ACÓRDÃO DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção)
30 de maio de 2013 ( *1 )
«Incumprimento de Estado — Diretiva 2006/24/CE — Conservação de dados gerados ou tratados no contexto da oferta de serviços de comunicações eletrónicas — Acórdão do Tribunal de Justiça que declara um incumprimento — Inexecução — Artigo 260.o TFUE — Sanções pecuniárias — Aplicação de uma quantia fixa»
No processo C-270/11,
que tem por objeto uma ação por incumprimento nos termos do artigo 260.o, n.o 2, TFUE, entrada em 31 de maio de 2011,
Comissão Europeia, representada por C. Tufvesson, D. Maidani e F. Coudert, na qualidade de agentes, com domicílio escolhido no Luxemburgo,
demandante,
contra
Reino da Suécia, representado por A. Falk e C. Meyer-Seitz, na qualidade de agentes,
demandado,
O TRIBUNAL DE JUSTIÇA (Quarta Secção),
composto por: L. Bay Larsen, presidente de secção, J. Malenovský, U. Lõhmus (relator), M. Safjan e A. Prechal, juízes,
advogado-geral: N. Jääskinen,
secretário: C. Strömholm, administradora,
vistos os autos e após a audiência de 9 de janeiro de 2013,
vista a decisão tomada, ouvido o advogado-geral, de julgar a causa sem apresentação de conclusões,
profere o presente
Acórdão
1 |
Com a sua petição, a Comissão Europeia pede que o Tribunal de Justiça se digne:
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Quadro jurídico
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O considerando 22 da Diretiva 2006/24 enuncia: «A presente diretiva respeita os direitos fundamentais e os princípios consagrados nomeadamente na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia [a seguir ‘Carta’]. Em especial, a presente diretiva, conjugada com a Diretiva 2002/58/CE [do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12 de julho de 2002, relativa ao tratamento de dados pessoais e à proteção da privacidade no setor das comunicações eletrónicas (Diretiva relativa à privacidade e às comunicações eletrónicas) (JO L 201, p. 37)], visa assegurar que sejam plenamente respeitados os direitos fundamentais dos cidadãos em matéria de respeito pela privacidade e pelas comunicações e de proteção dos dados pessoais, consagrados nos artigos 7.° e 8.° da Carta». |
3 |
O artigo 1.o da Diretiva 2006/24 dispõe: «1. A presente diretiva visa harmonizar as disposições dos Estados-Membros relativas às obrigações dos fornecedores de serviços de comunicações eletrónicas publicamente disponíveis ou de uma rede pública de comunicações em matéria de conservação de determinados dados por eles gerados ou tratados, tendo em vista garantir a disponibilidade desses dados para efeitos de investigação, de deteção e de repressão de crimes graves, tal como definidos no direito nacional de cada Estado-Membro. 2. A presente diretiva é aplicável aos dados de tráfego e aos dados de localização relativos quer a pessoas singulares quer a pessoas coletivas, bem como aos dados conexos necessários para identificar o assinante ou o utilizador registado. A presente diretiva não é aplicável ao conteúdo das comunicações eletrónicas, incluindo as informações consultadas utilizando uma rede de comunicações eletrónicas.» |
4 |
O artigo 15.o dessa diretiva enuncia: «1. Os Estados-Membros devem pôr em vigor as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à presente diretiva o mais tardar em 15 de setembro de 2007 e informar imediatamente a Comissão desse facto. Quando os Estados-Membros aprovarem essas disposições, estas devem incluir uma referência à presente diretiva ou ser acompanhadas dessa referência aquando da publicação oficial. As modalidades de referência são aprovadas pelos Estados-Membros. 2. Os Estados-Membros devem comunicar à Comissão o texto das principais disposições de direito interno que aprovarem nas matérias reguladas pela presente diretiva. 3. Até 15 de março de 2009, cada Estado-Membro pode diferir a aplicação da presente diretiva no que se refere à conservação de dados relacionados com o acesso à [I]nternet, às comunicações telefónicas através da Internet e ao correio eletrónico através da [I]nternet. Os Estados-Membros que tencionem recorrer a este número devem, aquando da aprovação da presente diretiva, notificar desse facto o Conselho e a Comissão, por meio de uma declaração. A declaração será publicada no Jornal Oficial da União Europeia.» |
