicos uma aplicação anual que atinja uma quota mínima de veículos ecológicos e energeticamente eficientes.

3.15

O Parlamento Europeu pronunciou-se a favor de um plano de acção comunitário para melhorar a eficiência energética no sector dos transportes, defendendo especificamente a importância de programas selectivos de concursos públicos para reduzir o preço de equipamentos energeticamente eficientes e torná-los competitivos em relação às tecnologias convencionais (15).

3.16

O Conselho Europeu deu um impulso a medidas destinadas à integração da gestão ambiental e do desenvolvimento sustentável na política dos transportes (16).

4.   Observações na generalidade

4.1

A aprovação da proposta de directiva em apreço introduziria uma série de medidas obrigatórias relativamente aos concursos públicos, medidas essas destinadas a acelerar a procura de mercado para os chamados veículos ecológicos. Ao mesmo tempo, a proposta promove a introdução de veículos não poluentes e energeticamente eficientes através de uma abordagem neutral do ponto de vista tecnológico, como foi recomendado pelos Estados-Membros (17).

4.2

A obrigação de concurso público para os veículos pesados que excedam as 3,5 t, em vez de acordos voluntários ou outros tipos de regulamentação, apresenta vantagens do ponto de vista do balanço custos-benefícios, quer no que diz respeito aos aspectos económicos de competitividade da indústria europeia quer, sobretudo, no tocante ao impacte ambiental.

4.3

Estabelecer que a quota a prever nos concursos públicos deve corresponder a 25 %, significa comparar com os 10 % de todo o mercado e, portanto, fazer referência a uma percentagem que permite influir no desenvolvimento do mercado dos veículos não poluentes e também incentivar economias de escala, mantendo aceitáveis os custos de investimento.

4.4

Segundo as estimativas efectuadas, o número de veículos pesados de transporte rodoviário abrangido por esta proposta de directiva é de cerca de 52 000, 17 000 dos quais autocarros e 35 000 veículos comerciais pesados. Introduzir 25 % de veículos não poluentes corresponderia, portanto, a 13 000 veículos pesados de transporte rodoviário VEA por ano. A escolha de um sector específico para a substituição (autocarros, veículos pesados de recolha do lixo ou outros) é deixada ao critério dos entes públicos, que têm toda a liberdade de determinar as quotas específicas de substituição.

4.5

Decidir lançar concursos públicos para a introdução sistemática de veículos não poluentes favoreceria o desenvolvimento da indústria automóvel e garantiria a expansão de um sólido mercado para os veículos pesados na Europa, aumentando nele o nível de concorrência e de competitividade.

4.6

Paris, Montpellier e Francoforte, como outras cidades, possuem já frotas de veículos não poluentes, que se preparam para ampliar ante os resultados positivos obtidos no plano ambiental e no plano socioeconómico.

4.7

A obrigatoriedade de uma percentagem de veículos VEA na frota de veículos pesados de transporte rodoviário representa mais um instrumento à disposição das administrações públicas para cumprirem as obrigações impostas pelas directivas comunitárias relativas à qualidade do ar.

4.8

A percentagem de substituição sugerida na proposta de directiva permitiria obter rapidamente os primeiros resultados de melhoria da qualidade do ar (18), respondendo os VEA a normas que reduzem drasticamente as emissões de HC, NOX e partículas.

4.9

A utilização de veículos VEA, além disso, contribui para diminuir os consumos de combustível e para incentivar a investigação para obter resultados cada vez mais significativos para o ambiente: o promover o uso de combustíveis alternativos e o estudar tecnologias de tratamento das emissões, por outro lado, dão um forte impulso ao crescimento da indústria automóvel.

4.10

Considerando que a vida média dos veículos pesados de transporte rodoviário que são objecto da proposta em exame é de cerca de 15 anos e pondo a hipótese da entrada em vigor da mesma em 2006, os entes públicos teriam tempo até 2030 para recuperar o investimento, fazer progressos a nível tecnológico e melhorar as normas das prestações.

4.11

Um empenho rápido e consistente na promoção dos veículos não poluentes teria efeitos benéficos também a nível social: melhorar a qualidade do ar dos centros urbanos significa, além do mais, reduzir o aparecimento ou o agravamento de doenças respiratórias, com a consequente melhoria do balanço da saúde pública.

Bruxelas, 17 de Maio de 2006.

A Presidente

do Comité Económico e Social Europeu

Anne-Marie SIGMUND


(1)  COM(2005) 634 final.

(2)  Directiva 2005/55/CE, artigo 1.o, alínea c) e Anexo I, ponto 6.2.1.

(3)  Directiva 1998/69/CE.

(4)  COM(2005) 261 final, de 5.7.2005.

(5)  COM(2005) 628 final, de 7.12.2005.

(6)  COM(2006) 34 final, de 7.2.2006.

(7)  COM(2000) 769.

(8)  COM(2001) 370.

(9)  COM(2001) 547: prevê a substituição de 20 % dos combustíveis tradicionais por combustíveis alternativos até 2020.

(10)  Direttiva 2003/30/CE.

(11)  COM(2005) 37.

(12)  COM(2005) 265.

(13)  Directiva 1996/62 relativa à qualidade do ar ambiente e directivas-filhas: Directiva 1999/30 relativa aos valores-limite para o dióxido de enxofre, dióxido de azoto, partículas em suspensão e chumbo no ar ambiente; Directiva 2000/69 relativa a valores-limite para o benzeno e o monóxido de carbono no ar ambiente; Directiva 2002/3 – objectivos para os valores do ozono.

(14)  COM(2005) 446 final.

(15)  A5-0054/2001.

(16)  Conselho Europeu de Helsínquia (1999) e Conselho Europeu de Gotemburgo (2001).

(17)  Em conformidade com as prioridades estabelecidas pelo Conselho Europeu de 22 e 23 de Março de 2005, no contexto da Estratégia de Lisboa.

(18)  A cidade de Montpellier introduziu os primeiros autocarros não poluentes a gás natural em 1999. Passados trinta meses as emissões de NOX tinham sido reduzidas em 50 %, as partículas em suspensão tinham desaparecido quase completamente e o ruído tinha sido reduzido de 5 a 8 decibéis. (Dados da ADEME, Agence de l'environnement et de la maitrise de l'energie – Delegação Regional do Languedoc-Roussillon).