Acórdão Comissão/Suécia
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No acórdão Comissão/Suécia, já referido, o Tribunal de Justiça declarou que, não tendo adotado, no prazo estabelecido, as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à Diretiva 2006/24, o Reino da Suécia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força dessa diretiva. |
Procedimento pré-contencioso
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Por ofício de 28 de junho de 2010, a Comissão enviou ao Reino da Suécia uma notificação para cumprir para que este lhe apresentasse as suas observações quanto às medidas adotadas para dar execução às obrigações decorrentes do acórdão Comissão/Suécia, já referido, no prazo de dois meses a contar da receção desta notificação para cumprir. |
7 |
Por ofícios de 27 de agosto de 2010, de 23 de novembro de 2010 e de 21 de janeiro de 2011, as autoridades suecas responderam à referida notificação para cumprir, tendo facultado à Comissão um ponto da situação do processo de transposição para o direito nacional da Diretiva 2006/24 e, designadamente, informado a mesma de que o projeto de lei para esse efeito tinha sido remetido ao Parlamento sueco em 8 de dezembro de 2010 e que a apreciação do mesmo estava prevista para a segunda metade do mês de março de 2011. |
8 |
Por ofício de 25 de março de 2011, o Reino da Suécia informou a Comissão de que, em 16 de março de 2011, o mesmo Parlamento decidiu adiar a adoção do referido projeto de lei por um ano. Essa decisão foi tomada por um sexto dos membros do Parlamento, em conformidade com um procedimento constitucional especial. Segundo esse Estado-Membro, após o decurso desse período de um ano, a comissão parlamentar responsável pelo processo apresentará no Parlamento uma proposta de transposição da Diretiva 2006/24 para o direito nacional. |
9 |
Nestas condições, a Comissão, considerando que o Reino da Suécia não tomou as medidas necessárias à execução do acórdão Comissão/Suécia, já referido, decidiu intentar a presente ação. |
Desenvolvimentos ocorridos durante o presente processo
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O Reino da Suécia, por um lado, informou a Comissão, por ofício de 22 de março de 2012, que o Parlamento sueco tinha adotado, em 21 de março de 2012, a proposta do governo relativa à transposição, para a sua ordem jurídica interna, da Diretiva 2006/24, cuja entrada em vigor se tinha fixado para 1 de maio de 2012, e, por outro, comunicou, por carta de 3 de abril de 2012, as medidas de transposição da referida diretiva para a legislação nacional. Por consequência, a Comissão declarou, em 7 de junho de 2012, que desistia parcialmente da sua ação no que diz respeito à sanção pecuniária compulsória de 40947,20 euros por dia. Todavia, manteve os seus pedidos relativos ao pagamento de uma quantia fixa e ao respetivo montante. |
11 |
Quanto às despesas, a Comissão considerou que, uma vez que a sua desistência relativa ao pedido principal de condenação do Reino da Suécia no pagamento de uma sanção pecuniária compulsória se deveu à atitude adotada por esse Estado-Membro após o termo da fase escrita, compete ao referido Estado suportar as despesas ligadas a esse aspeto do processo. |
12 |
Na sua contestação, o Reino da Suécia contesta, por um lado, o pedido da Comissão relativo ao pagamento de uma quantia fixa e, por outro, o seu respetivo montante. Esse Estado-Membro contesta igualmente o pedido da Comissão relativo às despesas e pede ao Tribunal de Justiça que condene cada uma das partes no pagamento das suas próprias despesas. |
Quanto ao incumprimento
Argumentos das partes
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No que respeita ao incumprimento alegado, a Comissão recorda que, em conformidade com o disposto no artigo 230.o, n.o 1, TFUE, quando o Tribunal de Justiça declara que um Estado-Membro não cumpriu uma das obrigações que lhe incumbem por força do Tratado FUE, esse Estado-Membro deve tomar as medidas que a execução do acórdão do Tribunal de Justiça implica. Quanto ao prazo no qual deve ser dada execução a esse acórdão, a Comissão precisa que decorre da jurisprudência do Tribunal de Justiça que o interesse na aplicação imediata e uniforme do direito da União Europeia impõe que essa execução seja iniciada imediatamente e esteja concluída no mais curto prazo possível. |
14 |
O Reino da Suécia admite que não adotou as medidas em questão no prazo estabelecido na notificação para cumprir de 28 de junho de 2010 para dar execução ao acórdão Comissão/Suécia, já referido. |
Apreciação do Tribunal
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Segundo o artigo 260.o, n.o 2, TFUE, se a Comissão considerar que o Estado-Membro em causa não tomou as medidas necessárias à execução do acórdão do Tribunal de Justiça, pode submeter o caso a este Tribunal, após ter dado a esse Estado a possibilidade de apresentar as suas observações, indicando a quantia fixa ou a sanção pecuniária compulsória a pagar pelo referido Estado que considere adequada às circunstâncias. |
16 |
A este respeito, a data de referência para apreciar a existência de um incumprimento nos termos do artigo 260.o, n.o 1, TFUE é a data do termo do prazo fixado na notificação para cumprir emitida ao abrigo dessa disposição (acórdãos de 11 de dezembro de 2012, Comissão/Espanha, C-610/10, Colet., n.o 67, e de 19 de dezembro de 2012, Comissão/Irlanda, C-374/11, n.o 19). |
17 |
No decurso do processo, o Reino da Suécia indicou que a adequação do seu direito nacional ao acórdão Comissão/Suécia, já referido, tinha sido designadamente efetuada através da proposta do governo relativa à transposição da Diretiva 2006/24, cuja entrada em vigor foi fixada para 1 de maio de 2012. |
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Assim, é pacífico que, após o período de dois meses que se seguiu à receção pelo Reino da Suécia da notificação para cumprir mencionada no n.o 6 do presente acórdão, a saber, em 28 de agosto de 2010, esse Estado-Membro não tinha, de qualquer modo, adotado todas as medidas necessárias para assegurar a execução do acórdão Comissão/Suécia, já referido. |
19 |
Nestas condições, há que declarar que, não tendo tomado as medidas necessárias para dar execução ao acórdão Comissão/Suécia, já referido, o Reino da Suécia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força do artigo 260.o TFUE. |
Quanto à quantia fixa
Argumentos das partes
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Para o cálculo da quantia fixa, a Comissão baseia-se no acórdão de 12 de julho de 2005, Comissão/França (C-304/02, Colet., p. I-6263), bem como na sua Comunicação de 13 de dezembro de 2005, intitulada «Aplicação do artigo 228.o do Tratado CE» [SEC(2005) 1658], conforme atualizada pela Comunicação de 20 de julho de 2010, intitulada «Aplicação do artigo 260.o do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia — Atualização dos dados utilizados para o cálculo das quantias fixas e das sanções pecuniárias compulsórias que a Comissão proporá ao Tribunal de Justiça no quadro de procedimentos de infração» [SEC(2010) 923/3, a seguir «comunicação de 2010»]. Segundo a Comissão, a fixação de sanções financeiras deve basear-se na gravidade da infração, na duração da mesma e na necessidade de assegurar o efeito dissuasivo da sanção para evitar situações de reincidência. |
21 |
Antes de mais, quanto à gravidade da infração, a Comissão alega que tem em conta a importância das disposições da União que são objeto da infração, os efeitos dessa infração nos interesses gerais e individuais, bem como a atitude do Estado demandado. |
22 |
No que diz respeito, em primeiro lugar, à importância das referidas disposições, a Comissão considera que a não execução do acórdão Comissão/Suécia, já referido, constitui um incumprimento particularmente grave, uma vez que este diz respeito a uma não transposição de uma diretiva que contém disposições de uma grande importância para os prestadores de serviços de comunicações eletrónicas. Além disso, essas disposições garantem, por um lado, um quadro jurídico equilibrado que garante o funcionamento do mercado interno assegurando, ao mesmo tempo, que as autoridades repressivas possam utilizar dados pertinentes a fim de lutar contra a grande criminalidade e, por outro, que os direitos fundamentais dos cidadãos sejam respeitados. |
23 |
Em segundo lugar, a Comissão considera que as consequências da infração para os interesses gerais e individuais são particularmente graves, na medida em que a não transposição pelo Reino da Suécia da Diretiva 2006/24 provocou um prejuízo financeiro às empresas estabelecidas em toda a União e a outros Estados-Membros. Essa não transposição conferiu uma vantagem concorrencial aos operadores privados de telecomunicações suecos, que não estão obrigados a conservar dados que concorrentes seus noutros Estados-Membros devem conservar nem a investir em mão de obra ou em material destinados a fornecer dados às autoridades. |
24 |
Em terceiro lugar, relativamente aos fatores a tomar em consideração na apreciação da gravidade da violação do direito da União, a Comissão considera que o incumprimento imputado está claramente demonstrado pelo facto de o Reino da Suécia não ter adotado nem notificado as medidas nacionais de transposição no prazo estabelecido, a saber, o mais tardar em 15 de setembro de 2007. Importa, contudo, ter em conta o facto de que esse Estado-Membro, no passado, nunca deixou de dar execução a um acórdão do Tribunal de Justiça nos termos do artigo 258.o TFUE. |
25 |
Tendo em conta os elementos e as circunstâncias acima mencionados, a Comissão propõe a aplicação de um coeficiente de gravidade de 10, numa escala de 1 a 20. |
26 |
Em seguida, quanto ao critério relativo à duração da infração, no contexto da execução do acórdão Comissão/Suécia, já referido, proferido em 4 de fevereiro de 2010, a Comissão salienta que decorreu um total de 426 dias entre o referido acórdão e 6 de abril de 2011, data da decisão de dar início a um processo por infração da Comissão contra o Reino da Suécia. |
27 |
Por último, quanto à necessidade de uma sanção dissuasiva suscetível de evitar a reincidência, a Comissão fixou, em aplicação da comunicação de 2010, o fator «n», fundado na capacidade de pagamento do Reino da Suécia, bem como no número de votos de que este dispõe no Conselho da União Europeia, em 4,57. |
28 |
Por consequência, a Comissão explica, na sua petição, que o montante da quantia fixa pedida, ou seja, 9597 euros por cada dia de infração, resulta, em conformidade com os critérios previstos na comunicação de 2010, da multiplicação da quantia fixa de base (210 euros por dia) pelo coeficiente de gravidade da infração fixado em 10 e pelo fator «n», que ascende a 4,57. O montante total assim obtido é de 4088322 euros por 426 dias de infração. |
29 |
Na sua contestação, o Reino da Suécia sustenta, principalmente, que a avaliação pela Comissão do incumprimento em causa é demasiado rigorosa, quer do ponto de vista da gravidade como da necessidade do efeito dissuasivo. Em especial, a Comissão não demonstrou a existência de circunstâncias que justifiquem a aplicação de um coeficiente de gravidade tão elevado de 10 para a infração em questão. |
30 |
A este respeito, esse Estado-Membro alega, por um lado, que a Diretiva 2006/24 não é tão importante para o funcionamento do mercado interno como a Comissão afirma. Esta diretiva apenas implica uma harmonização marginal das legislações nacionais na matéria. Com efeito, a obrigação imposta aos operadores para que conservem dados varia em função dos Estados-Membros, sendo-lhes facultado o poder de legislar no domínio do acesso das autoridades aos dados relativos ao tráfego das comunicações ou no da repartição dos custos da conservação suportados pelos operadores. Além disso, segundo o Reino da Suécia, já existem, no direito da União, regras que permitem, em certas condições, a conservação de dados relativos ao tráfego das comunicações tendo em vista a luta contra a criminalidade, designadamente a diretiva relativa à privacidade e às comunicações eletrónicas. |
31 |
Por outro lado, a Comissão não demonstrou que a não transposição desta diretiva pelo Reino da Suécia teve consequências ao nível dos interesses gerais e particulares que alega. Além disso, as regras atualmente em vigor no direito sueco permitiram, precisamente, evitar esses efeitos, garantindo a disponibilidade de dados para fins de investigação, deteção e perseguição de infrações graves. |
32 |
Esse Estado-Membro salienta igualmente que, na sua apreciação, a Comissão não levou em conta o facto de o acórdão Comissão/Suécia, já referido, só respeitar a uma falta parcial de aplicação da Diretiva 2006/24. Para este efeito, o Reino da Suécia refere que fez uso da faculdade que o artigo 15.o, n.o 3, desta diretiva confere de diferir a aplicação da mesma até 15 de março de 2009 no que respeita ao acesso à Internet, ao correio eletrónico e à telefonia via Internet. Por conseguinte, em seu entender, o acórdão Comissão/Suécia, já referido, só respeita à não transposição para a legislação nacional das disposições da diretiva relativamente às quais não era possível um adiamento do termo fixado em 15 de setembro de 2007. |
33 |
O Reino da Suécia salienta, por outro lado, que nunca deixou de executar um acórdão do Tribunal de Justiça nos termos do artigo 258.o TFUE. Além disso, sublinha que confere uma grande importância ao seu dever de cooperação leal. Apresenta como justificação do atraso imputado na execução do acórdão Comissão/Suécia, já referido, que teve de fazer face a um amplo debate político sobre a transposição da Diretiva 2006/24 para o seu direito interno e que a execução das medidas que a referida transposição exigia suscitou problemas ao nível do processo legislativo, bem como escolhas difíceis de efetuar, que implicam uma ponderação entre a proteção da privacidade e a necessidade de lutar eficazmente contra a criminalidade. |
34 |
Na sua réplica, a Comissão alega, antes de mais, que, ainda que a Diretiva 2006/24 não tenha por objetivo realizar uma harmonização completa, não pode daí concluir-se que esta diretiva não tem consequências ao nível do mercado interno ou dos interesses privados e públicos. As diferenças entre os Estados-Membros na aplicação da referida diretiva em nada diminuem a importância da obrigação de conservação dos dados de comunicação estabelecida por esta. |
35 |
Em seguida, quanto à regulamentação da União já existente e que o Reino da Suécia refere, designadamente a diretiva relativa à privacidade e às comunicações eletrónicas, a Comissão indica que esta não estabelece a obrigação aplicável em toda a União de conservar certos dados relativos ao tráfego durante um período definido. |
36 |
Além disso, no que diz respeito às disposições nacionais existentes invocadas pelo Estado-Membro demandado, a Comissão salienta que, mesmo na hipótese de o Reino da Suécia dever dispor de certos dados para efeito da luta contra a criminalidade, tal não resultaria da execução do acórdão Comissão/Suécia, já referido, na medida em que a disponibilidade desses dados depende unicamente de decisões comerciais tomadas pelos diversos operadores de telecomunicações. |
37 |
Por outro lado, quanto à argumentação desse Estado-Membro relativa ao facto de a inexecução do acórdão Comissão/Suécia, já referido, só respeitar a uma parte da Diretiva 2006/24, a Comissão salienta que, se os Estados-Membros podiam, em aplicação do artigo 15.o, n.o 3, desta diretiva, diferir a aplicação da obrigação de conservação até 15 de março de 2009, isso não significa que os referidos Estados estejam autorizados a não tomar a mínima medida relativa à obrigação de conservação de dados prevista nessa disposição antes de 15 de março de 2009. Por conseguinte, esse argumento baseia-se numa leitura errada do acórdão Comissão/Suécia, já referido. |
38 |
Por último, quanto ao argumento do Estado-Membro demandado relativo às dificuldades internas ligadas ao processo legislativo, a Comissão recorda a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça segundo a qual essas dificuldades internas não podem ser levadas em consideração no quadro da apreciação da infração cometida. |
39 |
Quanto às dificuldades de ordem interna, esse Estado-Membro alega que as invocou não para justificar a não transposição da Diretiva 2006/24, mas para justificar que, no caso em apreço, a transposição foi objeto de dificuldades tão pouco habituais que não podem ser atribuídas à abordagem nem à atitude normais do Reino da Suécia quando este aplica diretivas e dá execução aos acórdãos do Tribunal de Justiça. Esse Estado-Membro insiste igualmente no facto de o processo legislativo acima mencionado só se aplicar em casos excecionais. |
Apreciação do Tribunal
40 |
A título preliminar, importa recordar que a aplicação de uma quantia fixa deve, em cada caso concreto, depender de todos os elementos pertinentes relacionados tanto com as características do incumprimento verificado como com a atitude do Estado-Membro demandado no processo iniciado com fundamento no artigo 260.o TFUE. A este respeito, esta disposição confere ao Tribunal de Justiça um amplo poder de apreciação para decidir ou não a aplicação de uma sanção desta natureza (acórdãos, já referidos, Comissão/Espanha, n.o 141, e Comissão/Irlanda, n.o 47). |
41 |
Assim, as propostas da Comissão não vinculam o Tribunal de Justiça e apenas constituem uma base de referência útil. De igual modo, orientações como as constantes das comunicações da Comissão não vinculam o Tribunal de Justiça, mas contribuem para garantir a transparência, a previsibilidade e a segurança jurídica da ação empreendida pela Comissão (v. acórdão de 7 de julho de 2009, Comissão/Grécia, C-369/07, Colet., p. I-5703, n.o 112). |
42 |
Em primeiro lugar, quanto ao próprio princípio da aplicação de uma quantia fixa, por força do artigo 260.o TFUE, importa recordar que este princípio assenta, essencialmente, na apreciação das consequências da não execução das obrigações do Estado-Membro em causa ao nível dos interesses privados e públicos, designadamente quando o incumprimento tiver persistido por um longo período desde o acórdão que inicialmente o declarou (v. acórdão de 9 de dezembro de 2008, Comissão/França, C-121/07, Colet., p. I-9159, n.o 58). |
43 |
No presente processo, impõe-se declarar que, tendo em conta o objeto da Diretiva 2006/24, que visa, como decorre do artigo 1.o, n.o 1, desta última, garantir a disponibilidade dos dados relativos às comunicações eletrónicas para efeito de investigação, deteção e perseguição de infrações graves, a não execução do acórdão Comissão/Suécia, já referido, que declarou anteriormente um incumprimento relativo a essa diretiva, é suscetível de pôr em causa os interesses privados e públicos em questão. Além disso, na medida em que o incumprimento imputado ao Reino da Suécia durou mais de dois anos a contar de prolação desse acórdão, há que declarar que o mesmo persistiu durante um período considerável desde essa data. |
44 |
Assim, o Tribunal de Justiça considera que, no presente processo, há que aplicar ao Reino da Suécia o pagamento de uma quantia fixa. |
45 |
No que respeita, em segundo lugar, ao montante da quantia fixa, importa recordar que compete ao Tribunal de Justiça a respetiva fixação, de modo a que este seja, por um lado, adaptado às circunstâncias e, por outro, proporcionado ao incumprimento declarado e à capacidade de pagamento do Estado-Membro em causa (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Comissão/Grécia, n.o 146, e Comissão/Espanha, n.o 143). |
46 |
Entre os fatores pertinentes a esse respeito, figuram, designadamente, elementos como a gravidade da infração e o período durante o qual o incumprimento imputado persistiu, desde o acórdão que o declara (v., neste sentido, acórdão Comissão/Espanha, já referido, n.o 144). |
47 |
Em primeiro lugar, e quanto à gravidade do incumprimento à luz da importância das disposições da União infringidas, cumpre recordar que a Diretiva 2006/24 visa as atividades dos prestadores de serviços de comunicações eletrónicas no mercado interno e que o legislador da União prossegue o objetivo de proteger o bom funcionamento deste ao adotar regras harmonizadas em matéria de conservação dos dados relativos às comunicações eletrónicas (v., neste sentido, acórdão de 10 de fevereiro de 2009, Irlanda/Parlamento e Conselho, C-301/06, Colet., p. I-593, n.o 72). |
48 |
Através da harmonização que estabelece das legislações nacionais, a Diretiva 2006/24 visa, como resulta do seu artigo 1.o, n.o 1, garantir a disponibilidade desses dados para efeitos de investigação, de deteção e de perseguição de infrações graves, como são definidas por cada Estado-Membro no seu direito interno. Por outro lado, resulta do considerando 22 desta diretiva que esta visa assegurar que sejam plenamente respeitados os direitos fundamentais dos cidadãos em matéria de respeito pela privacidade e pelas comunicações e de proteção dos dados pessoais, consagrados nos artigos 7.° e 8.° da Carta. |
49 |
Neste quadro, há que considerar que o incumprimento da obrigação de transpor essa diretiva é suscetível de obstar ao bom funcionamento do mercado interno. Esse incumprimento reveste, por isso, um certo grau de gravidade, independentemente do nível de harmonização estabelecido pela Diretiva 2006/24. |
50 |
Quanto às consequências da não execução do acórdão Comissão/Suécia, já referido, ao nível dos interesses privados e públicos, no que respeita ao argumento da Comissão recordado no n.o 23 do presente acórdão, importa sublinhar que resulta dos pontos 6.1 e 6.2 do relatório da Comissão de 18 de abril de 2011, intitulado «Relatório da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu — Relatório de avaliação relativo à diretiva sobre a conservação de dados (Diretiva 2006/24/CE)» [COM(2011) 225 final], que a referida diretiva não alcançou plenamente o seu objetivo de instaurar condições de concorrência iguais entre os operadores da União. Assim, a Comissão devia demonstrar a alegada violação das condições de concorrência no mercado interno dos serviços de telecomunicações, o que não fez. |
51 |
Além disso, não pode ser admitido o argumento do Reino da Suécia segundo o qual já existem, no direito da União, regras que permitem, em certas condições, a conservação de dados relativos ao tráfego de comunicações com vista à luta contra a criminalidade e que as regras atualmente em vigor no direito sueco permitiram evitar consequências ao nível dos interesses gerais e particulares alegados pela Comissão. Com efeito, é pacífico que as referidas regras não respondem às exigências que decorrem da Diretiva 2006/24, uma vez que, em caso contrário, não haveria que declarar, relativamente a esse Estado-Membro, um incumprimento da sua obrigação de transposição da Diretiva 2006/24 para o direito interno. |
52 |
Quanto ao argumento do Reino da Suécia relativo ao facto de o acórdão Comissão/Suécia, já referido, só respeitar à falta de aplicação parcial da Diretiva 2006/24, este não tem fundamento. |
53 |
Com efeito, no acórdão Comissão/Suécia, já referido, o Tribunal de Justiça declarou e determinou que, não tendo adotado, no prazo estabelecido, as disposições legislativas, regulamentares e administrativas necessárias para dar cumprimento à Diretiva 2006/24, o Reino da Suécia não cumpriu as obrigações que lhe incumbem por força desta diretiva. O artigo 15.o, n.o 3, da Diretiva 2006/24 permitia aos Estados-Membros diferir a aplicação da obrigação de conservação de dados de comunicação até 15 de março de 2009, mas não a transposição da referida diretiva, que devia ser efetuada antes de 15 de setembro de 2007. |
54 |
Quanto à atitude adotada pelo Reino da Suécia à luz das suas obrigações que resultam da Diretiva 2006/24, as justificações invocadas por esse Estado-Membro de que o atraso na execução do referido acórdão se deveu a dificuldades internas extraordinárias, relacionadas com o processo legislativo, ao amplo debate político a respeito da transposição da Diretiva 2006/24 e aos problemas suscitados no plano de escolhas difíceis que implicam uma ponderação entre a proteção da privacidade e a necessidade de lutar eficazmente contra a criminalidade não podem ser acolhidas. Como o Tribunal de Justiça tem reiteradamente sublinhado, um Estado-Membro não pode invocar disposições, práticas ou situações da sua ordem jurídica interna para justificar a inobservância das obrigações resultantes do direito da União (v., designadamente, acórdão de 31 de março de 2011, Comissão/Grécia, C-407/09, Colet., p. I-2467, n.o 36). O mesmo se aplica relativamente a uma decisão como a do Parlamento sueco, a que é feita referência no n.o 8 do presente acórdão, de adiar por um ano a adoção do projeto de lei que visa transpor essa diretiva. |
55 |
Todavia, importa ter em conta como circunstância atenuante o facto de o Reino da Suécia nunca ter, no passado, deixado de executar um acórdão do Tribunal de Justiça nos termos do artigo 258.o TFUE. |
56 |
No que respeita, em segundo lugar, à duração do incumprimento que é objeto da presente ação, importa recordar que, embora o artigo 260.o TFUE não especifique o prazo dentro do qual deve ter lugar a execução de um acórdão, é, no entanto, facto assente que a execução deve ser iniciada imediatamente e estar concluída o mais rapidamente possível (v., designadamente, acórdão de 31 de março de 2011, Comissão/Grécia, já referido, n.o 34). |
57 |
No presente processo, há que salientar que o incumprimento se manteve durante aproximadamente 27 meses a contar da data de prolação do acórdão Comissão/Suécia, já referido, a saber, 4 de fevereiro de 2010, até à data em que o Reino da Suécia adequou totalmente a sua legislação ao referido acórdão, a saber, em 1 de maio de 2012. |
58 |
Por conseguinte, impõe-se declarar que o incumprimento imputado ao Reino da Suécia persistiu durante um período significativo desde a data da prolação do acórdão Comissão/Suécia, já referido. |
59 |
Atendendo aos elementos precedentes e, designadamente, às considerações que figuram nos n.os 47 a 58 do presente acórdão, o Tribunal de Justiça considera que será feita uma apreciação correta das circunstâncias do caso concreto ao fixar em 3 milhões de euros o montante da quantia fixa que o Reino da Suécia deverá pagar. |
60 |
Por conseguinte, há que condenar o Reino da Suécia a pagar à Comissão, na conta «Recursos próprios da União Europeia», uma quantia fixa de 3 milhões de euros. |
Quanto às despesas
61 |
Nos termos do artigo 138.o, n.o 1, do Regulamento de Processo do Tribunal de Justiça, a parte vencida é condenada nas despesas se a parte vencedora o tiver requerido. Tendo a Comissão pedido a condenação do Reino da Suécia e tendo este sido vencido, há que condená-lo nas despesas. |
Pelos fundamentos expostos, o Tribunal de Justiça (Quarta Secção) decide: |
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Assinaturas |
( *1 ) Língua do processo: sueco.